
| D.E. Publicado em 15/03/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, acolher questão preliminar, e, no mérito, dar parcial provimento ao apelo da União Federal e ao reexame necessário, bem como negar provimento ao apelo da impetrante, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0013091-68.2014.4.03.6105/SP
RELATÓRIO
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator:
Trata-se de apelações e reexame necessário perante sentença que concedeu parcialmente a segurança pleiteada por VS ESTACIONAMENTO CAMPINAS LTDA, reconhecendo a não incidência de contribuições previdenciárias e as contribuições destinadas a terceiros (sistema S) sobre: o abono constitucional de férias; o aviso prévio indenizado e seus reflexos; e os primeiros 15 dias de recebimento de auxílio-doença ou de auxílio-acidente. Por seu turno, denegou o pedido quanto: as férias gozadas; as horas extras e o salário-maternidade.
Em apertada síntese, sustenta a impetrante que as contribuições destinadas à Seguridade Social e a outras entidades e aquelas destinadas a terceiros (salário educação, SESC, SENAC, INCRA e SEBRAE) sobre a folha de salários não devem incidir sobre: (i) aviso prévio indenizado; (ii) férias normais; (iii) adicional constitucional de férias; (iv) auxílio-doença ou auxílio-acidente devidos nos primeiros 15 dias; (v) salário-maternidade; e (vi) horas extras, por configurarem verbas de natureza indenizatória. Pede ainda a compensação dos valores recolhidos indevidamente, corrigidos pela SELIC, com contribuições destinadas à Seguridade Social e a outras entidades.
SEBRAE-SP arguiu sua ilegitimidade passiva, ausente a capacidade tributária ativa, a atribuição do SEBRAE NACIONAL de receber e gerir os recursos das contribuições objeto do litígio e a impossibilidade de efetuar a compensação almejada (fls. 88/96).
O Delegado da Receita Federal do Brasil em Campinas (SP) apontou sua ilegitimidade em relação às contribuições destinadas a terceiros, e a impossibilidade de efetuar a compensação dessas contribuições. No mérito, defendeu a incidência das contribuições previdenciárias sobre as verbas identificadas na inicial, dada sua natureza salarial. Quanto ao direito à compensação, ressaltou a limitação imposta pelo art. 26 da Lei 11.457/07 e da vedação à compensação antes do trânsito em julgado (fls. 113/130).
SENAC prestou informações às fls. 132/142.
Ao fulcro do art. 7º, II, da Lei 12.016/09, o INCRA veio aos autos ressaltar que não tem interesse em ingressar no feito. No mérito, defendeu a exação tributária (fls. 197/210).
SESC-SP sustentou em preliminar a inadequação da via eleita, por traduzir discussão de lei em tese (Súmula 266 do STF). No mérito, defendeu que as bases de cálculo das contribuições previdenciárias e destinadas a terceiros não se confundem. Enquanto as primeiras recaem sobre as verbas de natureza salarial, as segundas devem incidir sobre todos os valores constantes na folha de salários. No mais, as contribuições sociais incidem sobre os rendimentos creditados a qualquer título ao trabalhador, na forma do art. 195, I, a, da CF. Ainda, defendeu a natureza salarial das verbas em comento (fls. 216/237).
O FNDE manifestou seu desinteresse de ingressar na causa (fls. 250).
O Ministério Público Federal oficiante em Primeiro Grau opinou apenas pelo regular prosseguimento do feito (fls. 255).
O juízo afastou as preliminares aventadas, sustentando que, enquanto destinatárias da receita proveniente das contribuições, figuram no polo passivo da obrigação tributária ora discutida. No mérito, considerou que: (i) as férias indenizadas e o adicional constitucional de férias não integram o salário-de-contribuição, conforme disposto no art. 28, § 9º, d, da Lei 8.212/91, e possuem natureza indenizatória; (ii) as férias gozadas ou normais têm natureza salarial; (iii) o aviso prévio indenizado e seus reflexos assumem caráter indenizatório, pois não decorrem da prestação laboral; (iv) o auxílio-doença e o auxílio-acidente devidos nos primeiros 15 dias é benefício previdenciário, não incidindo as contribuições; (v) o salário-maternidade constitui parcela remuneratória, consoante jurisprudência do STJ; e (vi) a hora extra assume natureza salarial, integrando inclusive o salário se paga com habitualidade.
