Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5147716-96.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
27/05/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 01/06/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADORA RURAL. ART. 143 DA
LEI N.º 8.213/91. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR
AO REQUERIMENTO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- O conjunto probatório é suficiente para ensejar a concessão do benefício vindicado.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
- Deferimento do pedido de tutela provisória de urgência, nos termos dos arts. 300, caput, 302,
inciso I, 536, caput, e 537, todos do Código de Processo Civil, observando-se o REsp n.°
1.734.685 – SP.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5147716-96.2020.4.03.9999
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARIA SILVA ROCHA SIQUIARI
Advogados do(a) APELANTE: ANA CLAUDIA TOLEDO - SP272239-A, CLELIA CONSUELO
BASTIDAS DE PRINCE - SP163569-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5147716-96.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARIA SILVA ROCHA SIQUIARI
Advogados do(a) APELANTE: ANA CLAUDIA TOLEDO - SP272239-A, CLELIA CONSUELO
BASTIDAS DE PRINCE - SP163569-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhadora rural,
prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91.
O juízo a quo julgou improcedente o pedido formulado. Foi interposto o recurso de apelação.
Em 11/06/2018, a e. 8ª Turma deu provimento ao apelo, anulando o decisum, para que a
instrução processual se concluísse, realizando, assim, a audiência de instrução.
Retornados os autos, foi realizada audiência de instrução em 14/02/2019.
Em seguida, foi proferida nova sentença, julgando improcedente o pedido.
A parte autora apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o
cumprimento dos requisitos legais necessários à concessão pretendida, bem como a “tutela
antecipada de urgência para imediata implantação do benefício”. Ao final, prequestiona a
matéria.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5147716-96.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARIA SILVA ROCHA SIQUIARI
Advogados do(a) APELANTE: ANA CLAUDIA TOLEDO - SP272239-A, CLELIA CONSUELO
BASTIDAS DE PRINCE - SP163569-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presente os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL)
O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts.
39, inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91.
Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de
1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha
que a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a
concessão do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único).
Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural
deveria comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do
pedido do benefício.
Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou
para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do
benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família.
Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve
comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.
O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de
Benefícios.
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever
de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício
laboral durante o período respectivo.
Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o
entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício
de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de
25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em
14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos
rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário-mínimo, durante
15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei.
Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006.
Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como
segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a
uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2
(dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na
Lei n.º 11.368/06.
Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu
nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu
art. 2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º
8.213/91, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e,
em seu art. 3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor
equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro
de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991;
II - de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado
por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016
a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a
12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil”.
É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra
permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria
por idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que
de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por
tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício
pretendido", consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo.
Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á
por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da
retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal.
Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa
conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova
testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da
Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça,in verbis:”
"A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para
efeito de obtenção do benefício previdenciário".
DO CASO DOS AUTOS
O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em
27/03/2006, devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 150 meses.
A autora afirma que, “nascida no interior da Bahia/BA, desde criança, exerceu atividades no
campo como rurícola, desenvolvendo ali suas atividades laborais juntamente com o conjunto
familiar”; que “se mudou com a família para o município de Novo Horizonte, passando a residir
na FAZENDA RIO MORTO, onde permaneceu trabalhando na agricultura, mesmo depois de
contrair matrimônio, o que ocorreu no ano de 1972.”
Afirma que nunca deixou de exercer o labor campesino e que “trabalhou bem mais que a
carência exigida, para obtenção do benefício em tela”. Contudo, o INSS indevidamente o
indeferiu, alegando “a não comprovação da carência mínima legal, ainda que de forma
descontínua.”
Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se:
- certidão de casamento, celebrado em 1972, com SEBASTIÃO SIQUIARI, qualificado como
agricultor;
- certidão de nascimento da filha primogênita do casal (ADRIANA SIQUIARI), em 1975, onde
consta a profissão do genitor (Sr. SEBASTIÃO SIQUIARI) como a de lavrador e o local de
nascimento da família na FAZENDA RIO MORTO, integrante da zona rural do município de
Novo Horizonte;
- notas fiscais de produtor rural, emitidas em nome do irmão da requerente (Sr. RANULFO
SILVA ROCHA), comprovando a venda, desde 1984, da produção agrícola (arroz) na
propriedade rural denominada FAZENDA RIO MORTO, integrante da zona rural do município
de Novo Horizonte;
- cópia da documentação trabalhista (“Caderneta de Colono”) emitida em nome do Sr.
RANULFO SILVA ROCHA (irmão da requerente), relativamente aos anos de 1976 a 1982,
comprovando os créditos e dias trabalhados na FAZENDA RIO MORTO – local em que a autora
alega ter passaram grande parte da vida laborativa, bem como sua família;
- cópias de três declarações de exercício de trabalho rural em nome da autora, subscritas em
28/04/2015, respectivamente, pelo Sr. LUIZ FLORES GALINDO e pelo Sr. MAURÍLIO
MOREIRA DA SILVA, nas quais afirmam que a autora prestou labor campesino, juntamente
com seus pais e irmãos, em regime de economia familiar, como “parceiros agrícolas”, na
propriedade rural denominada FAZENDA RIO MORTO, integrante da zona rural do município
de Novo Horizonte, pertencente à família do Sr. LUIZ JUNQUEIRA LOBATO;
- cópia da certidão de transcrição n.º 845 e de matrícula n.º 6228, comprovando que a
propriedade da FAZENDA RIO MORTO, integrante da zona rural do município de Novo
Horizonte é pertencente à família do Sr. LUIZ JUNQUEIRA LOBATO;
- cópia da “DECLARAÇÃO DE EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL n.º 31/2015”, com base na
Instrução Normativa n.º 77/PRES/INSS/2015, subscrita pela requerente e pelo Presidente do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Novo Horizonte, em 28/04/2015, de que a autora
exerceu o trabalho rural como lavradora, no imóvel rural denominado FAZENDA RIO MORTO,
integrante da zona rural do município de Novo Horizonte/SP, de propriedade do Sr. LUIZ
JUNQUEIRA LOBATO e outros.
O referido documento registra que a demandante e sua família trabalhavam na referida fazenda
como “parceiros agrícolas”, juntamente com seus pais e irmãos, em regime de economia
familiar.
A mencionada declaração descreve os seguintes produtos cultivados no referido imóvel rural:
arroz, café, milho, algodão, feijão, horta (verduras em geral), sendo que somente o plantio do
café e do algodão eram destinados à comercialização. Os demais produtos eram destinados à
unidade familiar e, quando havia excedente, também era comercializado.
Ressalte-se que também foi juntada aos autos a cópia do comunicado da decisão administrativa
do INSS, comprovando o indeferimento do benefício vindicado.
Da consulta ao Sistema CNIS da Previdência Social, em nome da autora, não constam registros
de atividades laborativas, o que se coaduna com as alegações da requerente, de que sempre
trabalhou sem registro.
Embora não conste do referido Sistema vínculo da demandante em atividade rural, também não
há registros de atividades urbanas em seu nome.
De acordo com o extrato do CNIS, o falecido cônjuge da requerente (Sr. SEBASTIÃO
SIQUIARI) também exerceu o labor rural.
Cumpre mencionar que a jurisprudência admite a extensão da condição à esposa, no
pressuposto de que o trabalho desenvolvido pela mulher, diante da situação peculiarmente
difícil no campo, se dê em auxílio a seu cônjuge e aos familiares, visando aumento de renda
para obter melhores condições de sobrevivência.
E é de sabença comum que, vivendo na zona rural, a família trabalha em mútua colaboração,
reforçando a capacidade laborativa, de modo a alcançar superiores resultados, retirando da
terra o seu sustento.
Nesse sentido, julgado da 8.ª Turma deste E. Tribunal, do qual se extrai:
“PREVIDENCIÁRIO. RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE. PROVA DOCUMENTAL E
TESTEMUNHAL SUFICIENTES. REQUISITOS SATISFEITOS. PERÍODO DE CARÊNCIA
CUMPRIDO. DESNECESSIDADE DE CONTRIBUIÇÕES.
