Processo
ApReeNec - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO / SP
5634146-20.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
18/12/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 10/01/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. ART. 48, "CAPUT", E § 3º DA LEI
8.213/91. AUXÍLIO-DOENÇA ENTRE PERÍODOS CONTRIBUTIVOS. POSSIBILIDADE DE
CÔMPUTO PARA EFEITO DE CARÊNCIA. ATIVIDADE RURAL E URBANA COMPROVADAS.
CONCOMITANTE EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA OU RURAL COM O IMPLEMENTO DO
REQUISITO ETÁRIO. INEXIGIBILIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO.
1. O benefício de aposentadoria por idade urbana exige o cumprimento de dois requisitos: a)
idade mínima, de 65 anos, se homem, ou 60 anos, se mulher; e b) período de carência (art. 48,
"caput", da Lei nº 8.213/91).
2. Início de prova material, corroborado por prova testemunhal, enseja o reconhecimento do
tempo laborado como trabalhador rural. A atividade rural desempenhada em data anterior a
novembro de 1991 pode ser considerada para averbação do tempo de serviço, sem necessidade
de recolhimento de contribuições previdenciárias.
3. A Lei 11.718, de 20 de junho de 2008, ao introduzir o § 3, do art. 48, do mencionado diploma
legal, permitiu a aposentadoria por idade híbrida, possibilitando a contagem cumulativa do tempo
de labor urbano e rural, para fins de aposentadoria por idade.
4. Em se tratando de aposentadoria por idade híbrida, não se exige a simultaneidade entre o
implemento do requisito etário e o exercício da atividade laborativa, seja esta urbana ou rural.
Precedentes do STJ e desta Corte.
5. Os intervalos de tempo em que o segurado gozou de auxílio-doença, desde que estejam entre
períodos contributivos, devem ser considerados para efeito de carência.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
6. Comprovadas as atividades rurais e urbanas pela carência exigida, e preenchida a idade
necessária à concessão do benefício, faz jus a parte autora ao recebimento da aposentadoria por
idade.
7. Apelação do INSS desprovida. Fixados, de ofício, os consectários legais.
Acórdao
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº5634146-20.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VILMA DO CARMO SOUZA GOTARDO
Advogado do(a) APELADO: JOSE LUIZ GOTARDO - SP176267-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº5634146-20.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VILMA DO CARMO SOUZA GOTARDO
Advogado do(a) APELADO: JOSE LUIZ GOTARDO - SP176267-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação previdenciária
proposta por VILMA DO CARMO SOUZA GOTARDO em face do INSTITUTO NACIONAL DO
SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade
híbrida.
O INSS apresentou contestação.
O pedido foi julgado procedente, determinando-se a imediata implantação do benefício. A
sentença não foi submetida ao reexame necessário.
O INSS interpôs apelação sustentando, em síntese, a improcedência do pedido.
Subsidiariamente, requer a reforma da r. sentença no tocante à fixação dos consectários legais.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº5634146-20.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VILMA DO CARMO SOUZA GOTARDO
Advogado do(a) APELADO: JOSE LUIZ GOTARDO - SP176267-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora a averbação
de atividade rural nos períodos declinados na inicial, com sua somatória à atividade urbana
exercida, e a concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por idade híbrida.
Do cômputo do período em gozo de benefício por incapacidade para efeito de carência.
De acordo com decisões reiteradas desta 10ª Turma, o intervalo de tempo em que a requerente
gozou de auxílio-doença, quando compreendido entre períodos contributivos, deve ser
reconhecido para efeito de carência. Nessa direção: STJ - AgRg no REsp: 1271928/RS
2011/0191760-1, Relator: Ministro Rogerio Schietti Cruz, Data de Julgamento: 16/10/2014, T6 -
Sexta Turma, Data de Publicação: DJe 03/11/2014.
Observo que tal entendimento foi sedimentado pelo Supremo Tribunal Federal, no RE 583835,
com repercussão geral reconhecida, no sentido de que o art. 29, §5º, da Lei nº 8.213/91, constitui
uma exceção à vedação da contagem de tempo ficto de contribuição, e que somente é aplicável
nos casos em que os benefícios por incapacidade são entremeados por períodos contributivos, a
saber:
"CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL.