Dado ser a base de cálculo idêntica, afastou a incidência tanto das contribuições previdenciárias quanto a de terceiras para aquelas verbas de natureza indenizatória. Reconheceu o direito à compensação, após o transito em julgado, dos créditos da impetrante - corrigidos pela SELIC - com quaisquer tributos ou contribuições administrados pela Receita Federal. Sujeitou sua decisão ao reexame necessário (fls. 258/272).
SESC-SP opôs embargos de declaração (fls. 275/281), não acolhidos (fls. 305).
A impetrante interpôs apelação, pleiteando o reconhecimento da natureza indenizatória das férias gozadas, do salário-maternidade e das horas extras, por não traduzirem contraprestação pelo labor (fls. 282/301).
SENAC interpôs apelo, procurando afastar o caráter indenizatório das aludidas verbas (fls. 307/320).
SEBRAE-SP reiterou sua ilegitimidade passiva, e pugnou pela impossibilidade de compensação das contribuições destinadas ao "Sistema S" (fls. 328/336).
A União Federal interpôs apelação, defendendo a exação tributária (fls. 351/357).
Contrarrazões às fls. 358/361, 378/382, 383/395, 396/410, 411/427, 435/457.
SESC interpôs apelo, reiterando os argumentos dispendidos em sua primeira manifestação (fls. 362/375).
A Procuradoria Regional da República opinou pelo regular prosseguimento do feito (fls. 432).
É o relatório.
VOTO
Em sede preliminar, cumpre analisar a legitimidade passiva das entidades às quais os recursos provenientes das contribuições a terceiros se destinam. Para tanto, mister analisar como se dá a instituição e cobrança dessas contribuições em nosso ordenamento, porquanto o objeto mandamental cinge-se sobre a relação obrigacional tributária da qual a impetrante é sujeito passivo.
O art. 149 da CF diz que "compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas". Ou seja, a competência tributária para a sua instituição é privativa da União Federal.
Por seu turno, com a edição da Lei 11.457/07 e a unificação das Receitas Federal e Previdenciária, a Secretaria da Receita Federal do Brasil passou a ser o órgão responsável pelo planejamento, execução e acompanhamento das atividades relativas à tributação, fiscalização, arrecadação, cobrança e recolhimento das contribuições sociais, incluindo nestas as contribuições destinadas a terceiros (arts. 2º e 3º).
Ou seja, as entidades que recebem as receitas provenientes daquelas contribuições não detêm capacidade tributária ativa quanto às mesmas; basicamente não podem efetuar seu lançamento ou cobrança, mantida tal atribuição junto à União Federal. Em assim sendo, não participam da relação tributária em nenhum momento, figurando apenas como destinatários daqueles recursos.
Nesse diapasão, não detém interesse jurídico para figurar nas causas onde se discute a exigibilidade das contribuições destinadas a terceiros, mantendo apenas interesse econômico, haja vista eventual procedência do pedido resultar em diminuição dos recursos destinados. Logo, não se configura o litisconsórcio necessário entre a União Federal e estas entidades, reconhecendo-se a ilegitimidade passiva destas na causa.
Por força do art. 5º, par. único, da Lei 9.469/97, o INCRA e o FNDE, enquanto pessoas jurídicas de natureza autárquica, poderiam solicitar o ingresso no feito com intuito meramente econômico - o que não importa na formação de litisconsórcio necessário. Porém, as mesmas expressamente registraram seu desinteresse quando se manifestaram (fls. 197 e 250), motivo pelo qual devem ser excluídos do polo passivo da causa.
Nesse sentido, registrem-se os seguintes julgados, notadamente da Primeira Turma desta Corte:
Registre-se a existência de jurisprudência em contrário (AMS 00228077120134036100 / TRF3 - QUINTA TURMA / DES. FED. PAULO FONTES / e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/12/2015, AC 003099122201340134000030991-22.2013.4.01.3400 / TRF1 - SÉTIMA TURMA / DES. FED. JOSÉ AMILCAR MACHADO / e-DJF1 DATA:22/01/2016), reputando suficiente para a configuração do litisconsórcio necessário o fato de o produto da arrecadação ser destinado legal e constitucionalmente àquelas entidades. Reitera-se, porém, que a destinação não traz as mesmas à relação tributária, motivo pelo qual deve ser reconhecida a ilegitimidade passiva do FNDE, SESC, SENAC, INCRA E SEBRAE.
