Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5015478-18.2020.4.03.6183
Relator(a)
Desembargador Federal MARCELO GUERRA MARTINS
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
21/10/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 28/10/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA.
AGENTES BIOLÓGICOS. PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA ESPECIAL
CUMULADA COM O EXERCÍCIO DE ATIVIDADES ESPECIAIS. QUESTÃO A SER ANALISADA
NA FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA.REQUISITOS CUMPRIDOS. REAFIRMAÇÃO DA
DER. BENEFÍCIO DEFERIDO.
1. O artigo 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil, estabelece o duplo grau de jurisdição
obrigatório nas condenações contra a União, suas autarquias e fundações de direito público, em
valor superior a 1.000 salários-mínimos. No caso concreto, a r. sentença, proferida em junho de
2021, condenou o INSS a implementar benefício de aposentadoria especial em favor da parte
autora especial desde a reafirmação da DER, em 03/06/2019. Portanto, o valor da condenação
equivale a, aproximadamente, 24 salários-mínimos, motivo pelo qual não é cabível o reexame
necessário.
2. O artigo 57 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei Federal nº. 9.032/1995: “A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado
que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei”.
3. Nos casos em que resta comprovada a exposição do profissional à nocividade do agente
biológico, a natureza de suas atividades já revela, por si só, que mesmo nos casos de utilização
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
de equipamentos de proteção individual, tido por eficazes, não é possível afastar a insalubridade
a que fica sujeito o profissional. Na mesma linha, confira-se: TRF-3, 9ª Turma, AC
00059571820124036183, DJe: 13/02/2017, Rel. Des. Fed. MARISA SANTOS.
4. Deve ser considerado como especial o período de 23/03/2017 a 14/07/2017.
5. O Superior Tribunal de Justiça, no regime de que tratava o artigo 543-C, do Código de
Processo Civil de 1.973, fixou a seguinte tese: “É possível a reafirmação da DER (Data de
Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a
concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a
entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do
CPC/2015, observada a causa de pedir” (1ª Seção, REsp 1.727.064/SP, DJe 02/12/2019, Rel.
Min. MAURO CAMPBELL MARQUES).
6. Ademais, no julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Especial Repetitivo nº
1.727.063, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que “quanto à mora, é sabido que a execução
contra o INSS possui dois tipos de obrigações: a primeira consiste na implantação do benefício, a
segunda, no pagamento de parcelas vencidas a serem liquidadas e quitadas pela via do
precatório ou do RPV. No caso de o INSS não efetivar a implantação do Superior Tribunal de
Justiça benefício, primeira obrigação oriunda de sua condenação, no prazo razoável de até
quarenta e cinco dias, surgirão, a partir daí, parcelas vencidas oriundas de sua mora. Nessa
hipótese deve haver a fixação dos juros, embutidos no requisitório de pequeno valor (STJ, 1ª
Seção, EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 1727063/SP, j. 19.05.2020, Rel. Min. MAURO
CAMPBELL MARQUES)”.
7. Desse modo, computando-se o período de atividade especial reconhecido nos autos,
acrescidos dos períodos de atividade especial reconhecidos como especiais pelo INSS (fls. 1/2,
ID 186396368 e 156/161, ID 186396374), até a data em que a parte autora requereu a
reafirmação da DER (14/07/2017), verifica-se que a parte autora comprovou o exercício de
atividades consideradas especiais por um período de tempo superior a 25 (vinte e cinco) anos,
conforme planilha anexa, razão pela qual preenche os requisitos para a concessão da
aposentadoria especial, nos moldes dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.
8. Deve-se observar, ainda, que nas “hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e
continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do
requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo,
seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o
retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão”.
(STF, Tribunal Pleno, RE 791961 – Repercussão Geral, j. 08/06/2020, DJe-206, DIVULG 18-08-
2020, PUBLIC 19-08-2020, Rel. Min. DIAS TOFFOLI). A questão deverá ser verificada na fase de
cumprimento.
9. Portanto, reconhece-se o direito da parte autora à concessão da aposentadoria especial, com
renda mensal de 100% (cem por cento) do salário de contribuição, desde a reafirmação da DER
em 14/07/2017.
10. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios
estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal
vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do
RE 870947 e EDcl no REsp 1727063.
11. Apelação da parte autora provida e apelação do INSS parcialmente provida. Correção, de
ofício, dos critérios de atualização monetária.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5015478-18.2020.4.03.6183
RELATOR:Gab. 24 - JUIZ CONVOCADO MARCELO GUERRA MARTINS
APELANTE: RITA DE CASSIA CARDOSO CERQUEIRA, INSTITUTO NACIONAL DO
SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: JANAINA CASSIA DE SOUZA GALLO - SP267890-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, RITA DE CASSIA
CARDOSO CERQUEIRA
Advogado do(a) APELADO: JANAINA CASSIA DE SOUZA GALLO - SP267890-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5015478-18.2020.4.03.6183
RELATOR:Gab. 24 - JUIZ CONVOCADO MARCELO GUERRA MARTINS
APELANTE: RITA DE CASSIA CARDOSO CERQUEIRA, INSTITUTO NACIONAL DO
SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: JANAINA CASSIA DE SOUZA GALLO - SP267890-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, RITA DE CASSIA
CARDOSO CERQUEIRA
Advogado do(a) APELADO: JANAINA CASSIA DE SOUZA GALLO - SP267890-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Juiz Federal Convocado Marcelo Guerra:
Trata-se de ação previdenciária ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL-INSS, objetivando o reconhecimento de atividades em condições especiais, para fins
de concessão do benefício de aposentadoria especial.
A r. sentença (ID 186397486) julgou o pedido inicial procedente, em parte, para reconhecer a
especialidade do período de 23/03/2017 a 14/07/2017, bem como conceder a aposentadoria
especial desde a reafirmação da DER, em 03/06/2019. Concedeu a tutela específica para a
implantação do benefício no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias. Condenou o INSS ao
pagamento de honorários advocatícios fixados no percentual mínimo legal sobre o valor das
parcelas vencidas, nos termos do artigo 85, § 3º, do Código de Processo Civil e com
observância do disposto na Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
O INSS, ora apelante (ID 186397488), requer, preliminarmente, a submissão do feito à remessa
oficial.
No mérito, alega que a parte autora não provou a exposição a agentes considerados nocivos à
saúde de maneira habitual e permanente e que legitimem o cômputo de tempo especial, nos
termos da lei e das normas técnicas de regência.
Argumenta com a utilização de EPI eficaz, o que neutralizaria os agentes agressivos, não se
podendo falar em condições prejudiciais do ambiente de trabalho.
Subsidiariamente, aponta a impossibilidade de reafirmação da DER no caso de preenchimento
dos requisitos entre a conclusão do requerimento administrativo e o ajuizamento da ação.
Alega, ainda, que os juros de mora deveriam incidir sobre as parcelas vencidas somente após
decorrido o prazo de 45 dias para o INSS implantar o benefício ora concedido, em
conformidade com o entendimento assentado pelo Superior Tribunal de Justiça no EDcl no
REsp 1727063.
Sustenta a impossibilidade de percepção do benefício da aposentadoria especial na hipótese
em que o segurado permanece no exercício de atividades laborais nocivas à saúde.
Por fim, insurge-se contra a condenação ao pagamento de honorários advocatícios.
Nas razões de apelação, a parte autora (ID 186397490) objetiva a reforma parcial da r.
sentença, com a reafirmação da DER em 14/07/2017.
Contrarrazões da parte autora (ID 186397492).
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5015478-18.2020.4.03.6183
RELATOR:Gab. 24 - JUIZ CONVOCADO MARCELO GUERRA MARTINS
APELANTE: RITA DE CASSIA CARDOSO CERQUEIRA, INSTITUTO NACIONAL DO
SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: JANAINA CASSIA DE SOUZA GALLO - SP267890-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, RITA DE CASSIA
CARDOSO CERQUEIRA
Advogado do(a) APELADO: JANAINA CASSIA DE SOUZA GALLO - SP267890-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Juiz Federal Convocado Marcelo Guerra:
*** Descabimento do reexame necessário ***
O artigo 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil, estabelece o duplo grau de jurisdição
obrigatório nas condenações contra a União, suas autarquias e fundações de direito público, em
valor superior a 1.000 salários-mínimos.
