
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5166978-32.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MANOEL DOS SANTOS PIRES
Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO APARECIDO DE MATOS - SP160362-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5166978-32.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MANOEL DOS SANTOS PIRES
Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO APARECIDO DE MATOS - SP160362-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
“(...) O conteúdo da norma contida no art. 143, segundo a lição de Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Junior, é assistencial, compatibiliza dentro de um regime previdenciário, a proteção social na velhice para os trabalhadores rurais que estavam expressamente excluídos do regime da Lei 3.807/1960, consoante inciso II do art. 3º, porquanto vinculados ao regime assistencial dos trabalhadores rurais - FUNRURAL- que não reclamava o recolhimento de contribuições, porém, em contrapartida, tinha contornos protetivos muito reduzidos.
(...) A aposentadoria por idade do segurado especial é uma das preocupações das autoridades governamentais em matéria de previdência social, em face da suposta facilidade em requerer benefício sem que tenha havido de fato trabalho nesta condição.
Por outro lado, os segurados especiais em atividade, por ocasião da Lei de Benefícios, em 24 de Julho de 1991, foram dispensados do recolhimento das contribuições relativas ao exercício do trabalho no campo, substituindo a carência pela comprovação do efetivo desempenho do labor agrícola
No caso em exame, a parte autora completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade em 25 de maio de 2007, devendo, assim, comprovar 156 (cento e cinquenta e seis) meses de atividade rural, nos termos dos arts. 142 e 143 da Lei 8.213/1991, para obtenção do benefício.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que, diante da dificuldade do segurado especial na obtenção de prova escrita do exercício de sua profissão, o rol de documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, inscrito no art. 106, parágrafo único, da Lei 8.213/1991, é meramente exemplificativo, e não taxativo, sendo admissíveis outros documentos além dos previstos no mencionado dispositivo, inclusive que estejam em nome de membros do grupo familiar ou ex-patrão. (...)
O início de prova material do exercício de atividade rural nem sempre se refere ao período imediatamente anterior ao requerimento da aposentadoria rural por idade. E este entendimento restou sedimentado no julgamento do recurso representativo da controvérsia REsp 1.348.633/SP.
Ademais, o fato de a autora ter trabalhado como empregada doméstica não descaracteriza sua condição de segurada especial, posto que exercido em períodos de entressafra. Neste ponto, a própria Lei 8.213/1991, em seu art. 48, § 2º c/c art. 12, § 13, da Lei 8.212/1991, garante o cômputo do período em que o trabalhador rural se encontre em período de entressafra ou do defeso, não superior a 120 (cento e vinte) dias.
Ainda, o trabalho urbano exercido pelo cônjuge da ora recorrida junto à Prefeitura, por si só, não descaracteriza a condição de segurado especial da parte autora. Neste ponto, confira-se o Recurso Especial Repetitivo 1.304.479/SP.
No caso em exame, a segurada completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade em 25 de maio de 2007, devendo, assim, comprovar, segundo tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991, 156 (cento e cinquenta e seis) meses de atividade rural, para obtenção do benefício.
A problemática do caso está no reconhecimento do benefício de aposentadoria por idade rural àquele segurado especial que nos moldes do art. 143 da Lei 8.213/1991 não mais trabalhava no campo no período em que completou a idade mínima, considerando que a Lei não especifica o que deve ser entendido como período imediatamente anterior ao do requerimento do benefício.
(...) Isto porque, afastando-se da atividade campesina antes do implemento da idade mínima para a aposentadoria, o segurado especial deixa de fazer jus ao benefício previsto no art. 48 da Lei 8.213/1991
Nesse tipo de benefício releva justamente a prestação do serviço agrícola às vésperas da aposentação ou, ao menos, em momento imediatamente anterior ao preenchimento do requisito etário, o que não aconteceu.
