
| D.E. Publicado em 07/12/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, acolher em parte as preliminares, DAR PROVIMENTO à apelação do INSS, e JULGAR PREJUDICADA a apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0039565-97.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação objetivando a concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez ou de auxílio doença ou, ainda, do benefício assistencial de prestação continuada (LOAS), previstos nos artigos 42/47 e 59/63 da Lei n° 8.213/91, e inciso V do artigo 203 da Constituição Federal.
A sentença, prolatada em 19.06.2015, julgou parcialmente procedente o pedido para condenar a autarquia a conceder a aposentadoria por invalidez, a partir da data fixada como início da incapacidade laborativa pelo perito judicial (06.2014). Determinou que nas parcelas vencidas, a partir das respectivas competências, haverá incidência de correção monetária, aplicando-se o IPCA-e, conforme orientação do STJ, e serão acrescidas de juros de mora, a partir da citação, com base no índice oficial de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme a Lei n° 11.960/2009. Condenou o réu, também, ao pagamento de honorários de advogado, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, devidamente atualizado. Dispensado o reexame necessário, nos termos do art. 475, §2°, do CPC/1973.
Deferida a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional (fls. 165-167) para imediata implantação do benefício. Implantada a aposentadoria por invalidez com DIB em 01.06.2014 e RMI de R$ 724,00 (fl. 200).
Apela a parte autora, pleiteando a reforma da sentença, para que o termo inicial da aposentadoria por invalidez seja fixado na data do requerimento administrativo do auxílio doença em 05.2012, e para que seja majorado o percentual fixado a título de honorários advocatícios.
O INSS interpõe apelação, requerendo, preliminarmente, a submissão da sentença ao reexame necessário e a suspensão dos efeitos da tutela antecipada. No mérito, pleiteia a reforma da sentença, sob alegação de que a parte autora não preenche os requisitos legais para a concessão da aposentadoria por invalidez, em razão da ausência da qualidade de segurada. Subsidiariamente, requer que o termo inicial do benefício seja fixado na data da juntada do laudo pericial aos autos, a aplicação do disposto no art. 1º-F da Lei 9494/97, com a redação dada pela Lei 11.960/2009, em relação aos juros e correção monetária, e a redução do percentual fixado para os honorários advocatícios.
Parecer do MPF, opinando pelo não provimento das apelações, e pela reforma da sentença no que tange ao termo inicial do benefício.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos de apelação.
Por primeiro, em análise à preliminar arguida pelo INSS, considerando que a sentença foi proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, passo ao exame da admissibilidade da remessa necessária prevista no seu artigo 475.
Inicialmente, embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício (06.2014), seu valor aproximado (um salário mínimo - fl. 200) e a data da sentença (19.06.2015), que o valor total da condenação é inferior à importância de 60 (sessenta) salários mínimos, estabelecida no § 2º do art. 475 do Código de Processo Civil/1973.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária, cabendo a rejeição desta preliminar.
A preliminar de suspensão de tutela antecipada suscitada pela autarquia federal se confunde com o mérito, e com este será analisado.
Passo ao exame do mérito.
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Também é considerado segurado aquele que trabalhava, mas ficou impossibilitado de recolher contribuições previdenciárias em razão de doença incapacitante.
Nesse passo, acresça-se que no que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.
Por fim, quanto à carência, exige-se o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, conforme prescreve a Lei n.º 8.213/91, em seu artigo 25, inciso I, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;".
No caso concreto, a perícia judicial (fls. 110-134) atesta que a autora, vendedora ambulante de livros (fls. 02, 15, 35 e 66-67), 66 anos de idade, é portadora de cervicalgia, transtornos de disco cervical com radiculopatia, espondilose cervical sem radiculopatia, tenossinovite dos flexores dos 4° e 5° dedos da mão, tendinopatia do manguito rotador à direita, bursite de ombros bilateral, espondilose sem radiculopatia, e varizes em ambos os membros inferiores, com dermatite de estase, apresentando dor em coluna cervical, dor e formigamento em membros superiores, mais à direita, e dor em coluna lombar. Afirma a impossibilidade ao exercício da sua atividade habitual (vendedora ambulante), e todas aquelas que solicitem esforços físicos de coluna lombar e cervical, e movimentos repetitivos de membros superiores e mão direita, não podendo permanecer muito tempo em pé, e realizar grandes caminhadas, não indicando a reabilitação profissional em razão da idade e grau de alfabetização. Conclui pela existência de incapacidade total e permanente para o trabalho, insuscetível de recuperação e/ou reabilitação profissional, estimando a data de início da incapacidade laborativa, por falta de dados objetivos, em 06.2014, segundo o relato da autora.
Desse modo, comprovada a incapacidade laborativa para o exercício do trabalho.
