
| D.E. Publicado em 07/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa necessária, tida por interposta, e à apelação do INSS, dar parcial provimento à apelação da parte autora, e fixar, de ofício os consectários legais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009384-22.2010.4.03.6109/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de pedido de aposentadoria especial ou, sucessivamente, aposentadoria por tempo de contribuição (melhor hipótese financeira), ajuizado por José Cloves Siqueira em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Contestação do INSS às fls. 112/118, na qual sustenta o não enquadramento das atividades exercidas pela parte autora como sendo de natureza especial, requerendo, ao final, a improcedência total do pedido.
Sentença às fls. 121/125, pela parcial procedência do pedido, apenas para reconhecer o período de 16.08.1993 a 05.03.1997 como sendo de natureza especial e determinar a respectiva averbação para efeito de contagem de tempo de contribuição do autor, fixando a sucumbência e a condenação da parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios fixados em R$ 300,00, com a exigibilidade suspensa nos termos do artigo 12, da Lei nº 1060/50.
Apelação da parte autora às fls. 134/144, pugnando pelo reconhecimento dos demais períodos pleiteados na inicial, como sendo de natureza especial, inclusive do período em que esteve exposta a agente insalubre (ruído), superior a 85 decibéis, diante da alteração legislativa introduzida pelo Decreto nº 4.882/03.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 31.01.1963, o reconhecimento do exercício de atividades especiais nos períodos de 01.06.1979 a 08.07.1988, de 01.02.1989 a 16.10.1992 e de 16.08.1993 a 30.09.2010, e a concessão do benefício de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição (melhor hipótese financeira), a partir do requerimento administrativo 01.09.2009), mediante a reafirmação da data da D.E.R. (fls. 101/105).
Preliminarmente, dou por interposta a remessa necessária, nos termos do § 2º do artigo 475 do Código de Processo Civil de 1973, ainda que tenha havido dispensa pelo Juízo de origem.
No mérito, para elucidação da controvérsia, cumpre distinguir a aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo diploma legal, pois a primeira pressupõe o exercício de atividade laboral considerada especial, pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, sendo que, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da EC 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, nem submissão ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição pode haver tanto o exercício de atividades especiais como o exercício de atividades comuns, sendo que os períodos de atividade especial sofrem conversão em atividade comum, aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da EC 20/98.
Da atividade especial.
No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica.
O art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original que "(...) A relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica (...)". Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96, tal dispositivo legal teve sua redação alterada, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na forma que segue:
Ressalto que os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
Saliento que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Quanto ao agente nocivo ruído, o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o referido decreto, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 decibéis como agente nocivo à saúde. Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto nº 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao C. Superior Tribunal de Justiça que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do Código de Processo Civil (Recurso Especial Repetitivo), fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, na forma que segue:
Dessa forma, deve-se considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a nível de ruído superior a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, superior a 90 decibéis e, a partir de então, superior a 85 decibéis.
De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei nº 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividades em condições especiais, fazendo às vezes do laudo técnico.
E não afasta a validade de suas conclusões o fato de ter sido o PPP ou laudo elaborado posteriormente à prestação do serviço, vez que tal requisito não está previsto em lei, mormente porque a responsabilidade por sua expedição é do empregador, não podendo o empregado arcar com o ônus de eventual desídia daquele e, ademais, a evolução tecnológica tende a propiciar condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas: i) tese 1 - regra geral: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial; e ii) tese 2 - agente nocivo ruído: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
NO CASO DOS AUTOS, os períodos incontroversos em virtude de acolhimento na via administrativa totalizam 29 (vinte e nove) anos e 10 (dez) meses e 10 (dez) dias (fls. 85/86), não tendo sido reconhecidos como de natureza especial nenhum dos períodos pleiteados na exordial. Portanto, a controvérsia colocada nos autos engloba o reconhecimento da natureza especial das atividades exercidas nos períodos de 01.06.1979 a 08.07.1988, de 01.02.1989 a 16.10.1992 e de 16.08.1993 a 30.09.2010, este último com reafirmação da data da D.E.R. (até 06.10.2010), com base no P.P.P. de fls. 102/103.
Ocorre que, no período de 01.06.1979 a 08.07.1988, a parte autora, na atividade de operador de máquinas, atuando no setor de produção de acessórios para teares, da empresa GERMER Industrial S/A - Filial de Nova Odessa - SP, esteve exposta a ruídos acima dos limites legalmente permitidos (P.P.P. de fls. 19/20 e laudo ambiental de fls. 69/77). Entretanto, observo que os níveis de exposição atestados (90/102 decibéis), foram considerados por equiparação ao laudo ambiental produzido em 1999, pelo médico do trabalho que avaliou o setor de produção (512 - Howa Tear - Doga - Batedeira - Esteira), instalado na sede da empresa empregadora, situada na cidade de Timbó-SC, com estrutura diversa do local de exercício da atividade laboral, portanto, não havendo comprovação da efetiva exposição da parte autora a níveis de ruído semelhantes aos constatados in loco na empresa matriz.