- Início de prova escrita corroborada pela prova testemunhal justifica o reconhecimento do
exercício de atividade rural para efeito de aposentadoria por idade.
- Documentos de identificação da autora, nascida em 11.06.1961.
- Certidão de nascimento da autora em 11.06.1961, qualificando o pai e a mãe como
lavradores.
- Certidão de casamento em 24.09.1990, qualificando o marido como lavrador.
- Certidão de nascimento do filho em 29.12.1982, qualificando o pai como agricultor. Anotado o
óbito em 22.03.2005.
- Certidão de óbito do filho em 22.03.2005, qualificando o pai como lavrador.
- Certidões de nascimento dos outros filhos em 03.08.1991 e 14.09.1992, qualificando o marido
como lavrador.
- CTPS do marido da autora, constando vínculos em atividade rural, nos períodos de
16.01.2002 a 17.11.2009, e a partir de 02.08.2010 (sem data de saída).
- Comunicado do indeferimento do pedido de aposentadoria por idade, segurado especial,
formulado na via administrativa em 13.06.2016.
- A Autarquia juntou consulta efetuada ao sistema Dataprev, não constando vínculos
empregatícios da autora, e que recebe pensão por morte desde 28.09.2005, ramo atividade
comerciário. Em nome do marido da autora, consta que requereu aposentadoria rural por idade,
que foi indeferida. Também trouxe a inicial de ação judicial da autora pleiteando pensão por
morte do filho.
- As testemunhas conhecem a autora há muito tempo e confirmam seu labor rural.
- A orientação pretoriana é no sentido de que a qualificação de lavrador do marido, constante de
certidão emitida pelo registro civil, é extensível à esposa, constituindo-se em início razoável de
prova material da sua atividade rural.
- A autora juntou início de prova material de sua condição de lavradora, o que corroborado pelo
depoimento das testemunhas, que são firmes em confirmar que sempre trabalhou no campo,
justifica a concessão do benefício pleiteado.
- Não há qualquer notícia no sistema DATAPREV, que tenha desenvolvido atividade urbana.
- A autora apresentou registros cíveis que qualificam o marido como lavrador, e é possível
estender à autora a condição de lavrador do marido, bem como dos testemunhos que
confirmam seu labor no campo, comprovam a atividade rural pelo período de carência
legalmente exigido.
- A autora trabalhou no campo, por mais de 15 anos. É o que mostra o exame da prova
produzida. Completou 55 anos em 2016, tendo, portanto, atendido às exigências legais quanto
à carência, segundo o art. 142 da Lei nº 8.213/91, por prazo superior a 180 meses.
- O termo inicial deve ser mantido na data da comunicação do indeferimento administrativo em
17.08.2016, conforme fixado na sentença. Entendimento de que o termo inicial deve ser fixado
na data do requerimento administrativo (13.06.2016), pois representa o momento em que a
Autarquia tomou conhecimento do pleito, não é possível no caso, pois não houve insurgência
da parte autora.
- Com relação aos índices de correção monetária e taxa de juros de mora, deve ser observado
o julgamento proferido pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso
Extraordinário nº 870.947, bem como o Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado.
- Nas ações de natureza previdenciária, a verba deve ser fixada em 10% do valor da
condenação, até a sentença (Súmula nº 111 do STJ).
- Apelação do INSS parcialmente provida.”
(TRF3, AC 5038619-35.2018.4.03.9999, Rel. Des. Fed. DIVA MALERBI, 8.ª Turma, j.
07/05/2019).
Insta salientar que o extrato da consulta ao Sistema Único de Benefícios – MPAS/INSS revela
que a autora recebe o benefício previdenciário de pensão por morte do marido desde
07/03/2000, constando como ramo de atividade: rural (ID n.º 122909995 - Pág. 17).
