
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000936-66.2020.4.03.6127
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANA LETICIA GUERREIRO FERNANDES
Advogados do(a) APELANTE: CELSO ROBERT MARTINHO BARBOSA - SP340016-N, EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N
APELADO: ANA LETICIA GUERREIRO FERNANDES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELADO: CELSO ROBERT MARTINHO BARBOSA - SP340016-N, EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000936-66.2020.4.03.6127
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANA LETICIA GUERREIRO FERNANDES
Advogados do(a) APELANTE: CELSO ROBERT MARTINHO BARBOSA - SP340016-N, EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N
APELADO: ANA LETICIA GUERREIRO FERNANDES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELADO: CELSO ROBERT MARTINHO BARBOSA - SP340016-N, EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
Trata-se de ação previdenciária ajuizada por ANA LETICIA GUERREIRO FERNANDES em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL-INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria especial, a contar da data do requerimento administrativo (11/10/2019), mediante o reconhecimento de atividade especial nos períodos de 01/04/1993 a 28/04/1995 e de 06/03/1997 a 01/10/2019, na qualidade de dentista, bem como requer a correção de valores referentes às contribuições das competências de 07/1996 a 08/1996, 10/1996 a 04/1997, 06/1997 a 11/1998, 01/1999 a 04/1999, 06/1999 a 12/1999, 12/2000, 05/2001 a 06/2001, 11/2001, 03/2002 a 07/2005, 12/2005 a 01/2006, 06/2006, 06/2007 e 09/2014.
A r. sentença (ID 284438075) julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer a especialidade dos períodos requeridos e determinar a concessão do benefício de aposentadoria especial a partir de 11/10/2019, acrescida de juros e correção monetária. A autarquia foi condenada em honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa. Custas na forma da lei.
O INSS ofertou apelação (ID284438077) requerendo, preliminarmente, a submissão do julgado ao reexame necessário. No mérito, sustenta que a autora não comprovou a exposição habitual e permanente a agente agressivo no período de 06/03/1992 a 01/10/2019 e que o uso de equipamento de proteção individual eficaz neutralizaria eventual agente nocivo, motivo pelo qual referido interregno deve ser considerado como tempo de serviço comum. Aduz que não foi juntado laudo ambiental comprovando a nocividade e que a metodologia empregada para aferição do agente agressivo não seria correta. Sustenta que a autora não teria preenchido os requisitos necessários para concessão do benefício, não podendo haver conversão de atividade especial após o advento da EC 103/2019. Afirma a impossibilidade de receber o benefício e continuar exercendo a atividade tida por nociva. Requer sejam os honorários fixados nos termos da Súmula 111 do STJ, pleiteia a devolução dos valores indevidamente pagos, a isenção de custas e a aplicação da prescrição quinquenal. Por fim, prequestiona a matéria para efeitos recursais.
Por sua vez, apela a autora (ID 284438081) sustentando que houve averbação a menor dos salários de contribuição nos períodos vindicados. Aduz que teria juntado ficha financeira dos valores recolhidos, requerendo sua correção, e, por conseguinte, o recálculo do valor do benefício. Por fim, requer a majoração da verba honorária.
Sem as contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000936-66.2020.4.03.6127
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ANA LETICIA GUERREIRO FERNANDES
Advogados do(a) APELANTE: CELSO ROBERT MARTINHO BARBOSA - SP340016-N, EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N
APELADO: ANA LETICIA GUERREIRO FERNANDES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELADO: CELSO ROBERT MARTINHO BARBOSA - SP340016-N, EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N
OUTROS PARTICIPANTES:
VOTO
Verifico, em juízo de admissibilidade, que os recursos ora analisados mostram-se formalmente regulares, motivados (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação (art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-os e passo a apreciá-los nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
De início, cumpre observar que, embora a sentença tenha sido desfavorável ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, não se encontra condicionada ao reexame necessário, considerados o valor do benefício e o lapso temporal de sua implantação, não excedente a 1000 (mil) salários mínimos (art. 496, §3º, I, do NCPC, CPC/2015), motivo pelo qual rejeito a preliminar arguida pela autarquia.
A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91.
A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91. Aos já filiados quando do advento da mencionada lei, vige a tabela de seu artigo 142 (norma de transição), em que, para cada ano de implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de meses de contribuição inferior aos 180 (cento e oitenta) exigidos pela regra permanente do citado artigo 25, inciso II.
