D.E. Publicado em 10/11/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido e dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA:10021 |
Nº de Série do Certificado: | 10A516070472901B |
Data e Hora: | 25/10/2016 20:52:52 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001457-22.2012.4.03.6113/SP
RELATÓRIO
Trata-se remessa oficial, havida como submetida, e apelação em ação de conhecimento objetivando computar o tempo de trabalho em atividade especial e reconhecimento do tempo comum de 08.01.86 a 17.02.86 e 01.03.86 a 28.04.86, cumulado com pedido de aposentadoria especial ou, sucessivamente, aposentadoria por tempo de contribuição, desde o requerimento administrativo.
O autor interpôs agravo retido às fls. 257/261.
O MM. Juízo a quo julgou extinto feito, nos termos do Art. 267, VI, do CPC/73, em relação ao reconhecimento da atividade comum de 08.01.86 a 17.02.86 e 01.03.86 a 28.04.86, e julgou parcialmente procedente o pedido, para o fim de reconhecer a natureza especial das atividades exercidas de 03.03.97 a 04.03.97, deixando de condenar o autor nos ônus da sucumbência, em razão do deferimento do benefício da assistência judiciária gratuita.
O autor apela, pleiteando, em preliminar, o conhecimento do agravo retido. No mérito, pleiteia a reforma parcial da r. sentença, com o reconhecimento da natureza especial das atividades de gerente de qualidade, gerente de produção, almoxarife e supervisor, nos períodos indicados e a concessão da aposentadoria especial.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
Por primeiro, conheço do agravo retido, contudo, nego-lhe provimento, vez que a legislação previdenciária impõe ao autor o dever de apresentar os formulários emitidos pelos empregadores descrevendo os trabalhos desempenhados, suas condições e os agentes agressivos a que estava submetido.
Passo ao exame da matéria de fundo.
Anoto o requerimento administrativo de aposentadoria especial NB 46/157.182.732-0, com a DER em 27/07/2011 (fls. 41).
Para a obtenção da aposentadoria integral exige-se o tempo mínimo de contribuição (35 anos para homem, e 30 anos para mulher) e será concedida levando-se em conta somente o tempo de serviço, sem exigência de idade ou pedágio, nos termos do Art. 201, § 7º, I, da CF.
Por sua vez, a Emenda Constitucional 20/98 assegura, em seu Art. 3º, a concessão de aposentadoria proporcional aos que tenham cumprido os requisitos até a data de sua publicação, em 16/12/98. Neste caso, o direito adquirido à aposentadoria proporcional, faz-se necessário apenas o requisito temporal, ou seja, 30 (trinta) anos de trabalho no caso do homem e 25 (vinte e cinco) no caso da mulher, requisitos que devem ser preenchidos até a data da publicação da referida emenda, independentemente de qualquer outra exigência.
Em relação aos segurados que se encontram filiados ao RGPS à época da publicação da EC 20/98, mas não contam com tempo suficiente para requerer a aposentadoria - proporcional ou integral - ficam sujeitos as normas de transição para o cômputo de tempo de serviço. Assim, as regras de transição só encontram aplicação se o segurado não preencher os requisitos necessários antes da publicação da emenda. O período posterior à Emenda Constitucional 20/98 poderá ser somado ao período anterior, com o intuito de se obter aposentadoria proporcional, se forem observados os requisitos da idade mínima (48 anos para mulher e 53 anos para homem) e período adicional (pedágio), conforme o Art. 9º, da EC 20/98.
A par do tempo de serviço, deve o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do Art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu Art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado Art. 25, II.
