
| D.E. Publicado em 11/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0037953-90.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Cuida-se de apelação interposta pela parte autora em face da r. sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade mista.
Inconformada, a apelante busca a reforma do julgado e a consequente concessão do benefício. Alega que somados os períodos laborados como lavradora - devidamente anotados em sua CTPS - com o trabalhado em atividade urbana, possui um total de carência superior ao mínimo exigido.
Contrarrazões não apresentadas.
Subiram os autos a esta Egrégia Corte, tendo estes sido distribuídos a este relator.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço da apelação, porque presentes os requisitos de admissibilidade do recurso.
Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão de aposentadoria por idade, a qual é regida pelo artigo 48 da Lei n. 8.213/91, cujo teor, após as alterações introduzidas pela Lei n. 11.718/2008, é o seguinte (g. n.):
Consoante se verifica da redação dos §§ 3º e 4º do art. 48 da Lei n. 8.213/91, a Lei n. 11.718/2008 introduziu nova modal idade de aposentadoria por idade, a qual permite ao segurado somar períodos de trabalho rural e urbano para completar o tempo correspondente à carência exigida, desde que alcançado o requisito etário de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. É a denominada aposentadoria por idade híbrida.
Sobre o tema, muitas interpretações surgiram nos tribunais.
Entretanto, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, pautada, sobretudo, na busca de equilíbrio entre as necessidades sociais - decorrentes do fenômeno do êxodo rural - e o Direito, assentou entendimento de que a concessão da aposentadoria híbrida independe da predominância das atividades, tampouco se mostra relevante averiguar o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento.
Confira-se:
No que concerne à prova do exercício da atividade rural, certo é que o legislador exigiu o início de prova material (art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91), no que foi secundado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, quando da edição da Súmula n. 149.
Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei 8.213/91, não significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por meio de documentos, o exercício de atividade na condição de rurícola, pois isto importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade a prova testemunhal para demonstração do labor rural.
Contudo, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar, na forma da súmula nº 34 da TNU.
Admite-se, ainda, a extensão da qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro. Para além, segundo a súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de trabalho rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
Com relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp 207.425, 5ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Pois bem, para a concessão do benefício previdenciário, via de regra, é necessário verificar se a autora preenche os requisitos legais estabelecidos, a saber:
a) contingência ou evento, consistente na idade mínima;
b) período de carência, segundo os artigos 25, II, e 142 da LBPS;
c) filiação, que no caso de aposentadoria por idade urbana é dispensada no momento do atingimento da idade ou requerimento.
A autora, consoante se constata dos documentos colacionados aos autos, cumpriu o requisito etário, em 29/7/2013.
Dessa forma, atende ao requisito da idade de 60 (sessenta e cinco) anos, previsto no artigo 48, caput, da Lei nº 8.213/91.
Quanto ao requisito da carência, a regra geral é o número de 180 (cento e oitenta) contribuições para as aposentadorias, segundo o artigo 25, II, da LBPS.
Já, em relação ao requisito da filiação, o artigo 3º, § 1º, da Lei nº 10.666/2003 dispensou a qualidade de segurado para a concessão da aposentadoria por idade, nos seguintes termos:
"Art. 3o A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial. |
§ 1o Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício. |
(...)" |
Antes mesmo da vigência dessa norma, entretanto, o Superior Tribunal de Justiça já havia firmado o entendimento de que o alcance da idade depois da perda da qual idade de segurado não obsta o deferimento do benefício, desde que satisfeita a carência prevista em lei. Dessa forma, não cabe cogitar aplicação retroativa da Lei n. 10.666/03.
