Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5336896-34.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
14/05/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 19/05/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADORA RURAL.
CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OPORTUNIZAÇÃO DA PRODUÇÃO DE PROVA
TESTEMUNHAL. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
- Caracterizado o cerceamento de defesa, ante a retirada da oportunidade de colheita de
depoimentos das testemunhas, impõe-se de rigor a anulação da sentença.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5336896-34.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: NAIDE AVILLA PRESTES
Advogado do(a) APELANTE: DAWILIN ABRARPOUR ZUMBINI - SP299445-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5336896-34.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: NAIDE AVILLA PRESTES
Advogado do(a) APELANTE: DAWILIN ABRARPOUR ZUMBINI - SP299445-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhadora rural,
prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91.
Inocorreu audiência de instrução e julgamento.
O juízo a quo julgou improcedente o pedido formulado.
A parte autora apela, pleiteando, em preliminar de conflito de competência e de cerceamento de
defesa, “acerca da devida e não observada prova oral”.
Pleiteia, assim, a nulidade da sentença, ante a ocorrência de cerceamento de defesa, por não
ter sido possibilitada a devida instrução processual, restando suprimida fase processual, apesar
de requerida prova testemunhal na inicial. Por fim, afirma que “acaso restem prejudicadas as
preliminares de mérito, requer seja totalmente reformada a sentença de primeiro graupara o fim
de reconhecimento da qualidade de segurada especial da parte autora, bem como reconhecido
o tempo de atividade rural e a consequente procedência da ação para conceder o benefício da
aposentadoria por idade rural desde a DER (fls. 147), porquanto comprovado a implementação
de todos os requisitos.” (ID n.º 143851946 - pág. 01 a 14).
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5336896-34.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: NAIDE AVILLA PRESTES
Advogado do(a) APELANTE: DAWILIN ABRARPOUR ZUMBINI - SP299445-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
A parte autora alega, em preliminar, conflito de competência, esclarecendo que “ingressou na
Justiça Estadual por competência delegada, por residir em município do interior paulista
(Cabreúva) o qual não possui Justiça Federal.”
Argumenta que “no Município de Jundiaí está instalada a Justiça Federal competente para
dirimir as demandas advindas do Município de Cabreúva.”
A demandante colacionou aos autos cópia de “decisão acerca da decretação de nulidade da
sentença e de todos os atos praticados no feito, bem como a remessa para a Vara Federal
competente”
No caso em tela, foi suscitada em preliminar matéria de ordem pública, que deve ser analisada.
Não se pode perder de vista que é dever do magistrado, assim que identificar a incompetência
absoluta, declará-la ex officio (§ 1.º do art. 64 do CPC/2015).
Como já referido no relatório, a ação foi proposta em 2019, cujos autos começaram a tramitar
perante o Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Cabreúva/SP.
Nos termos do § 3.º do art. 109 da Constituição Federal de 1988, in verbis:
“Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
(...)
§ 3.º Lei poderá autorizarque as causas de competência da Justiça Federal em que forem parte
instituição de previdência social e segurado possam ser processadas e julgadas na justiça
estadual quando a comarca dodomicílio do segurado não for sede de vara federal”. (Redação
dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019 – g.n.)”
Cumpre salientar que o art. 3.º da Lei n.º 13.876/2019 alterou a redação do art. 15 da Lei n.º
5.010/1966 para estabelecer, in verbis:
“Art. 15. Quando a Comarca não for sede de Vara Federal, poderão ser processadas e julgadas
na Justiça Estadual:
(...) III - as causas em que forem parte instituição de previdência social e segurado e que se
referirem a benefícios de natureza pecuniária, quando a Comarca de domicílio do segurado
estiver localizada a mais de 70 km (setenta quilômetros) de Município sede de Vara Federal;
(...)§ 1.º Sem prejuízo do disposto no art. 42 desta Lei e no parágrafo único do art. 237 da Lei nº
13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), poderão os Juízes e os auxiliares
da Justiça Federal praticar atos e diligências processuais no território de qualquer Município
abrangido pela seção, subseção ou circunscrição da respectiva Vara Federal.