Para aqueles que implementaram os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de serviço até a data de publicação da EC nº 20/98 (16/12/1998), fica assegurada a percepção do benefício, na forma integral ou proporcional, conforme o caso, com base nas regras anteriores ao referido diploma legal.
Por sua vez, para os segurados já filiados à Previdência Social, mas que não implementaram os requisitos para a percepção da aposentadoria por tempo de serviço antes da sua entrada em vigor, a EC nº 20/98 impôs as seguintes condições, em seu artigo 9º, incisos I e II.
Ressalte-se, contudo, que as regras de transição previstas no artigo 9º, incisos I e II, da EC nº 20/98 aplicam-se somente para a aposentadoria proporcional por tempo de serviço, e não para a integral, uma vez que tais requisitos não foram previstos nas regras permanentes para obtenção do referido benefício.
Desse modo, caso o segurado complete o tempo suficiente para a percepção da aposentadoria na forma integral, faz jus ao benefício independentemente de cumprimento do requisito etário e do período adicional de contribuição, previstos no artigo 9º da EC nº 20/98.
Por sua vez, para aqueles filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98, não há mais possibilidade de percepção da aposentadoria proporcional, mas apenas na forma integral, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres.
Portanto, atualmente vigoram as seguintes regras para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição:
1) Segurados filiados à Previdência Social antes da EC nº 20/98:
a) têm direito à aposentadoria (integral ou proporcional), calculada com base nas regras anteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91, e o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91 até 16/12/1998;
b) têm direito à aposentadoria proporcional, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que cumprida a carência do artigo 25 c/c 142 da Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço/contribuição dos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91, além dos requisitos adicionais do art. 9º da EC nº 20/98 (idade mínima e período adicional de contribuição de 40%);
c) têm direito à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e de 30 (trinta) anos, para as mulheres;
2) Segurados filiados à Previdência Social após a EC nº 20/98:
- têm direito somente à aposentadoria integral, calculada com base nas regras posteriores à EC nº 20/98, desde que completado o tempo de serviço/contribuição de 35 (trinta e cinco) anos, para os homens, e 30 (trinta) anos, para as mulheres.
Tendo em vista que o INSS não se insurgiu quanto ao reconhecimento do período de 01/04/1993 a 28/04/1995, tenho que tal período deve ser considerado como tempo de serviço especial, já que incontroverso.
O período de 03/06/1996 a 05/03/1997 (ID 284438050) já foi reconhecido administrativamente como especial, motivo pelo qual também é tido por incontroverso.
A controvérsia nos presentes autos refere-se ao reconhecimento de atividade especial no período de 06/03/1997 a 01/10/2019, bem como a correção de valores referentes às contribuições das competências de 07/1996 a 08/1996, 10/1996 a 04/1997, 06/1997 a 11/1998, 01/1999 a 04/1999, 06/1999 a 12/1999, 12/2000, 05/2001 a 06/2001, 11/2001, 03/2002 a 07/2005, 12/2005 a 01/2006, 06/2006, 06/2007 e 09/2014.
Atividade Especial
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60.
O critério de especificação da categoria profissional com base na penosidade, insalubridade ou periculosidade, definidas por Decreto do Poder Executivo, foi mantido até a edição da Lei nº 8.213/91, ou seja, as atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo seriam consideradas penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico, bastando, assim, a anotação da função em CTPS ou a elaboração do então denominado informativo SB-40.
Foram baixados pelo Poder Executivo os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, relacionando os serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos.
Embora o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 tenha limitado a aposentadoria especial às atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, o critério anterior continuou ainda prevalecendo, como a seguir se verifica.
De notar que, da edição da Lei nº 3.807/60 até a última CLPS que antecedeu à Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço especial foi sempre definido com base nas atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo como penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico.
A própria Lei nº 8.213/91, em suas disposições finais e transitórias, estabeleceu, em seu artigo 152, que a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física deverá ser submetida à apreciação do Congresso Nacional, prevalecendo, até então, a lista constante da legislação atualmente em vigor para aposentadoria especial.
Os agentes prejudiciais à saúde foram relacionados no Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 (art. 66 e Anexo IV), mas por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.
Destaque-se que o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, em sua redação original, deixou de fazer alusão a serviços considerados perigosos, insalubres ou penosos, passando a mencionar apenas atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, sendo que o artigo 58 do mesmo diploma legal, também em sua redação original, estabelecia que a relação dessas atividades seria objeto de lei específica.
