
| D.E. Publicado em 02/05/2017 |
EMENTA
- A aposentadoria por idade de rurícola exige idade mínima de 60 anos (homem) e 55 anos (mulher), bem assim comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência da benesse, conforme tabela progressiva, de cunho transitório, inserta no art. 142 da Lei nº 8.213/91, a ser manejada conforme o ano de implementação do requisito etário, ficando afastada a obrigatoriedade de contribuições.
- Imprescindibilidade de concomitância temporal - ainda que ínfima - entre a data do documento indiciário do afazer rurícola e o interstício de atividade rural necessário à concessão da benesse. Precedente do C. STJ, em sede de recurso repetitivo (RESP 201200891007).
- A parte autora implementou o requisito etário em 23/7/2001, tendo sido colacionado, aos autos, princípio de prova material do labor rural, contemporâneo ao lapso reclamado ao deferimento da benesse.
- No entanto, a prova oral produzida é vaga em ponto crucial, porquanto a aposentadoria pleiteada vincula-se à comprovação do desempenho de atividade rural, quando menos, por ocasião da ultimação do requisito etário, o que não ocorreu na hipótese em tela.
- Apelação da parte autora desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0010715-96.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação da parte autora tirada de sentença que, em autos de concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural, julgou improcedente o pedido inicial (fl. 49).
Em seu recurso, pugna, o promovente, pela reforma da decisão combatida, ao argumento de existência de início de prova material da atividade rurícola, corroborada por prova testemunhal harmônica (fls. 55/64).
Sem contrarrazões (fl. 65 verso), subiram os autos a este Tribunal.
É o Relatório.
VOTO
A aposentadoria por idade de rurícola exige idade mínima de 60 anos (homem) e 55 anos (mulher), bem assim comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência da benesse, conforme tabela progressiva, de cunho transitório, inserta no art. 142 da Lei nº 8.213/91, a ser manejada conforme o ano de implementação do requisito etário, ficando afastada a obrigatoriedade de contribuições. Findo o período de vigência da norma de transição, imperioso aplicar-se a regra permanente estampada no art. 48 e parágrafos do mesmo diploma, na dicção da Lei nº 11.718/2008, fincada, nesse particular, a exigência de demonstração do exercício de labor rural por 180 meses (carência da aposentadoria por idade).
Muito se debateu a respeito da comprovação da atividade rural para efeito de concessão do aludido benefício e, atualmente, reconhece-se na jurisprudência elenco de posicionamentos assentados sobre o assunto, a nortear apreciação das espécies e a valoração dos respectivos conjuntos probatórios. Dentre esses entendimentos, podem-se destacar os seguintes:
(i) é suficiente à demonstração do labor rural início de prova material (v.g., documentos expedidos por órgãos públicos que contemplem a qualificação rurícola da parte autora, não sendo taxativo o rol de documentos previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal coesa e harmônica, sendo inservível a tal finalidade prova exclusivamente testemunhal (Súmula STJ 149), inclusive para os chamados "boias-frias" (REsp nº 1.321.493/PR, apreciado na sistemática do art. 543-C do CPC);
(ii) são extensíveis à mulher, a partir da celebração do matrimônio ou do limiar da união estável, os documentos em que os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores (v.g., STJ, AGARESP 201402280175, Relatora Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJE 11/12/2014)
(iii) não se enquadra como princípio documental certidão recente da Justiça Eleitoral, preenchida de acordo com informações fornecidas pelo próprio postulante do jubilamento, assemelhando-se, portanto, à singela declaração unilateral de atividade profissional (e.g., TRF3, AC 00160584920114039999, Relator Juiz Convocado Valdeci dos Santos, Décima Turma, e-DJF3 01/07/2015; AC 00025385620104039999, AC 1482334, Relatora Desembargadora Federal Tania Marangoni, Oitava Turma, e-DJF3 16/04/2015).
(iv) o afastamento do ofício rural, após o preenchimento de todos os requisitos exigidos à aposentadoria, não interfere em sua concessão, sendo, contudo, inaplicável aos rurícolas o estatuído no art. 3º, da Lei nº 10.666/2003 (STJ, PET nº 7.476/PR, 3ª Seção, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 13/12/2010, Rel. p/ acórdão Min. Jorge Mussi; AgRg no REsp nº 1.253.184, 5ª Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 06/09/2011; AgRg no REsp nº 1.242.720, 6ª Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Junior, j. 02/02/2012; REsp nº 1.304.136, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamim, j. 21/02/2013, DJe 07/03/2013), sob pena, inclusive, de se atribuir aos trabalhadores rurais regime híbrido em que se mesclariam as vantagens típicas dos campesinos e outras inerentes exclusivamente aos obreiros urbanos;
(v) possível o reconhecimento de tempo de serviço rural antecedente ou ulterior ao princípio de prova documental apresentado, desde que ratificado por testemunhos idôneos (STJ, REsp nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).
