
| D.E. Publicado em 30/08/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo autárquico, ao recurso do autor e à remessa necessária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0040051-19.2014.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o enquadramento de tempo de serviço especial, com vistas à concessão de aposentadoria especial.
O pedido foi julgado procedente para reconhecer como especial o tempo de serviço arrolado na exordial (com exceção do período trabalhado na lavoura de cana-de-açúcar e como servente de usina) e para condenar o INSS a implantar aposentadoria especial.
Decisão não submetida ao reexame necessário.
Inconformado, o INSS apelou, requerendo a improcedência de todos os pedidos arrolados na inicial. Subsidiariamente, requer a minoração da verba honorária.
O autor, por seu turno, apresentou recurso adesivo, requerendo, preliminarmente, apreciação do agravo retido (cerceamento de defesa, pelo indeferimento da produção de prova pericial e oral); no mérito, pleiteou o reconhecimento da especialidade das atividades rural/servente de usina apontadas na inicial.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte, tendo sido distribuídos a este relator.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias:
Conheço das apelações, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
Quanto à tese preliminar de cerceamento de defesa , cabe ressaltar o fato de que a parte autora detém o ônus de comprovar a veracidade dos fatos constitutivos de seu direito, por meio de prova suficiente e segura, nos termos do artigo 373, I, do NCPC.
Nesse aspecto, para demonstração da natureza especial do labor desenvolvido nos lapsos vindicados, deveria a parte suplicante ter carreado documentos aptos certificadores das condições insalubres em que permaneceu exposta, com habitualidade e permanência, cabendo ao magistrado, em caso de dúvida fundada, o deferimento de prova pericial para confrontação do material reunido à exordial.
Assim, à míngua de prova documental descritiva das condições insalubres no ambiente laboral do obreiro, despicienda revela-se a produção de prova pericial para o deslinde da causa, não se configurando cerceamento de defesa ou violação de ordem constitucional ou legal.
Dessa forma, nego seguimento ao agravo retido.
Ademais, considerando que a r. sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, não se aplicam as novas regras previstas no artigo 496 e §§ do Novo CPC.
Assim, não obstante ter sido proferida a sentença após a vigência da alteração do artigo 475, § 2º, do Código de Processo Civil pela Lei n. 10.352/2001, que afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação for inferior a 60 (sessenta) salários-mínimos, dou a remessa oficial por interposta, por não haver valor certo a ser considerado, na forma da súmula nº 490 do STJ.
Assim, passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições prejudiciais.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art. 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
In casu, no tocante à especialidade da faina agrária (na função de trabalhador da cultura da cana de açúcar - 16/6/1976 a 30/11/1976, 1/12/1976 a 31/3/1977, 18/4/1977 a 30/11/1977, 1/12/1977 a 15/4/1978, 2/5/1978 a 31/10/1978, 3/11/1978 a 31/3/1979, 2/5/1979 a 21/12/1979, 2/1/1980 a 31/3/1980, 2/5/1980 a 31/10/1980, 3/11/1980 a 31/3/1981, 22/4/1981 a 23/9/1981, 1/10/1981 a 15/4/1982), para enquadrá-la à situação prevista no código 2.2.1 do anexo ao Decreto n. 53.831/64, a jurisprudência prevê a necessidade de comprovação da efetiva exposição, habitual e permanente, aos possíveis agentes agressivos à saúde, o que não ocorreu.
Nessa esteira, a simples sujeição às intempéries da natureza (sol, chuva, frio, calor, poeira etc.), ou alegação de utilização de veneno (agrotóxicos), não possui o condão para caracterizar a lida no campo como insalubre ou perigosa.
Confira-se (g.n.):
No mesmo sentido, os demais julgados: Superior Tribunal de Justiça, REsp 291.404/SP, Ministro Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, DJ 02/8/2004 e TRF3, AC 2003.03.99.017518-1/SP; 10ª Turma; Relator Des. Federal Sergio Nascimento, DJU 10/5/2006.
Quanto aos interregnos 1/6/1982 a 30/11/1983 e 1/12/1983 a 17/1/1984, a perícia de forma indireta, lastreada em suposta similaridade das empresas trabalhadas pela parte autora, despreza as especificidades inerentes a cada uma. Portanto, inviável seu enquadramento.