Nesse aspecto, o Enunciado n.º 188 FONAJEF: “O benefício concedido ao segurado especial,
administrativamente ou judicialmente, configura início de prova material válida para posterior
concessão aos demais integrantes do núcleo familiar, assim como ao próprio beneficiário”
(Aprovado no XIV FONAJEF-g.n.).
Cabe salientar a existência de prova oral. A audiência foi realizada no dia 14/02/2019 perante o
MM. Juízo da 1.ª Vara da Comarca de Novo Horizonte, Estado de São Paulo. O áudio e vídeo
de todos os depoimentos foram captados e gravados em arquivo na mídia.
As testemunhas declararam que conhecem a parte autora há bastante tempo e confirmam o
alegado labor rural.
Da oitiva das mídias constantes dos autos, é possível verificar que a testemunha FRANCISCO
DE ASSIS CALIXTO que declarou conhecer a Autora há mais de 40 anos.
Informou que o depoente trabalhou por muitos anos com Maria, na FAZENDA RIO MORTO e
por muitos anos também “levou a turma”, que incluía a demandante, para prestarem serviços
em outras fazendas.
Relatou que a lavradora e sua família trabalhavam juntos e que cultivavam de tudo: milho,
arroz, algodão, tomate, etc.
Por sua vez, a testemunha LUCIANA PEREIRA DA SILVA informou que conhece a autora há
40 anos e que trabalhou com ela por muitos anos. Esclareceu que, depois de longo período, a
depoente se mudou para a cidade e foi trabalhar em uma empresa, mas que pode afirmar que,
apesar de não trabalhar mais junto com Maria, sempre a via vestida como trabalhadora rural,
indo trabalhar como lavradora.
Por fim, a testemunha BENEDITO APARECIDO MATOS afirmou ter sido vizinho da casa da
autora na FAZENDA RIO MORTO.
Relatou que suas famílias (do depoente e da demandante) eram vizinhas na referida Fazenda e
que mesmo depois que ele se mudou para a cidade, continuou vendo sempre a Sra. Maria indo
trabalhar na roça, e que foram muitos e muitos anos assim.
Indagado pelo Juízo, informou que desconhecia se Maria exerceu outra profissão que não a de
trabalhadora rural, pois sempre a viu assim, trabalhando como lavradora e cultivando muitos
produtos, como algodão e tomate.
Diante dessas considerações, constata-se que, na presente hipótese, a prova testemunhal
produzida favorece o pleito autoral, sendo coesa e harmônica no que tange à prestação do
trabalho rural pelo interregno necessário à concessão do benefício requerido.
Ressalte-se que o Colendo Superior Tribunal de Justiça estabeleceu, no julgamento do RESP
n.º 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva, a
necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente
anterior ao implemento do requisito etário.
Oportuno mencionar o seguinte trecho do voto do Excelentíssimo Ministro MAURO CAMPBELL
MARQUES, relator do referido RESP n.º 1.354.908/SP, in verbis:
“(...) O conteúdo da norma contida no art. 143, segundo a lição de Daniel Machado da Rocha e
José Paulo Baltazar Junior, é assistencial, compatibiliza dentro de um regime previdenciário, a
proteção social na velhice para os trabalhadores rurais que estavam expressamente excluídos
do regime da Lei 3.807/1960, consoante inciso II do art. 3º, porquanto vinculados ao regime
assistencial dos trabalhadores rurais - FUNRURAL- que não reclamava o recolhimento de
contribuições, porém, em contrapartida, tinha contornos protetivos muito reduzidos.
(...) A aposentadoria por idade do segurado especial é uma das preocupações das autoridades
governamentais em matéria de previdência social, em face da suposta facilidade em requerer
benefício sem que tenha havido de fato trabalho nesta condição.
Por outro lado, os segurados especiais em atividade, por ocasião da Lei de Benefícios, em 24
de Julho de 1991, foram dispensados do recolhimento das contribuições relativas ao exercício
do trabalho no campo, substituindo a carência pela comprovação do efetivo desempenho do
labor agrícola, de acordo com o art. 26, I e art. 39, I, da Lei 8.213/1991.
