Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5002758-80.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
12/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 16/11/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. ART. 143 DA
LEI N.º 8.213/91. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR
AO REQUERIMENTO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. ASTREINTES. DESCUMPRIMENTO DE
DECISÃO JUDICIAL. OBRIGAÇÃO DE FAZER PELO INSS. MULTA DIÁRIA
CORRESPONDENTE A 1/30 DO VALOR DO BENEFÍCIO. ATENDIMENTO AOS FINS DA
IMPOSIÇÃO DA MULTA.
- A regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, segundo o qual “a
apelação terá efeito suspensivo”, é excepcionada no § 1.º desse mesmo dispositivo legal, cujo
inciso V expressamente determina que, “além de outras hipóteses previstas em lei, começa a
produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que confirma, concede ou
revoga tutela provisória”.
- A preliminar de necessidade de autodeclaração para os pedidos de aposentadorias, merece ser
rejeitada, porquanto trata-se de procedimento da entidade autárquica no âmbito administrativo, na
qual dispensa-se a determinação judicial.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- O conjunto probatório é suficiente para ensejar a concessão do benefício vindicado.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
- A imposição da multa diária como meio coercitivo para o cumprimento de obrigação de fazer
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
tem respaldo nos arts. 536, § 1.º, e 537 do Código de Processo Civil. A jurisprudência também
afirmou a possibilidade de cobrança de astreintes do INSS.
- Esta 8.ª Turma entende que a multa diária na proporção de 1/30 do benefício atende tanto a
intimidação do devedor para a força cogente das decisões judiciais quanto a relação de
proporcionalidade com o interesse a ser protegido pela prestação da obrigação principal. Quanto
ao prazo fixado para a implantação do benefício, reputa-se razoável o prazo de até 45 (quarenta
e cinco) dias, como dispõe o § 5.º, do art. 41-A, da Lei n.º 8.213/91.
- Matéria preliminar rejeitada. Apelação a que se dá parcial provimento.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002758-80.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSEFA MARTINS MONTEIRO BEZERRA
Advogado do(a) APELADO: PAULO RENAN PACHE CORREA - MS13961-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002758-80.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSEFA MARTINS MONTEIRO BEZERRA
Advogado do(a) APELADO: PAULO RENAN PACHE CORREA - MS13961-A
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural,
prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91.
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao
benefício pretendido, a partir da data do requerimento administrativo (02.06.2018). Deferida a
tutela provisória de urgência.
O INSS apela, requerendo, preliminarmente, o recebimento do recurso em seu duplo efeito e
alegando a necessidade da autora apresentar autodeclaração. No mérito, pleiteia a reforma da
sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento dos requisitos legais necessários à
concessão em questão. Se vencido, insurge-se com relação ao termo inicial do benefício e à
multa imposta à autarquia. Ao final, prequestiona a matéria.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002758-80.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSEFA MARTINS MONTEIRO BEZERRA
Advogado do(a) APELADO: PAULO RENAN PACHE CORREA - MS13961-A
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
Requer o INSS, em seu recurso de apelação, a concessão do efeito suspensivo, condicionando
eventual implantação de benefício previdenciário após ocorrido o trânsito em julgado.
Não lhe assiste razão.
A alegação veiculada pelo INSS, concernente ao recebimento da apelação no duplo efeito, não
se coloca na hipótese dos autos.
A regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, segundo o qual “a
apelação terá efeito suspensivo”, é excepcionada no § 1.º desse mesmo dispositivo legal, cujo
inciso V expressamente determina que, “além de outras hipóteses previstas em lei, começa a
produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que confirma, concede ou
revoga tutela provisória”.
Não impedem, os recursos, a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão em sentido
diverso, "se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou
impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso" (CPC, art.
995, parágrafo único).
Neste caso, em que o recurso é interposto pelo INSS, não há nem urgência nem evidência para
que se conceda o efeito suspensivo. Pelo contrário, a urgência serve à parte autora, já que o
benefício previdenciário é considerado verba alimentar.