Nessa esteira:
"EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA - PREVIDENCIÁRIO - APOSENTADORIA POR IDADE - PERDA DA QUAL IDADE DE SEGURADO - IRRELEVÂNCIA. 1. Para concessão de aposentadoria por idade , não é necessário que os requisitos exigidos pela lei sejam preenchidos simultaneamente, sendo irrelevante o fato de que o obreiro, ao atingir a idade mínima, já tenha perdido a condição de segurado." (ED em REsp n. 175.265/SP; Rel. Min. Fernando Gonçalves; j. 23/8/2000; v.u.) |
"PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADOR URBANO. APOSENTADORIA POR IDADE . PERDA DA QUAL IDADE DE SEGURADO. ART. 102 DA LEI Nº 8.213/91. 1. A perda da qual idade de segurado não impede a concessão de aposentadoria por idade , desde que atendidos os requisitos da idade mínima e do recolhimento das contribuições previdenciárias devidas. 2. Precedentes. 3. Recurso especial conhecido e provido." (REsp n. 328.756/PR, Rel. Min. Paulo Gallotti, 6ª Turma, DJ 9/12/2002, p. 398) |
Ou seja, os requisitos exigidos pela legislação previdenciária não precisam ser preenchidos, simultaneamente, no caso de aposentadoria por idade, segundo interpretação do artigo 102, § 1º da Lei 8.213/91, in verbis:
"Art. 102. (...). |
§ 1º A perda da qualidade de segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja concessão tenham sido preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos." |
No presente caso, o INSS indeferiu o requerimento administrativo de concessão do benefício porque computou apenas 115 (cento e quinze) meses de contribuições, além de não computar alguns períodos rurais (vide f. 86/92).
A parte autora requer o reconhecimento do tempo de atividade rural desde seus 12 (doze) anos de idade, a fim de ser somada às contribuições previdenciárias, como empregada urbana e contribuinte individual (vide CTPS de f. 72/81 e CNIS de f. 185/186).
Em termos de prova material, consta dos autos os seguintes documentos (vide folhas 14 usque 81):
- certidão de casamento - celebrado em 13/4/1971 - onde está anotada a qualificação de lavrador do marido João Luiz Neto;
- certidões de nascimento dos filhos, nascidos em 1972, 1974, 1977, 1985, nas quais consta a profissão de lavrador do primeiro marido;
- CTPS da autora com a presença de alguns vínculos empregatícios rurais, nos períodos de 13/1/1982 a 21/11/1982; 26/4/1983 a 15/6/1983; 24/3/1988 a 22/6/1988 (f. 17/23).
Todavia, os três depoentes foram genéricos e mal circunstanciados, pois se reportaram genericamente ao trabalho da requerente na roça, em períodos em que ela morou em fazendas nas quais o marido era empregado rural (vide CTPS do companheiro Donizete Aguiar Ribeiro de f. 17/25). Sequer conheciam a apelante na época em morava com seus pais.
As anotações de trabalho do companheiro como trabalhador rural, em fazendas de Adhemar Vicente, Dante Lorencetti, Tereza Flora etc, não podem ser estendidas à autora, na forma da súmula nº 73 do TRF4, dadas as características de pessoalidade e subordinação exigidos na relação de emprego.
Além disso, presentes recibos de entrega da declaração do ITR e escritura de compra e venda de propriedade rural de 3,025 ha, lavrada em 9/2/2004, na qual consta a qualificação de lavrador do companheiro, mas consta a profissão "doméstica", em relação à autora. Trata-se de certidão de épocas não antigas, em que já se tinha o costume de qualificar a real ocupação da mulher.
Todavia, novamente, impossível a qualificação de segurada especial da autora, já que, consoante seu próprio depoimento pessoal, ela nunca trabalhou em tal propriedade.
Assim, joeirado o conjunto probatório, entendo que a faina rural não restou demonstrada. No mesmo sentido: TRF3, APELREE n. 2005.03.99.033686-0/SP, Des. Federal Marisa Santos, 9ª Turma, DJF3 8/10/2010.
Desse modo, irretorquível o julgado.
Com relação à veracidade das informações constantes da CTPS, gozam elas de presunção de veracidade juris tantum.
Assim, conquanto não absoluta a presunção, as anotações nela contidas prevalecem até prova inequívoca em contrário, nos termos do Enunciado n.º 12 do TST.
Embora não conste no CNIS as contribuições referentes a alguns vínculos em CTPS, tal omissão não pode ser imputada à parte autora, pois sua remuneração sempre tem o desconto das contribuições, segundo legislação trabalhista e previdenciária, atual e pretérita.
