Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5720163-59.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
08/11/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 13/11/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. ARTIGO 48, §§ 3º E 4º DA LEI
N.8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.718/2008. REQUISITOS NÃO
CUMPRIDOS. PROVA MATERIAL EM NOME DO MARIDO. PROVA TESTEMUNHAL FRÁGIL.
CARÊNCIA MÍNIMA NÃO CUMPRIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Os períodos de trabalho rural e urbano podem ser somados para obtenção da carência exigida
para fins de aposentadoria por idade híbrida, desde que alcançado o requisito etário, nos termos
do art. 48, §§ 3º e 4º, da Lei n. 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n. 11.718/2008.
- No cômputo da carência do benefício híbrido é possível contar o tempo de atividade rural
exercida em período remoto e descontínuo, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento de
contribuições (Tema Repetitivo n. 1.007 do STJ).
- A comprovação do exercício da atividade rural deve ser feita por meio de início de prova
material, a qual possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à
sua data de referência, desde que corroborado por robusta prova testemunhal (REsp Repetitivo n.
1.348.633 e Súmula n. 149 do STJ).
- Admite-se como início de prova material documentos indicativos do labor rural do marido.
- A prova testemunhalvagae mal circunstanciada inviabiliza a comprovação dos períodos rurais e
afasta a possibilidade do cômputo desses interstícios para fins de complementar a carência
exigida à aposentadoria por idade mista.
- Cumprido o requisito etário, mas não comprovada a carência mínima exigida pela lei, é indevido
o benefício.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Inversão da sucumbência. Condenação da parte autora ao pagamento de custas processuais e
honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa,
majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do
CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto
processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5720163-59.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUZIA DAS GRACAS RIBEIRO
Advogado do(a) APELADO: JOSE CARLOS GOMES PEREIRA MARQUES CARVALHEIRA -
SP139855-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5720163-59.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUZIA DAS GRACAS RIBEIRO
Advogado do(a) APELADO: JOSE CARLOS GOMES PEREIRA MARQUES CARVALHEIRA -
SP139855-N
R E L A T Ó R I O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal DALDICE SANTANA:Cuida-se de apelação interposta
pelo INSS em face da r. sentença que julgou procedente o pedido para lhe conceder o benefício
de aposentadoria por idade híbrida, a partir do requerimento administrativo, dispensado o
reexame necessário.
Inconformada, a autarquia previdenciária requer a reforma integral do julgado, alegando
precipuamente que o não preenchimento dos requisitos necessários para a concessão do
benefício e fragilidade do início de prova material. Subsidiariamente insurge-se contra juros de
mora e correção, bem como invoca a necessidade de submissão da causa ao reexame
necessário. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Contrarrazões apresentadas.
Subiram os autos a esta Egrégia Corte, tendo sido distribuídos a estarelatora.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5720163-59.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUZIA DAS GRACAS RIBEIRO
Advogado do(a) APELADO: JOSE CARLOS GOMES PEREIRA MARQUES CARVALHEIRA -
SP139855-N
V O T O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: O recurso preenche os pressupostos de
admissibilidade e merece ser conhecido.
Inicialmente, não conheço da remessa oficial, por ter sido proferida a sentença na vigência do
CPC, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação
ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos.
No caso, a toda evidência não se excede esse montante.
Inadmissível, assim, o reexame necessário.
No mais, discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão de aposentadoria
por idade híbrida, prevista no artigo 48, §§ 2º e 3º, da Lei n. 8.213/1991, com a redação dada pela
Lei n. 11.718/2008, que tem o seguinte teor:
“Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
(Redação dada pela Lei nº 9.032/95)
(...)
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º
deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição
sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco)
anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de
acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-
de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-
contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)”
Consoante se verifica nos dispositivos citados, a Lei n. 11.718/2008 introduziu nova modalidade
de aposentadoria por idade, a qual permite ao segurado somar períodos de trabalho rural e
urbano para completar o tempo correspondente à carência exigida, desde que alcançado o
requisito etário de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se
mulher.