Quanto ao tempo de contribuição, a carteira de trabalho e previdência social - CTPS reproduzida às fls. 42/71, registra os contratos de trabalhos da autora nos seguintes períodos e cargos: de 27/05/1982 a 12/04/1985 - sapateiro, de 02/05/1985 a 06/01/1986 - sapateiro, de 08/01/1986 a 17/02/1986 - carteiro, de 01/03/1986 a 28/04/1986 - aux.controle de qualidade, de 02/05/1986 a 16/04/1987 - gerente de qualidade, de 20/04/1987 a 03/09/1987 - gerente de qualidade, de 01/10/1987 a 14/09/1988 - gerente de produção, de 11/10/1988 a 28/06/1991 - almoxarife, de 01/07/1991 a 21/08/2002 - supervisão de área, 10/09/2002 a 03/03/2003 - gerente de produção, 10/03/2003 a 31/12/2003 - gerente, 02/02/2004 a 11/03/2004 - gerente, 18/03/2004 a 28/09/2004 -gerente, e a partir de 01/03/2005 - gerente, sem anotação da data de saída.
A questão tratada nos autos também diz respeito ao reconhecimento do tempo trabalhado em condições especiais com a conversão em tempo comum.
Define-se como atividade especial aquela desempenhada sob certas condições peculiares - insalubridade, penosidade ou periculosidade - que, de alguma forma cause prejuízo à saúde ou integridade física do trabalhador.
A contagem do tempo de serviço rege-se pela legislação vigente à época da prestação do serviço.
Até 29/4/95, quando entrou em vigor a Lei 9.032/95, que deu nova redação ao Art. 57, § 3º, da Lei 8.213/91, a comprovação do tempo de serviço laborado em condições especiais era feita mediante o enquadramento da atividade no rol dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79, nos termos do Art. 295 do Decreto 357/91; a partir daquela data até a publicação da Lei 9.528/97, em 10.03.1997, por meio da apresentação de formulário que demonstre a efetiva exposição de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais a saúde ou a integridade física; após 10.03.1997, tal formulário deve estar fundamentado em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, assinado por médico do trabalho ou engenheiro do trabalho, consoante o Art. 58 da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.528/97. Quanto aos agentes ruído e calor, é de se salientar que o laudo pericial sempre foi exigido.
Nesse sentido:
Atualmente, no que tange à comprovação de atividade especial, dispõe o § 2º, do Art. 68, do Decreto 3.048/99, que:
Assim sendo, não é mais exigido que o segurado apresente o laudo técnico, para fins de comprovação de atividade especial, basta que forneça o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, assinado pela empresa ou seu preposto, o qual reúne, em um só documento, tanto o histórico profissional do trabalhador como os agentes nocivos apontados no laudo ambiental que foi produzido por médico ou engenheiro do trabalho.
Por fim, ressalte-se que o formulário extemporâneo não invalida as informações nele contidas. Seu valor probatório remanesce intacto, haja vista que a lei não impõe seja ele contemporâneo ao exercício das atividades. A empresa detém o conhecimento das condições insalubres a que estão sujeitos seus funcionários e por isso deve emitir os formulários ainda que a qualquer tempo, cabendo ao INSS o ônus probatório de invalidar seus dados.
Cabe ressaltar ainda que o Decreto 4.827 de 03/09/03 permitiu a conversão do tempo especial em comum ao serviço laborado em qualquer período, alterando os dispositivos que vedavam tal conversão.
Em relação ao agente ruído, os Decretos 53.831/64 e 83.080/79 consideravam nociva à saúde a exposição em nível superior a 80 decibéis. Com a alteração introduzida pelo Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, passou-se a considerar prejudicial aquele acima de 90 dB. Posteriormente, com o advento do Decreto 4.882, de 18.11.2003, o nível máximo tolerável foi reduzido para 85 dB (Art. 2º, do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Estabelecido esse contexto, esclareço que, anteriormente, manifestei-me no sentido de admitir como especial a atividade exercida até 05/03/1997, em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80 decibéis, e a partir de tal data, aquela em que o nível de exposição foi superior a 85 decibéis, em face da aplicação do princípio da igualdade.
