
| D.E. Publicado em 30/08/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento às apelações e à remessa oficial, tida por ocorrida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. A Desembargadora Federal Ana Pezarini acompanhou o Relator ressalvando entendimento pessoal.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0039089-93.2014.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora busca o enquadramento de atividade insalubre, com vistas à concessão de aposentadoria especial.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido apenas para declarar especiais os lapsos de 8/1/1990 a 30/4/1990, de 29/4/1995 a 15/12/1998 e de 16/12/1998 a 13/6/2005, visando à averbação no tempo de serviço. Fixou a sucumbência recíproca.
Decisão não submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a parte autora interpôs apelação, na qual, preambularmente, invoca cerceamento de defesa; na questão de fundo, aduz a suficiência do conjunto probatório à comprovação do trabalho especial afastado pelo julgado, o que lhe assegura a obtenção do benefício vindicado. Ressalta que a atividade na lavoura canavieira é por demais penosa, ensejando a contagem excepcional. Para tanto, junta prova emprestada de causas idênticas.
Também inconformada, apela a autarquia; exora, inicialmente, o reexame de toda matéria desfavorável ao ente público; na questão de fundo, (i) salienta a impossibilidade de enquadramento do trabalhador agrícola; (ii) aduz que a parte autora não logrou comprovar o labor especial pelo período vindicado; (iii) ademais, demonstrada a eficácia do EPI, o empregador deixa de recolher as contribuições para o SAT, inexistindo base de custeio para financiamento da aposentadoria especial. Subsidiariamente, requer modificação do termo inicial do benefício e da verba honorária. Por fim, prequestiona a matéria para efeitos recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte, tendo sido distribuídos a este relator.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço das apelações, porque presentes os requisitos de admissibilidade.
Considerando que a r. sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, não se aplicam as novas regras previstas no artigo 496 e §§ do Novo CPC.
Deste modo, apesar de ter sido proferida a sentença após a vigência da alteração do artigo 475, § 2º, do Código de Processo Civil pela Lei n. 10.352/2001, que afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação for inferior a 60 (sessenta) salários-mínimos, conheço da remessa oficial, por não haver valor certo a ser considerado, na forma da Súmula nº 490 do STJ.
Compulsados os autos, não visualizo o alegado cerceamento de defesa, pois a causa encontra-se suficientemente instruída com formulários e Perfis Profissiográficos Previdenciários à prova da atividade insalutífera.
Ademais, cabe ao magistrado, em caso de dúvida fundada, o deferimento de prova pericial para confrontação do material reunido à exordial, o que não convém ao caso.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições prejudiciais.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Nesse sentido, o C. STJ, ao julgar o Recurso Especial o n. 1.398.260, sob o regime do artigo 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento realizado em 14/5/2014).
A propósito, ainda, da comprovação do tempo de serviço prestado em condições especiais, sob a égide dos Decretos n. 53.831, de 25 de março de 1964, e 83.080, de 24 de janeiro de 1979, o enquadramento das atividades ocorria dava-se por grupos profissionais e pelo rol dos agentes nocivos. Assim, se a categoria profissional à qual pertencesse o segurado se encontrasse entre aquelas descritas nos anexos dos decretos, a concessão de aposentadoria especial, caso houvesse satisfação de todos os requisitos legais, independeria de comprovação da efetiva exposição aos agentes nocivos, exceto para a exposição a ruídos e calor, que sempre exigiu prova pericial. Nessa diretriz, para comprovação das atividades exercidas pelo segurado, foi criado o formulário "SB 40", no qual constavam as atividades especiais exercidas, bem como suas especificações.
Em relação ao EPI, cumpre tecer algumas considerações.
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Busca a parte autora o enquadramento dos seguintes períodos nas ocupações de rurícola, trabalhador agrícola e motorista na lavoura canavieira: de 16/5/1978 a 31/10/1978, de 16/1/1980 a 31/3/1980, de 2/5/1980 a 31/10/1980, de 3/11/1980 a 31/3/1981, de 22/4/1981 a 23/9/1981, de 4/1/1982 a 30/4/1982, de 16/6/1982 a 23/10/1982, de 3/11/1982 a 31/3/1983, de 18/4/1983 a 30/11/1983, de 1/12/1983 a 31/3/1984, de 23/4/1984 a 14/11/1984, de 19/11/1984 a 13/4/1985, de 2/5/1985 a 31/10/1985, de 11/11/1985 a 15/5/1986, de 30/3/1987 a 15/4/1987, de 21/4/1987 a 10/6/1987, de 6/5/1988 a 7/11/1988, de 13/2/1989 a 3/4/1989, de 9/5/1989 a 11/11/1989, de 8/1/1990 a 30/4/1990, de 29/4/1995 a 15/12/1998, de 16/12/1998 a 13/6/2005, de 13/1/2006 a 17/10/2006, de 15/5/2007 a 7/12/2007, de 5/5/2008 a 10/12/2008 e de 24/3/2009 a 7/8/2010, resultando, segundo seus cálculos, em mais de 26 anos de tempo especial.
A tanto, carreou à causa perfis profissiográficos e laudos.
O PPP de f. 43/45, emitido pela empregadora LDC BIOENERGIA S/A, atesta exposição habitual do autor aos agentes agressivos ruído de 85 dB e hidrocarbonetos (de 8/1/1990 a 30/4/1990) e níveis de ruído entre 87,5 dB (safra) e 91,3 dB (de 1/5/1990 a 13/6/2005), que na média resultam exatos 89,4 dB.