A redação original do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 foi alterada pela Lei nº 9.032/95 sem que até então tivesse sido editada lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, não havendo dúvidas até então que continuavam em vigor os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. Neste sentido, confira-se a jurisprudência: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
É de se ressaltar, quanto ao nível de ruído, que a jurisprudência já reconheceu que o Decreto nº 53.831/64 e o Decreto nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, ou seja, não houve revogação daquela legislação por esta, de forma que, constatando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado (STJ - REsp. n. 412351/RS; 5ª Turma; Rel. Min. Laurita Vaz; julgado em 21.10.2003; DJ 17.11.2003; pág. 355).
O Decreto nº 2.172/97, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 dB(A) como prejudicial à saúde.
Por tais razões, até ser editado o Decreto nº 2.172/97, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB(A) como agente nocivo à saúde.
Todavia, com o Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível voltou a ser de 85 dB(A) (art. 2º do Decreto nº 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Houve, assim, um abrandamento da norma até então vigente, a qual considerava como agente agressivo à saúde a exposição acima de 90 dB(A), razão pela qual é de se considerar o nível de ruídos superior a 85 dB(A) a partir de 05/03/1997.
Ademais, dispõe o Decreto nº 4.827/03 (que deu nova redação ao art. 70 do Decreto nº 3.048/99):
"Art. 1º, § 2º - As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Destaco, ainda, que inexiste vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa, ou nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 não demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado ser por isso prejudicado.
Por seu turno, o recebimento de adicional de insalubridade ou de pagamento da taxa SAT (com indicação de IEAN no CNIS) não implica necessariamente no reconhecimento de exercício de atividade especial, que tem que ser comprovada pelos meios estabelecidos na legislação vigente.
Quanto à possibilidade da contagem do tempo em gozo de auxílio-doença como atividade especial, o julgamento proferido em sede de repetitivo (Tema repetitivo n. 998), fixou da seguinte tese: “O Segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial”.
Registro que o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP substitui o laudo técnico, sendo documento suficiente para aferição das atividades nocivas a que esteve sujeito o trabalhador. E também não obsta o reconhecimento de tempo de trabalho em condições especiais à extemporaneidade de documento, pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual à constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica.
O artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, exige que a comprovação do tempo especial seja feita por formulário, ancorado em laudo técnico elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, o qual, portanto, pode se basear em qualquer metodologia científica. Não tendo a lei determinado que a aferição só poderia ser feita por meio de uma metodologia específica, não se pode deixar de reconhecer o labor especial pelo fato de o empregador ter utilizado uma técnica diversa daquela indicada na Instrução Normativa do INSS, pois isso representaria uma extrapolação do poder regulamentar da autarquia.
Quanto à eficácia do EPI, vale dizer que, por ocasião do julgamento do ARE 664335, o E. STF assentou as seguintes teses: a) “o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial"; b) "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Destaco, ainda, que o uso de equipamento de proteção individual não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal tipo de equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos. Nesse sentido, precedentes desta E. Corte (AC nº 2000.03.99.031362-0/SP; 1ª Turma; Rel. Des. Fed. André Nekatschalow; v.u; J. 19.08.2002; DJU 18.11) e do Colendo Superior Tribunal de Justiça: REsp 584.859/ES, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, 5ª Turma, julgado em 18/08/2005, DJ 05/09/2005 p. 458.
Contudo, cabe ressaltar que, para descaracterização da atividade especial em razão do uso de EPI, há necessidade de prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado.
Passo à análise do período de 06/03/1997 a 01/10/2019 trabalhado como dentista empregada perante o Município de Mogi Mirim.
Quanto ao período de 06/03/1997 a 01/10/2019, laborado no Município de Mogi Mirim, consta do PPP (ID 284438046) que a autora laborou como dentista, consistindo suas atividades em atender pacientes e realizar procedimentos odontológicos, estando em contato com pacientes portadores de doenças infectocontagiosas (vírus e bactérias), sujeitando-se aos agentes biológicos previstos no código 3.0.1 do Anexo IV, do Decreto nº 2.172/97 e código 3.0.1 do Anexos IV do Decreto 3.048/99.
Saliente-se ainda que a atividade de dentista implica exposição habitual e permanente a microrganismos e parasitas infectocontagiosos, pela própria natureza do trabalho, diante do contato próximo das mãos do profissional com a cavidade oral dos pacientes, sujeito a cortes e sangramentos.