Contudo, em julgamento recente, a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar a questão submetida ao rito do Art. 543-C do CPC, decidiu que no período compreendido entre 06.03.1997 e 18.11.2003, considera-se especial a atividade com exposição a ruído superior a 90 dB, nos termos do Anexo IV do Decreto 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto 3.048/1999, não sendo possível a aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o nível para 85 dB (REsp 1398260/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
Por conseguinte, em consonância com o decidido pelo C. STJ, é de ser admitida como especial a atividade em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80 decibéis até 05/03/1997, e 90 decibéis no período entre 06/03/1997 e 18/11/2003 e, a partir de então até os dias atuais, em nível acima de 85 decibéis.
No que diz respeito ao uso de equipamento de proteção individual, insta observar que este não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos. Nesse sentido: TRF3, AMS 2006.61.26.003803-1, Relator Desembargador Federal Sergio Nascimento, 10ª Turma, DJF3 04/03/2009, p. 990; APELREE 2009.61.26.009886-5, Relatora Desembargadora Federal Leide Pólo, 7ª Turma, DJF 29/05/09, p. 391.
Ainda que o laudo consigne a eliminação total dos agentes nocivos, é firme o entendimento desta Corte no sentido da impossibilidade de se garantir que tais equipamentos tenham sido utilizados durante todo o tempo em que executado o serviço, especialmente quando seu uso somente tornou-se obrigatório com a Lei 9732/98.
Igualmente nesse sentido:
Por demais, em recente julgamento proferido pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal, em tema com repercussão geral reconhecido pelo plenário virtual no ARE 664335/SC, restou decidido que o uso do equipamento de proteção individual - EPI, pode ser insuficiente para neutralizar completamente a nocividade a que o trabalhador esteja submetido.
A propósito, transcrevo os seguintes tópicos da ementa:
Quanto à possibilidade de conversão de atividade especial em comum, após 28/05/98, tem-se que, na conversão da Medida Provisória 1663-15 na Lei 9.711/98 o legislador não revogou o Art. 57, § 5º, da Lei 8213/91, porquanto suprimida sua parte final que fazia alusão à revogação. A exclusão foi intencional, deixando-se claro na Emenda Constitucional n.º 20/98, em seu artigo 15, que devem permanecer inalterados os artigos 57 e 58 da Lei 8.213/91 até que lei complementar defina a matéria.
O e. STJ modificou sua jurisprudência e passou a adotar o posicionamento supra, conforme ementa in verbis:
Na conversão do tempo de atividade especial em tempo comum, para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, deve ser efetuado o fator de 1,4, para o homem, e 1,2, para a mulher (Decreto 611/92), vigente à época do implemento das condições para a aposentadoria.
Importa mencionar que a necessidade de comprovação de trabalho "não ocasional nem intermitente, em condições especiais" passou a ser exigida apenas a partir de 29/4/1995, data em que foi publicada a Lei 9.032/95, que alterou a redação do Art. 57, § 3º, da lei 8.213/91, não podendo, portanto, incidir sobre períodos pretéritos. Nesse sentido: TRF3, APELREE 2000.61.02.010393-2, Relator Desembargador Federal Walter do Amaral, 10ª Turma, DJF3 30/6/2010, p. 798 e APELREE 2003.61.83.004945-0, Relator Desembargador Federal Marianina Galante, 8ª Turma, DJF3 22/9/2010, p. 445.
No mesmo sentido colaciono recente julgado do c. Superior Tribunal de Justiça:
O reconhecimento da contagem de tempo especial não destoa do entendimento adotado pela Corte Suprema, pois não determina que o benefício seja calculado de acordo com normas pertencentes a regimes jurídicos diversos, mas, apenas, que é dever do INSS conceder ao segurado o benefício que lhe for mais favorável, efetuando o cálculo da renda mensal inicial, desde que presentes todos os requisitos exigidos, de acordo com a legislação vigente até a data da EC 20/98, até a edição da Lei nº 9876/99 e até a DER (STF, RE 575089/RS, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, publicado em 24/10/2008).
Tecidas essas considerações gerais a respeito da matéria, passo a análise da documentação do caso em tela.