No caso em exame, a parte autora completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade em 25 de
maio de 2007, devendo, assim, comprovar 156 (cento e cinquenta e seis) meses de atividade
rural, nos termos dos arts. 142 e 143 da Lei 8.213/1991, para obtenção do benefício.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que, diante da
dificuldade do segurado especial na obtenção de prova escrita do exercício de sua profissão, o
rol de documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, inscrito no art. 106,
parágrafo único, da Lei 8.213/1991, é meramente exemplificativo, e não taxativo, sendo
admissíveis outros documentos além dos previstos no mencionado dispositivo, inclusive que
estejam em nome de membros do grupo familiar ou ex-patrão. (...)
O início de prova material do exercício de atividade rural nem sempre se refere ao período
imediatamente anterior ao requerimento da aposentadoria rural por idade. E este entendimento
restou sedimentado no julgamento do recurso representativo da controvérsia REsp
1.348.633/SP.
Ademais, o fato de a autora ter trabalhado como empregada doméstica não descaracteriza sua
condição de segurada especial, posto que exercido em períodos de entressafra. Neste ponto, a
própria Lei 8.213/1991, em seu art. 48, § 2º c/c art. 12, § 13, da Lei 8.212/1991, garante o
cômputo do período em que o trabalhador rural se encontre em período de entressafra ou do
defeso, não superior a 120 (cento e vinte) dias.
Ainda, o trabalho urbano exercido pelo cônjuge da ora recorrida junto à Prefeitura, por si só, não
descaracteriza a condição de segurado especial da parte autora. Neste ponto, confira-se o
Recurso Especial Repetitivo 1.304.479/SP.
No caso em exame, a segurada completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade em 25 de maio
de 2007, devendo, assim, comprovar, segundo tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991, 156 (cento
e cinquenta e seis) meses de atividade rural, para obtenção do benefício.
A problemática do caso está no reconhecimento do benefício de aposentadoria por idade rural
àquele segurado especial que nos moldes do art. 143 da Lei 8.213/1991 não mais trabalhava no
campo no período em que completou a idade mínima, considerando que a Lei não especifica o
que deve ser entendido como período imediatamente anterior ao do requerimento do benefício.
(...) Isto porque, afastando-se da atividade campesina antes do implemento da idade mínima
para a aposentadoria, o segurado especial deixa de fazer jus ao benefício previsto no art. 48 da
Lei 8.213/1991.
Nesse tipo de benefício releva justamente a prestação do serviço agrícola às vésperas da
aposentação ou, ao menos, em momento imediatamente anterior ao preenchimento do requisito
etário, o que não aconteceu.
Em verdade, é relevante o fato de a parte autora ter parado de trabalhar no campo antes de
preencher o requisito etário. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no art. 48, § 1º, da Lei
8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade como rural, sem ter atendido a
regra de carência, não fará jus à aposentadoria rural pelo descumprimento de um dos dois
únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito.
(...) A norma visa agraciar exclusivamente aqueles que se encontram, verdadeiramente, sob a
regra de transição, isto é, trabalhando em atividade rural, quando do preenchimento da idade.
(...) A regra, hoje, é assim: no dia em que o segurado especial completar a idade legal deverá
ter preenchido o tempo de carência contido na tabela do art. 142 conjugado com o art. 143 da
Lei 8.213/1991, para se aposentar.
Por conseguinte, fica assentada a tese, para fins de recurso especial repetitivo de que, o
segurado especial tem que estarlaborando no campo, quando completar a idade mínima para
se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a
hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua
aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os
requisitos carência e idade.” (g.n.).
