
| D.E. Publicado em 31/05/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido, negar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003720-61.2011.4.03.6113/SP
RELATÓRIO
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
Trata-se de ação previdenciária ajuizada por SOLANGE DE JESUS PEREIRA CRUZ em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL-INSS, objetivando a concessão do benefício da aposentadoria especial mediante o reconhecimento da atividade especial.
A r. sentença julgou parcialmente procedente os pedidos formulados na inicial, para reconhecer a atividade especial exercida pela autora nos períodos de 03/08/1981 a 02/03/1983, 05/04/1983 a 13/06/1988, 01/02/1986 a 13/06/1988, 14/06/1988 a 01/12/1989, 02/12/1989 a 17/05/1992 e 18/05/1992 a 05/03/1997, condenando o INSS a implantar o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a partir do ajuizamento da ação (19/12/2011), devendo os valores em atraso ser pagos de uma só vez, atualizados monetariamente e acrescidos de juros de mora desde a citação, julgando improcedente o pedido de indenização por danos morais. Considerou a sucumbência recíproca, deixando de condenar as partes ao pagamento dos honorários advocatícios. Deferiu a antecipação da tutela.
Às fls. 173/177 a autora interpôs agravo retido, em face ao indeferimento da produção de prova pericial.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a parte autora apelou do decisum, requerendo, de início, a apreciação do agravo retido, com o retorno dos autos à origem para produção de prova pericial. No mérito, afirma ter cumprido os requisitos legais para concessão da aposentadoria especial, nos termos previstos no artigo 57 da Lei nº 8.213/91. Aduz que trabalhou por mais de 25 (vinte e cinco) anos em atividade insalubre ou, caso assim não entenda, lhe seja deferida aposentadoria por tempo de contribuição com regras anteriores à EC nº 20/98, com termo inicial a partir do pedido administrativo, condenando o INSS ao pagamento da verba honorária, arbitrada em 15% (quinze por cento) do total da liquidação.
Também inconformado, o INSS ofertou apelação, requerendo, inicialmente, a revogação da tutela deferida na sentença. Aduz não ficar comprovado nos autos o exercício da atividade insalubre, pois a função exercida pela autora não está inserida nos decretos previdenciários. Alega ainda que o PPP juntado aos autos indica inexistência dos agentes agressivos no ambiente de trabalho, requerendo a reforma da sentença e improcedência total do pedido. Prequestionada a matéria para fins de eventual interposição de recurso junto à instância superior.
Com as contrarrazões das partes, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
Conheço do agravo retido interposto pela autora, vez que reiterada sua apreciação nas razões de apelação, contudo, nego-lhe provimento.
Entendo não se verificar ocorrência de nulidade na sentença por cerceamento da defesa, pois cabe ao Magistrado, no uso do seu poder instrutório, deferir ou não determinada, prova de acordo com a necessidade e para a formação do seu convencimento e, tendo sido possível ao juiz a quo formar seu convencimento através dos documentos juntados na inicial, não há que se falar em cerceamento de defesa.
In casu, a parte autora alega na inicial ter trabalhado em atividade especial, totalizando tempo suficiente para concessão da aposentadoria especial desde o requerimento administrativo em 25/05/2011.
Portanto, a controvérsia nos presentes autos restringe-se ao reconhecimento da atividade especial nos períodos elencados no item 3 (fls. 11/13) da inicial.
Aposentadoria Especial:
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60.
Por sua vez, dispõe o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 que a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a Lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
O critério de especificação da categoria profissional com base na penosidade, insalubridade ou periculosidade, definidas por Decreto do Poder Executivo, foi mantido até a edição da Lei nº 8.213/91, ou seja, as atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo seriam consideradas penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico, bastando, assim, a anotação da função em CTPS ou a elaboração do então denominado informativo SB-40.
Foram baixados pelo Poder Executivo os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, relacionando os serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos.
Embora o artigo 57 da Lei nº 8.213/91 tenha limitado a aposentadoria especial às atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, o critério anterior continuou ainda prevalecendo.