Não assiste razão ao INSS também no tocante à alegação de necessidade de a parte autora
ser intimada para apresentar autodeclaração, por se tratar deprocedimento da entidade
autárquica no âmbito administrativo.
Dessa forma, rejeitada a preliminar arguida, segue-se com a análise do mérito recursal.
APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL)
O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts.
39, inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91.
Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de
1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha
que a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a
concessão do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único).
Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural
deveria comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do
pedido do benefício.
Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou
para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do
benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família.
Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve
comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.
O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de
Benefícios.
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever
de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício
laboral durante o período respectivo.
Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o
entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício
de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de
25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em
14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos
rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante
15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei.
Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006.
Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como
segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a
uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2
(dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na
Lei n.º 11.368/06.
Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu
nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu
art. 2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º
8.213/91, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e,
em seu art. 3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor
equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro
de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991;
II - de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado
por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016
a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a
12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil”.
É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra
permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria
por idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que
de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por
tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício
pretendido", consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo.
Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á
por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da
retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal.
Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa
conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova
testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da
Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:”
"A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para
efeito de obtenção do benefício previdenciário".
DO CASO DOS AUTOS
O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em
25.05.2018, devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 180 meses.
Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se:
- Certidão do primeiro casamento da autora, celebrado em 03.07.1982, constando a
qualificação de lavrador de seu ex-marido;
- Certidão do segundo casamento da demandante, com o Sr. Erasmo Ricardo Bezerra,
celebrado em 26.08.2009, qualificando o seu cônjugecomo agricultor;
- Carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Nioaque, em nome da autora, com data de
admissão em 03.03.1998;
- Requerimento da demandante endereçado ao Superintendente Estadual do Ministério da
Agricultura e da Reforma Agrária, datado de 25.05.1995, cedendo a “parcela 49 do Projeto de
Assentamento Taquaral”.
- Certidão do MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO – INSTITUTO NACIONAL DE
COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA – SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DE MATO
GROSSO DO SUL – UNIDADE AVANÇADA JARDIM, datada de 05.10.2009, certificando que o
cônjuge da autora, Sr. Erasmo Ricardo Bezerra, “reside e explora a parcela n.º 47 do Projeto de
Assentamento ‘Uirapuru’, com a área de 20,0000 há (vinte hectares) aproximadamente, situado
no município de Nioaqui-MS, cadastrados no Sistema de Informações do Programa de Reforma
Agrária – SIPRA, em 03/08/1998”;
- “DAP - Declaração Anual do Produtor Rural”, em nome do marido da requerente, ano base:
2009, 2014 e 2015 e
- Nota fiscal de comercialização da produção em nome da autora e de seu marido, referente ao
ano 2018.
O INSS juntou aos autos as informações do Sistema CNIS da Previdência Social em nome da
autora, sem registros de atividades, bem como em nome de seu atual marido, Sr. Erasmo
Ricardo Bezerra e do Sr. Raimundo Santos de Matos (primeiro marido da autora).