No mérito, a questão central tem por escopo delimitar quais das verbas identificadas na inicial têm natureza indenizatória, o que a descaracterizaria como fato gerador das contribuições em tela, à luz do art. 195, I, a, da CF. Vamos a elas:
Auxílio doença e auxílio acidente pago pelo empregador
Previsto nos arts. 59 a 63 da Lei 8.213/91, o auxílio-doença é devido ao segurado incapacitado para o labor por mais de 15 dias consecutivos. Durante os primeiros 15 dias, incumbirá ao empregador o pagamento (art. 60, §3º), sendo pago o auxílio-doença pelo INSS após esse período.
O STJ já decidiu pelo caráter indenizatório desta verba quando do julgamento em sede de recursos repetitivos (REsp 1230957 - RS), pois o empregado afastado por motivo de doença não presta serviço e, consequentemente, não recebe salário, mas verba de caráter previdenciário do empregador nos 15 primeiros dias de incapacitação. O fato do empregador efetuar o pagamento não desnatura a natureza da verba recebida, mas apenas transfere o encargo do pagamento. In verbis:
A posição continua a ser aplicada pelo órgão superior:
O mesmo se diga quanto ao auxílio-acidente, previsto no art. 86 da Lei 8.213/91, conforme posição do STJ:
Aviso-prévio indenizado e reflexos
Em sede de recursos repetitivos, o STJ reconheceu a natureza indenizatória das verbas em tela (REsp 1230957 - RS):
Férias gozadas e indenizadas
O art. 142 da CLT impõe que caberá ao trabalhador a percepção da remuneração devida durante o gozo de férias, dispondo expressamente o art. 148 acerca de sua natureza salarial.
Por esse motivo, o STJ tem jurisprudência pacífica quanto à incidência das contribuições sobre a referida verba, já registrando a Colenda Corte que o decidido no RE 1.322.945-DF foi reformado em sede de embargos de declaração, de forma a adequar o julgado à posição remansosa proferida pelo tribunal:
Por seu turno, em não sendo gozadas, caberá indenização no valor da remuneração devida ou em dobro, se não gozadas no período concessivo. A referida verba é expressamente excluída do salário-de-contribuição dada a sua natureza indenizatória (art. 28, § 9º, d, da Lei 8.212/91), fato apontado pela jurisprudência deste Tribunal:
Adicional de Férias (terço constitucional)
Decorrente de expressa norma constitucional (art. 7º, XVII, da CF), o adicional de 1/3 devido pelo gozo de férias anuais, quando indenizado, não integra o salário-de-contribuição por disposição legal expressa (art. 28, § 9º, "d", da Lei 8.212/91).
Porém, o STJ decidiu (REsp 1230957 - RS) pela natureza indenizatória do adicional também quando percebido pelo gozo das férias, em obediência a entendimento do STF de que o adicional "tem por finalidade ampliar a capacidade financeira do trabalhador durante seu período de férias, possuindo, portanto, natureza compensatória/indenizatória".
Nesse sentido:
Não obstante o referido entendimento ter sido exarado para contribuições referentes a Regime Próprio Previdenciário, o STJ aplicou-o analogicamente, em atenção ao art. 201, § 11, da CF, pois somente os ganhos habituais incorporados ao salário constituiriam a base de cálculo da contribuição previdenciária. In verbis:
Julgados posteriores apontam que a posição não sofreu alterações:
Salário Maternidade
O salário-maternidade é devido às seguradas por ocasião do parto, adoção ou guarda judicial, cumprindo à empresa efetuar seu pagamento e compensar os valores pagos com as contribuições previdenciárias incidentes sobre a folha de salários (arts. 72, § 1º).