Nesse sentido (g. n.):
Em relação aos intervalos 21/8/1973 a 19/9/1973 e 1/6/1974 a 31/10/1974, 24/11/1984 a 22/4/1985, 7/11/1985 a 13/5/1986, 14/5/1986 a 31/5/1986, 1/6/1986 a 26/11/1986, 15/4/1987 a 15/11/1987, 20/4/1988 a 14/11/1988, 19/4/1989 a 11/11/1989, 29/4/1990 a 18/11/1990, 18/4/1991 a 9/11/1991, 5/5/1992 a 25/12/1992, 13/4/1993 a 30/11/1993, 12/4/1994 a 13/11/1994, 28/4/1995 a 5/12/1995, 9/4/1996 a 21/12/1996, 25/3/1997 a 23/12/1997, 7/4/1998 a 29/12/1998, 23/3/1999 a 30/6/1999, 1/7/1999 a 28/11/1999, 18/4/2000 a 13/11/2000, 1/5/2001 a 15/11/2001, 9/4/2002 a 21/10/2002, 18/3/2003 a 3/11/2003, 13/4/2004 a 19/12/2004, 26/3/2005 a 23/11/2005, 27/3/2006 a 25/10/2006, 4/4/2007 a 22/10/2007, 28/4/2008 a 10/12/2008, os laudos e PPPs acostados informam que o autor e esteve exposto, com permanência e habitualidade, ao agente agressivo ruído, acima do nível limítrofe estabelecido em lei. Portanto, devem ser enquadrados como especiais e convertidos para comum.
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, concluo que, na hipótese, o EPI não é realmente capaz de neutralizar a nocividade do agente.
Destarte, apenas os interstícios de 21/8/1973 a 19/9/1973 e 1/6/1974 a 31/10/1974, 24/11/1984 a 22/4/1985, 7/11/1985 a 13/5/1986, 14/5/1986 a 31/5/1986, 1/6/1986 a 26/11/1986, 15/4/1987 a 15/11/1987, 20/4/1988 a 14/11/1988, 19/4/1989 a 11/11/1989, 29/4/1990 a 18/11/1990, 18/4/1991 a 9/11/1991, 5/5/1992 a 25/12/1992, 13/4/1993 a 30/11/1993, 12/4/1994 a 13/11/1994, 28/4/1995 a 5/12/1995, 9/4/1996 a 21/12/1996, 25/3/1997 a 23/12/1997, 7/4/1998 a 29/12/1998, 23/3/1999 a 30/6/1999, 1/7/1999 a 28/11/1999, 18/4/2000 a 13/11/2000, 1/5/2001 a 15/11/2001, 9/4/2002 a 21/10/2002, 18/3/2003 a 3/11/2003, 13/4/2004 a 19/12/2004, 26/3/2005 a 23/11/2005, 27/3/2006 a 25/10/2006, 4/4/2007 a 22/10/2007, 28/4/2008 a 10/12/2008 devem ser considerados como de atividade especial.
Nessa esteira, a parte autora conta mais de 25 (vinte e cinco) anos de atividade especial e, desse modo, faz jus à concessão de aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 e seguintes da Lei n. 8.213/91.
Consectários
O termo inicial da aposentadoria especial deve ser a data da entrada do requerimento (5/8/2009), momento em que o PPP e laudos com os dados de exposição a agentes agressivos foram apresentados.
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, observado o disposto na Lei n. 11.960/2009, consoante Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 16/4/2015, Rel. Min. Luiz Fux.
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês, contados da citação, por força dos artigos 1.062 do antigo CC e 219 do CPC, até a vigência do novo CC (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos artigos 406 do novo CC e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, serem fixados no percentual de 0,5% ao mês, observadas as alterações introduzidas no art. 1-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09, pela MP n. 567, de 03 de maio de 2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07 de agosto de 2012, e por legislação superveniente.
Em relação às parcelas vencidas antes da citação, os juros são devidos desde então de forma global e, para as vencidas depois da citação, a partir dos respectivos vencimentos, de forma decrescente.
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante § 3º do artigo 20 do CPC/1973, orientação desta Turma e nova redação da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Considerando que a apelação foi interposta na vigência do CPC/1973, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, §§ 1º e 11, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal.
No tocante às custas processuais, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/74, 8.620/93 e 9.289/96, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/85 e 11.608/03 (Estado de São Paulo). Contudo, tal isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio. Quanto a Mato Grosso do Sul, em caso de sucumbência, as custas são pagas pelo INSS ao final do processo, nos termos da Lei Estadual n. 3.779/09, que revogou a isenção concedida na legislação pretérita, e do artigo 27 do CPC.
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados por ocasião da liquidação do julgado.
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação autárquica, ao recurso do autor e à remessa oficial para, nos termos da fundamentação, (i) reconhecer o enquadramento e a conversão de atividade especial; (ii) condenar o INSS a conceder aposentadoria especial ao autor; (iii) ajustar os consectários.
Intimem-se.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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