Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6079668-05.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal AUDREY GASPARINI
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
24/11/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 27/11/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. ART. 143 DA
LEI N.º 8.213/91. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR
AO REQUERIMENTO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- O conjunto probatório é suficiente para ensejar a concessão do benefício vindicado.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6079668-05.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: SONIA DORALICE GUTIERRES CLAUDINO
Advogado do(a) APELANTE: DANIEL BELZ - SP62246-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6079668-05.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: SONIA DORALICE GUTIERRES CLAUDINO
Advogado do(a) APELANTE: DANIEL BELZ - SP62246-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural,
prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91.
O juízo a quo julgou improcedente o pedido formulado.
A parte autora apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o cumprimento
dos requisitos legais necessários à concessão pretendida. Se vencida, prequestiona a matéria.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6079668-05.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: SONIA DORALICE GUTIERRES CLAUDINO
Advogado do(a) APELANTE: DANIEL BELZ - SP62246-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL)
O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts. 39,
inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91.
Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de
1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha que
a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a concessão
do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único).
Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural deveria
comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do pedido do
benefício.
Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou
para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do
benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família.
Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve
comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.
O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de Benefícios.
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de
verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral
durante o período respectivo.
Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o
entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de
atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de
25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em
14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos
rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15
(quinze) anos, contados da vigência da referida Lei.
Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006.
Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como
segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a
uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2
(dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na
Lei n.º 11.368/06.
Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu
nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu art.
2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º 8.213/91, de
24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e, em seu art.
3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor equivalente ao
salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a
atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro
de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três),
limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro
de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze)
meses dentro do respectivo ano civil”.
É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra
permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria por
idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de
forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo
igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido",
consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo.
Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á
por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada
Lei, corroborada por prova testemunhal.
Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa
conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova
testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da
Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:”
"A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito
de obtenção do benefício previdenciário".
DO CASO DOS AUTOS
O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em 31.01.2018,
devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 180 meses.
Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se:
- CTPS da autora, com registros de atividades em serviços rurais nos períodos de 05.11.2002 a
11.02.2003, 14.07.2003 a 03.09.2003, 20.10.2003 a 19.02.2004, 14.06.2004 a 27.01.2005,
23.08.2005 a 13.02.2006, 02.10.2006 a 31.01.2007, 01.06.2007 a 23.03.2008 e 01.04.2011 a
01.07.2014 e urbano de 15.03.1977 a 26.09.1977 e
- Consulta realizada no Sistema CNIS da Previdência Social, constando os registros informados
na CTPS, bem como o recebimento de auxílio doença previdenciário de 02.02.2014 a 28.03.2014.
- Insta asseverar que a autora também juntou aos autos a certidão de seu casamento, celebrado
em 05.04.1980, qualificando o cônjuge como corretor de imóveis.
O INSS juntou com a contestação as informações do Sistema CNIS da Previdência Social em
nome da autora e de seu marido.
Com relação ao cônjuge da requerente constam no mencionado sistema, os seguintes registros:
- TINTURARIA E ESTAMPARIA WIEZEL LTDA de 27.07.1979 a 03.03.1980;
- SERV SAN SANEAMENTO TECNICO E COMERCIO LTDA de 02.01.1984 a 09.03.1984;
- SERV SAN SANEAMENTO TECNICO E COMERCIO LTDA de 01.08.1988 a 09.01.1989;
- VALTER DE PAULA de 02.08.1999 a 10.12.1999;
- ANTONIO MARTINEZ de 05.11.2002 a 11.02.2003;
- M.A. - PRESTACOES DE SERVICOS RURAIS LTDA de 14.07.2003 a 03.09.2003;
- M.A. - PRESTACOES DE SERVICOS RURAIS LTDA a partir de 20/10/2003, com última
remuneração em 01.2004;
- MARCO ANTONIO MARTINEZ CITRUS de 14.06.2004 a 27.01.2005;
- ANTONIO MARTINEZ CITRUS a partir de 23.08.2005, com última remuneração em 12.2005;
- FRUCAN PRESTACOES DE SERVICOS RURAIS LTDA de 02.10.2006, sem data de saída e
- AGROPECUARIA MACUQUINHO LTDA de 01.04.2011 a 01.07.2014.
Cabe ressaltar a existência de prova oral. As testemunhas declaram que conhecem a parte
autora há bastante tempo e confirmam o alegado labor rural.
A testemunha Sr. José Aparecido Tronchin aduziu que conheceu a autora entre 1990 e 1993, que
trabalhou com a autora na Fazenda Santa Terezinha por aproximadamente três anos. Informou
que parou de trabalhar em razão de acidente sofrido, mas a demandante continuou trabalhando
no local. Indagado se atualmente a autora está trabalhando, informou que continua trabalhando
com hortaliças. Asseverou que nesse período a autora nunca exerceu atividade urbana.