Todavia, depreende-se do extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS (fls. 15-16 e 66) que a parte autora se filiou ao RGPS pela primeira vez, aos 51 anos de idade, recolhendo contribuições previdenciárias, como contribuinte individual, nos períodos de 04.1999 a 10.1999 e de 07.2001 a 10.2001, e gozou administrativamente do benefício de auxílio doença no interregno de 14.11.2001 a 15.09.2002. Após quase dez anos sem vínculo com a Previdência, refiliou-se ao RGPS, aos 63 anos de idade, recolhendo contribuições previdenciárias, na condição de contribuinte individual, no período de 11.2011 até 03.2012 (fl. 15), e requereu o benefício de auxílio doença NB n° 551.235.738-3 na data de 03.05.2012 (fl. 09), que restou indeferido em razão da não constatação de incapacidade laborativa.
A autora juntou aos autos documentos médicos posteriores ao requerimento administrativo do benefício de auxílio doença em 03.05.2012 (fls. 12-13 e 135-142), o que impede a verificação do momento em que efetivamente as patologias tornaram-se incapacitantes.
Desse modo, ressalto que, nos termos do art. 332 e 333, I do CPC/1973 (arts. 369 e 373, I, do CPC/2015), cabe à parte autora a comprovação do direito alegado, ônus do qual não se desincumbiu.
Não obstante, nota-se do teor do conjunto probatório (laudo pericial: doenças degenerativas, progressivas, irreversíveis, inerentes a grupo etário - fls. 114-124 e 129 / e do documento médico - fls. 135) que a parte autora se refiliou ao RGPS (11.2011 - fl. 66) já portadora de incapacidade laborativa, ressaltando-se que a requerente já apresentava afecções em grau avançado (com compressão radicular).
Vale salientar, conforme a prova dos autos, que trata-se de doenças degenerativas e evolutivas, comumente associadas à idade avançada e consolidadas com o passar dos anos, não sendo crível que surgissem abruptamente e a incapacitasse exatamente após o recolhimento das contribuições previdenciárias necessárias para readquirir a qualidade de segurada e recuperar a carência exigida para a concessão dos benefícios em espécie.
Nesse passo, levando em conta seu reingresso no sistema em 11.2011, aos 63 anos de idade, forçoso concluir que a incapacidade já se manifestara, e que a parte autora refiliou-se com o nítido intuito de readquirir sua condição de segurada para o fim de obter a aposentadoria por invalidez e/ou auxílio doença.
Desse modo, não basta a prova de ter contribuído em determinada época ao RGPS; há que se demonstrar a não existência da incapacidade laborativa, quando se filiou (ou refiliou) à Previdência Social, conforme evidenciado pelo conjunto probatório.
Ora, é sabido que a Previdência Social é ramo da seguridade social assemelhado ao seguro, vez que possui caráter eminentemente contributivo. O custeio do sistema pressupõe o recolhimento de contribuições para o fundo que será revertido àqueles que, preenchidos os requisitos, padecerem em eventos previstos e por ele cobertos.
Para outras situações de desamparo social, previu o constituinte benefícios assistenciais que dispensam contribuições regulares (art. 6º c/c art. 203, CF).
A doença ou invalidez são contingências futuras e incertas, todavia, as doenças degenerativas, evolutivas, próprias do envelhecer devem ser analisadas com parcimônia, já que filiações extemporâneas e reingressos tardios afrontam a lógica do sistema, causando desequilíbrio financeiro e atuarial.
Nesse sentido, os seguintes julgados: TRF3, AC 0034800-49.2016.403.9999SP, Décima Turma, Des. Fed. NELSON PORFIRIO, Julgamento: 20/06/2017, e-DJF3 Judicial I: 29/06/2017, TRF3, AC 0000986-12.2017.403.9999 SP, Oitava Turma, Des. Fed. TANIA MARANGONI, Julgamento: 06/03/2017, e-DJF3 Judicial I: 20/03/2017.
Logo, tratando-se de doenças, geradoras de incapacidade laborativa preexistente à refiliação ao RGPS, nos termos do parágrafo único do art. 59 e art. 42, § 2°, ambos, da Lei n° 8.213/91, não preencheu a parte autora um dos requisitos legais exigidos pela legislação de regência para a concessão dos benefícios por incapacidade, a tornar inviável a concessão dos benefícios pleiteados.
Passo ao exame dos critérios para concessão do benefício assistencial.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
Conforme cópia do documento de identidade de fls. 08, tendo a parte autora nascido em 09.03.1948, contava com 65 anos de idade no momento do ajuizamento do feito, e, portanto está compreendida no conceito legal de idosa para fins de concessão do benefício assistencial.
Assim, restando atendido um dos critérios fixados no caput do artigo 20 da Lei nº 8.742/93 com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011 c/c o art. 34 da Lei nº 10.741/2003, necessário averiguar-se o preenchimento do requisito da miserabilidade, uma vez que a lei exige a concomitância de ambos para que o benefício assistencial possa ser concedido.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
Com relação ao cálculo da renda per capita, a Lei 10.741/03 assim preceitua:
"Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - Loas. (Vide Decreto nº 6.214, de 2007)
Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas."
