
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5299114-90.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VALDEIR MOREIRA PINTO
Advogado do(a) APELADO: CARLOS EDUARDO RISATTO GAMBARINI - SP314574-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5299114-90.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VALDEIR MOREIRA PINTO
Advogado do(a) APELADO: CARLOS EDUARDO RISATTO GAMBARINI - SP314574-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de embargos de declaração opostos pelas partes em face do v. acórdão, proferido pela 9ª Turma que, por unanimidade,
rejeitou a preliminar e deu parcial provimento à apelação da Autarquia Federal,
para reformar a r. sentença e julgar improcedente o pedido de concessão de aposentadoria especial, restringindo o reconhecimento da especialidade da atividade aos períodos de 07/02/1996 a 18/06/2008 e de 20/01/2009 a 25/04/2014, observando-se no que tange à verba honorária os critérios estabelecidos no julgado.Em razões recursais, o embargante argui cerceamento de defesa, tendo em vista a necessidade de produção de nova prova técnica para a comprovação da especialidade da atividade. No mérito, sustenta, em síntese, que foi demonstrada a exposição aos agentes agressivos em seu ambiente de trabalho, devendo ser deferidos os pleitos declinados na exordial.
Por sua vez, a Autarquia Federal alega “(...)
incabível o enquadramento da atividade da parte autora por categoria profissional, com base no código 2.2.1. do Decreto 53.831/64.”.
Sem manifestação da parte contrária.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5299114-90.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VALDEIR MOREIRA PINTO
Advogado do(a) APELADO: CARLOS EDUARDO RISATTO GAMBARINI - SP314574-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O art. 1.022 do CPC/2015 estabelece que os embargos de declaração são cabíveis quando o decisum for obscuro, contraditório ou omisso, ou ainda, para corrigir erro material contra qualquer decisão judicial.
Passo inicialmente, a examinar a insurgência da Autarquia Federal.
No Julgado ora embargado, quanto ao reconhecimento da especialidade da atividade, no cultivo de cana de açúcar, não apresenta qualquer obscuridade, contradição ou omissão, tendo a Tuma Julgadora enfrentado regularmente a matéria de acordo com o entendimento então adotado, senão vejamos:
“(...)
CULTIVO DE CANA DE AÇÚCAR
Com relação à atividade desempenhada na cana-de-açúcar, entendo que, considerando a sua natureza extremamente penosa, caracteriza-se como insalubre e, portanto, passível de conversão. Nesse tocante, destaco que, melhor refletindo sobre o tema e alterando anterior posicionamento, passo a admitir como especiais todas as atividades rurais relacionadas ao cultivo da cana-de-açúcar, em consonância com o entendimento predominante nesta e. Nona Turma.
Confira-se o seguinte precedente:
"CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. RURÍCOLA. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. ATIVIDADE COMPROVADA. CORTE DE CANA. ATIVIDADE ESPECIAL. DIREITO À CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM. CARÊNCIA. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS.
1 - A concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço é devida, nos termos do art. 202, §1º, da Constituição Federal (redação original) e dos arts. 52 e seguintes da Lei nº 8.213/91, ao segurado que preencheu os requisitos necessários antes da Emenda Constitucional nº 20/98.
2 - A qualificação de lavrador do autor constante dos atos de registro civil constitui início razoável de prova material do exercício de atividade rural, conforme entendimento consagrado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça.
3 - A prova testemunhal, acrescida de início razoável de prova material, é meio hábil à comprovação da atividade rurícola.
4 - O art. 55, §2º, da Lei nº 8.213/91 estabelece que será computado o tempo de serviço rural independentemente do recolhimento das contribuições correspondente ao período respectivo, razão pela qual não há necessidade da parte autora indenizar a Autarquia Previdenciária.
5 - A atividade rural exercida no corte de cana é de ser considerada como exercida em condições especiais à saúde ou integridade física do trabalhador.
(...)
11 - Apelação e remessa oficial parcialmente providas. Tutela específica concedida."
(TRF3, 9ª Turma, AC nº 2006.03.99.013743-0/SP, Rel. Des. Fed. Marisa Santos, Rel. p/ Acórdão: Des. Fed. Nelson Bernardes, j. 08/02/2010, D.E. 12/3/2010).
(...)”.
Nesse contexto, restou amplamente analisada a matéria em debate, no Julgado ora embargado, concluindo pela possibilidade de reconhecimento, como especial, da atividade do trabalhador rural no cultivo de cana de açúcar.
Portanto, não merece prosperar os embargos opostos pela Autarquia Federal.
Por seu turno, no que tange aos pontos questionados pelo requerente, razão assiste em parte.
