
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5010600-79.2022.4.03.6183
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: RICARDO ANDRADE
Advogado do(a) APELANTE: MARCELO ADAIME DUARTE - RS62293-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5010600-79.2022.4.03.6183
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: RICARDO ANDRADE
Advogado do(a) APELANTE: MARCELO ADAIME DUARTE - RS62293-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria especial, mediante reconhecimento de tempo de serviço desenvolvido em condições especiais.
O juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido para condenar o INSS a averbar como tempo de serviço especial os períodos de 08/06/1990 a 31/12/1990 e 1º/01/1994 a 21/02/1995, junto à Superintendência de Controle de Endemias – SUCEN. Diante da sucumbência recíproca, determinou a distribuição proporcional entre as partes das despesas processuais e dos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 86 do Código de Processo Civil. Declarou suspensa a exigibilidade da verba honorária, se e enquanto perdurarem os benefícios da gratuidade da justiça, previstos no art. 98, do Código de Processo Civil.
O INSS informou que não apelaria.
A parte autora opôs embargos de declaração à sentença, os quais foram acolhidos parcialmente para suprir omissão quanto ao pedido de produção de prova pericial, indeferindo-a, e corrigir erro material no total de tempo especial apurado, consignando tratar-se de 4 anos, 8 meses e 14 dias.
A parte autora apela, arguindo, preliminarmente, cerceamento de defesa, considerando não ter sido oportunizada a produção de prova pericial e testemunhal, razão pela qual requer a anulação da sentença. No mérito, pleiteia a parcial reforma da sentença para que sejam reconhecidas as condições especiais das atividades realizadas no período de 22/02/1995 a 13/11/2019, com a concessão da aposentadoria especial.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5010600-79.2022.4.03.6183
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: RICARDO ANDRADE
Advogado do(a) APELANTE: MARCELO ADAIME DUARTE - RS62293-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivos os recursos e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
A controvérsia reside no reconhecimento do caráter especial dos períodos laborados em condições insalubres, para fins de concessão de aposentadoria especial.
Na inicial, na réplica e em embargos de declaração, a parte autora pleiteou a produção de prova pericial e testemunhal, o que restou indeferido pelo juízo de 1.º grau somente ao pronunciar-se nos embargos de declaração, nos seguintes termos (Id. 271984426):
Em que pese pleiteie a parte autora a produção de prova pericial e testemunhal acaso este Juízo entenda não comprovada por meio dos documentos anexados aos autos a especialidade dos períodos controversos, não traz aos autos qualquer elemento que macule o conteúdo dos PPPs juntados na inicial.
Conclui-se, portanto, que a parte autora não se desincumbiu do ônus que lhe era obrigatório, não havendo que se falar em prejuízo que não seja o julgamento do feito, conforme a produção probatória constante nos autos.
Proferida sentença de parcial procedência, na qual reconhecidas as condições especiais apenas dos trabalhos realizados nos períodos de 08/06/1990 a 31/12/1990 e 1º/01/1994 a 21/02/1995.
Alega, a parte autora, omissão no PPP fornecido pela Superintendência de Controle de Endemias – SUCEN com relação a exposição a ruídos, a agentes químicos e biológicos.
O PPP emitido em 15/07/2021 pelo órgão em questão informa a exposição a agentes agressivos químicos e biológicos apenas até 21/10/2007 e a ruídos apenas nos interstícios de 10/01/1992 a 09/01/1993, reconhecido como especial administrativamente, e de 09/04/2007 a 21/10/2007 (Id. 271984118, pp. 52-64).
A magistrada a quo considerou que a função desempenhada – Encarregado de Turma, Encarregado de Setor e Encarregado I — retiraria a habitualidade e permanência da exposição, admitindo o enquadramento tão somente da atividade de Desinsetizador, com base nas informações do PPP.
Objetivando comprovar o alegado, o demandante acostou laudo pericial elaborado judicialmente em relação a empregado que desempenhou a atividade de Desinsetizador e de Encarregado de Setor no mesmo órgão e em períodos concomitantes aos do autor, concluindo pela insalubridade por exposição a agentes químicos e biológicos, respectivamente (Id. 271984131).
