D.E. Publicado em 29/01/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO AUTORAL, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0031927-81.2013.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação da parte autora tirada de sentença que, em autos de concessão de aposentadoria por idade, com aproveitamento de tempos de trabalho rural e urbano, julgou improcedente o pedido inicial (fls. 34/35).
Em seu recurso, pugna a promovente pela reforma da decisão combatida, ao argumento de existência de início de prova material da atividade rurícola, corroborada por prova testemunhal harmônica, a ensejar o reconhecimento do labor rural que, aliado ao trabalho urbano desempenhado, leva à concessão do almejado beneplácito. Requer a antecipação dos efeitos da tutela (fls. 38/45).
Sem contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal.
Foi proferida decisão monocrática que deu provimento ao recurso autoral para reformar a sentença e julgar procedente o pedido (fls. 65/70). Interposto agravo pelo INSS (fls. 73/79), a este foi dado provimento, por maioria, sob o fundamento de que "ausente a necessária predominância da atividade rural, a ensejar o enquadramento do demandante na regra excepcional da aposentadoria por idade 'híbrida', uma vez que os lapsos temporais exercidos pelo autor em ambas as categorias (rural e urbano), em certa medida, se equivalem. Para além disso, não restou cumprido o requisito da imediatidade para a concessão da benesse, considerando que o início da prova da atividade rural se limita ao ano de 1973, tendo sido ilidido no ano de 1986, ocasião em que, repita-se, o autor ingressou no mercado de trabalho urbano e, nele permaneceu por longo período" (fls. 90/96).
A autoria opôs Embargos Infringentes (fls. 98/109), os quais não foram admitidos (fl. 121), desafiando a interposição de Agravo (fls. 124/125), o qual restou improvido (fls. 131/136).
O requerente interpôs Recurso Especial (fls. 142/153), não admitido pela Vice-Presidência desta E. Corte (fls. 157/159). Interposto Agravo (fls. 161/167), foi o Recurso Especial recebido pelo E. STJ, segundo o qual "o Tribunal de origem deu provimento ao recurso da autarquia baseando-se apenas na inexistência de predominância de atividade rural, o que, segundo a jurisprudência desta Corte de justiça, é irrelevante. Desta feita, necessário se faz o retorno dos autos ao Tribunal de origem, a quem é dada a análise das circunstâncias fáticas da causa, a fim de que seja analisado se houve comprovação de labor rural ou não". Nessa toada, determinou o E. STJ que esta E. Corte Regional examine "as provas dos autos para verificar se a parte recorrente pode ter reconhecido o período de maio de 1973 até dezembro de 1986 como atividade rural" (fls. 180/184). Consequentemente, se faz jus ao benefício postulado.
VOTO
A modalidade de jubilamento postulado pela autoria vem consagrado no § 3º do artigo 48 da Lei nº 8.213/91, na dicção da Lei nº 11.718/2008, e é, tradicionalmente, denominado híbrido ou misto, haja vista a permissão legislativa quanto à contagem de tempo desempenhado em mister rural, em consórcio a outros interstícios contributivos atinentes a categorias de segurado diversas, de sorte a adimplir, com referido somatório, o lapso de carência, delimitado a partir da aplicação da tabela progressiva constante do artigo 142 da Lei nº 8.213/91. Quanto ao quesito etário, remanesce assinalado em 65 anos (homem) e 60 anos (mulher).
Ao prever tal espécie de aposentação, teve o legislador ordinário por fito salvaguardar os interesses dos exercentes de ofício rural que, em sua jornada profissional, de forma transitória ou permanente, vieram a galgar ocupações distintas, notadamente de natureza urbana, circunstância que, eventualmente, empecer-lhes-ia a outorga de aposentadoria por idade de trabalhador rural, relegando-os a verdadeiro limbo jurídico, à constatação de que desempenharam labor urbano por expressivo lapso temporal ou bem teriam abandonado a atividade campestre antes do atingimento etário ou da vindicação da benesse. É-lhes propiciada, nessa medida, a contabilização do tempo laboral desenvolvido no campo, ainda que de forma descontínua, conjugando-o ao afazer urbano, na busca do atendimento à carência legal. Desimporta, aqui, investigar-se do predomínio de atividades rurais no histórico laboral do requerente do benefício; tampouco, apurar-se se, quando da dedução do requerimento, o solicitante ainda estava a labutar no campo.
Vale ponderar, ainda, que, ao contrário do que sucede na aposentadoria por idade de trabalhador rural, na modalidade híbrida encontra aplicabilidade o artigo 3º, § 1º, da Lei nº 10.666/2003, mercê do qual a perda da qualidade de segurado, anteriormente ao atingimento da idade exigida, não é de molde a obstar a outorga do benefício, contanto que seja alcançada a carência exigida. Precedente deste Tribunal nesse diapasão: AC 00038436520164039999, Relator DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO, TRF3, SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 23/06/2016.
Quanto à demonstração do labor rural, há de se operar à luz dos contornos arraigados na jurisprudência, tais os seguintes:
- é suficiente à demonstração do labor rural início de prova material (v.g., documentos expedidos por órgãos públicos que contemplem a qualificação rurícola da parte autora, não sendo taxativo o rol de documentos previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal coesa e harmônica, sendo inservível a tal finalidade prova exclusivamente testemunhal (Súmula STJ 149), inclusive para os chamados "boias-frias" (REsp nº 1.321.493/PR, apreciado na sistemática do art. 543-C do CPC);
- são extensíveis à mulher, a partir da celebração do matrimônio ou do limiar da união estável, os documentos em que os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores (v.g., STJ, AGARESP 201402280175, Relatora Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJE 11/12/2014);
- possível o reconhecimento de tempo de serviço rural antecedente ou ulterior ao princípio de prova documental apresentado, desde que ratificado por testemunhos idôneos (STJ, REsp nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).
