Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1955684 / SP
0009237-24.2014.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
12/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/08/2019
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL.
AGROPECUÁRIA. AGENTES QUÍMICOS. AGENTES BIOLÓGICOS. RUÍDO. CALOR.
RECONHECIMENTO. TEMPO INSUFICIENTE PARA A CONCESSÃO DA APOSENTADORIA
ESPECIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA
NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de
Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em
ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação
aplicável à matéria.
2 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
3 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
4 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial:
(a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
5 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
6 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
7 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
8 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
9 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
10 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
11 - A apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento
da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia
tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima
do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos
anos anteriores, referido nível era superior.
12 - Controvertida, na demanda, a especialidade dos períodos de 27/05/1975 a 20/05/1976,
28/12/1978 a 31/05/1979, 01/09/1987 a 29/09/1989, 15/02/1990 a 11/05/1990, 01/09/1990 a
25/01/1991, 01/04/1991 a 02/08/1991, 02/09/1991 a 15/11/1991, 10/03/1992 a 13/03/1992 e
17/03/1992 a 26/08/2013 (data da sentença).
13 - No período de 27/05/1975 a 20/05/1976, trabalhado na "Tercon - Terraplanagem e
Construção S/A", como "servente", o laudo pericial (fls. 230/249) aponta a exposição do autor
ao agente químico "piche", o que enquadra a atividade como especial com base no item 1.2.11
do Decreto nº 53.831/64 e item 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79.
14 - No que diz respeito ao ínterim de 28/12/1978 a 31/05/1979, consta da CTPS (fl. 17) do
requerente que este laborou em estabelecimento "agropecuário", como "trabalhador braçal",
função que se subsome à hipótese do item 2.2.1 do Decreto nº 53.831/64.
15 - Durante as atividades realizadas na granja de frango de corte do empregador "Cirano Jim
Galves", de 01/09/1990 a 25/01/1991, o laudo (fls. 230/249) dá conta que o autor estava
exposto a calor de 30,7 IBUTG, ao exercer as funções de "trabalhador rural".
16 - De acordo com a NR-15, da Portaria nº 3.214/78, de observância imperativa consoante
determinam os Anexos IV do Decreto nº 2.172/97 e do Decreto nº 3.048/99, a insalubridade
deve levar em consideração não só o IBUTG, mas também o tipo de atividade exercida (leve,
moderada ou pesada), sendo que quanto mais dinâmica for a atividade, menor a intensidade de
temperatura exigida, conforme Quadro n.º 1. Tipo de atividade - anexo nº 3, da NR15.
17 - No caso presente, com base no quadro n.º 3 (taxas de metabolismo por tipo de atividade)
do anexo nº 3, da NR15, a atividade do autor, conforme se infere da descrição do laudo (fl.
232), é classificada como pesada. Considerado, ainda, o trabalho como contínuo, regra
aplicada na ausência de qualquer ponderação em contrário. Logo, a exposição ao calor de 30,7
IBUTG extrapolava os limites de tolerância, fixados pela legislação de regência.
18 - Durante o desempenho da função de "servente geral residencial", em favor de
"Guilhermina de Mendonça Lago", de 02/09/1991 a 15/11/1991, atestou o laudo (fls. 260/268)
que o demandante estava sujeito a "ácido muriático", amoldando-se à previsão do item 1.2.9 do
Decreto nº 53.831/64.
19 - Restou evidenciada, pela perícia (fls. 230/249), a submissão do autor a agentes biológicos,
no lapso de 17/03/1992 a 21/10/2009 (ajuizamento da demanda), pelo exercício das atividades
"lavar os banheiros da rodoviária, retirar ossos das covas no cemitério, coletar lixo da cidade"
(fl. 232), em favor da "Prefeitura Municipal de José Bonifácio". As tarefas desempenhadas
podem ser classificadas como especiais com espeque no item 1.3.5 do Decreto nº 83.080/79 e
item 3.0.1 dos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.048/99.
20 - Quanto ao intervalo de 01/09/1987 a 29/09/1989, laborado na empresa "Cargill Agrícola
S/A", o laudo pericial (fls. 230/249) informa a exposição ao ruído de 98,7dB.
21 - Igualmente, no período de labor como "servente de carpintaria", para a "Heanlo - Indústria
de Confecções Ltda.", de 15/02/1990 a 11/05/1990, a perícia (fls. 230/249) indica submissão ao
fragor de 98,7dB.
22 - Da mesma forma em relação ao encargo de "ajudante geral", desempenhados nas
"Fábricas de Salames Rio Preto S/A", de 01/04/1991 a 02/08/1991, em que o d. especialista
aferiu a sujeição à intensidade sonora de 98,7dB (fls. 230/249).
23 - Já na empresa "Sofruta Ind. Alimentícia Ltda", de 10/03/1992 a 13/03/1992, consta do
laudo pericial (fls. 260/268) a exposição do demandante à pressão sonora de 87,5dB.
24 - Destarte, verifica que o autor trabalhou submetido a ruído superior aos limites de tolerância
de 01/09/1987 a 29/09/1989, 15/02/1990 a 11/05/1990, 01/04/1991 a 02/08/1991 e 10/03/1992
a 13/03/1992.
25 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrados como especiais os períodos de
27/05/1975 a 20/05/1976, 28/12/1978 a 31/05/1979, 01/09/1987 a 29/09/1989, 15/02/1990 a
11/05/1990 e 01/09/1990 a 25/01/1991, 01/04/1991 a 02/08/1991, 02/09/1991 a 15/11/1991,
10/03/1992 a 13/03/1992 e 17/03/1992 a 17/06/2011.
26 - Destarte, computando-se o labor especial reconhecido nesta demanda, verifica-se que a
parte autora contava com 22 anos, 3 meses e 14 dias de trabalho em condições especiais na
data do ajuizamento (21/10/2009), não fazendo jus ao benefício de aposentadoria especial.
27 - Vale consignar que, conquanto tenha sido reconhecida a especialidade de todos os
intervalos requeridos na inicial, o tempo é insuficiente para a fruição do benefício pleiteado.
28 - Sagrou-se vitorioso o autor ao ver reconhecida parte da especialidade vindicada. Por outro
lado, não foi concedida a aposentadoria especial, restando vencedora nesse ponto a autarquia.
Desta feita, dou os honorários advocatícios por compensados entre as partes, ante a
sucumbência recíproca (art. 21 do CPC/73), e deixo de condenar qualquer delas no reembolso
das custas e despesas processuais, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita e o
INSS delas isento.
29 - Apelação do INSS e remessa necessária parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
apelação do INSS e à remessa necessária para, mantendo o reconhecimento dos períodos
especiais referenciados, julgar improcedente o pedido de concessão da aposentadoria especial,
deferida na origem, e, reconhecendo a sucumbência recíproca, dar os honorários advocatícios
por compensados entre as partes, mantendo, no mais, a r. sentença, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Referência Legislativa
LEG-FED LEI-5890 ANO-1973 ART-9***** LOPS-60 LEI ORGÂNICA DA PREVIDÊNCIA
SOCIAL
LEG-FED LEI-3807 ANO-1960 ART-31LEG-FED LEI-9032 ANO-1995LEG-FED DEC-2172
ANO-1997 ITE-3.0.1LEG-FED LEI-9528 ANO-1997LEG-FED DEC-53831 ANO-1964 ITE-1.2.11
ITE-2.2.1 ITE-1.2.9***** RBPS-79 REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA
SOCIAL
LEG-FED DEC-83080 ANO-1979 ITE-1.2.10 ITE-1.3.5LEG-FED PRT-3214 ANO-1978
NR-15***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-21