Assim, cabível se afigura enquadrar os lapsos de 8/1/1990 a 30/4/1990 e de 18/11/2003 a 13/6/2005, em virtude do labor sob influência a níveis de pressão sonora acima dos limites de tolerância para a época de prestação do serviço (90 dB e 85 dB, respectivamente) - códigos 1.1.6 e 2.0.1 dos anexos aos Decretos 53.831/64 e 3.048/99.
Cumpre, ainda, reconhecer o caráter penoso da função de motorista agrícola de transporte de cargas durante o período de 29/4/1995 a 5/3/1997 - código 2.4.4 do anexo ao Dec. 53.831/64.
Aos intervalos remanescentes, não prospera a tese autoral.
Senão vejamos.
Para os lapsos de 16/5/1978 a 31/10/1978, de 16/1/1980 a 31/3/1980, de 2/5/1980 a 31/10/1980, de 3/11/1980 a 31/3/1981, de 22/4/1981 a 23/9/1981, de 16/6/1982 a 23/10/1982, de 3/11/1982 a 31/3/1983, de 18/4/1983 a 30/11/1983, de 1/12/1983 a 31/3/1984, de 23/4/1984 a 14/11/1984, de 19/11/1984 a 13/4/1985, de 2/5/1985 a 31/10/1985, de 11/11/1985 a 15/5/1986, de 30/3/1987 a 15/4/1987, de 21/4/1987 a 10/6/1987, de 13/1/2006 a 17/10/2006 e de 5/5/2008 a 10/12/2008, nas funções de "corte de cana" e "motorista", trouxe o suplicante PPP (fs. 35/36v) certificador de exposição a "condições climáticas diversas" e ruídos abaixo dos patamares permitidos.
Com efeito, para o enquadramento na situação prevista no código 2.2.1 (trabalhadores na agropecuária) do anexo ao Decreto n. 53.831/64, a jurisprudência prevê a necessidade de comprovação da efetiva exposição, habitual e permanente, aos possíveis agentes agressivos à saúde.
A simples sujeição às intempéries da natureza, como consta nos formulários, é insuficiente a caracterizar a lida no campo como insalubre ou penosa.
Nesse sentido (g. n.):
Igualmente, não há como acolher os vínculos empregatícios compreendidos de 6/5/1988 a 7/11/1988 e de 13/2/1989 a 3/4/1989, à míngua de fatores de risco no perfil profissiográfico e respectivo laudo coligidos a fs. 37/39.
Outrossim, é descabida a pretensão de contagem excepcional dos interregnos de 4/1/1982 a 30/4/1982 e de 9/5/1989 a 10/11/1989, em vista da indicação genérica dos elementos degradantes "calor", "poeira mineral" e "ruído" nos formulários de f. 42 e 43, em desacordo às normas regulamentares.
O PPP de f. 46/47 também padece de irregularidade ao informar o agente físico ruído de modo genérico para o período de 15/5/2007 a 7/12/2007.
Por fim, o PPP emitido pela empregadora USINA SÃO MARTINHO S/A (f. 48), para o liame de 24/3/2009 a 7/8/2010, não se presta a asseverar a nocividade do labor, porquanto as intensidades de ruído aferidas estão abaixo dos limites admitidos pela legislação previdenciária (85 dB).
Por outro lado, malgrado guardar certa semelhança fática, não há como aproveitar a prova emprestada trazida pelo autor nas razões recursais, por se tratar de terceiros estranhos à lide e não vinculantes a presente causa previdenciária.
Nesse sentido, aplicável ao caso (g. n.):
No mais, questões relativas ao enquadramento e recolhimento da contribuição adicional ao SAT por parte da empresa, consoante brandido pelo réu, não devem, em tese, influir no cômputo como especial da atividade exercida pelo segurado, mercê do princípio da automaticidade, previsto no artigo 30, I, da Lei n. 8.212/91, aplicável neste enfoque.
Em suma, com a ressalva dos lapsos reconhecidos, forçoso o desacolhimento do pleito, pois entendo não provados os demais períodos a ensejar seu enquadramento e consequente concessão do benefício.
Assim, não se faz presente o requisito temporal exigido à concessão da aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 e seguintes da Lei n. 8.213/91.
Passo à análise da questão referente aos honorários de advogado à luz do direito processual intertemporal.
"Em caso de sucumbência recíproca, deverá ser considerada proveito econômico do réu, para fins do art. 85, § 2º, do CPC/2015, a diferença entre o que foi pleiteado pelo autor e o que foi concedido, inclusive no que se refere às condenações por danos morais." (Enunciado n° 14 aprovado pela ENFAM), sendo vedada a compensação na forma do § 14 do mesmo artigo.
Contudo, a despeito da sucumbência recíproca verificada in casu, deixo de condenar ambas as partes a pagar honorários ao advogado da parte contrária, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do NCPC, isso para evitar surpresa à parte prejudicada, aplicando-se o mesmo entendimento da doutrina concernente a não aplicação da sucumbência recursal.
De fato, considerando que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, §§ 1º a 11º, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal.
Nesse diapasão, o Enunciado Administrativo nº 7 do STJ, in verbis: "Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC".
Em relação à parte autora, de todo modo, é suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser beneficiária da justiça gratuita.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO às apelações e à remessa oficial, tida por ocorrida, para, nos termos da fundamentação: (i) restringir o enquadramento da atividade especial aos períodos de 8/1/1990 a 30/4/1990, de 29/4/1995 a 5/3/1997 e de 18/11/2003 a 13/6/2005; (ii) julgar improcedente o pedido de aposentadoria especial.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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| Data e Hora: | 16/08/2016 18:47:48 |
