
| D.E. Publicado em 06/09/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial e à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0001385-30.2015.4.03.6113/SP
RELATÓRIO
Trata-se de remessa oficial e apelação interposta contra sentença proferida em ação de conhecimento, em que se pleiteia a concessão de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de trabalho especial nos períodos de 02.04.84 a 04.03.85, 02.05.85 a 07.06.86, 12.08.86 a 25.01.89, 01.11.89 a 01.03.90, 07.03.90 a 01.05.90, 03.05.90 a 23.10.91, 26.03.92 a 22.07.93, 01.08.93 a 30.04.94, 01.09.94 a 30.06.95, 03.06.96 a 20.12.99, 01.06.00 a 17.08.05 e 01.04.06 a 04.11.14.
O MM. Juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, determinando a averbação do labor especial de 02.05.85 a 07.06.86, 07.03.90 a 01.05.90, 03.06.96 a 05.03.97 e 01.06.00 a 17.08.05, condenando a parte autora no pagamento de custas processuais e honorários advocatícios em 10% sobre o valor da causa corrigido desde o ajuizamento, observada a justiça gratuita concedida.
Apela o autor, argumentando fazer jus ao reconhecimento de todos os períodos pleiteados como especiais.
Subiram os autos, sem contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
A questão tratada nos autos diz respeito ao reconhecimento do tempo trabalhado em condições especiais com a conversão em tempo comum.
Define-se como atividade especial aquela desempenhada sob certas condições peculiares - insalubridade, penosidade ou periculosidade - que, de alguma forma cause prejuízo à saúde ou integridade física do trabalhador.
A contagem do tempo de serviço rege-se pela legislação vigente à época da prestação do serviço.
Até 29.04.95, quando entrou em vigor a Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao Art. 57, § 3º, da Lei nº 8.213/91, a comprovação do tempo de serviço laborado em condições especiais era feita mediante o enquadramento da atividade no rol dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, nos termos do Art. 295 do Decreto nº 357/91; a partir daquela data até a publicação da Lei nº 9.528/97, em 10.03.97, por meio da apresentação de formulário que demonstre a efetiva exposição de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais a saúde ou a integridade física; após 10.03.97, tal formulário deve estar fundamentado em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, assinado por médico do trabalho ou engenheiro do trabalho, consoante o Art. 58 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.528/97. Quanto aos agentes ruído e calor, é de se salientar que o laudo pericial sempre foi exigido.
Nesse sentido:
Atualmente, no que tange à comprovação de atividade especial, dispõe o § 2º, do Art. 68, do Decreto nº 3.048/99, que:
Assim sendo, não é mais exigido que o segurado apresente o laudo técnico, para fins de comprovação de atividade especial, basta que forneça o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, assinado pela empresa ou seu preposto, o qual reúne, em um só documento, tanto o histórico profissional do trabalhador como os agentes nocivos apontados no laudo ambiental que foi produzido por médico ou engenheiro do trabalho.
Por fim, ressalte-se que o formulário extemporâneo não invalida as informações nele contidas. Seu valor probatório remanesce intacto, haja vista que a lei não impõe seja ele contemporâneo ao exercício das atividades. A empresa detém o conhecimento das condições insalubres a que estão sujeitos seus funcionários e por isso deve emitir os formulários ainda que a qualquer tempo, cabendo ao INSS o ônus probatório de invalidar seus dados.
Em relação ao agente ruído, os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79 consideravam nociva à saúde a exposição em nível superior a 80dB. Com a alteração introduzida pelo Decreto nº 2.172, de 05.03.97, passou-se a considerar prejudicial aquele acima de 90dB. Posteriormente, com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.03, o nível máximo tolerável foi reduzido para 85dB (Art. 2º, do Decreto nº 4.882/03, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Estabelecido esse contexto, esclareço que, anteriormente, manifestei-me no sentido de admitir como especial a atividade exercida até 05.03.97, em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80dB, e a partir de tal data, aquela em que o nível de exposição foi superior a 85dB, em face da aplicação do princípio da igualdade.
Contudo, em julgamento recente, a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar a questão submetida ao rito do Art. 543-C do CPC, decidiu que no período compreendido entre 06.03.97 e 18.11.03, considera-se especial a atividade com exposição a ruído superior a 90dB, nos termos do Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, não sendo possível a aplicação retroativa do Decreto 4.882/03, que reduziu o nível para 85dB (REsp 1398260/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14.05.14, DJe 05.12.14).