Em relação ao período de carência, o artigo 25, inciso II, da Lei n. 8.213/1991, exige o número
mínimo de 180 (cento e oitenta) contribuições mensais, observada a regra transitória disposta em
seu artigo 142 para os segurados já inscritos na Previdência Social na época da entrada em vigor
dessa lei.
Sobre o período rural passível de ser utilizado para completar a carência exigida para a
concessão desse benefício, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao apreciar o Tema Repetitivo
n. 1.007, fixou a seguinte tese:
“O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei
8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria
híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos
termos do art. 48, § 3º da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido
no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito
etário ou do requerimento administrativo.”
Quanto à comprovação do exercício da atividade rural, esta deve ser feita por meio de início de
prova material, a qual possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o
posterior à sua data de referência, desde que corroborado por robusta prova testemunhal (REsp
Repetitivo n. 1.348.633 e Súmula n. 149 do STJ).
No caso concreto, a parte autora cumpriu o requisito etário em 13/4/2013, consoante se constata
nos documentos colacionados aos autos.
Ocorre que a autora não possui tempo bastante de carência.
Quando do requerimento administrativo, apresentado em 16/12/2016, a autarquia federal não
reconheceu o direito ao benefício previdenciário por não ter sido comprovado o efetivo exercício
da atividade rural, ainda que de forma descontínua no período correspondente à carência do
benefício imediatamente anterior ao requerimento ou a data em que implementou a idade exigida
necessária.
A parte autora, nestaação,requer o reconhecimento de tempo de atividade rural, supostamente
realizada nos interstícios de 13/4/1966 a 1º/1/1994, 4/10/1998 a 31/8/2006 e 21/12/2006 a
16/12/2016, a fim de ser somado às contribuições previdenciárias, como empregada urbana, nos
períodos de 2/1/1994 a 3/10/1998 e 1º/9/2006 a 20/12/2006 (vide Carteira de Trabalho e
Previdência Social - CTPS).
Para tanto, no intuito de reforçar sua tese inicial, a autora coligiu aos autos certidões de
nascimento das filhas, nascidas em 1975, 1981, 1987 e 1988, nas quais o cônjuge foi qualificado
como lavrador, bem como CTPS do mesmo com duas anotações de vínculos empregatícios
rurais, nos períodos de 1º/10/1987 a 1º/12/1987 e de 22/1/2004 a 25/2/2004, e uma de urbano,
entre 10/7/2000 a 1º/9/2000. Nada mais.
A certidão eleitoral, embora anote a ocupação do cônjuge de agricultor, não serve para tanto, pois
os servidores da Justiça Eleitoral não diligenciam para aferir a veracidade do ali informado. Tudo
é que consta do documento o cunho meramente declaratório da informação a respeito da
profissão.
Como se vê, a autora não logrou carrear, em nome próprio, indícios razoáveis de prova material
capazes de demonstrar a faina agrária aventada.
O termo de depoimento extraído de processo judicial movido por Francini Aparecida Pimentel
Padilha em face do INSS, no qual a parte autora,então qualificada como trabalhadora rural,foi
ouvida na condição de testemunha, não possui qualquer relevância ou força probatória, porque
fruto de declaração unilateral não desinteressada.
Diferentemente de tempos pretéritos, não é razoável que a parte autora não possua alguma
anotação de vínculo empregatício em sua CTPS, já que alega que trabalhou por vários anos nas
lides rurais.
O próprio cônjuge possui anotações rurais em sua CTPS no período em que a parte autora
deseja comprovar seu labor rural.
Por seu turno, os depoimentos das duas testemunhas foram vagos e mal circunstanciados, já que
trouxeram relatos inconsistentes e superficiais acerca da suposta rotina rural vivenciada pela
parte autora, não sendo seus relatos dotados da robustez necessária para respaldar o
reconhecimento do efetivo exercício de atividade rural nos períodos alegados.