Juntados, ainda, atestados de Saúde Ocupacional relativos a exames periódicos do autor para a empresa nos anos de 2010, 2014, 2017, 2018 e 2019, nos quais declinadas a exposição a ruído, agentes químicos (dentre os quais organofosforados) e a agentes biológicos (Id. 271984127).
Tais elementos de prova acostados colocam em dúvida o teor do PPP, na medida em que o contradizem.
Assim, conforme requerido pela parte autora durante a instrução do processo, mostra-se imprescindível, para viabilizar a análise do pedido de reconhecimento, como especial, dos períodos pleiteados, a realização da perícia técnica para a comprovação do efetivo exercício de atividade em condições agressivas, idôneas a ocasionar danos à saúde ou à integridade física do trabalhador.
O juiz é o destinatário da prova, o mesmo ocorrendo com os revisores na 2.ª instância, última a examinar a prova, de modo que, se entender que o conjunto probatório é insuficiente, pode determinar, até mesmo de ofício, a produção daquelas necessárias à formação de seu convencimento, nos termos do art. 370 do CPC.
Nesse sentido:
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. PROVA PERICIAL. COMPLEMENTAÇÃO. NECESSIDADE. MATÉRIA PROBATÓRIA. PRECLUSÃO PRO JUDICATO. NÃO OCORRÊNCIA.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que o juiz é o destinatário da prova, cabendo-lhe, com base em seu livre convencimento, avaliar a necessidade de sua produção.
3. A iniciativa probatória do magistrado, em busca da veracidade dos fatos alegados, com realização de provas até mesmo de ofício, não se sujeita à preclusão temporal, porque é feita no interesse público de efetividade da Justiça. Precedentes.
4. Em questões probatórias, não há preclusão para o magistrado.
Precedentes.
5. Há cerceamento de defesa quando o juiz indefere a realização de provas requeridas, oportuna e justificadamente pela parte autora, com o fito de comprovar suas alegações, e o pedido é julgado improcedente por falta de provas. Precedentes do STJ.
6. Recurso especial não provido.
(REsp n. 1.677.926/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 23/3/2021, DJe de 25/3/2021.)
Em específico, a posição prevalecente e atual nesta 8.ª Turma:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
- É imprescindível a produção da prova pericial para a comprovação do efetivo exercício de atividade em condições agressivas.
- A falta de oportunidade para a realização da prova pericial, requerida pela parte, implica no cerceamento de defesa e ofensa aos princípios constitucionais do contraditório e do devido processo legal, impondo a nulidade do feito, a partir da eiva verificada.
- Registre-se que a perícia deve ser realizada por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, nos termos do artigo 58, §1º, da Lei nº 8.213/91, com o objetivo de apurar a efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos no ambiente laborado.
(TRF 3ª Região, 8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5003947-38.2022.4.03.6126, Rel. Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA, julgado em 19/03/2024, DJEN DATA: 22/03/2024)
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE LABOR EXERCIDO SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS. INDEFERIMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA CARACTERIZADO. ANULAÇÃO DA R. SENTENÇA, COM O RETORNO DOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM PARA PRODUÇÃO DA PROVA.
1- Constitui cerceamento do direito constitucional de defesa o indeferimento de prova pericial, requerida pela parte autora no curso da relação processual, que objetivava a demonstração de eventuais condições especiais de labor.
2- Os PPPs trazidos aos autos, apesar de indicarem a exposição a "frio", não especificam qual a temperatura a que o autor esteve exposto, de modo que se mostra imprescindível a realização de perícia técnica a comprovar a atividade especial eventualmente desenvolvida nos períodos mencionados.
3- Preliminar acolhida para determinar a anulação da r. sentença recorrida e o retorno dos autos para instrução probatória. No mérito, apelação do autor prejudicada.