Confira-se, ainda, o relevante trecho do pronunciamento da Excelentíssima Ministra
ASSUSETE MAGALHÃES, ao proferir voto-vista na egrégia 1.ª Sessão do Colendo STJ,
quando do julgamento desse RESP n.º 1.354.908/SP, acompanhando o relator, in verbis:
“Concordo, assim, com o eminente Relator, quando concluiu que, para fazer jus ao benefício de
aposentadoria por idade, previsto no art. 143 da Lei 8.213/91, o beneficiário deve estar
laborando no campo, quando implementar o requisito etário, quando poderá requerer o
benefício.
Faço, porém, uma observação: a interpretação literal do art. 143 da Lei 8.213/91 não pode
excluiro direito daquele que, implementados, no exercício da atividade rural, ambos os
requisitos para a aposentadoria por idade nele prevista, incorporou tal direito ao seu patrimônio,
por força da regra geral do direito adquirido. Se, naquele momento em que implementados os
requisitos para a aposentadoria por idade, o beneficiário deixa de requerê-la, poderá fazê-lo
posteriormente, porquanto o exercício de um direito não se confunde com a sua aquisição,
como advertem Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Junior:
"Mais uma vez, uma interpretação literal de um preceito legal revela-se insuficiente para a
compreensão global do enunciado normativo veiculado. Sem dúvida que estamos em face de
uma regra cunhada para viger temporariamente, mas quando o preceito normativo dispõe que
'pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário-mínimo, durante quinze anos',
ele deve ser compreendido como uma regra aplicável para o trabalhador rural que comprovar o
exercício de atividade rural, pelo período necessário e imediatamente anterior ao implemento da
idade, durante 15 anos, porquanto o exercício de um direito não se confunde com a sua
aquisição".
Aliás, esta é a conclusão que se extrai do julgamento da 3.ª Seção do STJ, na Petição
7.476/PR, quando registra que, "se ao alcançar a faixa etária exigida pelo art. 48, § 1º da Lei n.
8.213/91, o segurado especial deixar de exercer atividade como rurícola sem ter atendido a
regra de carência, não fará jus à aposentação rural pelo descumprimento de um dos dois únicos
critérios legalmente previstos para a aquisição do direito" (DJe de 25/04/2011).”
No caso em tela, a carência para o benefício ora vindicado abrange o interregno de 150 meses,
tendo em vista que a parte autora completou a idade mínima em 27/03/2006.
Diante dessas considerações, constata-se que, na presente hipótese, a prova testemunhal
produzida favorece o pleito autoral, sendo coesa e harmônica no que tange à prestação do
trabalho rural pelo interregno necessário à concessão do benefício requerido.
É dispensável que o início de prova material abranja todo o período de carência, contanto que a
prova testemunhal amplie sua eficácia probatória. Assim:
"PREVIDENCIÁRIO – RECURSO ESPECIAL – RECONHECIMENTO DE TEMPO DE
SERVIÇO RURAL - PROVA TESTEMUNHAL CORROBORADA POR INÍCIO DE PROVA
DOCUMENTAL.
- A exigência legal para a comprovação da atividade laborativa rural resulta na prova
testemunhal, corroborada por um início razoável de prova documental, ainda que constituída
por dados do registro civil, certidão de casamento, ou qualquer documento que mereça fé
pública.
- No caso em exame, o autor apresentou certidão expedida pelo Registro de Imóveis da
Comarca de Paulo de Faria, Estado de São Paulo (fls. 17/20), que comprova a existência da
"Fazenda Figueira", e que se harmoniza com os depoimentos testemunhais demonstrando o
exercício da atividade rurícola do autor, sem registro e contemporâneo ao período que pretende
ver reconhecido.
- Precedentes desta Corte.
- Recurso conhecido e desprovido."
(REsp 422.095/SP, rel. Min. JORGE SCARTEZZINI, DJ de 23/09/2002 – g.n.)
De rigor, portanto, o deferimento do benefício, porquanto comprovado o exercício de atividade
rural pelo período de carência legalmente exigido.
A aposentadoria corresponde ao valor de um salário-mínimo mensal, nos termos do art. 143 da
Lei n.º 8.213/91.