No caso concreto, a r. sentença, proferida em junho de 2021, condenou o INSS a implementar
benefício de aposentadoria especial em favor da parte autora especial desde a reafirmação da
DER, em 03/06/2019.
Portanto, o valor da condenação equivale a, aproximadamente, 24 salários-mínimos, motivo
pelo qual não é cabível o reexame necessário.
*** Aposentadoria especial ***
A aposentadoria especial foi originalmente prevista no artigo 31, da Lei Federal nº. 3.807, nos
seguintes termos: “a aposentadoria especial será concedida ao segurado que, contando no
mínimo 50 (cinqüenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições tenha trabalhado
durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos pelo menos, conforme a atividade
profissional, em serviços, que, para êsse efeito, forem considerados penosos, insalubres ou
perigosos, por Decreto do Poder Executivo”.
Com a edição da Lei Federal nº 5.890/73, a aposentadoria especial passou a ser disciplinada
em seu artigo 9º, alterando apenas o período de carência de 15 (quinze) anos para 5 (cinco)
anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
O Poder Executivo editou o Decreto Federal nº 53.831/64, posteriormente alterado pelo Decreto
Federal nº 83.080/79, para listar as categorias profissionais que estavam sujeitas a agentes
físicos, químicos e biológicos considerados prejudiciais à saúde ou à integridade física do
segurado.
Destaca-se que os Decretos Federais nº 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea,
de forma que, na hipótese de divergência entre as suas normas, deve prevalecer aquela mais
favorável ao segurado (STJ, 5ª Turma, REsp. nº 412.351, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, Rel.
Min. LAURITA VAZ).
Com a edição da Lei Federal nº 8.213/91, a aposentadoria especial passou a ser disciplinada
em seu artigo 57, segundo o qual “a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a
carência exigida nesta lei, ao segurado que tiver trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou
25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física”, restando assegurado, ainda, a conversão do
período trabalhado no exercício de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em razão da ausência de edição de lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais
sujeitas a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, os Decretos
Federais nº 53.831/64 e 83.080/79 permaneceram em vigor, até a edição da Lei Federal nº
9.032/95 (STJ, 5ª Turma, Resp. 436.661/SC, j. 28.04.2004, DJ 02.08.2004, Rel. Min. JORGE
SCARTEZZINI).
Ou seja, até a edição da Lei Federal nº 9.032, em 28 de abril de 1995, para o reconhecimento
da condição especial da atividade exercida, bastava o seu enquadramento nos aludidos
Decretos Federais, mediante a anotação da função em CTPS.
Com a edição da Lei Federal nº 9.032, a redação do artigo 57 da Lei Federal nº 8.213/91 foi
alterada, passando a ser exigida, para a concessão do benefício, a prova de trabalho
permanente em condições especiais, bem como a efetiva exposição do segurado a agentes
nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à
integridade física, pelo período equivalente ao exigido. A prova seria feita mediante a
apresentação de informativos e formulários, como o SB-40 ou o DSS-8030.
O Decreto Federal nº 2.172, de 5 de março de 1997, previu os agentes prejudiciais à saúde
(artigo 66 e Anexo IV), bem como estabeleceu requisitos mais rigorosos para a prova da efetiva
exposição do segurado aos agentes nocivos, mediante a apresentação de laudo técnico ou
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), para a caracterização da condição especial da
atividade exercida. Por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a
partir da edição da Lei Federal nº 9.528, de 10 de dezembro de 1997.
Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente
da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos
arts. 28 da Lei Federal nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91. Aliás, com a edição da Lei nº
6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese da conversão do tempo
laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a harmonizar a adoção de dois
sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial, o que não significa que a
atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de conversão, eis que tal
circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
Ressalte-se que, no que diz respeito ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo
segurado e à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da
prestação do trabalho (STJ, 1ª Seção, PET nº 9.194/PR, j. 28/05/2014, DJe: 03/06/2014, Rel.
Min. ARNALDO ESTEVES LIMA). Trata-se de aplicar o vetusto princípio geral de direito do
tempus regit actum.
Nessa linha, em breve resumo, tem-se o seguinte:
a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou
pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova;
b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa;
c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo
técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por PPP (Perfil
Profissiográfico Previdenciário), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com
indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração
biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
Importante ressaltar que o PPP, instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros
ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os
efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições
especiais.
