Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1944012 / SP
0004823-80.2014.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
26/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/09/2019
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REMESSA NECESSÁRIA, TIDA POR
INTERPOSTA. SUSPEIÇÃO DO PERITO. ALEGAÇÃO EXTEMPORÂNEA. PROVA PERICIAL.
ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. CANA-DE-AÇÚCAR. ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL.
AGROPECUÁRIA. IMPOSSIBILIDADE DEFINIDA PELO STJ. TEMPO INSUFICIENTE À
APOSENTADORIA ESPECIAL. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. PRELIMINAR REJEITADA.
APELAÇÃO DO AUTOR DESPROVIDA. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DO INSS
PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - O INSS foi condenado a reconhecer período de labor especial do autor. Assim, não havendo
como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame
necessário, nos termos do inciso I do artigo 475 do CPC/73 e da Súmula 490 do STJ.
2 - A ausência da impugnação específica no momento da nomeação do perito implica a
preclusão da oportunidade processual de arguir o seu impedimento ou suspeição. No caso em
apreço, a parcialidade do perito foi invocada tão somente em sede recursal, após a
apresentação do laudo, embora o INSS tivesse condições, desde a designação judicial, de
constatar a causa de fundada parcialidade do profissional. A prova pericial - e a nomeação do
profissional responsável a tanto - fora designada por decisão inicial proferida nos autos,
juntamente com a citação do ente autárquico, o qual, em sua manifestação acerca do laudo
pericial, nada alegou. Preliminar de nulidade da perícia rejeitada.
3 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
4 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
5 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial:
(a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
6 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
7 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
8 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
9 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
10 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
11 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
12 - A apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento
da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia
tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima
do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos
anos anteriores, referido nível era superior.
13 - Pleiteia a parte autora o reconhecimento do labor especial nos períodos de 15/06/1975 a
23/10/1975, 17/11/1975 a 31/05/1976, 01/06/1976 a 28/06/1976, 25/02/1977 a 20/12/1978,
01/04/1979 a 29/02/1980, 01/05/1980 a 13/01/1983, 01/05/1983 a 13/11/1983, 17/11/1983 a
31/03/1984, 02/04/1984 a 30/04/1989, 29/04/1995 a 31/03/2000, 01/04/2000 a 16/09/2002,
06/05/2003 a 01/03/20007 e de 12/04/2007 a 14/08/2008. A r. sentença monocrática
reconheceu a especialidade dos lapsos de 25/02/1977 a 20/12/1978, 01/04/1979 a 29/02/1980,
01/05/1980 a 13/01/1983, 29/04/1995 a 31/03/2000, 01/04/2000 a 16/09/2002 e de 12/04/2007
a 14/08/2008.
14 - No tocante aos lapsos de 15/06/1975 a 23/10/1975, 17/11/1975 a 31/05/1976, 01/06/1976
a 28/06/1976, a CTPS do autor informa que ele desempenhou as funções de corte de cana
junto à Antonio José Rodrigues Filho. No que diz com os interregnos de 01/05/1983 a
13/11/1983, 17/11/1983 a 31/03/1984, o demandante exerceu a função de trabalhador agrícola,
no corte de cana, junto à Usina Açucareira de Jaboticabal.
15 - A 1ª Seção do c. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Pedido de Uniformização
de Interpretação de Lei autuado sob n.º 452/PE, firmou entendimento no sentido de não ser
possível equiparar a categoria profissional de agropecuária, constante no item 2.2.1 do Anexo
ao Decreto n.º 53.831/1964, à atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana-de-
açúcar. Assim, com ressalva de entendimento deste Relator, não se reconhece a natureza
especial do labor exercido na lavoura de cana-de-açúcar.
16 - Quanto ao período de 25/02/1977 a 20/12/1978, a CTPS do requerente informa que ele
exerceu a função de aprendiz junto à Gráfica Crisper Ltda., bem como o laudo técnico pericial
relata a exposição a ruído de 82,4dB, o que permite a conversão pretendida.