De notar que, da edição da Lei nº 3.807/60 até a última CLPS, que antecedeu à Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço especial foi sempre definido com base nas atividades que se enquadrassem no decreto baixado pelo Poder Executivo como penosas, insalubres ou perigosas, independentemente de comprovação por laudo técnico.
A própria Lei nº 8.213/91, em suas disposições finais e transitórias, estabeleceu, em seu artigo 152, que a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física deverá ser submetida à apreciação do Congresso Nacional, prevalecendo, até então, a lista constante da legislação em vigor para aposentadoria especial.
Os agentes prejudiciais à saúde foram relacionados no Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 (art. 66 e Anexo IV), mas por se tratar de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n 9.528, de 10/12/1997.
Destaque-se que o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, em sua redação original, deixou de fazer alusão a serviços considerados perigosos, insalubres ou penosos, passando a mencionar apenas atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, sendo que o artigo 58 do mesmo diploma legal, também em sua redação original, estabelecia que a relação dessas atividades seria objeto de lei específica.
A redação original do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 foi alterada pela Lei nº 9.032/95 sem que até então tivesse sido editada lei que estabelecesse a relação das atividades profissionais sujeitas a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, não havendo dúvidas até então que continuavam em vigor os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. Nesse sentido, confira-se a jurisprudência: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
É de se ressaltar, quanto ao nível de ruído, que a jurisprudência já reconheceu que o Decreto nº 53.831/64 e o Decreto nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, ou seja, não houve revogação daquela legislação por esta, de forma que, constatando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado (STJ - REsp. n. 412351/RS; 5ª Turma; Rel. Min. Laurita Vaz; julgado em 21.10.2003; DJ 17.11.2003; pág. 355).
O Decreto nº 2.172/97, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 dB(A) como prejudicial à saúde.
Por tais razões, até ser editado o Decreto nº 2.172/97, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB(A) como agente nocivo à saúde.
Todavia, com o Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível voltou a ser de 85 dB(A) (art. 2º do Decreto nº 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Houve, assim, um abrandamento da norma até então vigente, a qual considerava como agente agressivo à saúde a exposição acima de 90 dB(A), razão pela qual vinha adotando o entendimento segundo o qual o nível de ruídos superior a 85 dB(A) a partir de 05/03/1997 caracterizava a atividade como especial.
Ocorre que o C. STJ, no julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do artigo 543-C do CPC, decidiu não ser possível a aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, de modo que no período de 06/03/1997 a 18/11/2003, em consideração ao princípio tempus regit actum, a atividade somente será considerada especial quando o ruído for superior a 90 dB(A).
Nesse sentido, segue a ementa do referido julgado:
Destaco, ainda, que o uso de equipamento de proteção individual não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal tipo de equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos. Nesse sentido, precedentes desta E. Corte (AC nº 2000.03.99.031362-0/SP; 1ª Turma; Rel. Des. Fed. André Nekatschalow; v.u; J. 19.08.2002; DJU 18.11) e do Colendo Superior Tribunal de Justiça: REsp 584.859/ES, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em 18/08/2005, DJ 05/09/2005 p. 458).
Cumpre observar, por fim, que, por ocasião da conversão da Medida Provisória nº 1.663/98 na Lei nº 9.711/98, permaneceu em vigor o parágrafo 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, razão pela qual continua sendo plenamente possível a conversão do tempo trabalhado em condições especiais em tempo de serviço comum relativamente a qualquer período, incluindo o posterior a 28/05/1998. (STJ, AgRg no Resp nº 1.127.806-PR, 5ª Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 05/04/2010)
No presente caso, da análise do Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP juntado às fls. 66/67 e laudo técnico emprestado (fls. 68/85) e, de acordo com a legislação previdenciária vigente à época, a parte autora comprovou o exercício de atividade especial nos seguintes períodos:
Assim, deve o INSS homologar os citados períodos como atividade especial, nos termos dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.
