Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5027311-02.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
22/04/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 25/04/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. CÔMPUTO DE ATIVIDADE RURAL E
URBANA. MODALIDADE HÍBRIDA.
I- Ressente-se do pressuposto de admissibilidade a apelação interposta sem que haja algum
proveito prático a ser alcançado, com o que fica afastado o interesse recursal.
II- Os requisitos para a concessão da aposentadoria por idade, na modalidade "híbrida",
compreendem a idade (60 anos, se mulher e 65 anos, se homem) e o cumprimento da carência,
computando-se períodos de atividades rural e urbana, devendo, no entanto, haver predominância
de labor rural, tendo em vista que o benefício previsto no § 3º do art 48 da Lei nº 8.213/91
destina-se ao trabalhador rural.
III- Tratando-se de comprovação de tempo de serviço, é indispensável a existência de início
razoável de prova material da atividade rural, contemporânea à época dos fatos, corroborada por
coerente e robusta prova testemunhal.
IV- O Colendo Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento no sentido de que é possível
o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo acostado aos
autos como início de prova material, desde que amparado por prova testemunhal idônea.
V- O C. STJ possui diversos julgados no sentido de que o Recurso Especial Representativo de
Controvérsia acima mencionado autorizou o reconhecimento do tempo de serviço rural não
apenas relativamente ao período anterior ao documento mais antigo, mas também posterior à
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
prova material mais recente, desde que amparado por prova testemunhal robusta.
VI- No caso concreto, o acervo probatório permite o reconhecimento da atividade rural no período
de 7/2/67 (data em que a autora completou 12 anos de idade) a 31/12/00. Ressalva-se que, a
atividade rural reconhecida no período anterior à Lei nº 8.213/91, não poderá ser utilizado para
fins de carência, e que o período posterior à mencionada Lei só poderá ser utilizado para os fins
específicos previstos no art. 39, inc. I, da Lei de Benefícios, tal como determinado na R. sentença.
VII- A legislação, ao vedar o trabalho infantil, tem por escopo proteger o menor, não podendo ser
utilizada em prejuízo do trabalhador, motivo pelo qual é possível o reconhecimento da atividade
rural a partir dos 12 anos de idade.
VIII- In casu, observa-se que a sentença foi julgada parcialmente procedente, apenas para
reconhecer o exercício da atividade rural, ficando afastado eventual cunho condenatório, motivo
pelo qual a R. sentença não está sujeita ao duplo grau obrigatório. Quadra ressaltar,
adicionalmente, que o valor de 1.000 salários mínimos não seria atingido, ainda que fossemos
considerar o valor atribuído à causa.
IX- Apelação do INSS conhecida em parte e parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5027311-02.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA APARECIDA NASCIMENTO XAVIER
Advogado do(a) APELADO: TAKESHI SASAKI - SP48810-N
APELAÇÃO (198) Nº 5027311-02.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA APARECIDA NASCIMENTO XAVIER
Advogado do(a) APELADO: TAKESHI SASAKI - SP48810-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à concessão de
aposentadoria por idade, mediante a conjugação de períodos de atividades rural e urbana
(modalidade híbrida).
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, “para declarar como efetivo exercício da
atividade de trabalhador rural, pela autora, o período compreendido entre 1965 a 2000,
assegurando, em consequência, a contagem desse tempo como de efetivo serviço, cumprindo ao
réu fornecer à autora, uma vez transitada esta em julgado, a respectiva Certidão de Tempo de
Serviço, ficando ressalvado que: (a) o período anterior ao início da vigência da Lei 8.213/91 esta
isento de contribuições, mas não pode ser considerado para efeito de carência; e (b) o período
reconhecido posterior à vigência da Lei 8.213/91 está condicionado ao pagamento das
contribuições previdenciárias respectivas” (fls. 81/81). Por fim, reconheceu a sucumbência
recíproca.
Inconformada, apelou a autarquia sustentando, inicialmente, a necessidade de sujeição da
sentença ao duplo grau de jurisdição. No mérito, pleiteia a reforma da R. sentença.