Saliente-se, ainda, a teor de entendimento do TRF da 3ª Região, "a desnecessidade de que o
laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face
de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no
cenário laboral"(TRF-3, 8ª Turma, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, DJe: 15/05/2015
Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv.
0002587-92.2008.4.03.6111, j. 24/10/2016, DJe: 04/11/2016, Rel. Des. Fed. PAULO
DOMINGUES).
No que se refere ao uso de EPI (equipamento de proteção individual), verifica-se que o Plenário
do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, j. 04/12/2014, DJe:
12.02.2015, Rel. Min. LUIZ FUX, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
"(...) a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a
efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for
realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à
aposentadoria especial. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as
informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de
divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa
a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da
aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar
suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se
submete";
(...)
a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do
trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no
âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento
de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para
aposentadoria".
Portanto, a desqualificação em decorrência do uso de EPI requer prova da efetiva neutralização
do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento
não afastam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C.
STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que
integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
** agentes biológicos **
Nos casos em que resta comprovada a exposição do profissional à nocividade do agente
biológico, a natureza de suas atividades já revela, por si só, que mesmo nos casos de utilização
de equipamentos de proteção individual, tido por eficazes, não é possível afastar a
insalubridade a que fica sujeito o profissional. Nessa linha, confira-se:
"PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA ESPECIAL.
ATIVIDADES EXERCIDAS EM CONDIÇÕES ESPECIAIS DE TRABALHO. AGENTE
AGRESSIVO BIOLÓGICO. EXPOSIÇÃO. UTILIZAÇÃO DO EPI EFICAZ. CONFIGURADAS AS
CONDIÇÕES ESPECIAIS DE TRABALHO.
- Apelação tempestiva, recebida no efeito previsto no CPC/2015.- (...) As profissões de "auxiliar
de enfermagem", "atendente de enfermagem" e "enfermeira" constam dos decretos legais e a
sua natureza especial pode ser reconhecida apenas pelo enquadramento profissional até
05.03.1997, ocasião em que passou a ser imprescindível a apresentação do laudo técnico ou
do perfil profissiográfico previdenciário.
- O enquadramento foi realizado com base na exposição a vírus e bactérias, pelo exercício das
atividades de enfermagem em hospital.
- A exposição ao agente agressivo biológico, demonstrada no período abrangido pelo PPP, é
suficiente para a concessão da aposentadoria especial, uma vez que a utilização de EPI eficaz,
no caso de tal agente, não neutraliza os efeitos nocivos da exposição.
- A natureza da atividade corrobora a exposição a agentes biológicos, sendo viável a aferição
da condição especial de trabalho, conforme se verifica nas informações trazidas nos PPPs
constantes do processo administrativo que indeferiu a concessão do benefício.
- Comprovada a exposição a agentes biológicos, de forma habitual e permanente, até a
expedição do PPP. (...).
- Remessa oficial, tida por interposta, parcialmente provida e Apelação provida”.
(TRF-3, 9ª Turma, AC 00059571820124036183, DJe: 13/02/2017, Rel. Des. Fed. MARISA
SANTOS, grifei).
*** Caso concreto ***
No caso concreto, da análise do Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP (fls. 1/2, ID
186396367), e de acordo com a legislação previdenciária vigente à época, a parte autora
provou o exercício da atividade especial no período de 23/03/2017 a 14/07/2017 (IRMANDADE
DA SANTA CASA DE MISERICORDIA DE SAO PAULO), uma vez que trabalhou no cargo de
auxiliar de enfermagem, exposta de modo habitual e permanente a agentes biológicos (sangue,
secreção e excreção), atividade enquadrada no código 3.0.1, Anexo IV, do Decreto nº 3.048/99.
Saliento que, nos termos do entendimento jurisprudencial já referido, a atividade especial
somente pode ser considerada por presunção legal até 28/04/1995, ocasião em que os artigos
57 e 58 da Lei nº 8.213/91 foram alterados pela Lei nº 9.032/95. A partir de então, o
reconhecimento da atividade especial apenas se dá caso seja demonstrada a exposição, de
forma habitual e permanente, a agentes nocivos à saúde ou à integridade física.