No que se refere ao atual cônjuge da requerente, a mencionada consulta revela os seguintes
registros:
- MONTCALM MONTAGENS INDUSTRIAIS S/A, empregado de 27/05/1974 a 09/04/1976;
- SIME SOCIEDADE INDUSTRIAL DE MECANICA E ESTAMPARIA LTDA, empregado com
data de início de atividade em 09/04/1976, sem data fim;
- Empresa NÃO CADASTRADA, empregado de 01/02/1979 a 30/04/1979;
- ITAU PINTURAS LTDA, empregado de 19/06/1979 a 27/06/1979;
- KLEBER MONTAGENS INDUSTRIAIS LTDA, empregado de 27/12/1979 a 29/12/1979;
- TEQUISA TUBOS INOXIDAVEIS LTDA, empregado de 23/09/1980 a 20/01/1982;
- APARAS DE PAPEIS SULINA LTDA, empregado de 19/07/1982 a 03/08/1982;
- ESCRITORIO TECNICO DE ENGENHARIA ETEMA, empregado de 01/10/1982 a 14/10/1982;
- ITAU PINTURAS LTDA, empregado de 08/11/1982 a 12/11/1982;
- NATIVA ENGENHARIA SA, empregado de 01/03/1984 a 04/05/1984;
- PINTURAS YPIRANGA LTDA, empregado de 11/07/1984 a 27/07/1984;
- VIGEL MÃO DE OBRA TEMPORARIA LTDA, empregado de 17/12/1984 a 17/03/1985;
- JARDIM PARTICIPACOES LTDA, empregado de 18/03/1985 a 28/07/1985 e
- APOSENTADORIA POR IDADE, com data de início em 05/11/2009.
Com relação ao primeiro marido da autora constam os seguintes registros:
- SOLO ENGENHARIA CONSTRUCOES E EMPREENDIMENTOS LTDA, empregado
13/11/1984 a 13/05/1985;
- SERGIO GUIMARAES DIAS, empregado de 18/05/1991 a 30/08/1991;
- AGROAZUL AGRICOLA ALCOAZUL LTDA, empregado de 19/06/1995 a 12/07/2001;
- ALCOAZUL S/A - ACUCAR E ALCOOL - EM RECUPERACAO JUDICIAL, empregado de
19/06/1995, com última remuneração em 12/1996;
- AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO, de 27/07/2000 a 31/12/2000;
- AGROAZUL AGRICOLA ALCOAZUL LTDA, empregado de 25/04/2002 a 23/10/2002;
- AGROBRAS ARACATUBA LTDA, empregado de 19/04/2003 a 31/10/2003;
- SERGIO XAVIER DE SOUZA ARACATUBA, empregado de 17/04/2004 a 13/12/2004;
- AGROBRAS ARACATUBA LTDA, empregado de 18/04/2005 a 10/11/2005;
- AGROAZUL AGRICOLA ALCOAZUL LTDA, empregado de 10/04/2006 a 10/11/2006;
- SERGIO XAVIER DE SOUZA ARACATUBA, empregado de 18/04/2007 a 14/12/2007;
- ALCOAZUL S/A - ACUCAR E ALCOOL - EM RECUPERACAO JUDICIAL, empregado de
09/04/2008, com última remuneração em 02/2011;
- FIGUEIRA INDUSTRIA E COMERCIO S/A - EM RECUPERACAO JUDICIAL, empregado de
09/04/2008 a 23/04/2015;
- AGROAZUL AGRICOLA ALCOAZUL LTDA, empregado de 09/04/2008, com última
remuneração em 02/2014;
- AGRAL S/A - AGRICOLA ARACANGUA, empregado de 09/04/2008, com última remuneração
em 06/2014;
- TEUCLE MANNARELLI FILHO, empregado de 09/11/2015 a 06/02/2016 e
- DUO R ENGENHARIA LTDA Empregado 11/05/2016, com última remuneração em 06/2019.
Esclareça-se que o fato de o cônjuge da requerente possuir registros urbanos, conforme revela
a consulta no Sistema CNIS acima mencionada, não altera a solução da causa, pois trata-se de
época anterior à carência exigida em lei, bem como o fato de o primeiro marido da requerente
possuir registros urbanos, pois encontra-se acostado aos autos documentos em nome da
própria autora indicando que exerceu suas atividades no meio rural.
Acrescente-se, ainda, que embora não conste do Sistema CNIS vínculo em atividade rural da
autora, também não há registros de atividades urbanas em seu nome.
Cabe ressaltar a existência de prova oral. As testemunhas declaram que conhecem a parte
autora há bastante tempo e confirmam o alegado labor rural.