Em verdade, é relevante o fato de a parte autora ter parado de trabalhar no campo antes de preencher o requisito etário. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no art. 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade como rural, sem ter atendido a regra de carência, não fará jus à aposentadoria rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito
.(...) A norma visa agraciar exclusivamente aqueles que se encontram, verdadeiramente, sob a regra de transição, isto é, trabalhando em atividade rural, quando do preenchimento da idade.
(...) A regra, hoje, é assim: no dia em que o segurado especial completar a idade legal deverá ter preenchido o tempo de carência contido na tabela do art. 142 conjugado com o art. 143 da Lei 8.213/1991, para se aposentar.
Por conseguinte, fica assentada a tese, para fins de recurso especial repetitivo de que, o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade
“Concordo, assim, com o eminente Relator, quando concluiu que, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por idade, previsto no art. 143 da Lei 8.213/91, o beneficiário deve estar laborando no campo, quando implementar o requisito etário, quando poderá requerer o benefício
Faço, porém, uma observação: a interpretação literal do art. 143 da Lei 8.213/91 não pode excluir o direito daquele que, implementados, no exercício da atividade rural, ambos os requisitos para a aposentadoria por idade nele prevista, incorporou tal direito ao seu patrimônio, por força da regra geral do direito adquirido naquele momento em que implementados os requisitos para a aposentadoria por idade, o beneficiário deixa de requerê-la, poderá fazê-lo posteriormente, porquanto o exercício de um direito não se confunde com a sua aquisição
"Mais uma vez, uma interpretação literal de um preceito legal revela-se insuficiente para a compreensão global do enunciado normativo veiculado. Sem dúvida que estamos em face de uma regra cunhada para viger temporariamente, mas quando o preceito normativo dispõe que 'pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário-mínimo, durante quinze anos', ele deve ser compreendido como uma regra aplicável para o trabalhador rural que comprovar o exercício de atividade rural, pelo período necessário e imediatamente anterior ao implemento da idade
Aliás, essa é a conclusão que se extrai do julgamento da 3.ª Seção do STJ, na Petição 7.476/PR, quando registra que, "se ao alcançar a faixa etária
"PREVIDENCIÁRIO – RECURSO ESPECIAL – RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL - PROVA TESTEMUNHAL CORROBORADA POR INÍCIO DE PROVA DOCUMENTAL.
- A exigência legal para a comprovação da atividade laborativa rural resulta na prova testemunhal, corroborada por um início razoável de prova documental, ainda que constituída por dados do registro civil, certidão de casamento, ou qualquer documento que mereça fé pública.
- No caso em exame, o autor apresentou certidão expedida pelo Registro de Imóveis da Comarca de Paulo de Faria, Estado de São Paulo (fls. 17/20), que comprova a existência da "Fazenda Figueira", e que se harmoniza com os depoimentos testemunhais demonstrando o exercício da atividade rurícola do autor, sem registro e contemporâneo ao período que pretende ver reconhecido.
- Precedentes desta Corte.
- Recurso conhecido e desprovido."
(REsp 422.095/SP, rel. Min. JORGE SCARTEZZINI, DJ de 23/09/2002 – g.n.)
Esclareça-se que o fato de o requerente receber o benefício de amparo social ao idoso desde 2006 não afasta seu direito ao benefício vindicado, tendo em vista que se deu posteriormente ao implemento do requisito etário (em 2000).
De rigor, portanto, o deferimento do benefício, porquanto comprovado o exercício de atividade rural pelo período de carência legalmente exigido.
A aposentadoria corresponde ao valor de um salário-mínimo mensal, nos termos do art. 143 da Lei n. º 8.213/91.
O termo inicial do benefício previdenciário deve retroagir à data do requerimento administrativo, de acordo com a previsão contida no inciso II do art. 49 da Lei n. º 8.213/91.
Na ausência de demonstração do requerimento, o termo inicial deve retroagir à data da citação, ocasião em que a autarquia tomou conhecimento da pretensão.