Subsidiariamente, requer a incidência da correção monetária e dos juros de mora nos termos do
art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09, bem como a redução dos
honorários advocatícios.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5027311-02.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA APARECIDA NASCIMENTO XAVIER
Advogado do(a) APELADO: TAKESHI SASAKI - SP48810-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): No que tange à
apelação do INSS, devo ressaltar, inicialmente, que a mesma será parcialmente conhecida, dada
a falta de interesse em recorrer relativamente aos consectários legais, uma vez que a R. sentença
apenas tem cunho declaratório. Como ensina o Eminente Professor Nelson Nery Júnior ao tratar
do tema, "O recorrente deve, portanto, pretender alcançar algum proveito do ponto de vista
prático, com a interposição do recurso, sem o que não terá ele interesse em recorrer" (in
Princípios Fundamentais - Teoria Geral dos Recursos, 4.ª edição, Revista dos Tribunais, p. 262).
Passo ao exame do recurso, relativamente à parte conhecida.
Dispõe o art. 48 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 11.718/08, in verbis:
"A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei,
completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de
trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea 'a' do inciso I, na
alínea 'g' do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo
exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei.
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º
deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição
sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco)
anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
(...)"
Da leitura dos §§ 1º e 2º acima transcritos, depreende-se que o trabalhador rural, ao completar 60
(sessenta) anos, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher, tem direito à
aposentadoria por idade desde que comprove o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de
forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício (ou
implemento do requisito etário, conforme jurisprudência pacífica sobre o tema), por tempo igual
ao número de meses de contribuição correspondente à carência, observada a tabela constante
do art. 142 da Lei nº 8.213/91. Cumpre ressaltar, adicionalmente, que a Terceira Seção do C.
Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Incidente de Uniformização - Petição nº 7.476/PR,
firmou posicionamento no sentido de que o § 1º do art. 3º da Lei nº 10.666/03 dirige-se apenas ao
trabalhador urbano.
No que tange ao disposto no § 3º, se o trabalhador rural não comprovar o exercício de atividade
no campo no período imediatamente anterior ao requerimento da aposentadoria (ou implemento
do requisito etário) e nem possuir o tempo de atividade rural equivalente à carência, poderá valer-
se dos períodos de contribuição da atividade urbana para aposentar-se. Nessa hipótese, o
requisito etário é majorado para 65 (sessenta e cinco) e 60 (sessenta) anos, respectivamente,
homem e mulher.
Considero relevante transcrever, a propósito, trechos da "Exposição de Motivos" da Medida
Provisória nº 410/07, a qual foi convertida na Lei nº 11.718/08, que inseriu diversas alterações na
Lei nº 8.213/91, especialmente, no referido art. 48:
"(...) No mencionado art. 143 da Lei nº 8.213, de 1991, foi estabelecida regra de transição, até 24
de julho de 2006, para assegurar a esses trabalhadores o acesso aos benefícios. Esperava-se
que nesse tempo houvesse mudança do comportamento dos empregadores da área rural quanto
à formalização das relações do trabalho. No entanto, a situação de informalidade no setor não
mudou. (...) Agrava a situação o fato de as contratações serem, em sua maioria, para serviços de
curta duração.
6. Vossa Excelência é conhecedor de toda a problemática e, também, dos esforços envidados por
parte destes Ministérios para conscientizar o empregador da área rural da importância da
formalização das relações do trabalho no campo. Não obstante os esforços despendidos, na
prática, pouco se avançou e esses trabalhadores, já bastante sacrificados pelo tipo e condições
de trabalho, não podem ficar sem amparo previdenciário. (...)
23. São essas, em síntese, Senhor Presidente, as razões que nos levam a submeter o presente
anteprojeto de medida provisória, que, em merecendo acolhida, atenderá aos reclamos de uma
parcela significativa de trabalhadores e produtores rurais." (grifos meus)
Verifica-se, dessa forma, que o motivo pelo qual a Lei nº 8.213/91 sofreu diversas alterações (por
força da MP nº 410, convertida na Lei nº 11.718/08) foi justamente a preocupação em proteger os
trabalhadores rurais, cujas contratações eram feitas sem nenhum registro formal e, em sua
maioria, para serviços de curta duração.
Ressalte-se que a verdadeira razão de ser da lei foi a de dar proteção normativa ao trabalhador
rural (e não ao trabalhador urbano), motivo pelo qual a aposentadoria por idade "híbrida", prevista
no § 3º do art. 48 da Lei de Benefícios, deve ser concedida àqueles que exerceram atividade
predominantemente rural, mas que por alguns períodos foram obrigados a trabalhar em atividade
urbana para sobreviver, não constituindo óbice à concessão da aposentadoria o fato de a última
atividade exercida pelo segurado não ter sido de natureza rural.