Como ressaltado pelo Juízo a quo: “Eis o início de prova material. Soma-se a isso, os
depoimentos prestados pelas testemunhas Emílio Barcelos Benitez e Valmir Francisco dos
Santos. A testemunha Emílio Barcelos Benitez disse que é vizinho da autora e que a conhece
há mais ou menos dezoito anos. Disse que foram assentados no Uirapuru, na mesma época.
No lote, a autora trabalha com seu esposo, Sr. Erasmo e pratica agricultura familiar, cria uns
porcos, galinhas. No mesmo sentido foi o depoimento da testemunha Valmir Francisco.
Portanto, a autora vive e trabalha em ambiente campesino há pelo menos 15 anos, segundo a
prova testemunhal, que corrobora a prova material”.
É inconteste o valor probatório dos documentos de qualificação civil, dos quais é possível inferir
a profissão exercida pela parte autora, à época dos fatos que se pretende comprovar.
E os documentos juntados constituem início de prova material, o que foi corroborado pela prova
testemunhal, confirmando a atividade campesina da parte autora.
De rigor, portanto, o deferimento do benefício, porquanto comprovado o exercício de atividade
rural pelo período de carência legalmente exigido.
A aposentadoria corresponde ao valor de um salário mínimo mensal, nos termos do art. 143 da
Lei n.º 8.213/91.
O termo inicial do benefício previdenciário deve retroagir à data do requerimento administrativo,
de acordo com a previsão contida no inciso II do art. 49 da Lei n.º 8.213/91. Na ausência de
demonstração do requerimento, o termo inicial deve retroagir à data da citação, ocasião em que
a autarquia tomou conhecimento da pretensão.
No caso, existe comprovação de requerimento, devendo o termo inicial ser nele fixado.
Devida a gratificação natalina, nos termos preconizados no art. 7.º, inciso VIII, da Constituição
da República.
Quer seja em relação aos juros moratórios, devidos a partir da citação, momento em que
constituído o réu em mora; quer seja no tocante à correção monetária, incidente desde a data
do vencimento de cada prestação, há que prevalecer tanto o decidido, sob a sistemática da
repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do
Ministro Luiz Fux, quanto o estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para
Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião da execução do julgado, observada a
rejeição dos embargos de declaração no âmbito do julgamento em epígrafe, em 03/10/2019.
Nos termos do art. 4.º, inciso I, da Lei Federal n.º 9.289/1996, o INSS está isento do pagamento
de custas processuais nas ações de natureza previdenciária ajuizadas nesta Justiça Federal,
assim como o está naquelas aforadas na Justiça do estado de São Paulo, por força do art. 6.º
da Lei Estadual n.º 11.608/2003, c. c. o art. 1.º, § 1.º, da mesma Lei n.º 9.289/1996,
circunstância que não o exime, porém, de arcar com as custas e as despesas processuais em
restituição à parte autora, em decorrência da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Já no que diz respeito às ações propostas perante a Justiça do estado de Mato Grosso do Sul,
as normativas que tratavam da aludida isenção (Leis Estaduais n.º 1.135/91 e n.º 1.936/98)
restaram revogadas a partir da edição da Lei Estadual n.º 3.779/09 (art. 24, §§ 1.º e 2.º), pelo
que, nos feitos advindos daquela Justiça Estadual, de rigor a imposição à autarquia
previdenciária do pagamento das custas processuais, exigindo-se o recolhimento apenas ao
final da demanda, caso caracterizada a sucumbência.
Quanto ao prequestionamento suscitado, saliente-se inexistir contrariedade alguma a legislação
federal ou a dispositivos constitucionais.
Passa-se a analisar o pedido de afastamento da multa diária.
A imposição da multa diária como meio coercitivo para o cumprimento de obrigação de fazer
tem respaldo nos arts. 536, § 1.º, e 537 do Código de Processo Civil, dos seguintes teores:
“Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou
de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica
ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias
à satisfação do exequente.
§ 1º Para atender ao disposto nocaput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a
imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de
obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de
força policial.
Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de
conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja
suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento
do preceito.
§ 1º O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa
vincenda ou excluí-la, caso verifique que:
I - se tornou insuficiente ou excessiva;
II - o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para
o descumprimento.
§ 2º O valor da multa será devido ao exequente.
§ 3º A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada
em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à
parte.
§ 4º A multa será devida desde o dia em que se configurar o descumprimento da decisão e
incidirá enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado.
§ 5º O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que
reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional.”
Em recentes julgamentos a respeito do tema, o Superior Tribunal de Justiça assim enfrentou o
tema:
“O Superior Tribunal de Justiça, como guardião da legislação federal e da segurança jurídica,
deve zelar pela credibilidade do Poder Judiciário como um todo, dele devendo partir as
diretrizes que dão sustento à força cogente das decisões judiciais em qualquer instância, e não
servir de inspiração para o desacato premeditado das ordens que emanam desse Poder,
cabendo aqui a máxima de que ‘ordem judicial não se discute, se cumpre’. Em um Estado
Democrático de Direito, as ordens judiciais não são passíveis de discussão, senão pela via dos
recursos cabíveis. O destinatário da ordem judicial deve ter em mente a certeza de que
eventual desobediência lhe trará consequências mais gravosas que o próprio cumprimento da
ordem, e não a expectativa de redução ou de limitação da multa a ele imposta, sob pena de
tornar inócuo o instituto processual e de violar o direito fundamental à efetividade da tutela
jurisdicional.”
(STJ, REsp 1819069/SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 26/05/2020,
DJe 29/05/2020184)
“A respeito do montante da multa diária, o Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência
pacífica no sentido de que o valor das astreintes deve guardar relação de proporcionalidade
com o interesse a ser protegido pela prestação da obrigação principal, evitando-se, assim, o
desvirtuamento da medida coercitiva, que poderia i) ser mais atrativa ao demandado, por ser a
transgressão mais lucrativa que o cumprimento da obrigação (insuficiência da penalidade), ou ii)
ser mais vantajosa ao demandante, que enriqueceria abruptamente às custas do réu
(penalidade excessiva).
Com efeito, a multa cominatória tem por finalidade constranger o devedor a adotar um
comportamento tendente à implementação da obrigação, e não servir de compensação pela
deliberada inadimplência.
Assim, para a apuração da razoabilidade e da proporcionalidade das astreintes, não é
recomendável se utilizar apenas do critério comparativo entre o valor da obrigação principal e a
soma total obtida com o descumprimento da medida coercitiva, sendo mais adequado, em
regra, o cotejamento ponderado entre o valor diário da multa no momento de sua fixação e a
prestação que deve ser adimplida pelo demandado recalcitrante. A esse respeito, confiram-se:
REsp nº 1.475.157/SC, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, DJe 6/10/2014, e AgRg no AREsp
nº 394.283/SC, Rel. Ministro Moura Ribeiro, DJe 26/2/2016.
(...)
No julgamento do AgInt no AgRg no AREsp nº 738.682/RJ, o Ministro Luis Felipe Salomão, ao
discorrer acerca dos parâmetros normalmente admitidos pela jurisprudência desta Corte
Superior para fins de fixação da multa cominatória, constatou que, por vezes, eles apresentam
certa incompatibilidade: (...)
Ao final de seu voto, destacou Sua Excelência que 'a vinculação das astreintes à obrigação
principal ou à dimensão econômica do dever, apesar de parâmetro confiável, não é, por óbvio,
critério absoluto, sendo apenas um dos elementos a ser levados em conta' (AgInt no AgRg no
AREsp 738.682/RJ, Rel. p/ acórdão Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em
17/11/2016, DJe 14/12/2016).