- indisputável a existência de início de prova material contemporâneo a, quando menos, quinhão do período rural por testificar-se (v. Súmula TNU 34; cf., também, RESP 201200891007, Relator Min. HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, DJE 19/12/2012, apreciado sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, donde se colhe ser dispensável que o princípio de prova documental diga respeito a todo o interregno a comprovar, admitindo-se que aluda, apenas, à parcela deste);
- tratando-se de aposentadoria híbrida, despiciendo quer o recolhimento de contribuições previdenciárias relativamente ao tempo rural invocado pela autoria, à moda do que sucede em sede de aposentadoria por idade de trabalhador rural (RESP nº1497086/PR, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 06/04/2015), quer a demonstração do exercício da labuta campesina ao tempo da oferta do requerimento administrativo do benefício (AgRg no RESP 1.497.086/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, STJ - Segunda Turma, DJe 06/04/2015; RESP 201300429921, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, STJ - Segunda Turma, DJe 10/09/2014).
Ao caso dos autos, pois.
A parte autora, nascida em 24/04/1942 (fl. 11), adimpliu o requisito etário em 2007, incumbindo-lhe demonstrar o exercício de atividades rurícola e urbana por, no mínimo, 156 meses.
Há nos autos cópia da CTPS do autor (fls. 14/15), corroborada pela cópia do CNIS coligida à fl. 16, contendo registros de vínculos empregatícios de natureza urbana nos períodos de 20/12/1986 a 28/02/1997 e 01/08/1997 a 01/09/1997.
Ademais, no intuito de denotar a labuta campesina desenvolvida, o demandante juntou Certidão de Casamento, ocorrido em 05/05/1973, em que exsurge qualificado como "lavrador" (fl. 13).
As testemunhas Manoel Laurêncio de Oliveira (fl. 22), Leonidas Luiz da Cruz (fl. 23) e Sebastião Oliveira da Cruz (fl. 24) afirmaram conhecer o autor há, respectivamente, 50 e 40 anos, historiando que este se mudou para Atibaia apenas em 1986. Informaram que anteriormente a tal data, o requerente laborava nas terras de seu pai, em Minas Gerais, nas lavouras de mandioca, feijão, milho e arroz.
Por aí vai-se vendo que os testigos ouvidos, coesos e harmônicos quanto à prestação de trabalho rural pelo requerente, permitem concluir pelo desempenho dessa atividade, aproximadamente, entre 1963 e 1986. Remarque-se a existência de vestígio documental do trabalho rural, a refutar a arguição vertida pela autarquia securitária, no sentido de que o reconhecimento da atividade agrícola escora-se em prova exclusivamente testemunhal.
Agregando-se o lapso de labor rural ora reconhecido aos demais interregnos de serviço que ecoam dos elementos carreados aos autos, ressai que a suplicante reúne tempo superior ao legalmente reclamado, sendo de rigor a acolhida do pleito inicial e, de conseguinte, a reforma da sentença de improcedência.
De acordo com o entendimento esposado pela jurisprudência dominante, o termo inicial do benefício deve ser fixado a partir da citação (Nesse sentido: AC 00250164820164039999, Nona Turma, Relator Juiz Convocado Rodrigo Zacharias, e-DJF3 judicial 10/10/2016; AC 00413601720104039999, Nona Turma, Relator, Desembargador Federal Gilberto Jordan, e-DJF3 judicial 11/07/2016).
Passo à análise dos consectários.
Sobre os valores em atraso, incidirão juros e correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
Deve o INSS arcar com os honorários advocatícios em percentual a ser definido na fase de liquidação, nos termos do inciso II do § 4º do artigo 85 do NCPC, observando-se o disposto nos §§ 3º, 5º e 11 desse mesmo dispositivo legal e considerando-se as parcelas vencidas até a data da decisão concessiva do benefício (Súmula n. 111 do STJ).
Quanto às custas processuais, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, nos termos das Leis Federais n. 6.032/74, 8.620/93 e 9.289/96, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/85 e 11.608/03 (Estado de São Paulo). Contudo, tal isenção não exime a Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
De sorte que a r. decisão recorrida, alinhada à jurisprudência daquela Corte Superior, deve ser reformada, dando-se provimento à irresignação autoral, nos moldes do art. 932, inc. V, do NCPC.
Finalmente, em consulta ao CNIS, observa-se que o vindicante percebe amparo social ao idoso, desde 08/04/2014. Assim, cabe atentar ao disposto no art. 20, § 4º, da Lei nº 8.742/93, que veda a cumulação com qualquer outro benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória, devendo ser facultada ao demandante, no âmbito administrativo, a opção pelo benefício mais vantajoso, abatendo-se valores já recebidos.
Ante o exposto, voto por DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, PARA REFORMAR A SENTENÇA E JULGAR PROCEDENTE O PEDIDO, concedendo-lhe o benefício de aposentadoria híbrida, a partir da citação, e explicitando os critérios de incidência de juros e correção monetária, abatidos eventuais valores já recebidos.
Em atenção a expresso requerimento da autoria, e considerando tratar-se de verba de caráter alimentar, consociada à idade da parte autora, antecipo a tutela de urgência, nos termos dos artigos 300, caput, e 536 do NCPC, determinando ao INSS a imediata implantação do benefício.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal Relatora
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Data e Hora: | 13/12/2017 16:08:37 |