Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2296911 / SP
0007508-21.2018.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
07/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/10/2019
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAS.
AGENTE NOCIVO RUÍDO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
- O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será devida, uma vez
cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições), ao segurado que tiver trabalhado
sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15
(quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei". Considerando a
evolução da legislação de regência pode-se concluir que (i) a aposentadoria especial será
concedida ao segurado que comprovar ter exercido trabalho permanente em ambiente no qual
estava exposto a agente nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve, em
regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se
excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de reconhecimento de labor
especial a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada
a sua efetiva danosidade; (iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional
nem intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja indissociável da
produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as condições de trabalho podem ser
provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA,
PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e
CAT) ou outros meios de prova.
- O laudo técnico não contemporâneo não invalida suas conclusões a respeito do
reconhecimento de tempo de trabalho dedicado em atividade de natureza especial, primeiro,
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução da
tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas experimentadas
pelo trabalhador à época da execução dos serviços.
- Quando o PPP consigna que o EPI era eficaz, tal eficácia diz respeito à sua aptidão de
atenuar ou reduzir os efeitos do agente nocivo. Isso não significa, contudo, que o EPI era
"realmente capaz de neutralizar a nocividade". A dúvida, nesse caso, beneficia o trabalhador.
- Constando da perícia que o segurado ficava exposto a agente nocivo, seja pela simples
presença do agente no ambiente, ou porque estava acima do limite de tolerância, deve-se
concluir que tal exposição era, nos termos do artigo 65, do RPS - Regulamento da Previdência
Social, habitual, não ocasional nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da
prestação do serviço. Nesse sentido, a jurisprudência desta C. Turma: APELAÇÃO/REMESSA
NECESSÁRIA - 1773938 - 0008160-27.2011.4.03.6105, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL
CARLOS DELGADO, julgado em 12/03/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/03/2018.
- Até a edição do Decreto 2.171/1997 (06.03.1997), considerava-se especial a atividade
exercida com exposição a ruído superior a 80 decibéis. A partir de então, passou-se a
considerar como especial o trabalho realizado em ambiente em que o nível de ruído fosse
superior a 90 decibéis. Por fim, com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o
limite de tolerância a esse agente físico foi reduzido para 85 decibéis. Considerando tal
evolução normativa e o princípio tempus regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido
como especial de acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -,
reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB (até 05/03/1997);
superior a 90 dB (de 06/03/1997 a 18/11/2003); e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003. O C.
STJ, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do
CPC/73, firmou a tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto 4.882/2003: "O
limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído
deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto
2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do
Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da
LINDB (ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694). O E. STF, de seu turno, no julgamento do ARE
664335, assentou a tese segundo a qual "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído
acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil
Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI),
não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria". A Corte Suprema assim
decidiu, pois o EPI não elimina o agente nocivo, mas apenas reduz os seus efeitos, de sorte
que o trabalhador permanece sujeito à nocividade, existindo estudos científicos que
demonstram inexistir meios de se afastar completamente a pressão sonora exercida sobre o
trabalhador, mesmo nos casos em que haja utilização de protetores auriculares. Logo, no caso
de ruído , ainda que haja registro no PPP de que o segurado fazia uso de EPI ou EPC,
reconhece-se a especialidade do labor quando os níveis de ruído forem superiores ao tolerado,
não havendo como se sonegar tal direito do segurado sob o argumento de ausência de prévia
fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque
o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuído ao trabalhador, mas sim à
inércia estatal no exercício do seu poder de polícia.
- No período de 20/04/1972 a 22/12/1973, 02/02/1974 a 10/04/1975, 01/08/1977 a 01/02/1979 e
15/10/1986 a 10/11/1986, consoante CTPS e PPP's, o autor exerceu a atividade de apontador,
aprendiz de manutenção e auxiliar de controle, na construção de estradas e obras pesadas
para a Andrade Gutierrez. Contudo, não há menção de exposição a agentes nocivos nos PPP's.
Instada a fornecer o respectivo laudo técnico, a empresa informou que não possui laudos
técnicos relativos aos períodos laborados pelo autor, contudo encaminhou laudo elaborado em
obra similar às realizadas por ele (construção de rodovia), asseverando exposição a ruído na
intensidade de 90,8 dB, o que permite enquadramento especial do labor nos períodos em
questão, nos termos dos itens 1.1.5 e 1.1.6 dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79.
- No período de 01/11/1987 a 10/08/1989, o autor exerceu a atividade de apontador de canteiro
de obra 01/11/1987 a 10/08/1989 da Schahin Engenharia S/A., porém o PPP não há menção da
exposição a agentes nocivos, motivo pelo qual aludido intervalo deve ser considerado comum.
- No intervalo de 01/10/1997 a 31/03/1998, consoante PPP, o autor era almoxarife da
Construcione Engenharia e Construções Ltda., porém não há menção da exposição a agentes
nocivos, sem a exposição a agentes nocivos, razão pela qual o intervalo deve ser computado
como tempo comum.
- No período de 14/12/2009 a 11/01/2012, consoante PPP, o autor era assistente administrativo
da Construtora Capellano, sem a exposição a agentes nocivos, razão pela qual o intervalo deve
ser computado como tempo comum.
- Enfim, restou satisfatoriamente comprovada a especialidade das atividades laborativas
executadas pelo autor, apenas nos períodos de 20/04/1972 a 22/12/1973, 02/02/1974 a
10/04/1975, 01/08/1977 a 01/02/1979 e 15/10/1986 a 10/11/1986.
- Considerando o tempo de serviço especial ora reconhecido, convertido em tempo comum pelo
fator de conversão de 1,40, somado ao tempo de serviço incontroverso, apurado pelo INSS (29
anos, 8 meses e 21 dias), perfaz o autor, na data do requerimento administrativo, 24.09.2014,
apenas 31 anos, 6 meses e 1 dia de tempo de contribuição, insuficientes para concessão do
benefício.
- Diante do parcial provimento do recurso do autor, com o deferimento parcial do pedido de
reconhecimento de trabalho em condições especiais e com o indeferimento do pedido de
aposentadoria, a hipótese dos autos é de sucumbência recíproca, motivo pelo qual as despesas
processuais devem ser proporcionalmente distribuídas entre as partes, na forma do artigo 86,
do CPC/15, não havendo como se compensar as verbas honorárias, por se tratar de verbas de
titularidade dos advogados e não da parte (artigo 85, § 14, do CPC/15). Por tais razões, com
base no artigo 85, §§2° e 3°, do CPC/15, condeno a parte autora ao pagamento de honorários
advocatícios aos patronos do INSS, que fixo em 10% do valor atualizado da causa,
considerando que não se trata de causa de grande complexidade, mas sim repetitiva, o que
facilita o trabalho realizado pelo advogado, diminuindo o tempo exigido para o seu serviço.
Suspensa, no entanto, a sua execução, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC/2015, por ser a
parte autora beneficiária da Justiça Gratuita.
- Apelação do autor parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL
PROVIMENTO à apelação do autor, apenas para condenar a autarquia federal a averbar como
especial o trabalho desenvolvido nos períodos de 20/04/1972 a 22/12/1973, 02/02/1974 a
10/04/1975, 01/08/1977 a 01/02/1979 e 15/10/1986 a 10/11/1986, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
