D.E. Publicado em 06/12/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária e negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0006163-27.2015.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de pedido de aposentadoria especial ajuizado por Indalécio de Jesus Cores em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Contestação do INSS às fls. 73/90 na qual sustenta a ausência de comprovação do exercício da atividade especial, requerendo, ao final, a improcedência total do pedido.
Decurso do prazo para réplica (fl. 91, verso), bem como para a juntada aos autos dos documentos comprobatórios da exposição da parte autora a agentes nocivos à saúde, conforme despacho de fl. 91.
Sentença às fls. 94/98, pela procedência do pedido, para reconhecer a natureza especial dos períodos laborados de 03.12.1998 a 08.06.2006 e de 02.04.2007 a 04.03.2015, e condenar o réu ao pagamento do benefício da aposentadoria especial, a partir do requerimento administrativo (14.03.2015). Fixou a sucumbência e submeteu o feito à remessa necessária.
Apelação às fls. 103/109, requerendo a reforma da sentença ao argumento da não comprovação do exercício da atividade especial exercida nos períodos em que não houve a indicação de profissional habilitado e responsável pelos registros ambientais no local de trabalho. Sustenta, ainda, que o período de fruição auxílio-doença não pode ser reconhecido como especial. Para a hipótese de entendimento contrário, pleiteia que o critério de incidência de correção monetária e juros de mora se dê nos termos da Lei nº 11.960/09.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 15.01.1969, o reconhecimento do exercício de atividades especiais nos períodos de 03.12.1998 a 08.06.2006 e de 02.04.2007 a 04.03.2015, e a concessão do benefício de aposentadoria especial a partir da data do requerimento administrativo (D.E.R. 14.03.2015).
Inicialmente, anoto que a sentença foi proferida já na vigência do novo Código de Processo Civil - Lei 13.105/2015 -, razão pela qual se deve observar o disposto no art. 496, §3º, I. No caso dos autos, não obstante a sentença ser ilíquida é certo que o proveito econômico obtido pela parte autora não superará o valor de 1.000 salários mínimos, ainda que se considere o teto dos benefícios pagos pela previdência social. Afasto, portanto, a alegação da necessidade da submissão do julgado à remessa necessária.
Para melhor elucidação da controvérsia colocada em Juízo, cumpre distinguir a aposentadoria especial prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo diploma legal, pois enquanto a aposentadoria especial pressupõe o exercício de atividade considerada especial pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, e, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da E.C. nº 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, assim como não se submete ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição há tanto o exercício de atividade especial como o exercício de atividade comum, sendo que o período de atividade especial sofre a conversão em atividade comum aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da E.C. nº 20/98.
Da atividade especial.
No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica.
O art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original que (...) Art. 58. A relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica (...).
Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96, o dispositivo legal acima mencionado teve sua redação alterada, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na forma que segue:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico.
No mesmo sentido:
Assim, em tese, pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030, exceto para o agente nocivo ruído por depender de prova técnica.
Ressalto que os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
Saliento que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Quanto ao agente nocivo ruído, o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o referido decreto, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 decibéis como agente nocivo à saúde.
Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto nº 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo Superior Tribunal de Justiça que, no julgamento do Recurso especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do Código de Processo Civil (Recurso especial Repetitivo), fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, na forma que segue:
Dessa forma, deve-se considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a ruídos de 85 decibéis.
Conforme acima destacado, está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o limite de 90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei nº 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividades em condições especiais, fazendo às vezes do laudo técnico.
E não afasta a validade de suas conclusões o fato de ter sido o PPP ou laudo elaborado posteriormente à prestação do serviço, vez que tal requisito não está previsto em lei, mormente que a responsabilidade por sua expedição é do empregador, não podendo o empregado arcar com o ônus de eventual desídia daquele e, ademais, a evolução tecnológica propicia condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas: "i) tese 1 - regra geral: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial; e ii) tese 2 - agente nocivo ruído: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos".
NO CASO DOS AUTOS, os períodos incontroversos em virtude de acolhimento na via administrativa totalizam 10 (dez) anos, 06 (seis) meses e 18 (dezoito) dias, tendo sido reconhecido como tempo especial o período laborado de 01.03.1998 a 02.12.1998 (fls. 59/60 e 64/65). Portanto, a controvérsia colocada nos autos engloba o reconhecimento da natureza especial das atividades exercidas nos períodos de 03.12.1998 a 08.06.2006 e de 02.04.2007 a 04.03.2015.