Por sua vez, a testemunha Sr. Servino Pereira afirmou que conhece a ora apelante há
aproximadamente 10 anos e que já trabalharam juntos na Fazenda Santa Terezinha colhendo
laranjas por várias safras. Alegou que a requerente trabalhou como diarista em hortas na região
do Bacuri. Esclareceu que atualmente a demandante está trabalhando como diarista colhendo
pimentões.
Cumpre mencionar que o fato de a autora ter exercido atividade urbana de 15.03.1977 a
26.09.1977, de acordo com a sua CTPS e seu marido de 27.07.1979 a 03.03.1980, 02.01.1984 a
09.03.1984 e 01.08.1988 a 09.01.1989, conforme revela a consulta realizada no Sistema CNIS,
não alteram a solução da causa, pois trata-se de época anterior à carência exigida em lei, eis que
restou provada a predominância da atividade rural durante todo o período produtivo de exercício
laboral.
Esclareça-se que o Colendo Superior Tribunal de Justiça estabeleceu, no julgamento do RESP
n.º 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva, a
necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente
anterior ao implemento do requisito etário.
É inconteste o valor probatório dos documentos de qualificação civil, dos quais é possível inferir a
profissão exercida pela parte autora, à época dos fatos que se pretende comprovar.
E os documentos juntados constituem início de prova material, o que foi corroborado pela prova
testemunhal, confirmando a atividade campesina da parte autora.
De rigor, portanto, o deferimento do benefício, porquanto comprovado o exercício de atividade
rural pelo período de carência legalmente exigido.
A aposentadoria corresponde ao valor de um salário mínimo mensal, nos termos do art. 143 da
Lei n.º 8.213/91.
O termo inicial do benefício previdenciário deve retroagir à data do requerimento administrativo,
de acordo com a previsão contida no inciso II do art. 49 da Lei n.º 8.213/91. Na ausência de
demonstração do requerimento, o termo inicial deve retroagir à data da citação, ocasião em que a
autarquia tomou conhecimento da pretensão.
No caso, existe comprovação de requerimento, devendo o termo inicial ser nele fixado.
Devida a gratificação natalina, nos termos preconizados no art. 7.º, inciso VIII, da Constituição da
República.
Quer seja em relação aos juros moratórios, devidos a partir da citação, momento em que
constituído o réu em mora; quer seja no tocante à correção monetária, incidente desde a data do
vencimento de cada prestação, há que prevalecer tanto o decidido, sob a sistemática da
repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do Ministro
Luiz Fux, quanto o estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na
Justiça Federal, em vigor por ocasião da execução do julgado, observada a rejeição dos
embargos de declaração no âmbito do julgamento em epígrafe, em 03/10/2019.
Nos termos do art. 4.º, inciso I, da Lei Federal n.º 9.289/1996, o INSS está isento do pagamento
de custas processuais nas ações de natureza previdenciária ajuizadas nesta Justiça Federal,
assim como o está naquelas aforadas na Justiça do estado de São Paulo, por força do art. 6.º da
Lei Estadual n.º 11.608/2003, c. c. o art. 1.º, § 1.º, da mesma Lei n.º 9.289/1996, circunstância
que não o exime, porém, de arcar com as custas e as despesas processuais em restituição à
parte autora, em decorrência da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Já no que diz respeito às ações propostas perante a Justiça do estado de Mato Grosso do Sul, as
normativas que tratavam da aludida isenção (Leis Estaduais n.º 1.135/91 e n.º 1.936/98) restaram
revogadas a partir da edição da Lei Estadual n.º 3.779/09 (art. 24, §§ 1.º e 2.º), pelo que, nos
feitos advindos daquela Justiça Estadual, de rigor a imposição à autarquia previdenciária do
pagamento das custas processuais, exigindo-se o recolhimento apenas ao final da demanda,
caso caracterizada a sucumbência.
À vista do quanto disposto no art. 85 do Código de Processo Civil, sendo o caso de sentença
ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado na liquidação do julgado, com
observância ao disposto no inciso II do § 4.º, c. c. o § 11, ambos do art. 85 do CPC, bem como no
art. 86 do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência
(STJ, Súmula 111). Na hipótese em que a pretensão do segurado somente seja deferida em sede
recursal, a verba honorária incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão ou acórdão,
em atenção ao disposto no § 11 do art. 85 do CPC.
Posto isso, dou provimento à apelação, para reformar a sentença e julgar procedente o pedido
formulado, fixando os critérios dos consectários e determinando a incidência de verba honorária
nos termos da fundamentação, supra.
O benefício é de aposentadoria por idade de trabalhador rural, no valor de um salário mínimo,
com DIB em 01.02.2018.
É o voto.
AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. ART. 143 DA
LEI N.º 8.213/91. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR
AO REQUERIMENTO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- O conjunto probatório é suficiente para ensejar a concessão do benefício vindicado.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