A utilização de equipamento de proteção individual não é suficiente para afastar o risco de contaminação, diante da proximidade e constância do contato com o paciente. Logo, deve ser mantido o reconhecimento da especialidade do período de06/03/1997 a 01/10/2019.
Dessa forma, convertendo-se os períodos especiais ora reconhecidos, além daqueles já reconhecidos administrativamente e os incontroversos, descontados os períodos concomitantes, a autora possui até a data do requerimento administrativo, anterior ao advento da EC 103/2019, mais de 25 (vinte e cinco) anos de tempo de serviço especial, fazendo jus ao benefício de aposentadoria especial.
O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com o art. 29, II, da Lei 8.213/91, com redação dada pela Lei 9.876/99 (média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, sem incidência do fator previdenciário, e multiplicado pelo coeficiente de 100%).
Quanto à possibilidade de correção dos valores recolhidos nas competências de 07/1996 a 08/1996, 10/1996 a 04/1997, 06/1997 a 11/1998, 01/1999 a 04/1999, 06/1999 a 12/1999, 12/2000, 05/2001 a 06/2001, 11/2001, 03/2002 a 07/2005, 12/2005 a 01/2006, 06/2006, 06/2007 e 09/2014, deve a mesma ser providenciada junto ao INSS administrativamente e só então, após efetivada, ser considerada para efeito de cálculo do benefício.
Assim, entendo que o pedido não merece acolhida haja vista que não restou demonstrada a negativa da autarquia em realizar a correção de eventuais valores apontados.
Cumpre observar, ainda, que o C. STF, por ocasião do julgamento do Tema nº 709 no RE 791.961, firmou a seguinte tese: “(i) [é] constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o benefício previdenciário em questão.
Segue abaixo a ementa do referido julgado:
“Direito Previdenciário e Constitucional. Constitucionalidade do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91. Percepção do benefício de aposentadoria especial independentemente do afastamento do beneficiário das atividades laborais nocivas a sua saúde. Impossibilidade. Recurso extraordinário parcialmente provido.
1. O art. 57,§ 8º, da Lei nº 8.213/91 é constitucional, inexistindo qualquer tipo de conflito entre ele e os arts. 5º, inciso XIII; 7º, inciso XXXIII; e 201,§ 1º, da Lei Fundamental. A norma se presta, de forma razoável e proporcional, para homenagear o princípio da dignidade da pessoa humana, bem como os direitos à saúde, à vida, ao ambiente de trabalho equilibrado e à redução dos riscos inerentes ao trabalho.
2. É vedada a simultaneidade entre a percepção da aposentadoria especial e o exercício de atividade especial, seja essa última aquela que deu causa à aposentação precoce ou não. A concomitância entre a aposentadoria e o labor especial acarreta a suspensão do pagamento do benefício previdenciário.
3. O tema da data de início da aposentadoria especial é regulado pelo art. 57, § 2º, da Lei nº 8.213/91, que, por sua vez, remete ao art. 49 do mesmo diploma normativo. O art. 57,§ 8º, da Lei de Planos e Benefícios da Previdência Social cuida de assunto distinto e, inexistindo incompatibilidade absoluta entre esse dispositivo e aqueles anteriormente citados, os quais também não são inconstitucionais, não há que se falar em fixação da DIB na data de afastamento da atividade, sob pena de violência à vontade e à prerrogativa do legislador, bem como de afronta à separação de Poderes.
4. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “(i) [é] constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o benefício previdenciário em questão.
5. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento.
(RE 791961, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 08/06/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-206 DIVULG 18-08-2020 PUBLIC 19-08-2020)
Diante disso, deve ser observado o quanto decidido pelo C. STF por ocasião do julgamento do Tema nº 709 no RE 791.961
Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observado o quanto decidido pelo C. STF por ocasião do julgamento do RE 870947, sendo que a partir da promulgação da EC 113/2021, publicada em 09/12/2021, haverá a incidência da taxa Selic para fins de atualização monetária e compensação da mora, inclusive do precatório, uma única vez, até o efetivo pagamento, acumulado mensalmente.
A verba honorária de sucumbência incide no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, conforme entendimento desta Turma (artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil/2015), aplicada, nos termos do julgamento do Tema Repetitivo 1105, a Súmula 111 do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual os honorários advocatícios, nas ações de cunho previdenciário, não incidirão sobre o valor das prestações vencidas após a data da prolação da sentença ou, na hipótese de a pretensão do segurado somente ser deferida em sede recursal, não incidirão sobre as parcelas vencidas após a prolação da decisão ou acórdão.