Inicialmente, afasto a arguição de cerceamento de defesa, tendo em vista que foi confeccionado o laudo técnico judicial, para demonstrar a especialidade da atividade nos períodos elencados na exordial.
Do compulsar dos autos, verifica-se que o laudo judicial (ID n. 138859496) indica que nos períodos de:
-
26/10/1987 a 22/04/1988
, de02/05/1988 a 18/11/1988
e de01/12/1989 a 12/06/1995
- Atividade de trabalhador rural no cultivo de cana de açúcar e no período de entressafra estava exposto a ruído de 90db(A);-
15/12/1988 a 30/04/1989
e de02/05/1989 a 08/11/1989
- Atividade de trabalhador rural no cultivo de cana de açúcar e no período de entressafra estava exposto a ruído de 90,76db(A);-
07/02/1996 a 18/06/2008
- Atividade de trabalhador rural no cultivo de cana de açúcar e no período de entressafra estava exposto a ruído de 90,76db(A); Já reconhecido no Julgado ora embargado.-
20/01/2009 a 08/06/2014
- Atividade de trabalhador rural no cultivo de cana de açúcar e no período de entressafra estava exposto a ruído de 90,76db(A); O período de 20/01/2009 a 25/04/2014 foi reconhecido no Julgado ora embargado, através do ppp confeccionado em 25/04/2014. Possibilidade de enquadramento até 08/06/2014, através do laudo judicial.-
12/01/2015 a 14/05/2019
– Agente agressivo ruído de 99,39 dB(A).De se observar que tais interregnos constam na emenda da inicial (ID n. 138859424).
A atividade desempenhada na cana-de-açúcar, considerando a sua natureza extremamente penosa, caracteriza-se como insalubre.
Além do que, admite-se o enquadramento no item 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, item 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79 e item 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 que elenca a atividade realizada em condições de exposição a ruídos excessivos, classificando-a como insalubre.
É importante destacar que a realização de perícia judicial é prevista no ordenamento processual como um dos meios de prova, e realizada sob o crivo do contraditório, podendo, inclusive, a parte interessada ser assistida por assistente técnico. A parcialidade do perito deve ser arguida no tempo e no modo próprio, de modo que simples alegação de parcialidade do laudo não tem o condão de infirmar as conclusões do perito judicial.
Como todos os meios de provas legalmente previstos são lícitos a prova pericial prevista no Código de Processo Civil é um meio de prova lícito, sendo certo que é possível a realização de perícia indireta.
Neste sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ESPECIAL Nº 1.370.229 - RS (2013/0051956-4)
RELATOR: MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES
EMENTA - PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. SÚMULA 284/STF. CÔMPUTO DE TEMPO ESPECIAL. PROVA TÉCNICA. PERÍCIA POR SIMILARIDADE. CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E NESSA PARTE PROVIDO.
1. Em preliminar, cumpre rejeitar a alegada violação do art. 535 do CPC, porque desprovida de fundamentação. O recorrente apenas alega que o Tribunal a quo não cuidou de atender o prequestionamento, sem, contudo, apontar o vício em que incorreu. Recai, ao ponto, portanto, a Súmula 284/STF.
2. A tese central do recurso especial gira em torno do cabimento da produção de prova técnica por similaridade, nos termos do art. 429 do CPC e do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/1991.
3. A prova pericial é o meio adequado e necessário para atestar a sujeição do trabalhador a agentes nocivos à saúde para seu enquadramento legal em atividade especial. Diante do caráter social da previdência, o trabalhador segurado não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção da prova técnica.
4. Quanto ao tema, a Segunda Turma já teve a oportunidade de se manifestar, reconhecendo nos autos do Recurso Especial 1.397.415/RS, de Relatoria do Ministro Humberto Martins, a possibilidade de o trabalhador se utilizar de perícia produzida de modo indireto, em empresa similar àquela em que trabalhou, quando não houver meio de reconstituir as condições físicas do local onde efetivamente prestou seus serviços.
5. É exatamente na busca da verdade real/material que deve ser admitida a prova técnica por similaridade. A aferição indireta das circunstâncias de labor, quando impossível a realização de perícia no próprio ambiente de trabalho do segurado é medida que se impõe.
6. A perícia indireta ou por similaridade é um critério jurídico de aferição que se vale do argumento da primazia da realidade, em que o julgador faz uma opção entre os aspectos formais e fáticos da relação jurídica sub judice, para os fins da jurisdição.
7. O processo no Estado contemporâneo tem de ser estruturado não apenas consoante as necessidades do direito material, mas também dando ao juiz e à parte a oportunidade de se ajustarem às particularidades do caso concreto.