A despeito de toda evolução exegética a respeito da matéria, certo é que alguns pontos permaneceram polêmicos por anos e apenas recentemente experimentaram pacificação. Talvez o maior deles diga respeito, justamente, à necessidade de demonstração da labuta rural no período imediatamente anterior ao requerimento da benesse.
Respeitáveis posições recusavam uma resposta apriorística do que viesse a se entender pela expressão período imediatamente anterior, sob o argumento de que a solução da controvérsia passa por acurado estudo de cada caso concreto, com destaque à cronologia laboral da parte autora, a fim de definir se verdadeiramente se está diante de pessoa que dedicou sua vida profissional às lides rurais.
Sem embargo, o dissenso acabou desfechado pelo c. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia, in verbis:
No mesmo sentido:
Da análise dos entendimentos jurisprudenciais coletados, penso que a concessão da aposentadoria por idade de trabalhador rural há de se atrelar à comprovação do desempenho de labor rural quando da propositura da ação, da formulação do requerimento administrativo ou, ao menos, por ocasião do atingimento do requisito etário, como, de resto, textualmente deliberado por esta E.Corte em paradigma da Terceira Seção:
Outra temática remanesce polêmica à atualidade, mormente na seara desta egrégia Corte, e diz com a necessidade de contemporaneidade do início de prova material amealhado a, quando menos, uma fração do período exigido pela lei para a outorga do benefício.
Muito embora reconheça postura algo hesitante deste Tribunal - que, muita vez, vem relativizando o atendimento dessa exigência, principalmente naquelas espécies em que o histórico laborativo rural da parte impressiona, permitindo divisar que na maior parte de sua jornada trabalhista a parte dedicou-se veramente aos ofícios campestres - tenho por certo que o egrégio STJ vem consagrando a imprescindibilidade de concomitância temporal - ainda que ínfima - entre a data do documento indiciário do afazer rurícola e o interstício de atividade rural necessário à concessão da benesse.
Seguem arestos nesse diapasão:
Esposando o mesmo raciocínio, a Súmula 34 da TNU, verbis:
A propósito, tenho que a condicionante resulta, de certo modo, enaltecida em recurso repetitivo emanado do c. STJ. Vale constatar, num primeiro lanço, o seguinte aresto, exarado sob o rito do art. 543-C do CPC/1973:
Ora bem, da leitura da ementa retrotranscrita, ressai cristalino ser dispensável que o princípio de prova documental diga respeito a todo o período a comprovar-se: admite-se que aluda, apenas, à parcela deste. Equivale, pois, a afirmar-se que o princípio deve reportar-se ao menos a um quinhão do intervalo laborativo a ser comprovado. E, em ação de aposentadoria por idade rural, o que deve ser demonstrado é justamente o lapso dito de carência, vale dizer, a labuta campesina no período imediatamente anterior à vindicação do benefício, pois, sem isso, não há benesse a deferir-se.
Destarte, à luz dos julgados do c. STJ e da linha exegética acima, inclino-me pela simultaneidade, ainda quando diminuta, entre os documentos ofertados e o interregno laboral necessário à outorga do beneplácito.
Postas as balizas, passa-se ao exame do caso dos autos.
De pronto, verifica-se o cumprimento pela parte autora do requisito etário em 23/7/2001 (fl. 18), incumbindo-lhe, pois, demonstrar atividade campestre por 120 meses.
A título de início de prova documental, o proponente colacionou cópia de anotação de vínculos empregatícios em CTPS, vendo-se que atuou como trabalhador rural nos períodos de 11/8/1987 a 20/8/1987; 21/8/1987 a 22/01/1988; 02/02/1988 a 01/5/1988; 05/5/1993 a 19/7/1993; 02/8/1993 a 07/12/1993 e 16/02/1994 a 08/10/1994 (fls. 20/23), e, em um dos intervalos, exerceu a função de auxiliar de cozinha, de 14/4/1989 a 01/8/1989 (fl. 21).
A anotação em CTPS é prova plena do labor campestre, no lapso nela indicado, e funciona como vestígio de prova no que concerne ao restante do interregno a ser comprovado, sendo apta, em linha de princípio, a amparar o trabalho agrícola no intervalo necessário, desde que ratificada por prova oral coesa e harmônica.