Registro que o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP substitui o laudo técnico, sendo
documento suficiente para aferição das atividades nocivas a que esteve sujeito o trabalhador.
Logo, deve ser considerado como especial o período de 23/03/2017 a 14/07/2017.
Sendo o requerimento do benefício posterior à Lei Federal nº 8.213/91, deve ser aplicado o
fator de conversão de 1,20, mais favorável ao segurado, como determina o artigo 70 do Decreto
Federal nº. 3048/99, com a redação dada pelo Decreto Federal nº. 4.827/03.
Os períodos registrados em CTPS são suficientes para garantir o cumprimento da carência, de
acordo com a tabela do artigo 142 da Lei Federal nº 8.213/1991.
O Superior Tribunal de Justiça, no regime de que tratava o artigo 543-C, do Código de Processo
Civil de 1.973, fixou a seguinte tese:
“É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que
implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no
interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias
ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir”(1ª
Seção, REsp 1.727.064/SP, DJe 02/12/2019, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES).
Ademais, no julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Especial Repetitivo nº
1.727.063, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que:
“Quanto à mora, é sabido que a execução contra o INSS possui dois tipos de obrigações: a
primeira consiste na implantação do benefício, a segunda, no pagamento de parcelas vencidas
a serem liquidadas e quitadas pela via do precatório ou do RPV. No caso de o INSS não
efetivar a implantação do Superior Tribunal de Justiça benefício, primeira obrigação oriunda de
sua condenação, no prazo razoável de até quarenta e cinco dias, surgirão, a partir daí, parcelas
vencidas oriundas de sua mora. Nessa hipótese deve haver a fixação dos juros, embutidos no
requisitório de pequeno valor (STJ, 1ª Seção, EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 1727063/SP, j.
19.05.2020, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES)”.
Desse modo, computando-se o período de atividade especial reconhecido nos autos,
acrescidos dos períodos de atividade especial reconhecidos como especiais pelo INSS (fls. 1/2,
ID 186396368 e 156/161, ID 186396374), até a data em que a parte autora requereu a
reafirmação da DER (14/07/2017), verifica-se que a parte autora comprovou o exercício de
atividades consideradas especiais por um período de tempo superior a 25 (vinte e cinco) anos,
conforme planilha anexa, razão pela qual preenche os requisitos para a concessão da
aposentadoria especial, nos moldes dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.
Deve-se observar, ainda, que nas “hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e
continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do
requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo,
seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o
retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão”.
(STF, Tribunal Pleno, RE 791961 – Repercussão Geral, j. 08/06/2020 DJe-206, DIVULG 18-08-
2020, PUBLIC 19-08-2020, Rel. Min. DIAS TOFFOLI). A questão deverá ser verificada na fase
de cumprimento.
Portanto, reconhece-se o direito da parte autora à concessão da aposentadoria especial, com
renda mensal de 100% (cem por cento) do salário de contribuição, desde a reafirmação da DER
em 14/07/2017.
Anote-se, na espécie, a obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores
eventualmente pagos à parte autora na esfera administrativa.
Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos
pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à
época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE
870947 e EDcl no REsp 1727063.
Mantida a verba honorária fixada.
O INSS é isento de custas processuais, arcando com as demais despesas, inclusive honorários
periciais (Res. CJF nºs. 541 e 558/2007), além de reembolsar custas recolhidas pela parte
contrária, o que não é o caso dos autos, ante a gratuidade processual concedida (art. 4º, I e
parágrafo único, da Lei 9.289/1996, art. 24-A da Lei 9.028/1995, n.r., e art. 8º, § 1º, da Lei
8.620/1993).
Por tais fundamentos, dou provimento à apelação da parte autora e dou parcial provimento à
apelação do INSS, apenas para fixar os juros de mora, nos termos da fundamentação. Corrijo,
de ofício, os critérios de atualização monetária para determinar a observância do RE 870.947.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA.
AGENTES BIOLÓGICOS. PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA ESPECIAL
CUMULADA COM O EXERCÍCIO DE ATIVIDADES ESPECIAIS. QUESTÃO A SER
ANALISADA NA FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA.REQUISITOS CUMPRIDOS.