8. Recurso especial conhecido em parte e nessa parte provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indicadas,acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: "A Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso e, nessa parte, deu-lhe provimento, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)." A Sra. Ministra Assusete Magalhães, os Srs. Ministros Humberto Martins, Herman Benjamin e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro Relator. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Mauro Campbell Marques. Brasília (DF), 25 de fevereiro de 2014. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, Relator.Nesse contexto, é possível o reconhecimento da especialidade da atividade nos interregnos acima mencionados.
Por seu turno, cumpre examinar se preenchidos os requisitos para o deferimento da aposentadoria especial.
A somatória do tempo de serviço especial ora reconhecido até 16/04/2015, data do requerimento administrativo, a parte autora totaliza mais de 25 anos de serviço, o que autoriza o deferimento do benefício vindicado.
TERMO INICIAL
A data de início do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo, em 16/04/2015, não havendo parcelas prescritas.
JUROS DE MORA
Conforme disposição inserta no art. 219 do Código de Processo Civil 1973 (atual art. 240 Código de Processo Civil - Lei nº 13.105/2015), os juros de mora são devidos a partir da citação na ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
CORREÇÃO MONETÁRIA
A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
CUSTAS
Conquanto a Lei Federal nº 9.289/96 disponha no art. 4º, I, que as Autarquias são isentas do pagamento de custas na Justiça Federal, seu art. 1º, §1º, delega à legislação estadual normatizar sobre a respectiva cobrança nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual no exercício da competência delegada. Note-se que, em se tratando das demandas aforadas no Estado de São Paulo, tal isenção encontra respaldo na Lei Estadual nº 11.608/03 (art. 6º).
A isenção referida não abrange as despesas processuais que houver efetuado, bem como, aquelas devidas a título de reembolso à parte contrária, por força da sucumbência.
VERBA HONORÁRIA
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015, bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios, a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência; contudo, uma vez que a pretensão do segurado somente foi deferida nesta sede recursal, a condenação da verba honorária incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da presente decisão ou acórdão, atendendo ao disposto no § 11 do artigo 85, do CPC.
Nesse contexto, merece reparos o Julgado.
Ante o exposto,
rejeito os embargos de declaração opostos pela Autarquia Federal e acolho, em parte, os embargos de declaração da parte autora
, para sanar a omissão apontada e, atribuindo-lhes efeitos infringentes, reconhecer a especialidade da atividade nos períodos de 26/10/1987 a 22/04/1988, de 02/05/1988 a 18/11/1988, de 01/12/1989 a 12/06/1995, de 15/12/1988 a 30/04/1989 e de 02/05/1989 a 08/11/1989, de 26/04/2014 a 08/06/2014 e de 12/01/2015 a 14/05/2019 e conceder a aposentadoria especial, desde a data do requerimento administrativo, com os consectários conforme fundamentado.É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL.
OMISSÃO. CARACTERIZADA. ATIVIDADE ESPECIAL RECONHECIDA. CULTIVO DE CANA DE AÇÚCAR. RUÍDO. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A APOSENTAÇÃO. TERMO INICIAL. CONSECTÁRIOS. EFEITO INFRINGENTE.
EMBARGOS DO INSS REJEITADOS. EMBARGOS DA PARTE AUTORA ACOLHIDOS EM PARTE.
- Nos termos do art. 1.022 do CPC/2015, os embargos de declaração são cabíveis quando o decisum for obscuro, contraditório ou omisso, ou ainda, para corrigir erro material contra qualquer decisão judicial.
- In casu, afasto a arguição de cerceamento de defesa, tendo em vista que foi confeccionado o laudo técnico judicial, para demonstrar a especialidade da atividade nos períodos elencados na exordial.
- O laudo judicial demonstra que o requerente laborou no cultivo de cana de açúcar e esteve exposto a ruído de 90db(A), que possibilita o enquadramento dos períodos questionados.
- Com a somatória do tempo de serviço esecial ora reconhecido, o autor totalizou mais de 25 anos, fazendo jus à concessão da aposentadoria especial, a contar da data do requerimento administrativo.
- Os juros de mora são devidos a partir da citação na ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
- A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
- A isenção de custas concedida à Autarquia Federal não abrange as despesas processuais que houver efetuado, bem como, aquelas devidas a título de reembolso à parte contrária, por força da sucumbência.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
- Embargos de declaração da Autarquia Federal rejeitados.
- Embargos de declaração acolhidos, em parte, com efeitos infringentes.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar os embargos de declaração opostos pela Autarquia Federal e acolher, em parte, os embargos de declaração da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