§ 2.º Caberá ao respectivo Tribunal Regional Federal indicar as Comarcas que se enquadram
no critério de distância previsto no inciso III do caput deste artigo.” (g.n.)
Nos termos do art. 5.º da referida norma, o art. 3.º da Lei n.º 13.876/2019 entrou em vigor
somente a partir de 01/01/2020.
Sobre o tema, cabe trazer à colação o teor da Resolução n.º 603/2019, do Conselho da Justiça
Federal, que dispõe sobre o exercício da competência da Justiça Federal delegada, nos termos
das alterações promovidas pelo art. 3.º da Lei n.º 13.876/2019. Confira-se:
“Art. 1º. Esta resolução se destina a estabelecer, de forma uniforme, critérios para os Tribunais
Regionais Federais publicarem a lista das comarcas estaduais com competência federal
delegada para processamento e julgamento das causas em que forem parte instituição de
previdência social e segurado relativamente a benefícios de natureza pecuniária.
Art. 2º. O exercício da competência delegada é restrito às comarcas estaduais localizadas a
mais de 70 quilômetros do Município sede da vara federal cuja circunscrição abranja o
Município sede da comarca.
§ 1º. Para definição das comarcas dotadas de competência delegada federal na forma do caput
deste artigo, deverá ser considerada a distância entre o centro urbano do Município sede da
comarca estadual e o centro urbano do Município sede da vara federal mais próxima, em nada
interferindo o domicílio do autor.
§ 2º. A apuração da distância, conforme previsto pelo parágrafo anterior, deverá considerar a
tabela de distâncias indicada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE ou em
outra ferramenta de medição de distâncias disponível.
Art. 3º. Observadas as regras estabelecidas pela Lei n.º 13.876, de 20 de setembro de 2019,
bem como por esta Resolução, os Tribunais Regionais Federais farão publicar, até o dia 15 de
dezembro de 2019, lista das comarcas com competência federal delegada.
§ 1 º. As listas das comarcas previstas no caput deste artigo deverão ser disponibilizadas nas
páginas da internet dos respectivos tribunais, além de ser enviadas ao Conselho da Justiça
Federal para divulgação em sua página própria, às seccionais da Ordem dos Advogados do
Brasil, às Procuradorias Regionais Federais, às Procuradorias Regionais do Ministério Público
Federal, às Corregedorias dos Tribunais de Justiça, à Defensoria Pública Federal, ao Instituto
Nacional do Seguro Social, sem prejuízo de outros órgãos ou entidades que tenham interesse
na matéria.
§ 2º. As Comarcas estaduais que deixarem de possuir competência delegada federal e os
respectivos Tribunais Regionais deverão afixar em local de acesso aos advogados e ao público
informação sobre a localização da vara federal competente para processamento das ações de
que trata esta Resolução.
Art. 4º. As ações, em fase de conhecimento ou de execução, ajuizadas anteriormente a 1.º de
janeiro de 2020, continuarão a ser processadas e julgadas no juízo estadual, nos termos em
que previsto pelo § 3º do art. 109 da Constituição Federal, pelo inciso III do art. 15 da Lei n.
5.010, de 30 de maio de 1965, em sua redação original, e pelo art. 43 do Código de Processo
Civil.
Art. 5º. Havendo declínio de competência de ações propostas em comarcas que não possuam
competência delegada a partir de 1º de janeiro de 2020, a remessa para a vara federal
competente deverá ser promovida eletronicamente, nos termos em que definido pelo Tribunal
Regional Federal respectivo.
Art. 6º. Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação.” (g.n.).
Em cumprimento ao disposto no art. 3º da Resolução-CJF n.º 603/2019, este e. Tribunal
Regional Federal da 3.ª Região indicou as comarcas que se enquadram no critério de distância
previsto na Lei n.º 13.876/2019 por meio da Resolução-PRES n.º 322/2019, que já sofreu
alterações pela Resolução-PRES n.º 334/2020.
De fato, a Comarca de Cabreúva/SP não foi contemplada na lista das Comarcas com
competência federal delegada no Estado de São Paulo. Porém, no presente caso, não foi
proferida decisão de declínio nem suscitado conflito de competência.