Com relação à atividade de 'sapateiro', embora não conste das atividades previstas nos Decretos nº 53.831/64, 83.080/79, 2.172/91 e 3.048/99 a exposição ao agente agressivo hidrocarboneto tóxico-derivado do carbono "cola de sapateiro" é inerente ao exercício da função, razão pela qual tal atividade deve ser considerada especial, ainda que se baseando em prova emprestada.
E ainda que o laudo pericial tenha sido produzido a pedido do Sindicato dos Empregados nas Indústrias de Calçados de Franca, aproveita à parte autora para o reconhecimento da atividade especial, considerando que se refere à situação similar por ela vivenciada, vez que sempre trabalhou em indústrias de calçados em Franca.
Observo que o documento foi emitido por Engenheiro de Segurança do Trabalho (fls. 68/85), trazendo em seu bojo, de forma discriminada, cada setor da indústria calçadista, informando que os ambientes das empresas avaliadas utilizam em seu processo produtivo insumos industriais (colas, vernizes, tintas, thinners, halogênicos entre outros).
E dentre as funções avaliadas no laudo encontra-se a atividade exercida pela autora, conforme se observa pela sua CTPS (fls. 39/65), vez que sempre trabalhou em 'setor de pesponto', inicialmente como auxiliar, como subchefe e, por fim, como supervisora de pesponto, estando o setor inserido dentre aqueles em que ocorre exposição a tolueno e acetona em níveis acima do legalmente permitido, autorizando enquadrar a atividade como insalubre. No mesmo sentido, já decidiu esta Corte:
Desse modo, computando-se os períodos de atividades especiais ora reconhecidos até a data do requerimento administrativo (25/05/2011 - fls. 38) perfazem-se 29 (vinte e nove) anos, 01 (um) mês e 11 (onze) dias de atividade exclusivamente especial, conforme planilha anexa, suficientes à concessão da aposentadoria especial prevista nos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91, com renda mensal de 100% (cem por cento) do salário de benefício.
Portanto, faz jus a autora à aposentadoria especial a partir de 25/05/2011 (DER fls. 38), momento em que o INSS teve ciência da pretensão.
Para o cálculo dos juros de mora, aplicam-se os critérios estabelecidos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação. Quanto à correção monetária, acompanho o entendimento firmado pela Sétima Turma no sentido da aplicação do Manual de Cálculos, naquilo que não conflitar como o disposto na Lei nº 11.960/2009, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009.
A verba honorária de sucumbência incide no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, conforme entendimento desta Turma (artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil/2015), aplicada a Súmula 111 do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual os honorários advocatícios, nas ações de cunho previdenciário, não incidem sobre o valor das prestações vencidas após a data da prolação da sentença.
O INSS é isento de custas processuais, arcando com as demais despesas, inclusive honorários periciais (Res. CJF nºs. 541 e 558/2007), além de reembolsar as custas recolhidas pela parte contrária, o que não é o caso dos autos, ante a gratuidade processual concedida (art. 4º, I e parágrafo único, da Lei nº 9.289/1996, art. 24-A da Lei nº 9.028/1995, n.r., e art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/1993).
Independentemente do trânsito em julgado, determino seja expedido ofício ao INSS, instruído com os documentos da parte segurada (SOLANGE DE JESUS PEREIRA CRUZ) a fim de que se adotem as providências cabíveis ao imediato cancelamento do benefício NB 42/163.521.404-9 e implantação da aposentadoria especial NB 46/156.789.549-0, com data de início - DIB em 25/05/2011 (DER fls. 38) nos termos do artigo 497 do CPC de 2015. O aludido ofício poderá ser substituído por e-mail, na forma a ser disciplinada por esta Corte.
Anote-se, na espécie, a obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores eventualmente pagos à parte autora após o termo inicial assinalado à benesse outorgada, ao mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124 da Lei nº 8.213/1991 e art. 20, § 4º, da Lei 8.742/1993).
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, nego provimento ao agravo retido e dou parcial provimento à apelação da autora para reconhecer os períodos de atividades especiais e lhe conceder a aposentadoria especial, conforme fundamentação.
É como voto.
TORU YAMAMOTO
Desembargador Federal
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