Assim, a obrigação de verter as contribuições à Previdência Social sempre foi de seu empregador, a teor do que dispõe o atual artigo 30 da Lei n.º 8.212/91.
Diante do princípio da automaticidade, hospedado no artigo 30, I, "a" e "b", da Lei nº 8.212/91, cabe ao empregador descontar o valor das contribuições das remunerações dos empregados e recolhê-las aos cofres da previdência social.
Lamentavelmente, o mercado de trabalho brasileiro não é conhecido pelo respeito aos direitos trabalhistas e previdenciários dos trabalhadores, de modo que a situação vivenciada pela autora é compreensível.
Se o empregador não cumpre tal dever, não pode o segurado sofrer as consequências do descumprimento de tal obrigação legal, consoante entendimento tranquilo da doutrina e da jurisprudência.
Forçoso é reconhecer que, sobre a regra prevista no artigo 19, § 2º, do Decreto nº 3.048/99, prevalece a norma constante do artigo 33, § 5º, da Lei nº 8.212/91, que tem a seguinte dicção:
Noutro passo, a obrigação de fiscalizar o recolhimento dos tributos é do próprio INSS (rectius: da Fazenda Nacional), nos termos do artigo 33 da Lei n.º 8.212/91.
E ressalte-se: tal regra vale tanto para o empregador urbano, como para o rural, ainda que em período anterior à Lei nº. 8.213/91, considerando-se que, no presente caso, a autora foi empregada com registro em CTPS, referente aos seus períodos - como trabalhadora rural - 13/1/1982 a 21/11/1982; 26/4/1983 a 15/6/1983; 24/3/1988 a 22/6/1988.
Entendo que caberia ao INSS comprovar a irregularidade das anotações da CTPS da autora, ônus a que não de desincumbiu nestes autos, notadamente porque as anotações obedeceram à ordem cronológica e não apresentam indícios de adulteração.
Não obstante, diferentemente do entendimento do INSS, o tempo de atividade rural exercido anteriormente à Lei nº 8.213/91 deve ser computado como tempo de carência.
Quanto ao tempo de atividade rural anterior à vigência da Lei nº 8.213/91, prestado com registro em CTPS, acolho o entendimento de que, desde a edição da Lei n.º 4.214/1963, as contribuições previdenciárias, no caso de empregado rural, ganharam caráter impositivo e não facultativo, constituindo obrigação do empregador, o que foi mantido na sistemática da Lei Complementar n.º 11/1971, que criou o Fundo de Assistência do Trabalhador Rural - FUNRURAL (art. 15, inciso II, c.c. os artigos 2.º e 3.º do Decreto-lei n.º 1.146/1970).
Ademais, recentemente, o C. STJ decidiu, em recurso representativo da controvérsia (REsp 1.352.791, art. 543-C do CPC), pela possibilidade de averbação do trabalho rural anterior a 1991, com registro em CTPS, para efeito de carência:
A propósito, veja a seguinte ementa deste egrégio TRF 3ª Região:
Assim, tal pleito constitui ponto a ser apreciado, porquanto o INSS indeferiu o benefício exatamente por falta de cumprimento do requisito da carência, pois deixou de computar os períodos rurais com anotação em CTPS anteriores à Lei nº 8.213/91.
Sendo assim, mesmo computando os períodos rurais anotados em CTPS às contribuições já computadas pelo INSS, indevido o benefício, porque não cumprida a carência de 180 (cento e oitenta) meses.
Deve a r. sentença, assim sendo, ser parcialmente reformada.
Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, condeno ambas as partes a pagar honorários ao advogado da parte contrária, arbitrados em 3% (três por cento) sobre o valor da condenação, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do Novo CPC.
Todavia, em relação à parte autora, fica suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação, somente para determinar ao réu o cômputo, como tempo de carência, dos períodos de trabalho rural da autora, anotados em CTPS, de 13/1/1982 a 21/11/1982; 26/4/1983 a 15/6/1983; 24/3/1988 a 22/6/1988, bem como fixar a sucumbência recíproca.
É o voto.
Juiz Federal Convocado
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