Cabe ainda lembrar que a apelante afirmou (sic): “caso venha a ser suscitado conflito de
competência no presente feito, requer-se seja decretada a nulidade da sentença e todos atos
praticados no feito, bem assim a remessa dos autos a uma das Varas Federais de Jundiaí – SP,
mirando-se o princípio da celeridade processual, visto a parte autora ser idosa, humilde
(rurícola) e, portanto, necessitar de breve provimento jurisdicional”.
Mesmo que assim não fosse, o art. 4º da mencionada Resolução n.º 603/2019, do Conselho da
Justiça Federal estabelece que “as ações, em fase de conhecimento ou de execução, ajuizadas
anteriormente a 1.º de janeiro de 2020, continuarão a ser processadas e julgadas no juízo
estadual, nos termos em que previsto pelo § 3º do art. 109 da Constituição Federal, pelo inciso
III do art. 15 da Lei n. 5.010, de 30 de maio de 1965, em sua redação original, e pelo art. 43 do
Código de Processo Civil.” (g.n.).
Dessa forma, segue-se com a análise da segunda preliminar arguida pela apelante, qual seja: o
cerceamento de defesa, visto não ter sido dada oportunidade de comprovar seu direito por meio
de prova testemunhal.
Com efeito, o juízo a quo julgou antecipadamente o pedido, fundamentando-se no art. 355,
inciso I, do Código de Processo Civil, baseando-se exclusivamente na prova documental trazida
aos autos.
Conforme preleciona Arruda Alvim, em sua obra Manual de Direito Processual Civil, 5ª ed.: “O
julgamento antecipado da lide marca-se pela desnecessidade ou irrelevância da audiência para
produção de provas. Este entendimento vem claro na interpretação do novo § 2º do artigo 331
ao se referir à designação da audiência de instrução e julgamento se necessária. Esta
expressão, parece-nos, diz com a necessidade de produção de provas em audiência de
instrução e julgamento. Assim sendo, deve-se ter o julgamento antecipado da lide porque a
questão de mérito se resume na aplicação da lei ao caso concreto, já definido pela ausência de
qualquer controvérsia em torno dos fatos e, então, encontra aplicação a regra de que acerca do
direito não se faz prova, por força da aplicação do princípio iura novit curia (...), ou, então,
porque, apesar da existência de questões de fato que dependam de prova, essa prova não é
oral e nem há prova pericial a ser realizada em audiência de instrução, por ser exclusivamente
documental, por exemplo”.
O caráter alimentar dos benefícios previdenciários imprime ao processo em que são vindicados
a necessidade de serem facultados todos os meios de prova, não só a documental, a fim de
que o autor possa devidamente comprovar os fatos por ele alegados, ainda mais, em casos,
como nos autos, em que se sustenta a situação de trabalhador no campo.
A ausência de produção de prova testemunhal, devidamente requerida e necessária para o fim
declarado, acarreta violação ao princípio constitucional do contraditório e do devido processo
legal, tornando a sentença nula.
Nesse sentido tem decidido a 9.ª Turma (ApCiv 5896402-15.2019.4.03.9999 – Des. Fed.
Relatora Daldice Santana – Julgado em 15/12/2019 – Publicado em 19/12/2019; ApCiv
5635875-81.2019.4.03.9999 – Des. Fed. Relatora Vanessa Mello – Julgado em 26/02/2020 –
Intimação via sistema em 28/02/2020), sento também o entendimento majoritário nos demais
órgãos julgadores desta Corte (AC 5125838-52.2019.4.03.9999; Relatora: Des. Fed. INES
VIRGINIA, 7.ª Turma, v.u., DJE: 07/05/2019; AC 5610325-84.2019.4.03.9999, Relator: Des.
Fed. NELSON PORFIRIO, 10.ª Turma, v.u., DJE: 27/08/2019).
Posto isso, dou provimento à apelação, para anular a sentença proferida e determinar o retorno
dos autos à vara de origem, para seu regular processamento.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADORA RURAL.
CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OPORTUNIZAÇÃO DA PRODUÇÃO DE PROVA
TESTEMUNHAL. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
- Caracterizado o cerceamento de defesa, ante a retirada da oportunidade de colheita de
depoimentos das testemunhas, impõe-se de rigor a anulação da sentença. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