Assim fazendo, verifico que a parte autora comprovou que exerceu atividade especial nos períodos de:
- 03/03/1997 a 04/03/1997, laborado na Calçados Samello S/A, onde exerceu as funções de supervisor, conforme PPP de fls.72/73, exposto a ruído de 85 dB, agente nocivo previsto no item 1.1.5 do Decreto 83.080/79. Os demais períodos laborados na empresa não são reconhecidos, vez que os períodos de 11/10/1988 a 28/06/91 e 01/07/1991 a 02/03/1997 não consta exposição a qualquer agente nocivo e quanto ao período após 05/03/1997, a exposição ao ruído estava abaixo do nível de tolerância (90dB).
- 27/05/1982 a 12/04/1985 e 02/05/1985 a 06/01/1986, laborados na empresa Indústria de Calçados Nelson Palermo S/A, no cargo de sapateiro (CTPS - fls. 44), exposto aos componentes da cola de sapateiro, como hidrocarbonetos, agente nocivo por enquadramento da atividade previsto no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64; a utilização de hidrocarboneto tóxico - derivado do carbono "cola de sapateiro " é inerente a atividade, havendo presunção legal de que a presença de hidrocarboneto tóxico no processo produtivo era prejudicial ao trabalhador. Assevera-se que os hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância relacionada como cancerígena.
Não se reconhecem os períodos de 02/06/1986 a 16/04/1987 (Trigger Calçados), 20/04/1987 a 03/09/1987 (Vivipel Industria e Comércio de Calçados Ltda.), 01/10/1987 a 14/09/1988 (Curtume Berger Ltda), onde exerceu as funções de gerente, vez que nesta função não restou comprovado seu contato direto com o processo produtivo.
Os demais períodos (10/09/2002 a 03/03/2003, 10/03/2003 a 31/12/2003, 02/02/2004 a 11/03/2004, 18/03/2004 a 11/03/2004, 18/03/2004 a 28/09/2004, 18/03/2004 a 28/09/2004 e 01/03/2005 a 19/07/2011) alegados como trabalhados em atividades especiais posteriormente a 28/04/1995, não permitem o enquadramento por categoria profissional, apenas pelos dados registrados na CTPS.
Cabe ressaltar também, que o laudo elaborado por solicitação do Sindicato dos Empregados nas Indústrias de Calçados de Franca, que acompanha a petição inicial às fls. 74/91 e seus anexos de fls. 93/124, se limita a relatar de forma genérica as atividades e os componentes químicos utilizados nas indústrias de calçados, enquanto que a legislação previdenciária exige laudo com apuração específica para cada empresa.
Assim, o tempo de trabalho em atividade especial, comprovado nos autos, corresponde a 03 (três) anos, 06 (seis) meses e 23 (vinte e três) dias, sendo insuficiente para o benefício de aposentadoria especial.
Ainda, o tempo total de serviço/contribuição, contado de forma não concomitante até a DER em 19/07/2011, incluindo os trabalhos em atividades especiais com o acréscimo da conversão em tempo comum, e os demais períodos de serviços comuns registrados na CTPS e como contribuinte individual/autônomo assentado no CNIS, alcançam 29 (vinte e nove) anos, 08 (oito) meses e 20 (vinte dias), insuficiente para o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Resta, portanto, apenas o direito à averbação dos períodos de trabalhos em atividade especial reconhecidos, a ser feito nos cadastros em nome do autor, junto ao INSS, para os fins previdenciários.
Tendo a autoria decaído de parte do pedido, é de se aplicar a regra contida no Art. 86, do CPC. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93 e a parte autora, por ser beneficiária da assistência judiciária integral e gratuita, está isenta de custas, emolumentos e despesas processuais.
Posto isto, nego provimento ao agravo retido e dou parcial provimento à apelação.
É o voto.
BAPTISTA PEREIRA
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA:10021 |
Nº de Série do Certificado: | 10A516070472901B |
Data e Hora: | 25/10/2016 20:52:55 |