Não fosse assim interpretado o dispositivo legal, teríamos a esdrúxula situação de conceder a
aposentadoria a alguém que permaneceu todo o tempo no campo, sem nunca ter recolhido uma
única contribuição previdenciária, em detrimento daquele que a vida toda laborou no campo mas
passou a exercer atividade urbana, de caráter contributivo, pouco tempo antes de completar a
idade exigida em lei.
Quadra mencionar que o período de carência encontra-se previsto no art. 142 da Lei nº 8.213/91,
sendo que o tempo de atividade rural poderá ser considerado para tal fim, consoante
jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
"AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR
IDADE. TRABALHADOR RURAL. CARÊNCIA. MODALIDADE HÍBRIDA. POSSIBILIDADE.
1. Os trabalhadores rurais que não satisfazem a condição para a aposentadoria prevista no art.
48, §§ 1° e 2°, da Lei de Benefícios podem computar períodos urbanos, pelo art. 48, § 3°, que
autoriza a carência híbrida.
2. Por essa nova modalidade, os trabalhadores rurais podem somar, para fins de apuração da
carência, períodos de contribuição sob outras categorias de segurado, hipótese em que não
haverá a redução de idade em cinco anos, à luz do art. 48, § 3º, da Lei n. 8.213/91.
3. A jurisprudência da Segunda Turma desta Corte tem decidido que o 'segurado especial que
comprove a condição de rurícola, mas não consiga cumprir o tempo rural de carência exigido na
tabela de transição prevista no artigo 142 da Lei 8.213/1991 e que tenha contribuído sob outras
categorias de segurado, poderá ter reconhecido o direito ao benefício aposentadoria por idade
híbrida, desde que a soma do tempo rural com o de outra categoria implemente a carência
necessária contida na Tabela, não ocorrendo, por certo, a diminuição da idade' (REsp
1.497.837/RS Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 26/11/2014).
4. O Tribunal de origem decidiu que a segurada comprovou os requisitos da idade, bem como
tempo de labor rural e urbano apto à concessão do benefício de aposentadoria por idade no valor
mínimo, nos termos dos arts. 48, § 3º, e 143 da Lei de Benefícios.
Agravo regimental desprovido."
(STJ, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, j. 10/3/15, v.u., DJe 13/3/15, grifos meus)
Com relação à comprovação do labor no campo, o C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o
Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.348.633-SP, firmou posicionamento no
sentido de ser possível o reconhecimento do "tempo de serviço rural mediante apresentação de
um início de prova material sem delimitar o documento mais remoto como termo inicial do período
a ser computado, contanto que corroborado por testemunhos idôneos a elastecer sua eficácia"
(Primeira Seção, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, por maioria, j. 28/08/2013, DJe
05/12/14). O E. Relator, em seu voto, deixou consignada a regra que se deve adotar ao afirmar:
"Nessa linha de compreensão, mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural
anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal,
colhida sob o contraditório."
Dessa forma, depreende-se que os requisitos para a concessão da aposentadoria por idade
"híbrida" compreendem a idade (60 anos, se mulher e 65 anos, se homem) e o cumprimento da
carência, computando-se períodos de atividades rural e urbana, devendo, no entanto, haver
predominância de labor rural, tendo em vista que o benefício previsto no § 3º do art 48 da Lei nº
8.213/91 destina-se ao trabalhador rural.
Passo à análise do caso concreto.
Inicialmente, em que pese a MM.ª Juíza a quo ter reconhecido o labor rural e determinado a
expedição da respectiva certidão, observo que a demandante não é funcionária pública, mas sim
segurada vinculada ao Regime Geral da Previdência Social.
Outrossim, tendo em vista a ausência de recurso interposto pela parte autora, verifico que a
questão ainda controversa restringe-se ao reconhecimento da atividade rural exercida sem
registro em CTPS, no período de 1965 a 2000.