Ocorre que, nos períodos de 03.12.1998 a 08.06.2006, no exercício das atividades de oficial afiador de ferramentas e preparador de máquina de usinagem, a parte autora esteve exposta a ruídos acima dos limites legalmente permitidos - na variação de 93, 95, 90,10 e 87,10 dB(A), bem como a óleo mineral e graxa (P.P.P. - fls. 34/35), devendo ser reconhecida a natureza especial das atividades exercidas nesses períodos, conforme código 1.2.11 e 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.5 e 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79, código 1.0.7 "b" e 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97, código 1.0.7 "b" e 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99, neste ponto observado, ainda, o Decreto nº 4.882/03.
Anoto que em relação ao período de fruição de auxílio-doença previdenciário a 10ª Turma deste Egrégio Tribunal adotou entendimento no sentido de que "... a percepção do benefício de auxílio-doença não elide o direito à contagem com acréscimo de 40%, na hipótese de exercício de atividade especial quando do afastamento do trabalho." (APELREEX 00128627320114036183, DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO, TRF3 - DÉCIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/04/2017).
Quanto ao período de 02.04.2007 a 04.03.2015, verifico que a parte autora exerceu a atividade de afiador de ferramentas de usinagem, no setor da indústria metalúrgica (P.P.P. - fl. 37), e esteve exposta a agente físico (ruídos acima dos limites legalmente permitidos, nas intensidades de 89,1, 87,6, 86,3, 85,1 e 89,6 d(A)) e químico (poeira metálica e sílica livre), devendo ser reconhecido o exercício da atividade especial no referido período, conforme código 1.0.18 "b" e 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 1.0.18 "b" e 2.0.1, do Decreto nº 3.048/99, neste ponto observado, ainda, o Decreto nº 4.882/03.
Com efeito, não há evidências nos autos de que nos períodos intermediários às constatações dos peritos técnicos, regularmente habilitados para aferição dos registros ambientais, houve alteração substancial no ambiente laboral a afastar a insalubridade apontada, tampouco havendo informação quanto à mudança de layout nas instalações da empresa empregadora, a infirmar as declarações emitidas pelo seu representante, nos termos do artigo 264, § 1º, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 77, DE 21/01/2015 - DOU DE 22/01/2015, editada nos seguintes termos:
Ademais, a eventual irregularidade no preenchimento do documento não pode ser imputada ao segurado, em prejuízo de seu direito, visto que a legislação de regência atribui a incumbência de fiscalização da veracidade das informações prestadas pela empresa à própria autarquia previdenciária, consoante previsão do art.1º do Decreto 4.882/03, que alterou o Decreto 3.048/99, dando nova redação ao artigo 338, ao dispor no parágrafo terceiro que:
Sendo assim, somados todos os períodos especiais, totaliza a parte autora 26 (vinte e seis) anos, 02 (dois) meses e 11 (onze) dias de tempo especial até a data do requerimento administrativo (14.03.2015), observado o conjunto probatório produzido nos autos e os fundamentos jurídicos explicitados na presente decisão.
Restaram cumpridos pela parte autora, ainda, os requisitos da qualidade de segurado (art. 15 e seguintes da Lei nº 8.213/91) e carência para a concessão do benefício almejado (art. 142 e seguintes da Lei nº 8.213/91).
Destarte, a parte autora faz jus à aposentadoria especial, com renda mensal inicial de 100% do salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, sendo este último calculado pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, nos termos do art. 29, inc. II, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
O benefício é devido a partir do requerimento administrativo ou, na sua ausência, da data da citação.
A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, §3º, §4º, II, e §11, e no art. 86, todos do CPC/2015, e incidirá sobre as parcelas vencidas até data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ), atendido o disposto no art. 98, § 3º, do mesmo diploma legal, no caso de parte beneficiária da gratuidade da justiça.
Embora o INSS seja isento do pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).
Caso a parte autora já esteja recebendo benefício previdenciário concedido administrativamente, deverá optar, à época da liquidação de sentença, pelo beneficio que entenda ser mais vantajoso. Se a opção recair no benefício judicial, deverão ser compensadas as parcelas já recebidas em sede administrativa, face à vedação da cumulação de benefícios.
Diante do exposto, não conheço da remessa necessária, nego provimento à apelação e fixo, de oficio, os consectários legais, tudo na forma acima explicitada.
As verbas acessórias e as prestações em atraso também deverão ser calculadas na forma acima estabelecida, em fase de liquidação de sentença.
É como voto.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
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