O termo inicial do benefício previdenciário deve retroagir à data do requerimento administrativo,
de acordo com a previsão contida no inciso II do art. 49 da Lei n.º 8.213/91. Na ausência de
demonstração do requerimento, o termo inicial deve retroagir à data da citação, ocasião em que
a autarquia tomou conhecimento da pretensão.
No caso, existe comprovação de requerimento, devendo o termo inicial ser nele fixado
(20/04/2015).
Devida a gratificação natalina, nos termos preconizados no art. 7.º, inciso VIII, da Constituição
da República.
Quer seja em relação aos juros moratórios, devidos a partir da citação, momento em que
constituído o réu em mora; quer seja no tocante à correção monetária, incidente desde a data
do vencimento de cada prestação, há que prevalecer tanto o decidido, sob a sistemática da
repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do
Ministro Luiz Fux, quanto o estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para
Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião da execução do julgado, observada a
rejeição dos embargos de declaração no âmbito do julgamento em epígrafe, em 03/10/2019.
Nos termos do art. 4.º, inciso I, da Lei Federal n.º 9.289/1996, o INSS está isento do pagamento
de custas processuais nas ações de natureza previdenciária ajuizadas nesta Justiça Federal,
assim como o está naquelas aforadas na Justiça do estado de São Paulo, por força do art. 6.º
da Lei Estadual n.º 11.608/2003, c. c. o art. 1.º, § 1.º, da mesma Lei n.º 9.289/1996,
circunstância que não o exime, porém, de arcar com as custas e as despesas processuais em
restituição à parte autora, em decorrência da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Já no que diz respeito às ações propostas perante a Justiça do estado de Mato Grosso do Sul,
as normativas que tratavam da aludida isenção (Leis Estaduais n.º 1.135/91 e n.º 1.936/98)
restaram revogadas a partir da edição da Lei Estadual n.º 3.779/09 (art. 24, §§ 1.º e 2.º), pelo
que, nos feitos advindos daquela Justiça Estadual, de rigor a imposição à autarquia
previdenciária do pagamento das custas processuais, exigindo-se o recolhimento apenas ao
final da demanda, caso caracterizada a sucumbência.
À vista do quanto disposto no art. 85 do Código de Processo Civil, sendo o caso de sentença
ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado na liquidação do julgado, com
observância ao disposto no inciso II do § 4.º, c. c. o § 11, ambos do art. 85 do CPC, bem como
no art. 86 do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência
(STJ, Súmula 111). Na hipótese em que a pretensão do segurado somente seja deferida em
sede recursal, a verba honorária incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão ou
acórdão, em atenção ao disposto no § 11 do art. 85 do CPC.
Quanto ao prequestionamento suscitado, saliente-se inexistir contrariedade alguma a legislação
federal ou a dispositivos constitucionais.
Defiro o pedido de tutela provisória de urgência, nos termos dos arts. 300, caput, 302, inciso I,
536, caput, e 537, todos do Código de Processo Civil, observando-se os efeitos do decidido no
âmbito do Recurso Especial n.° 1.734.685 – SP (2018/0082173-0), para determinar ao INSS a
imediata concessão da prestação em causa, tendo em vista a idade avançada da parte autora e
o caráter alimentar do benefício.
Posto isso, dou provimento à apelação, para reformar a sentença e julgar procedente o pedido
formulado, fixando os critérios dos consectários e determinando a incidência de verba honorária
nos termos da fundamentação, supra.
O benefício é de aposentadoria por idade de trabalhadora rural, no valor de um salário-mínimo,
com DIB em 20/04/2015.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADORA RURAL. ART. 143
DA LEI N.º 8.213/91. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO
ANTERIOR AO REQUERIMENTO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- O conjunto probatório é suficiente para ensejar a concessão do benefício vindicado.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
- Deferimento do pedido de tutela provisória de urgência, nos termos dos arts. 300, caput, 302,
inciso I, 536, caput, e 537, todos do Código de Processo Civil, observando-se o REsp n.°
1.734.685 – SP. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, deferindo o pedido de tutela provisória de
urgência, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