17 - No que tange à 01/04/1979 a 29/02/1980, inviável a conversão pretendida, uma vez que o
formulário dá conta de que o postulante exerceu a função de ajudante geral junto à Petrini &
Cia. Ltda, atividade que não encontra enquadramento nos Decretos que regem a matéria, bem
como o laudo pericial elaborado em Juízo não relata agentes nocivos no exercício de seu labor.
18 - No tocante à 01/05/1980 a 13/01/1983, o formulário informa que o autor trabalhou como
impressor junto à Gráfica Grieco Ltda., sendo certo que o laudo pericial relata a exposição a
ruído de 84,6dB, o que permite a conversão pretendida.
19 - No tocante ao lapso de 02/04/1984 a 30/04/1989, o formulário e o laudo técnico pericial
relatam a função do autor de entregador de cana junto à Usina Açucareira Jaboticabal S/A, com
atividades que não se sujeitam a qualquer enquadramento, posto que consistiam em "fiscalizar
as equipes de funcionários, fazendo apontamento, fiscalizando o plantio e o corte de cana de
açúcar, para que seja cumprido o planejamento de plantio e corte da matéria prima".
20 - No que tange ao interregno de 29/04/1995 a 31/03/2000, o formulário e o referido laudo
pericial dão conta de que o postulante laborou como motorista de ônibus junto à mesma
empregadora, exposto a ruído de 85,4dB, o que permite o reconhecimento da especialidade de
seu trabalho somente no interregno de 29/04/1995 a 05/03/1997, uma vez que após tal data
necessária a exposição do segurado à ruído superior a 90dB para caracterização do labor como
especial.
21 - Quanto ao período de 01/04/2000 a 16/09/2002, o formulário e o laudo técnico pericial
relatam a função do autor de encarregado de colheita mecanizada, com exposição a ruído de
83,8 dB, inferior, portanto, ao limite legal previsto à época (90 dB).
22 - No que se refere ao período de 06/05/2003 a 01/03/2007, inviável o reconhecimento
pretendido, uma vez que o PPP indica que o autor laborou como líder agrícola e fiscal de
transporte junto à Usina da Barra S/A. Açúcar sujeito a intempéries do tempo e poeiras, sem
especificação quanto ao seu tipo, agentes nocivos que não encontram enquadramento nos
Decretos que regem a matéria.
23 - No tocante ao lapso de 12/04/2007 a 14/08/2008, o PPP relata que o postulante laborou
como supervisor de transporte de colheita mecanizada e coordenador de colheita junto à LDC
Bioenergia S/A. exposto a ruído de 82,1dB e poeiras. Assim, inviável o reconhecimento da
especialidade do referido labor, uma vez que a pressão sonora encontra-se abaixo do
estabelecido em lei para sua caracterização como especial, bem como não há especificação
quanto ao tipo de poeira a que o autor estava submetido no exercício de seu trabalho.
24 - À vista do conjunto probatório, enquadrado como especial os períodos de 25/02/1977 a
20/12/1978, 01/05/1980 a 13/01/1983 e 29/04/1995 a 05/03/1997.
25 - Foi reconhecida a especialidade das atividades desempenhadas de 01/05/1989 a
28/04/1995 na seara administrativa, conforme Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo
de Contribuição.
26 - Somando-se os períodos de atividade especial ora reconhecidos, aos já assim
considerados pelo próprio INSS, verifica-se que, quando do requerimento administrativo
(14/08/2008), a parte autora perfazia 12 anos, 04 meses e 14 dias de atividade desempenhada
em condições especiais, número de anos aquém do exigido ao deferimento da aposentadoria
especial (mínimo de 25 anos de labor). Dessa forma, não faz jus a parte autora à concessão de
seu benefício beneficiário.
28 - Ante a sucumbência recíproca, deixa-se de condenar as partes em honorários
advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73, e em custas processuais, dada a
gratuidade da justiça conferida à parte autora (fl. 29) e por ser o INSS delas isento.
29 - Matéria preliminar rejeitada. Apelação do autor desprovida. Remessa necessária, tida por
interposta, e apelação do INSS parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria
preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação do autor e dar parcial provimento à
apelação do INSS e à remessa necessária, tida por interposta, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