Acerca da possibilidade de referido documento fazer as vezes de início de prova material, impende conferir os seguintes julgados deste Tribunal:
AC 00145693520154039999, Relator DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, TRF3, SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 03/03/2016: |
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. REQUISITOS NÃO DEMONSTRADOS. 1. No caso em questão, a parte autora apresentou os seguintes documentos: I) Certidão de casamento, celebrado em 28/10/72, na qual o marido foi qualificado como lavrador; II) Certidão de óbito do marido, falecido em 26/03/2009, na qual também foi qualificado como lavrador; III) Cópia da sua CTPS, na qual constam os seguintes vínculos: de 01/03/90 a 11/03/92, como ajudante de lavoura, 01/04/97 a 21/07/97, como doméstica, de 05/01/2004 a 20/01/2004, 08/11/2004 a 10/01/2005, 21/11/2007 a 18/03/2008, no cargo de serviços gerais da agropecuária, de 08/11/2004 a 10/01/2005, como trabalhador rural, 01/06/2007 a 29/06/2007, como safrista; IV) Cópia da CTPS do marido, na qual constam os seguintes vínculos: de 27/10/79 a 23/08/80, no cargo de "diversos" na Fazenda Santa Maria; de 25/05/84 a 24/09/84, no cargo de serviços diversos da agropecuária. 2. É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira. 3. Assim, as certidões apresentadas constituem início de prova material do labor rural da autora. 4. A CTPS da requerente, com anotação de trabalho no meio rural constitui prova do labor rural do período anotado e início de prova material dos períodos que pretende comprovar. 5. As anotações na CTPS do autor são prova da atividade rural dele nos períodos registrados. 6. No entanto, os extratos do CNIS demonstram que ele recebe aposentadoria por invalidez, como comerciário/contribuinte individual, desde 09/11/2006 (fl. 63), e que a autora recebe pensão em razão da morte dele, como comerciário, desde 26/03/2009 (fl. 61). 7. Além disso, a prova oral apresenta-se insubsistente, pois foi lacônica e evasiva quanto aos períodos efetivamente laborados pela autora nas lides rurais. 8. Assim, o conjunto probatório não foi suficiente para comprovar a atividade rural da autora pelo período necessário para fazer jus ao benefício pleiteado, sendo de rigor a manutenção da sentença. 9. Agravo legal desprovido." (g.n.). |
AC 00542011520084039999, Relatora DESEMBARGADORA FEDERAL LUCIA URSAIA, TRF3, NONA TURMA, e-DJF3 06/07/2011: |
"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL (ART.557, § 1º, DO CPC). APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. BENEFÍCIO DEVIDO. 1. Anotação de contrato de trabalho rural em CTPS constitui início de prova material para instruir pedido de aposentadoria por ela formulado. 2. A prova testemunhal que corrobore início de prova material é suficiente para a comprovação do trabalho rural, nos termos do § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça. 3. A partir da vigência da Lei nº 11.960/09 (30/06/2009), os juros de mora devem refletir a mesma taxa aplicada aos depósitos da caderneta de poupança, por força do seu artigo 5º, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97. 4. Agravo legal provido."(g.n.). |
Presentes as considerações introdutoriamente lançadas, resulta evidenciada a presença, in casu, de princípio de prova documental do labor rural, contemporâneo ao lapso reclamado ao deferimento da benesse (23/7/1991 a 23/7/2001).
Averbe-se que o vínculo de natureza urbana registrado na CTPS do recorrente (de 14/4/1989 a 01/8/1989, cf. fl. 21) não interfere na contagem do tempo de serviço rural, por ser anterior ao início do interregno em que se apura a carência para a aposentadoria postulada. Nesse sentido, o posicionamento da Nona Turma deste E. Tribunal: APELREEX 00051955820164039999, Relator Juiz Convocado Rodrigo Zacharias, e-DJF3 Judicial 16/08/2016; AC 00015403920114036124, Relator Juiz Convocado Rodrigo Zacharias, e-DJF3 Judicial 16/08/2016.
Não obstante, a imprecisão dos testemunhos colhidos impede a outorga do benefício vindicado.
Com efeito, Severino José da Silva (fl. 52), único testigo que conheceu o autor desde 1991, pôde afirmar, somente, que trabalharam "juntos no eucalipto para um rapaz, por cerca de dois a três anos". Que, após, o pretendente saiu para trabalhar no bairro Guararema, em serviços gerais, mas não soube informar até quando, pois ausentou-se da cidade e, quando retornou, ele já não mais trabalhava.
Otília Maria de Jesus Freitas (fl. 51) e Maria de Fátima de Jesus Martins Proença (fl. 53) historiam que, desde que conhecem o apelante, ele sempre trabalhou na roça, tendo parado por problemas de saúde. No entanto, a primeira testemunha conheceu-o, apenas, em 1995, e a segunda, em 1998, de modo que não puderam afiançar o desempenho do alegado labor rural desde 1991.
Veja-se, ademais, que nenhum dos depoentes mostrou-se capaz de declinar os períodos e locais em que o vindicante trabalhou, tampouco quando deixou as lides campesinas.
A prova oral é, portanto, vaga em ponto crucial, porquanto, como dito, a concessão da aposentadoria pleiteada vincula-se à comprovação do desempenho de atividade rural, quando menos, por ocasião da ultimação do requisito etário.
Impõe-se, destarte, a improcedência da pretensão.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, mantendo a sentença recorrida.
É como voto.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal Relatora
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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| Data e Hora: | 17/04/2017 20:07:43 |
