D.E. Publicado em 02/06/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação autárquica e à remessa oficial, tida por ocorrida, e tornar prejudicada a apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0019874-68.2013.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora busca o enquadramento de atividade insalubre, com vistas à concessão de aposentadoria especial.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido para determinar o enquadramento dos lapsos de 25/3/1983 a 13/11/1983 e de 9/1/1989 a 30/4/1989, para fins de averbação no tempo de serviço.
Decisão não submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a parte autora interpôs apelação, na qual aduz a suficiência do conjunto probatório à comprovação do trabalho especial em contenda, o que lhe assegura a obtenção do benefício vindicado. Ressalta que a atividade na lavoura canavieira é por demais penosa, ensejando a contagem excepcional.
Também inconformada, apela a autarquia; exora, inicialmente, o reexame de toda matéria desfavorável ao ente público; na questão de fundo, (i) salienta a impossibilidade de enquadramento do trabalhador agrícola; (ii) sustenta a imprestabilidade do laudo judicial; (iii) aduz, em síntese, que a parte autora não logrou comprovar o labor especial pelo período vindicado; (iv) ademais, demonstrada a eficácia do EPI, o empregador deixa de recolher as contribuições para o SAT, inexistindo base de custeio para financiamento da aposentadoria especial. Por fim, prequestiona a matéria para efeitos recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte, tendo sido distribuídos a este relator.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço das apelações, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
Considerando que a r. sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, não se aplicam as novas regras previstas no artigo 496 e §§ do Novo CPC.
Deste modo, apesar de ter sido proferida a sentença após a vigência da alteração do artigo 475, § 2º, do Código de Processo Civil pela Lei n. 10.352/2001, que afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação for inferior a 60 (sessenta) salários-mínimos, conheço da remessa oficial, por não haver valor certo a ser considerado, na forma da Súmula nº 490 do STJ.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições prejudiciais.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Nesse sentido, o C. STJ, ao julgar o Recurso Especial o n. 1.398.260, sob o regime do artigo 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento realizado em 14/5/2014).
A propósito, ainda, da comprovação do tempo de serviço prestado em condições especiais, sob a égide dos Decretos n. 53.831, de 25 de março de 1964, e 83.080, de 24 de janeiro de 1979, o enquadramento das atividades ocorria dava-se por grupos profissionais e pelo rol dos agentes nocivos. Assim, se a categoria profissional à qual pertencesse o segurado se encontrasse entre aquelas descritas nos anexos dos decretos, a concessão de aposentadoria especial, caso houvesse satisfação de todos os requisitos legais, independeria de comprovação da efetiva exposição aos agentes nocivos, exceto para a exposição a ruídos e calor, que sempre exigiu prova pericial. Nessa diretriz, para comprovação das atividades exercidas pelo segurado, foi criado o formulário "SB 40", no qual constavam as atividades especiais exercidas, bem como suas especificações.
Em relação ao EPI, cumpre tecer algumas considerações.
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Busca a parte autora o enquadramento dos seguintes períodos na ocupação de rurícola e de trabalhador agrícola na lavoura canavieira: de 6/12/1978 a 15/4/1979, de 27/10/1979 a 30/4/1980, de 12/5/1980 a 27/9/1980, de 29/9/1980 a 15/4/1981, de 25/5/1981 a 25/9/1981, de 3/11/1981 a 15/4/1982, de 27/5/1982 a 15/10/1982, de 8/11/1982 a 22/3/1983, de 25/3/1983 a 13/11/1983, de 23/11/1983 a 30/3/1984, de 11/5/1984 a 27/10/1984, de 3/12/1984 a 30/4/1985, de 2/5/1985 a 24/10/1985, de 2/12/1985 a 30/4/1986, de 1º/5/1986 a 22/11/1986, de 1º/12/1986 a 31/3/1987, de 10/4/1987 a 11/10/1987, de 3/11/1987 a 22/4/1988, de 2/5/1988 a 18/11/1988, de 9/1/1989 a 30/4/1989, de 2/5/1989 a 8/11/1989, de 15/1/1990 a 15/3/1996, de 30/4/1996 a 7/12/1996, de 5/5/1997 a 12/2/2001, de 7/5/2001 a 11/12/2001, de 13/2/2002 a 27/9/2004 e de 10/2/2005 a 23/5/2008, resultando, segundo seus cálculos, em mais de 26 anos de tempo especial.