(TRF 3ª Região, 8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5005933-50.2022.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 17/11/2023, DJEN DATA: 21/11/2023)
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO DO INSS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. PERÍODOS DE ATIVIDADES ESPECIAIS REQUERIDOS PELA AUTORA. ALEGADO CERCEAMENTO DE DEFESA POR FALTA DE PERÍCIA. AGRAVO RETIDO PROVIDO. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. INDEFERIMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. SENTENÇA NULA. PREJUDICADA A ANÁLISE DO MÉRITO RECURSAL.
1- Com razão a irresignação da parte autora manifestada no agravo retido, em face da decisão que indeferiu a realização de prova pericial para a comprovação da insalubridade das funções laborais exercidas pelo autor e reiterada a apreciação nas razões recursais.
2. Com efeito, o autor requereu na inicial a produção de provas por todos os meios admitidos em direito, inclusive, prova pericial. Relacionou, ainda, a relação de quesitos para serem respondidos por meio de perícia técnica, objetivando a caracterização de atividade especial.
3. A hipótese trata de pedido de aposentadoria por tempo de contribuição com reconhecimento de atividades especiais pelo recorrente.
4. A Constituição Federal de 1988 no art. 5º inc. LV dispõe sobre o princípio do contraditório e ampla defesa, além da inafastabilidade da tutela jurisdicional inc. XXXV.
5. O direito à produção de prova prevista no Código de Processo, alcança patamar constitucional, que preserva a garantia do contraditório e defesa, de modo que a exclusão de uma prova no processo judicial sempre será prejudicial.
6. Em conformidade com o art. 373 do Novo CPC, o ônus da prova incumbe (I) ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; (II) ao réu quanto à existência de fato impeditivo, modificativo e extintivo do direito do autor.
7. Nesse contexto, o julgamento causou grave prejuízo ao recorrente, impedido (cerceada) do direito de provar suas alegações, com a produção de outras provas.
8. Prova pericial, cuja realização, em tese, poderia demonstrar a caracterização da especialidade das funções exercidas pela parte autora e o direito ao benefício de aposentadoria com o cômputo das especialidades
9. - Sentença anulada. - Agravo retido da parte autora provido. - Prejudicada a apelação da parte autora e a remessa oficial.
10. Agravo interno do INSS improvido.
(TRF 3ª Região, 8ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 0025206-11.2016.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal JOSE DENILSON BRANCO, julgado em 10/07/2023, DJEN DATA: 13/07/2023)
A falta de oportunidade para a realização da prova pericial, requerida pela parte no curso do processo de maneira justificada, implica cerceamento de defesa e ofensa aos princípios constitucionais do contraditório e do devido processo legal, impondo a nulidade do feito, a partir da eiva verificada.
Registre-se que a perícia deve ser realizada por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, nos termos do art. 58, § 1.º, da Lei n.º 8.213/91, com o objetivo de apurar a efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos no ambiente laborado.
Despicienda, no entanto, a produção de prova testemunhal por se tratar de matéria eminentemente técnica.
Assim, a falta de oportunidade para a realização da prova pericial que apure as reais condições em que as atividades eram desenvolvidas, requerida pela parte em diversas ocasiões no curso do processo, implica cerceamento de defesa e ofensa aos princípios constitucionais do contraditório e do devido processo legal, impondo a nulidade do feito, a partir da eiva verificada.
Posto isto, dou provimento à apelação da parte autora, para reconhecer a ocorrência de cerceamento de defesa alegada preliminarmente e anular a sentença, determinando o retorno dos autos à vara de origem, para a produção de prova pericial, prejudicado o exame do recurso quanto ao mérito propriamente dito.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
- O juiz é o destinatário da prova, o mesmo ocorrendo com os revisores na 2.ª instância, última a examinar a prova, de modo que, se entender que o conjunto probatório é insuficiente, pode determinar, até mesmo de ofício, a produção daquelas necessárias à formação de seu convencimento, nos termos do art. 370 do CPC.
- No caso concreto, é imprescindível a produção da prova pericial para a comprovação do efetivo exercício de atividade em condições agressivas.
- A falta de oportunidade para a realização da prova pericial, requerida pela parte de maneira justificada, implica no cerceamento de defesa e ofensa aos princípios constitucionais do contraditório e do devido processo legal, impondo a nulidade do feito, a partir da eiva verificada.