Outrossim, no período de 01.02.1989 a 16.10.1992, no exercício da atividade de auxiliar de laboratório da empresa RIPASA S.A. Celulose e Papel, a parte autora esteve exposta a nível de ruído equivalente a 80 decibéis (fls. 78 e 79/81), portanto, devendo ser computado como tempo de serviço comum, visto que não superou o limite de tolerância legalmente estabelecido (85 decibéis), para exposição contínua ao referido agente físico.
Em relação ao período de 16.08.1993 a 01.09.2009 (data da D.E.R), a parte autora laborou junto ao Departamento de Água e Esgoto de Americana-SP (fls. 21/22), no exercício das atividades de operador de bombas e controlador do sistema de telemetria, ocasião em que esteve exposta a agente físico (ruído na intensidade de 85 dB, acima dos limites legalmente permitidos, no período compreendido entre 16.08.1993 a 05.03.1997 e de 19.11.2003 em diante, sendo indevida a aplicação retroativa do Decreto n.º 4.882/03, que reduziu para 85 dB o patamar de 90 dB previsto no Anexo IV do Decreto n.º 2.172/97), bem como a umidade, calor, e a agentes biológicos nocivos à saúde (vírus e bactérias), devendo ser reconhecida a natureza especial das atividades exercidas em todo o período, conforme código 1.1.3, 1.1.6 e 1.2.10, do Decreto nº 53.831/64, código 1.2.11 do Decreto nº 83.080/79, código 3.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 2.0.1 e 3.0.1 do Decreto nº 3.048/99, observado, ainda, o Decreto nº 4.882/03.
Sendo assim, somados todos os períodos especiais, totaliza a parte autora 16 (dezesseis) anos e 16 (dezesseis) dias de tempo especial, até a data do requerimento administrativo, observado o conjunto probatório produzido nos autos e os fundamentos jurídicos explicitados na presente decisão.
Anoto que o Perfil Profissiográgico Previdenciário juntado às fls. 102/103, produzido em 06/10/2010, embora confirme a continuidade da atividade prestada pela parte autora, junto ao Departamento de Água e Esgoto de Americana-SP, não esclarece quanto à exposição do segurado aos fatores de risco ambiental, sendo insuficientes, como elementos de prova, as declarações emitidas pelo representante do órgão empregador (fls. 104 e 105), em face da exigência de aferição da insalubridade por perito, responsável técnico.
Todavia, a reunião dos requisitos para concessão do benefício, ocorrida após a entrada do requerimento administrativo, pode ser considerada como fato superveniente, conforme artigo 493 do novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/15). O artigo 623 da Instrução Normativa nº45/2011 determina o mesmo procedimento.
Tal prática deve ser adotada em processos cujo lapso temporal necessário para a concessão do benefício seja diminuto, bem como nos casos de redução significativa na renda igualmente em função de pequeno período de tempo. Nesse sentido:
Assim, em consulta ao CNIS (cópia em anexo) é possível verificar que o segurado manteve recolhimentos durante todo o curso do processo, tendo completado em 23.10.2014 o período de 35 anos de contribuição necessário para obtenção do benefício pleiteado.
Restaram cumpridos pela parte autora, ainda, os requisitos da qualidade de segurado (art. 15 e seguintes da Lei nº 8.213/91) e a carência para a concessão do benefício almejado (art. 24 e seguintes da Lei nº 8.213/91).
Destarte, a parte autora faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição, com valor calculado na forma prevista no art. 29, I, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
O benefício é devido a partir da data do preenchimento dos requisitos.
A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a sentença de primeiro grau, nos termos da Súmula 111 do E. STJ.
Embora o INSS seja isento do pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).
Caso a parte autora já esteja recebendo benefício previdenciário concedido administrativamente, deverá optar, à época da liquidação de sentença, pelo beneficio que entenda ser mais vantajoso. Se a opção recair no benefício judicial, deverão ser compensadas as parcelas já recebidas em sede administrativa, face à vedação da cumulação de benefícios.
Diante do exposto, nego provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, tida por interposta, dou parcial provimento à apelação da parte autora, fixo, de oficio, os consectários legais, para julgar parcialmente procedente o pedido e condenar o réu a conceder a parte autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do preenchimento dos requisitos (23.10.2014), observada eventual prescrição quinquenal, tudo na forma acima explicitada.
Determino que, independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, instruído com os devidos documentos da parte autora JOSÉ CLOVES SIQUEIRA, a fim de serem adotadas as providências cabíveis para que seja implantado de imediato o benefício de APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, com D.I.B. em 23.10.2014 e R.M.I. a ser calculada pelo INSS, nos termos da presente decisão, tendo em vista os arts. 497 e seguintes do novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/15).
É como voto.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
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