Não prospera a tese autoral.
Senão vejamos.
Ao período de 25/3/1983 a 13/11/1983, carreou formulário padrão em que aponta a presença genérica de ruído, sem laudo confirmatório subscrito por profissional habilitado.
Para os lapsos de 27/10/1979 a 30/4/1980, de 12/5/1980 a 27/9/1980, de 29/9/1980 a 15/4/1981, de 3/11/1981 a 15/4/1982, de 25/5/1981 a 25/9/1981, de 27/5/1982 a 15/10/1982 e de 8/11/1982 a 22/3/1983, acostou formulários do tipo SB40, firmados pelas Fazendas "Santo Antônio" (Matão/SP) e "São Joaquim" (Araraquara/SP), os quais descrevem a presença genérica a "poeira", "calor", "frio" e "chuva"; aos vínculos de 23/11/1983 a 30/3/1984, de 11/5/1984 a 27/10/1984, de 3/12/1984 a 30/4/1985, de 2/5/1985 a 24/10/1985, de 2/12/1985 a 30/4/1986, de 1º/5/1986 a 22/11/1986, de 1º/12/1986 a 31/3/1987, de 10/4/1987 a 11/10/1987, de 3/11/1987 a 22/4/1988, de 2/5/1988 a 18/11/1988, de 9/1/1989 a 30/4/1989, de 2/5/1989 a 8/11/1989 e de 15/1/1990 a 15/3/1996, nas funções de "trabalhador agrícola", "entregador de cana" e "ajudante fiscal", trouxe informações de atividade insalutífera que consignam agentes nocivos de forma genérica, como "calor", "poeira mineral" e "ruído"; já os perfis profissiográficos de f. 37/39, 40, 42, 46/47 apontam exposição a intempéries, radiação solar e condições climáticas diversas.
Com efeito, para o enquadramento na situação prevista no código 2.2.1 (trabalhadores na agropecuária) do anexo ao Decreto n. 53.831/64, a jurisprudência prevê a necessidade de comprovação da efetiva exposição, habitual e permanente, aos possíveis agentes agressivos à saúde.
A simples sujeição às intempéries da natureza, como consta nos formulários, é insuficiente a caracterizar a lida no campo como insalubre ou penosa.
Nesse sentido (g. n.):
Por outro giro, não há como aproveitar a prova pericial produzida no curso da instrução (f. 120/132), visando constatar a prejudicialidade da atividade, pois baseada nas informações já presentes nos autos, assim como nas colhidas em campo junto ao próprio autor interessado.
Não se mostra apto, portanto, a atestar com confiabilidade as condições degradantes do obreiro, de modo habitual e permanente, nos lapsos debatidos; além de ser extemporâneo.
Nesse sentido, trago o seguinte precedente:
Ademais, o sr. perito assevera, com precisão, exposição a intensidades de ruído na ordem dos 82,9 dB e de calor a 32,7ºC, sem indicação, contudo, dos equipamentos e da metodologia empregados. Afinal, como chegou o experto a esses valores a título de temperatura e de pressão acústica incidente sobre os ouvidos dos trabalhadores?
Assim, entendo que o mourejo rural não deve ser enquadrado como especial.
Não se faz presente o requisito temporal exigido à concessão da aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 e seguintes da Lei n. 8.213/91.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, DOU PROVIMENTO à apelação autárquica e à remessa oficial, tida por ocorrida, para, nos termos da fundamentação, julgar improcedente o pedido. Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85, § 4º, III, do Novo CPC, mas fica suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita. Ademais, considerando que a apelação foi interposta na vigência do CPC/1973, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, § 1º, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal. PREJUDICADA a apelação da parte autora.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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Data e Hora: | 17/05/2016 18:47:50 |