Ei-los à luz da r. sentença
“José Divino Padilha disse que conhece a autora por ser seu vizinho há cerca de 45 anos. Disse
que ela já trabalhava quando se conheceram, como boia-fria, e que chegou a vê-la trabalhando
para terceiros. Acrescentou que, ainda hoje, ela está trabalhando, pois a viu ontem carpindo
mandioca. Tem conhecimento que ela parou um tempo para trabalhar em escola, por
aproximadamente 4 anos, há uns 4 anos atrás, mas depois voltou para a roça. Sabe que ela
trabalhou para o Maurício, Tangerica, Joarez, René, Machado, Pardo, nos bairros do Padilha,
Samuel Bainha, dos Frois, dos Corrêa, todos em volta de Riversul. Os gatos que a levava eram
Edinho, Nenê Baiano, um do Rio Verde que não sabe o nome. Sabe que ela trabalhou com milho,
mandioca, feijão, soja, e que ainda trabalha no bairro Padilha.
Em seguida João Batista Rodrigues disse que conhece a autora do Bairro Padilha há uns 40
anos, e que ela trabalha na roça como boia-fria. O depoente trabalha em propriedade própria, e
que chegou a vê-la trabalhando no feijão, para o Genésio Padilha, Jairo Padilha, Maurício, porque
passa em frente, transitando pelo local. Acrescentou que ela já trabalhava há quarenta anos
atrás, quando a conheceu, e sabe que ela parou duas vezes para trabalhar na escola pela
Prefeitura, por uns 4 anos, e a outra por uns 9 meses, mas, fora isso, sempre trabalhou na roça.
Inclusive, essa semana a viu trabalhando com milho. Vê ela toda semana, sendo que os "gatos"
são Edinho, Darci, Davi, entre outros. Ela chegou a trabalhar nos bairros Barra alegre,
Samambainha, Taboa, entre outros. Ela mora no Padilha, onde chegou a trabalhar também.
Trabalhou em plantações de arroz, feijão, mandioca. Ultimamente, trabalhava para o Jairo
Padilha, próximo ao seu sítio e ao bairro do Padilha. Semana passada estava trabalhando com
milho.”
Note-se que nenhuma das testemunhas efetivamente trabalhou com a requerente.
A prova oral, quanto mais, indica trabalho eventual da autora no meio rural, sem a habitualidade e
profissionalismo necessário à caracterização da sua qualificação profissional como trabalhadora
rural.
Assim, com o não reconhecimento do tempo de atividade rural, torna-se inviável a concessão do
benefício de aposentadoria por idade híbrida, à medida que o tempo de atividade urbana, só por
só, não completa o tempo mínimo de carência exigido no artigo 25, II, da Lei n. 8.213/1991.
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados
em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do CPC,
suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto processual, por
tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, dou provimento à apelação, para julgar improcedente o pedido de concessão
de aposentadoria híbrida.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. ARTIGO 48, §§ 3º E 4º DA LEI
N.8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.718/2008. REQUISITOS NÃO
CUMPRIDOS. PROVA MATERIAL EM NOME DO MARIDO. PROVA TESTEMUNHAL FRÁGIL.
CARÊNCIA MÍNIMA NÃO CUMPRIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Os períodos de trabalho rural e urbano podem ser somados para obtenção da carência exigida
para fins de aposentadoria por idade híbrida, desde que alcançado o requisito etário, nos termos
do art. 48, §§ 3º e 4º, da Lei n. 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n. 11.718/2008.
- No cômputo da carência do benefício híbrido é possível contar o tempo de atividade rural
exercida em período remoto e descontínuo, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento de
contribuições (Tema Repetitivo n. 1.007 do STJ).
- A comprovação do exercício da atividade rural deve ser feita por meio de início de prova
material, a qual possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à
sua data de referência, desde que corroborado por robusta prova testemunhal (REsp Repetitivo n.
1.348.633 e Súmula n. 149 do STJ).
- Admite-se como início de prova material documentos indicativos do labor rural do marido.
- A prova testemunhalvagae mal circunstanciada inviabiliza a comprovação dos períodos rurais e
afasta a possibilidade do cômputo desses interstícios para fins de complementar a carência
exigida à aposentadoria por idade mista.
- Cumprido o requisito etário, mas não comprovada a carência mínima exigida pela lei, é indevido
o benefício.
- Inversão da sucumbência. Condenação da parte autora ao pagamento de custas processuais e
honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa,
majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do
CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto
processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