Nessa mesma ocasião, foram elencados os seguintes parâmetros para a adequada fixação do
valor das astreintes: i) valor da obrigação e importância do bem jurídico tutelado; ii) tempo para
cumprimento (prazo razoável e periodicidade); iii) capacidade econômica e capacidade de
resistência do devedor e iv) possibilidade de adoção de outros meios pelo magistrado e dever
do credor de mitigar o próprio prejuízo (duty to mitigate de loss).”
(STJ, REsp 1840693/SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 26/05/2020,
DJe 29/05/2020)
Esta 8.ª Turma entende que a multa diária na proporção de 1/30 do benefício atende tanto a
intimidação do devedor para a força cogente das decisões judiciais quanto à relação de
proporcionalidade com o interesse a ser protegido pela prestação da obrigação principal, sem
que se tenha o enriquecimento ilícito da parte, mormente à vista da natureza pública dos
valores a serem pagos pelo INSS, não prosperando o pedido de sua exclusão.
Considerando que o valor de “multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), até o limite de 20
(vinte dias)”, a título de astreintes, mostra-se em descompasso com esse entendimento, impõe-
se sua redução nos moldes acima delineados, não prosperando, contudo, o pedido de sua
exclusão, por atraso injustificado na implantação do benefício.
Dessa forma, posto que cabível a imposição de astreintes ao INSS, deve ser fixada o valor da
multa diária fixada em 1/30 do valor do benefício.
Quanto ao prazo fixado para a implantação do benefício, dispõe o art. 537 do Código de
Processo Civil o seguinte:
"A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento,
em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e
compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito."
Portanto, considerando-se que são normalmente necessários diversos procedimentos
administrativos para cumprimento das diversas determinações judiciais, reputa-se razoável o
prazo de até 45 (quarenta e cinco) dias, como dispõe o § 5.º, do art. 41-A, da Lei n.º 8.213/91:
“§ 5.º O primeiro pagamento do benefício será efetuado até quarenta e cinco dias após a data
da apresentação, pelo segurado, da documentação necessária a sua concessão.”
Posto isso, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou parcial provimento à apelação, para
fixar os critérios de incidência da multa diária, nos termos da fundamentação, supra.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. ART. 143 DA
LEI N.º 8.213/91. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR
AO REQUERIMENTO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. ASTREINTES. DESCUMPRIMENTO
DE DECISÃO JUDICIAL. OBRIGAÇÃO DE FAZER PELO INSS. MULTA DIÁRIA
CORRESPONDENTE A 1/30 DO VALOR DO BENEFÍCIO. ATENDIMENTO AOS FINS DA
IMPOSIÇÃO DA MULTA.
- A regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, segundo o qual “a
apelação terá efeito suspensivo”, é excepcionada no § 1.º desse mesmo dispositivo legal, cujo
inciso V expressamente determina que, “além de outras hipóteses previstas em lei, começa a
produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que confirma, concede ou
revoga tutela provisória”.
- A preliminar de necessidade de autodeclaração para os pedidos de aposentadorias, merece
ser rejeitada, porquanto trata-se de procedimento da entidade autárquica no âmbito
administrativo, na qual dispensa-se a determinação judicial.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- O conjunto probatório é suficiente para ensejar a concessão do benefício vindicado.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
- A imposição da multa diária como meio coercitivo para o cumprimento de obrigação de fazer
tem respaldo nos arts. 536, § 1.º, e 537 do Código de Processo Civil. A jurisprudência também
afirmou a possibilidade de cobrança de astreintes do INSS.
- Esta 8.ª Turma entende que a multa diária na proporção de 1/30 do benefício atende tanto a
intimidação do devedor para a força cogente das decisões judiciais quanto a relação de
proporcionalidade com o interesse a ser protegido pela prestação da obrigação principal.
Quanto ao prazo fixado para a implantação do benefício, reputa-se razoável o prazo de até 45
(quarenta e cinco) dias, como dispõe o § 5.º, do art. 41-A, da Lei n.º 8.213/91.
- Matéria preliminar rejeitada. Apelação a que se dá parcial provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, dar parcial provimento à
apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