A parte autora, nascida em 7/2/55, para comprovar o labor rural acostou aos autos as cópias dos
seguintes documentos:
1) Documento escolar em nome da autora, referente à década de 60, qualificando seu pai como
lavrador e indicando domicílio na zona rural;
2) Certidão de casamento da demandante, celebrado em 22/5/76, qualificando a autor como
“prendas domésticas” e seu marido como “motorista”;
3) Certidão de nascimento do filho da requerente, registrado em 1977, qualificando seu marido
como lavrador;
4) Ficha do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Mirandópolis em nome do pai da autora,
constando sua admissão em 1975 e pagamento de mensalidades até maio de 2000;
5) Certidão de casamento do pai da demandante, qualificando-o como lavrador;
6) CTPS do pai da autora, com registros como trabalhador rural entre os anos de 1980 e 1994;
7) CTPS da mãe da requerente, com registro como trabalhadora rural nos período de julho a
outubro de 1992;
8) Documentos imobiliários em nome de terceiros e
9) CTPS do marido da demandante, com registro como trabalhador rural entre os anos de 1970 a
1977.
Os documentos supramencionados qualificando os pais e o marido da autora como trabalhadores
rurais constituem inícios razoáveis de prova material para comprovar a condição de rurícola da
requerente.
Por sua vez, todas as testemunhas foram unânimes em afirmar que conhecem a autora desde
sua infância e que a mesma já exercia atividade rural (sistema audiovisual).
Os documentos considerados como início de prova material, somados aos depoimentos
testemunhais, formam um conjunto harmônico apto a demonstrar que a parte autora exerceu
atividades no campo, no período de 7/2/67 (data em que a autora completou 12 anos) a 31/12/00.
Ressalvo que, a atividade rural reconhecida no período anterior à Lei nº 8.213/91, não poderá ser
utilizado para fins de carência, e que o período posterior à mencionada Lei só poderá ser utilizado
para os fins específicos previstos no art. 39, inc. I, da Lei de Benefícios, tal como determinado na
R. sentença.
No que tange ao reconhecimento do trabalho exercido a partir dos 12 (doze) anos de idade,
cumpre transcrever os dispositivos da Constituição Federal de 1967 (art. 158, inc. X) e da
Emenda Constitucional n.º 1 de 1969 (art. 165, inc. X), que tratam da matéria, in verbis:
"Art 158 - A Constituição assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, além de outros que,
nos termos da lei, visem à melhoria, de sua condição social:
(...)
X - proibição de trabalho a menores de doze anos e de trabalho noturno a menores de dezoito
anos, em indústrias insalubres a estes e às mulheres;"
"Art. 165. A Constituição assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, além de outros que,
nos termos da lei, visem à melhoria de sua condição social:
X - proibição de trabalho, em indústrias insalubres, a mulheres e menores de dezoito anos, de
trabalho noturno a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de doze anos;"
Da leitura dos dispositivos acima transcritos, verifica-se que surgiu a previsão constitucional da
atividade laborativa para os maiores de 12 (doze) anos de idade, motivo pelo qual, havendo prova
do trabalho exercido, deve ser reconhecido o tempo de serviço efetivamente realizado.
O C. Superior Tribunal de Justiça, em 23/6/08, no julgamento da Ação Rescisória nº 3.629-RS, no
qual se discutia o direito de a autora averbar o trabalho rural a partir da data em que completou
12 anos de idade (2/5/1965a 31/1/77), julgou procedente o pedido formulado "para desconstituir o
acórdão proferido no REsp 600.666/RS, mantendo aquele proferido pelo Tribunal Regional
Federal da 4ª Região, no julgamento da Apelação Cível 2000.04.01.113950-0/RS, e confirmando
o direito ao cômputo do trabalho rural, a partir de 02/05/65, sem recolhimento de contribuições
previdenciárias." Asseverou a E. Relatora, em seu voto: "(...) é preciso salientar que já é pacífico
nas Turmas integrantes da Terceira Seção do STJ o entendimento de que, comprovada a
atividade rural do trabalhador menor, a partir dos seus 12 anos, em regime de economia familiar,
esse tempo deve ser computado para fins previdenciários. A justificar tal medida, amparando-se
no princípio da universalidade da cobertura da Seguridade Social, deve-se partir da ideia de que a
proibição do trabalho ao menor de 14 anos foi estabelecida em benefício do menor e não em seu
prejuízo." Nesse sentido: AREsp. nº 315.764, Relator Ministro Benedito Gonçalves, decisão
monocrática proferida em 26/6/15, DJe 4/8/15 e REsp. nº 1.397.928, Relator Mauro Campbell
Marques, decisão monocrática proferida em 28/8/13, DJe 3/9/13.