Por conseguinte, em consonância com o decidido pelo C. STJ, é de ser admitida como especial a atividade em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80dB até 05.03.97, e 90dB no período entre 06.03.97 e 18.11.03 e, a partir de então até os dias atuais, em nível acima de 85dB.
No que diz respeito ao uso de equipamento de proteção individual, insta observar que este não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos. Nesse sentido: TRF3, AMS 2006.61.26.003803-1, Relator Desembargador Federal Sergio Nascimento, 10ª Turma, DJF3 04.03.09, p. 990; APELREE 2009.61.26.009886-5, Relatora Desembargadora Federal Leide Pólo, 7ª Turma, DJF 29.05.09, p. 391.
Ainda que o laudo consigne a eliminação total dos agentes nocivos, é firme o entendimento desta Corte no sentido da impossibilidade de se garantir que tais equipamentos tenham sido utilizados durante todo o tempo em que executado o serviço, especialmente quando seu uso somente tornou-se obrigatório com a Lei nº 9.732/98.
Igualmente nesse sentido:
Por demais, em recente julgamento proferido pelo e. Supremo Tribunal Federal, em tema com repercussão geral reconhecido pelo plenário virtual no ARE 664335/SC, restou decidido que o uso do equipamento de proteção individual - EPI pode ser insuficiente para neutralizar completamente a nocividade a que o trabalhador esteja submetido.
A propósito, transcrevo os seguintes tópicos da ementa:
Cabe ressaltar que a necessidade de comprovação de trabalho "não ocasional nem intermitente, em condições especiais" passou a ser exigida apenas a partir de 29.04.95, data em que foi publicada a Lei nº 9.032/95, que alterou a redação do Art. 57, § 3º, da Lei nº 8.213/91, não podendo, portanto, incidir sobre períodos pretéritos. Nesse sentido: TRF3, APELREE 2000.61.02.010393-2, Relator Desembargador Federal Walter do Amaral, 10ª Turma, DJF3 30.06.10, p. 798 e APELREE 2003.61.83.004945-0, Relator Desembargador Federal Marianina Galante, 8ª Turma, DJF3 22.09.10, p. 445.
No mesmo sentido colaciono recente julgado do c. Superior Tribunal de Justiça:
Tecidas essas considerações gerais a respeito da matéria, passo a análise da documentação do caso em tela.
Assim fazendo, verifico que a parte autora comprovou que exerceu atividade especial de maneira habitual e permanente nos seguintes períodos e empresas:
- de 02.05.85 a 07.06.96, na H. Bettarello Curtidora e Calçados Ltda., na função de sapateiro, exposto aos componentes da cola de sapateiro, como hidrocarbonetos, agente nocivo previsto no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64, conforme descrito na CTPS à fl. 173 e Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 189/192;
- de 12.08.86 a 01.03.90, na Calçados Penha Ltda., nas funções de aviador de palmilhas e montador na molina, exposto aos componentes da cola de sapateiro, como hidrocarbonetos, agente nocivo previsto no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64, conforme descrito na CTPS à fl. 173;
- de 07.03.90 a 01.05.90, na Calçados Netto Ltda., na função de montador na molina, exposto aos componentes da cola de sapateiro, como hidrocarbonetos, agente nocivo previsto no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64, conforme descrito na CTPS à fl. 174;
- de 03.05.90 a 23.10.91, na Rejane Calçados Ltda., na função de sapateiro de serviços correlatos, exposto aos componentes da cola de sapateiro, como hidrocarbonetos, agente nocivo previsto no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64, conforme cópia da CTPS à fl. 174;
- de 01.08.93 a 30.04.94 e de 01.09.94 a 30.06.95, na Bordallo Artefatos de Couro Ltda., no cargo de montador na molina do setor de montagem, exposto aos componentes da cola de sapateiro, como hidrocarbonetos, agente nocivo previsto no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64, por enquadramento, conforme descrito no Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 238/239, e
- de 01.06.00 a 17.08.05 e de 01.04.06 a 04.11.14, na Bordallo Artefatos de Couro Ltda., no cargo de montador na molina do setor de montagem, exposto ao agente nocivo ruído de intensidades médias equivalentes a 90,5dB e 86,57dB, respectivamente, previsto no 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, conforme descrito no Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 238/239.