No caso, existe comprovação de requerimento (em 19/03/2018), devendo o termo inicial ser nele fixado, compensando-se os valores recebidos a título de benefício de amparo social ao idoso e observando-se ser devida a gratificação natalina, nos termos preconizados no art. 7.º, inciso VIII, da Constituição da República.
Quer seja em relação aos juros moratórios, devidos a partir da citação, momento em que constituído o réu em mora; quer seja no tocante à correção monetária, incidente desde a data do vencimento de cada prestação, há que prevalecer tanto o decidido, sob a sistemática da repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do Ministro Luiz Fux, quanto o estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião da execução do julgado, observada a rejeição dos embargos de declaração no âmbito do julgamento em epígrafe, em 03/10/2019.
Nos termos do art. 4.º, inciso I, da Lei Federal n.º 9.289/1996, o INSS está isento do pagamento de custas processuais nas ações de natureza previdenciária ajuizadas nesta Justiça Federal, assim como o está naquelas aforadas na Justiça do estado de São Paulo, por força do art. 6.º da Lei Estadual n.º 11.608/2003, c. c. o art. 1.º, § 1.º, da mesma Lei n.º 9.289/1996, circunstância que não o exime, porém, de arcar com as custas e as despesas processuais em restituição à parte autora, em decorrência da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Já no que diz respeito às ações propostas perante a Justiça do estado de Mato Grosso do Sul, as normativas que tratavam da aludida isenção (Leis Estaduais n.º 1.135/91 e n.º 1.936/98) restaram revogadas a partir da edição da Lei Estadual n.º 3.779/09 (art. 24, §§ 1.º e 2.º), pelo que, nos feitos advindos daquela Justiça Estadual, de rigor a imposição à autarquia previdenciária do pagamento das custas processuais, exigindo-se o recolhimento apenas ao final da demanda, caso caracterizada a sucumbência.
À vista do quanto disposto no art. 85 do Código de Processo Civil, sendo o caso de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II do § 4.º, c. c. o § 11, ambos do art. 85 do CPC, bem como no art. 86 do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência (STJ, Súmula 111). Na hipótese em que a pretensão do segurado somente seja deferida em sede recursal, a verba honorária incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão ou acórdão, em atenção ao disposto no § 11 do art. 85 do CPC.
Posto isso, dou provimento à apelação, para reformar a sentença e julgar procedente o pedido formulado, fixando os critérios dos consectários e determinando a incidência de verba honorária nos termos da fundamentação, supra.
O benefício é de aposentadoria por idade de trabalhador rural, no valor de um salário-mínimo, com DIB em 19/03/2018, compensando-se os valores recebidos a título de benefício de amparo social ao idoso.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE PESCADOR ARTESANAL PROFISSIONAL NO PERÍODO ANTERIOR AO PREENCHIMENTO DO REQUISITO ETÁRIO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova testemunhal.
- De acordo com as definições constantes das sucessivas Instruções Normativas expedidas pelo INSS em matéria de benefícios previdenciários, o pescador artesanal é o segurado especial que, individualmente ou em regime de economia familiar, faz da pesca sua profissão habitual ou principal meio de vida, desde que: (a) não utilize embarcação; ou (b) utilize embarcação de até seis toneladas de arqueação bruta, ainda que com auxílio de parceiro; ou (c) na condição exclusiva de parceiro outorgado, utilize embarcação de arqueação bruta igual ou menor que dez toneladas.
- O pescador artesanal também tem direito à aposentadoria por idade, independentemente de ter recolhido contribuição previdenciária, uma vez que está equiparado ao trabalhador rural, na qualidade de segurado especial, para fins de proteção previdenciária. Neste sentido: TNU, PU n.º 2006.85.00.504951-4, Sessão de 13/8/2007.
- O conjunto probatório é suficiente para ensejar a concessão do benefício vindicado.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