Entretanto, a Suprema Corte, no RE 580.963/PR, sob regime de repercussão geral, declarou a inconstitucionalidade parcial, por omissão, sem pronúncia de nulidade da norma em comento, ante a inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em, relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo.
E nesse sentido, assim o Colendo Superior Tribunal de Justiça decidiu em sede de julgamento de recurso repetitivo: "(...) 2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93." RECURSO REPETITIVO (Tema: 640) REsp 1355052 / SP RECURSO ESPECIAL 2012/0247239-5 Relator(a) Ministro BENEDITO GONÇALVES (1142)Órgão Julgador S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data do Julgamento 25/02/2015, Data da Publicação/Fonte DJe 05/11/2015)
Indo mais além, a constitucionalidade do próprio § 3º, artigo 20 da Lei 8742/93, também foi questionada na ADI 1.232-1/DF, que, todavia, foi julgada improcedente.
Embora reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93, a jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelece situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impede o exame de situações específicas do caso concreto, a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Ou seja, a verificação da renda per capita familiar seria uma das formas de aferição de miserabilidade, mas não a única.
Neste sentido decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.112.557-MG:
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade e o entendimento firmado no julgamento da ADI 1.232-DF levou a Corte Suprema a enfrentar novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993. O julgado reconheceu a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
O reconhecimento da inconstitucionalidade parcial sem nulidade do § 3º, art. 20 da Lei 8742/93 indica que a norma só é inconstitucional naquilo em que não disciplinou, não tendo sido reconhecido a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência.
Cabe ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial, e suprimir a inconstitucionalidade apontada.
Dessa forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Tecidas tais considerações, no caso concreto o estudo social elaborado em 08.05.2014 (fls. 93/101) revela que a parte autora reside com seu marido em casa própria, de alvenaria, com dois quartos, duas salas, banheiro, cozinha e varanda, em bom estado de conservação.
Informaram que a renda da família advém da aposentadoria do marido da parte autora, que somada ao salário por ele auferido face ao seu labor na Prefeitura do Município de Birigui/SP alcança o valor de 1.448,00.
Relataram despesas no valor de R$ 1.554,92, tendo sido reportados gastos com empréstimos consignados (R$ 342,71), energia elétrica (R$ 50,00), água (R$ 35,00), gás (R$ 40,00), IPTU e parcelamento de IPTU (R$ 70,00), convênio médico (R$ 87,21), farmácia (R$ 240,00), alimentação/produtos de higiene/limpeza (R$ 600,00) e padaria (R$ 90,00).
Em que pese a argumentação de que o valor auferido pelo casal é insuficiente para suprir suas necessidades básicas, conforme o extrato do sistema CNIS que ora faço juntar a esta decisão, verifico que o salário auferido pelo marido da autora em maio e junho de 2014 foi de R$ 868,00, entretanto em julho de 2014 teve substancial aumento, e passou a receber valores acima R$ 1.100,00, sendo que em 08/2018 sua remuneração foi de R$ 1.768,00. Assim, nota-se que em 07/2014 a renda do casal era de aproximadamente R$ 1.824,00, valor superior às despesas informadas.
Além disso, nota-se que o casal possui três filhos maiores de idade e aptos ao trabalho.
Por certo que nos termos do § 1o do artigo 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados não integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação da família de prestar a assistência, pelo que o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Nesse sentido, aliás, a decisão proferida pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), datada de 23 de fevereiro de 2017, em sede de pedido de uniformização de jurisprudência formulado pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS nos autos do processo nº 0517397-48.2012.4.05.8300, que firmou posicionamento no sentido que "o benefício assistencial de prestação continuada pode ser indeferido se ficar demonstrado que os devedores legais podem prestar alimentos civis sem prejuízo de sua manutenção".
Desta forma, não restando comprovada a condição de miserabilidade da parta autora, resta incabível a concessão do benefício assistencial.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de advogado, que ora fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, de acordo com o §4º do artigo 20 do Código de Processo Civil/1973, considerando que o recurso foi interposto na sua vigência, não se aplicando as normas dos §§1º a 11º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.
Revogo a antecipação de tutela anteriormente concedida e, em consequência, determino a devolução dos valores recebidos a esse título, consoante decidido pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia, REsp nº 1401560/MT, julgado em 12/02/2014, DJe 13/10/2015.
Ante o exposto, acolho em parte as preliminares, e DOU PROVIMENTO à apelação do INSS, para julgar improcedente o pedido formulado na inicial, e JULGO PREJUDICADA a apelação da parte autora. Em consequência, revogo a tutela antecipada concedida e determino a devolução dos valores indevidamente pagos a esse título, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal
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