Em relação ao reconhecimento da especialidade do labor de 02.04.84 a 04.03.85, observo que o Perfil Profissiográfico Previdenciário apresentado está irregular, não contando com a assinatura do responsável técnico (fls. 178/179 e 235/236).
O período de 26.03.92 a 22.07.93 não pode ser reconhecido, porquanto não consta vínculo empregatício em CTPS. Igualmente, durante o interregno de 03.06.96 a 20.12.99 o autor não foi submetido a ruído superior a 90dB.
Somados os períodos reconhecidos como especiais, restaram comprovados, na data do requerimento administrativo (04.11.14 - fl. 139), 31 anos, 08 meses e 03 dias de tempo de serviço em condições especiais, suficiente para a aposentadoria especial.
Conquanto o autor tenha continuado a trabalhar em atividades insalubres, e malgrado a ressalva contida no § 8º, do Art. 57, da Lei 8.213/91 ("Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei.") e o disposto no Art. 46 ("O aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno."), reconsidero meu entendimento quanto ao termo inicial do benefício de aposentadoria especial, uma vez que o beneplácito administrativo previsto no § 3º, do Art. 254, da IN/INSS/PRES nº 77, de 21/01/15 ("Não será considerado permanência ou retorno à atividade o período entre a data do requerimento da aposentadoria especial e a data da ciência da decisão concessória do benefício."), e o que dispõe a Nota Técnica nº 00005/2016/CDPREV/PRF3R/PGF/AGU, ratificada pelo Parecer nº 25/2010/DIVCONS/CGMBEN/PFE-INSS e pelas Notas nº 00026/2017/DPIM/PFE-INSS-SEDE/PGF/AGU e nº 00034/2017/DIVCONT/PFE-INSS-SEGE/PGF/AGU, letra "d", permite ao segurado executar as parcelas vencidas entre a data do requerimento administrativo e a data da ciência da decisão concessória da aposentadoria especial, "..., independentemente da continuidade do trabalho sob condições agressivas durante a tramitação do processo judicial.".
Destarte, é de se reformar a r. sentença, devendo o réu averbar no cadastro do autor como trabalhados em condições especiais os períodos de 02.05.85 a 07.06.96, 12.08.86 a 01.03.90, 07.03.90 a 01.05.90, 03.05.90 a 23.10.91, 01.08.93 a 30.04.94, 01.09.94 a 30.06.95, 01.06.00 a 17.08.05 e de 01.04.06 a 04.11.14, e conceder o benefício de aposentadoria especial a partir de 04.11.14, e pagar as prestações vencidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora.
A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observando-se a aplicação do IPCA-E conforme decisão do e. STF, em regime de julgamento de recursos repetitivos no RE 870947, e o decidido também por aquela Corte quando do julgamento da questão de ordem nas ADIs 4357 e 4425.
Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em 19.04.17 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE579431, com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante nº 17.
Convém alertar que das prestações vencidas devem ser descontadas aquelas pagas administrativamente ou por força de liminar, e insuscetíveis de cumulação com o benefício concedido, na forma do Art. 124, da Lei nº 8.213/91, não podendo ser incluídos, no cálculo do valor do benefício, os períodos trabalhados, comuns ou especiais, após o termo inicial/data de início do benefício - DIB.
De outra parte, a fixação de multa diária, em caso de descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, além de refletir previsão, encontra amparo nos princípios constitucionais da efetividade e da duração razoável do processo, na medida em que consiste num mecanismo de concretização e eficácia do comando judicial, devendo o seu valor ser fixado com a observância dos parâmetros da razoabilidade e proporcionalidade.
Confiram-se:
Assim, o valor da multa diária fixada pela r. sentença deve ser reduzida para R$100,00, limitada a R$5.000,00, nos termos dos precedentes da Turma, com prazo de 45 dias.
Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96, do Art. 24-A da Lei nº 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93.
Posto isto, dou parcial provimento à remessa oficial e à apelação nos termos em que explicitado.
É o voto.
BAPTISTA PEREIRA
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 28/08/2018 20:23:37 |