REAFIRMAÇÃO DA DER. BENEFÍCIO DEFERIDO.
1. O artigo 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil, estabelece o duplo grau de
jurisdição obrigatório nas condenações contra a União, suas autarquias e fundações de direito
público, em valor superior a 1.000 salários-mínimos. No caso concreto, a r. sentença, proferida
em junho de 2021, condenou o INSS a implementar benefício de aposentadoria especial em
favor da parte autora especial desde a reafirmação da DER, em 03/06/2019. Portanto, o valor
da condenação equivale a, aproximadamente, 24 salários-mínimos, motivo pelo qual não é
cabível o reexame necessário.
2. O artigo 57 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei Federal nº. 9.032/1995: “A
aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao
segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a
integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser
a lei”.
3. Nos casos em que resta comprovada a exposição do profissional à nocividade do agente
biológico, a natureza de suas atividades já revela, por si só, que mesmo nos casos de utilização
de equipamentos de proteção individual, tido por eficazes, não é possível afastar a
insalubridade a que fica sujeito o profissional. Na mesma linha, confira-se: TRF-3, 9ª Turma, AC
00059571820124036183, DJe: 13/02/2017, Rel. Des. Fed. MARISA SANTOS.
4. Deve ser considerado como especial o período de 23/03/2017 a 14/07/2017.
5. O Superior Tribunal de Justiça, no regime de que tratava o artigo 543-C, do Código de
Processo Civil de 1.973, fixou a seguinte tese: “É possível a reafirmação da DER (Data de
Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a
concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a
entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do
CPC/2015, observada a causa de pedir” (1ª Seção, REsp 1.727.064/SP, DJe 02/12/2019, Rel.
Min. MAURO CAMPBELL MARQUES).
6. Ademais, no julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Especial Repetitivo nº
1.727.063, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que “quanto à mora, é sabido que a
execução contra o INSS possui dois tipos de obrigações: a primeira consiste na implantação do
benefício, a segunda, no pagamento de parcelas vencidas a serem liquidadas e quitadas pela
via do precatório ou do RPV. No caso de o INSS não efetivar a implantação do Superior
Tribunal de Justiça benefício, primeira obrigação oriunda de sua condenação, no prazo razoável
de até quarenta e cinco dias, surgirão, a partir daí, parcelas vencidas oriundas de sua mora.
Nessa hipótese deve haver a fixação dos juros, embutidos no requisitório de pequeno valor
(STJ, 1ª Seção, EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 1727063/SP, j. 19.05.2020, Rel. Min.
MAURO CAMPBELL MARQUES)”.
7. Desse modo, computando-se o período de atividade especial reconhecido nos autos,
acrescidos dos períodos de atividade especial reconhecidos como especiais pelo INSS (fls. 1/2,
ID 186396368 e 156/161, ID 186396374), até a data em que a parte autora requereu a
reafirmação da DER (14/07/2017), verifica-se que a parte autora comprovou o exercício de
atividades consideradas especiais por um período de tempo superior a 25 (vinte e cinco) anos,
conforme planilha anexa, razão pela qual preenche os requisitos para a concessão da
aposentadoria especial, nos moldes dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.
8. Deve-se observar, ainda, que nas “hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e
continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do
requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo,
seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o
retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão”.
(STF, Tribunal Pleno, RE 791961 – Repercussão Geral, j. 08/06/2020, DJe-206, DIVULG 18-08-
2020, PUBLIC 19-08-2020, Rel. Min. DIAS TOFFOLI). A questão deverá ser verificada na fase
de cumprimento.
9. Portanto, reconhece-se o direito da parte autora à concessão da aposentadoria especial, com
renda mensal de 100% (cem por cento) do salário de contribuição, desde a reafirmação da DER
em 14/07/2017.
10. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios
estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça
Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos
autos do RE 870947 e EDcl no REsp 1727063.
11. Apelação da parte autora provida e apelação do INSS parcialmente provida. Correção, de
ofício, dos critérios de atualização monetária.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da parte autora e dar parcial provimento à
apelação do INSS e corrigir, de ofício, os critérios de atualização monetária para determinar a
observância do RE 870.947, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