O STJ tem posição sedimentada sobre a natureza salarial do benefício (REsp 1230957 - RS), asseverando que o fato de não haver prestação de trabalho durante o período do recebimento (licença-maternidade) não autoriza o pensamento em contrário, sob pena de se ampliar a proteção dada sem base legal. In verbis:
O STJ continua a aplicar o entendimento firmado em sede de recurso repetitivo:
Horas Extras e Adicionais de Insalubridade, Periculosidade e Noturno
Em sede de recurso repetitivo (REsp 1358281 / SP, MIN. HERMAN BENJAMIN, DJe 05.12.14), a Primeira Seção do STJ sedimentou posição pela natureza remuneratória das horas extras, adicionais noturno e de periculosidade, concluindo pela incidência da contribuição previdenciária.
Nesse sentido, e ampliando o caráter remuneratório ao adicional de insalubridade, por analogia:
Assentado o reconhecimento da natureza indenizatória de algumas das verbas aludidas na inicial, mister reconhecer também a não incidência das contribuições - previdenciárias ou destinadas a terceiros - sobre as mesmas, por não configurarem base de cálculo daqueles tributos. Não obstante apresentarem destinação diversa, por óbvio aquelas contribuições apresentam idêntica base de cálculo - as verbas salarias devidas pelo empregador - não cumprindo qualquer distinção quanto ao que seja "folha de salários" para fins de sua incidência.
Nesse sentido:
Assentada a existência de créditos tributários em favor da impetrante, a serem atualizados pela Taxa SELIC (art. 89, § 4º, da Lei 8.212/91), cumpre verificar a possibilidade de sua compensação com débitos tributários eventualmente devidos.
O art. 89 da Lei 8.212/91 dispõe que os indébitos oriundos de contribuições previdenciárias, contribuições instituídas a título de substituição e de contribuições destinadas a terceiros poderão ser restituídas ou compensadas de acordo com regulamentação a ser instituída pela Receita Federal do Brasil. Por seu turno, o art. 26, par. único da Lei 11.457/06 exclui o sistema previsto no art. 74 da Lei 9.430/96 para as contribuições previdenciárias, impossibilitando sua compensação com tributos de outras espécies também administrados pela Receita Federal.
Seguindo os parâmetros estabelecidos pelas normas legais acima e à sistemática adotada antes da vigência do art. 74 (art. 66 da Lei 8.383/91 c/c art. 39 da Lei 9.250/95), o art. 44 da então vigente IN RFB 900/08 e o art. 56 da IN RFB 1.300/12 preveem a possibilidade de compensação dos créditos de contribuições previdenciárias pagas a maior ou indevidamente com débitos vincendos de mesma espécie.
Porém, em seus arts. 47 e 59, expressamente vedam a compensação de contribuições destinadas a outras entidades ou fundos, instituindo limitação até então não prevista na lei. Por isso, em recente decisão, o STJ entendeu que aqueles dispositivos extrapolaram os limites do poder regulamentar autorizado pelo art. 89, reputando-os ilegais:
A partir deste entendimento, notadamente a Segunda Turma deste Tribunal vem afastando a aplicação da norma infralegal e permitindo a compensação de contribuições a terceiros com débitos de mesma espécie:
Não se desconhece a existência de julgados em contrário (AMS 00001701620154036114 / TRF3 - PRIMEIRA TURMA / DES. FED. WILSON ZAUHY / e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/10/2016, APELREEX 00071318320134036100 / TRF3 - PRIMEIRA TURMA / DES. FED. WILSON ZAUHY / e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/10/2016), mas o teor do art. 89 somente admite a regulamentação do procedimento de compensação a ser adotado pelo contribuinte quando detentor de créditos provenientes de contribuições previdenciárias, em substituição e destinadas a terceiros - não a supressão de uma dessas hipóteses. Logo, deve-se admitir a compensação dos respectivos créditos com débitos tributários de mesma espécie, nos moldes estipulados para as contribuições previdenciárias.
Pelo exposto, conheço de questão preliminar para excluir do polo passivo todos os entes que não a União Federal. No mérito, dou parcial provimento ao apelo da União Federal e ao reexame necessário e nego provimento ao apelo da impetrante, reconhecendo o direito creditório da impetrante quanto às contribuições incidentes sobre: adicional constitucional de férias, aviso prévio indenizado e reflexos, e auxílio-acidente e auxílio-doença devidos nos primeiros 15 dias, recolhidas a maior nos últimos cinco anos da impetração. Os créditos poderão ser compensados com tributos de mesma espécie, após atualização pela taxa SELIC.
É como voto.
Johonsom di Salvo
Desembargador Federal
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