Cabe esclarecer, por fim, que a ausência de prévia fonte de custeio para a concessão do benefício, tendo em vista que nos documentos técnicos apresentados não constam códigos de recolhimento pertinentes à exposição a agente nocivo no respectivo campo GFIP, não é motivo para o indeferimento do benefício, pois o trabalhador não pode ser penalizado pelo incorreto recolhimento de tributos por parte de seu empregador. Além disso, a autarquia previdenciária tem meios próprios de receber seus créditos.
Ante o exposto, REJEITO A PRELIMINAR ARGUIDA PELO INSS, E, NO MÉRITO, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA AUTARQUIA apenas para determinar a observância do quanto decidido pelo C. STF por ocasião do julgamento do Tema nº 709 no RE 791.961, E DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA AUTORA para explicitar os critérios de fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do C. STJ, mantendo, no mais, a sentença recorrida.
É como voto.
QUADRO CONTRIBUTIVO
| Data de Nascimento | 24/03/1971 |
|---|---|
| Sexo | Feminino |
| DER | 11/10/2019 |
Tempo especial
| Nº | Nome / Anotações | Início | Fim | Fator | Tempo | Carência |
| 1 | - | 01/04/1993 | 28/04/1995 | Especial 25 anos | 2 anos, 0 meses e 28 dias | 25 |
| 2 | - | 03/06/1996 | 05/03/1997 | Especial 25 anos | 0 anos, 9 meses e 3 dias | 10 |
| 3 | - | 06/03/1997 | 01/10/2019 | Especial 25 anos | 22 anos, 6 meses e 26 dias | 271 |
| Marco Temporal | Tempo especial | Tempo total (especial + comum s/ conversão) para fins de pontos | Carência | Idade | Pontos (art. 21 da EC nº 103/19) |
| Até a DER (11/10/2019) | 25 anos, 4 meses e 27 dias | Inaplicável | 306 | 48 anos, 6 meses e 17 dias | Inaplicável |
| Até a data da Reforma - EC nº 103/19 (13/11/2019) | 25 anos, 4 meses e 27 dias | Inaplicável | 306 | 48 anos, 7 meses e 19 dias | Inaplicável |
| Até Lei nº 14.331/2022 (04/05/2022) | 25 anos, 4 meses e 27 dias | 25 anos, 4 meses e 27 dias | 306 | 51 anos, 1 meses e 10 dias | 76.5194 |
| Até a data de hoje (24/01/2024) | 25 anos, 4 meses e 27 dias | 25 anos, 4 meses e 27 dias | 306 | 52 anos, 10 meses e 0 dias | 78.2417 |
- Aposentadoria especial
Em 11/10/2019 (DER), a segurada tem direito à aposentadoria especial (Lei 8.213/91, art. 57), porque cumpre o tempo mínimo de 25 anos sujeito a condições prejudiciais à saúde ou à integridade física. O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com o art. 29, II, da Lei 8.213/91, com redação dada pela Lei 9.876/99 (média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, sem incidência do fator previdenciário, e multiplicado pelo coeficiente de 100%).
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL . ATIVIDADE ESPECIAL. DENTISTA. VALORES. RECOLHIMENTO. PRELIMINAR REJEITADA E, NO MÉRITO, APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO DA AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA. BENEFÍCIO MANTIDO. CONTINUIDADE DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL.
1. Embora a sentença tenha sido desfavorável ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, não se encontra condicionada ao reexame necessário, considerados o valor do benefício e o lapso temporal de sua implantação, não excedente a 1000 (mil) salários mínimos (art. 496, §3º, I, do NCPC, CPC/2015), motivo pelo qual rejeito a preliminar arguida pela autarquia.
2. Tendo em vista que o INSS não se insurgiu quanto ao reconhecimento do período de 01/04/1993 a 28/04/1995, tenho que tal período deve ser considerado como tempo de serviço especial, já que incontroverso.
3. O período de 03/06/1996 a 05/03/1997 já foi considerado administrativamente como especial (ID 284438050).
4. A controvérsia nos presentes autos refere-se ao reconhecimento de atividade especial no período de 06/03/1997 a 01/10/2019, bem como a correção de valores referentes às contribuições das competências de 07/1996 a 08/1996, 10/1996 a 04/1997, 06/1997 a 11/1998, 01/1999 a 04/1999, 06/1999 a 12/1999, 12/2000, 05/2001 a 06/2001, 11/2001, 03/2002 a 07/2005, 12/2005 a 01/2006, 06/2006, 06/2007 e 09/2014.