Por derradeiro, o § 3º do art. 496 do CPC, de 2015, dispõe não ser aplicável a remessa
necessária "quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e
líquido inferior a: I) 1.000 (mil) salários mínimos para a União e as respectivas autarquias e
fundações de direito público".
No tocante à aplicação imediata do referido dispositivo, peço vênia para transcrever os
ensinamentos do Professor Humberto Theodoro Júnior, na obra "Curso de Direito Processual
Civil", Vol. III, 47ª ed., Editora Forense, in verbis:
"A extinção da remessa necessária faz desaparecer a competência do tribunal de segundo grau
para o reexame da sentença. Incide imediatamente, impedindo o julgamento dos casos
pendentes. É o que se passa com as sentenças condenatórias dentro dos valores ampliados pelo
§ 3º do art. 496 do NCPC para supressão do duplo grau obrigatório. Os processos que versem
sobre valores inferiores aos novos limites serão simplesmente devolvidos ao juízo de primeiro
grau, cuja sentença terá se tornado definitiva pelo sistema do novo Código, ainda que proferida
anteriormente à sua vigência." (grifos meus)
In casu, observo que a sentença foi julgada parcialmente procedente, apenas para reconhecer o
exercício da atividade rural, ficando afastado eventual cunho condenatório, motivo pelo qual a R.
sentença não está sujeita ao duplo grau obrigatório.
Quadra ressaltar, adicionalmente, que o valor de 1.000 salários mínimos não seria atingido, ainda
que fossemos considerar o valor atribuído à causa.
Ante o exposto, não conheço de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, dou-lhe
parcial provimento, para limitar o reconhecimento da atividade rural ao período de 7/2/67 a
31/12/00.
É o meu voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. CÔMPUTO DE ATIVIDADE RURAL E
URBANA. MODALIDADE HÍBRIDA.
I- Ressente-se do pressuposto de admissibilidade a apelação interposta sem que haja algum
proveito prático a ser alcançado, com o que fica afastado o interesse recursal.
II- Os requisitos para a concessão da aposentadoria por idade, na modalidade "híbrida",
compreendem a idade (60 anos, se mulher e 65 anos, se homem) e o cumprimento da carência,
computando-se períodos de atividades rural e urbana, devendo, no entanto, haver predominância
de labor rural, tendo em vista que o benefício previsto no § 3º do art 48 da Lei nº 8.213/91
destina-se ao trabalhador rural.
III- Tratando-se de comprovação de tempo de serviço, é indispensável a existência de início
razoável de prova material da atividade rural, contemporânea à época dos fatos, corroborada por
coerente e robusta prova testemunhal.
IV- O Colendo Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento no sentido de que é possível
o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo acostado aos
autos como início de prova material, desde que amparado por prova testemunhal idônea.
V- O C. STJ possui diversos julgados no sentido de que o Recurso Especial Representativo de
Controvérsia acima mencionado autorizou o reconhecimento do tempo de serviço rural não
apenas relativamente ao período anterior ao documento mais antigo, mas também posterior à
prova material mais recente, desde que amparado por prova testemunhal robusta.
VI- No caso concreto, o acervo probatório permite o reconhecimento da atividade rural no período
de 7/2/67 (data em que a autora completou 12 anos de idade) a 31/12/00. Ressalva-se que, a
atividade rural reconhecida no período anterior à Lei nº 8.213/91, não poderá ser utilizado para
fins de carência, e que o período posterior à mencionada Lei só poderá ser utilizado para os fins
específicos previstos no art. 39, inc. I, da Lei de Benefícios, tal como determinado na R. sentença.
VII- A legislação, ao vedar o trabalho infantil, tem por escopo proteger o menor, não podendo ser
utilizada em prejuízo do trabalhador, motivo pelo qual é possível o reconhecimento da atividade
rural a partir dos 12 anos de idade.
VIII- In casu, observa-se que a sentença foi julgada parcialmente procedente, apenas para
reconhecer o exercício da atividade rural, ficando afastado eventual cunho condenatório, motivo
pelo qual a R. sentença não está sujeita ao duplo grau obrigatório. Quadra ressaltar,
adicionalmente, que o valor de 1.000 salários mínimos não seria atingido, ainda que fossemos
considerar o valor atribuído à causa.
IX- Apelação do INSS conhecida em parte e parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu não conhecer de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, dar-lhe
parcial provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