5. Quanto ao período de 06/03/1997 a 01/10/2019, laborado no Município de Mogi Mirim, consta do PPP (ID 284438046) que a autora laborou como dentista, consistindo suas atividades em atender pacientes e realizar procedimentos odontológicos, estando em contato com pacientes portadores de doenças infectocontagiosas (vírus e bactérias), sujeitando-se aos agentes biológicos previstos no código 3.0.1 do Anexo IV, do Decreto nº 2.172/97 e código 3.0.1 do Anexos IV do Decreto 3.048/99.
6. Saliente-se ainda que a atividade de dentista implica exposição habitual e permanente a microrganismos e parasitas infectocontagiosos, pela própria natureza do trabalho, diante do contato próximo das mãos do profissional com a cavidade oral dos pacientes, sujeito a cortes e sangramentos.
7. A utilização de equipamento de proteção individual não é suficiente para afastar o risco de contaminação, diante da proximidade e constância do contato com o paciente. Logo, deve ser mantido o reconhecimento da especialidade do período de06/03/1997 a 01/10/2019.
8. Dessa forma, convertendo-se os períodos especiais ora reconhecidos, além daqueles já reconhecidos administrativamente e os incontroversos, descontados os períodos concomitantes, a autora possui até a data do requerimento administrativo, anterior ao advento da EC 103/2019, mais de 25 (vinte e cinco) anos de tempo de serviço especial, fazendo jus ao benefício de aposentadoria especial.
9. O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com o art. 29, II, da Lei 8.213/91, com redação dada pela Lei 9.876/99 (média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, sem incidência do fator previdenciário, e multiplicado pelo coeficiente de 100%).
10. Quanto à possibilidade de correção dos valores recolhidos nas competências de 07/1996 a 08/1996, 10/1996 a 04/1997, 06/1997 a 11/1998, 01/1999 a 04/1999, 06/1999 a 12/1999, 12/2000, 05/2001 a 06/2001, 11/2001, 03/2002 a 07/2005, 12/2005 a 01/2006, 06/2006, 06/2007 e 09/2014, deve a mesma ser providenciada junto ao INSS administrativamente e só então, após efetivada, ser considerada para efeito de cálculo do benefício.
11. Assim, entendo que o pedido não merece acolhida haja vista que não restou demonstrada a negativa da autarquia em realizar a correção de eventuais valores apontados.
12. Cumpre observar, ainda, que o C. STF, por ocasião do julgamento do Tema nº 709 no RE 791.961, firmou a seguinte tese: “(i) [é] constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; (ii) nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros; efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o benefício previdenciário em questão.
13. Diante disso, deve ser observado o quanto decidido pelo C. STF por ocasião do julgamento do Tema nº 709 no RE 791.961
14. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observado o quanto decidido pelo C. STF por ocasião do julgamento do RE 870947, sendo que a partir da promulgação da EC 113/2021, publicada em 09/12/2021, haverá a incidência da taxa Selic para fins de atualização monetária e compensação da mora, inclusive do precatório, uma única vez, até o efetivo pagamento, acumulado mensalmente.
15. A verba honorária de sucumbência incide no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, conforme entendimento desta Turma (artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil/2015), aplicada, nos termos do julgamento do Tema Repetitivo 1105, a Súmula 111 do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual os honorários advocatícios, nas ações de cunho previdenciário, não incidirão sobre o valor das prestações vencidas após a data da prolação da sentença ou, na hipótese de a pretensão do segurado somente ser deferida em sede recursal, não incidirão sobre as parcelas vencidas após a prolação da decisão ou acórdão.
16. Cabe esclarecer, por fim, que a ausência de prévia fonte de custeio para a concessão do benefício, tendo em vista que nos documentos técnicos apresentados não constam códigos de recolhimento pertinentes à exposição a agente nocivo no respectivo campo GFIP, não é motivo para o indeferimento do benefício, pois o trabalhador não pode ser penalizado pelo incorreto recolhimento de tributos por parte de seu empregador. Além disso, a autarquia previdenciária tem meios próprios de receber seus créditos.
17. Preliminar rejeitada e, no mérito, apelação do INSS parcialmente provida. Apelação da autora parcialmente provida.