CARÁTER CONTRIBUTIVO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA.
COMPETÊNCIA REGULAMENTAR. LIMITES.
1. O caráter contributivo do regime geral da previdência social (caput do art. 201 da CF) a
princípio impede a contagem de tempo ficto de contribuição.
2. O § 5º do art. 29 da Lei nº 8.213/1991 (Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS) é
exceção razoável à regra proibitiva de tempo de contribuição ficto com apoio no inciso II do art. 55
da mesma Lei. E é aplicável somente às situações em que a aposentadoria por invalidez seja
precedida do recebimento de auxílio-doença durante período de afastamento intercalado com
atividade laborativa, em que há recolhimento da contribuição previdenciária. Entendimento, esse,
que não foi modificado pela Lei nº 9.876/99.
3. O § 7º do art. 36 do Decreto nº 3.048/1999 não ultrapassou os limites da competência
regulamentar porque apenas explicitou a adequada interpretação do inciso II e do § 5º do art. 29
em combinação com o inciso II do art. 55 e com os arts. 44 e 61, todos da Lei nº 8.213/1991.
4. A extensão de efeitos financeiros de lei nova a benefício previdenciário anterior à respectiva
vigência ofende tanto o inciso XXXVI do art. 5º quanto o § 5º do art. 195 da Constituição Federal.
Precedentes: REs 416.827 e 415.454, ambos da relatoria do Ministro Gilmar Mendes.
5. Recurso extraordinário com repercussão geral a que se dá provimento". (STF,
REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO, RELATOR MIN. AYRES BRITTO DJe-032 DIVULG
13.02.2012 PUBLIC 14-02-2012).
Desse modo, os períodos nos quais a parte autora esteve em gozo de auxílio-doença, por
estarem entremados por períodos contributivos, devem ser computados para efeito de carência.
Da atividade rural.
O tempo de serviço do trabalhador rural exercido antes da data de início de vigência da Lei n.
8.213/1991, é de ser computado e averbado, independentemente do recolhimento das
contribuições correspondentes.
Assim, a comprovação do tempo de serviço, mesmo que anterior à perda da qualidade de
segurado, nos termos do artigo 55, § 3º, da aludida norma legal, produz efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida, porém, a prova exclusivamente testemunhal,
salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito.
É certo que a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que é
insuficiente apenas a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, nos
termos da Súmula 149: (...) A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da
atividade rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário (...).Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA.
CERTIDÃO DE CASAMENTO. MARIDO LAVRADOR. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA
MATERIAL.
1. A comprovação da atividade laborativa do rurícola deve-se dar com o início de prova material,
ainda que constituído por dados do registro civil, como certidão de casamento onde consta à
profissão de lavrador atribuída ao marido da Autora. Precedentes da Terceira Seção do STJ.
2. Recurso especial conhecido em parte e provido (...).(REsp 707.846/CE, Rel. Min. LAURITA
VAZ, Quinta Turma, DJ de14/3/2005).
Importante anotar, contudo, que não se exige que a prova material se estenda por todo o período
de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal amplie a eficácia probatória dos
documentos, como se verifica nos autos. A matéria, a propósito, foi objeto de Recurso Especial
Representativo de Controvérsia:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/91. TEMPO DE
SERVIÇO RURAL. RECONHECIMENTO A PARTIR DO DOCUMENTO MAIS ANTIGO.
DESNECESSIDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONJUGADO COM PROVA
TESTEMUNHAL. PERÍODO DE ATIVIDADE RURAL COINCIDENTE COM INÍCIO DE
ATIVIDADE URBANA REGISTRADA EM CTPS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A controvérsia cinge-se em saber sobre a possibilidade, ou não, de reconhecimento do período
de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova material.
2. De acordo com o art. 400 do Código de Processo Civil "a prova testemunhal é sempre
admissível, não dispondo a lei de modo diverso". Por sua vez, a Lei de Benefícios, ao disciplinar a
aposentadoria por tempo de serviço, expressamente estabelece no § 3º do art. 55 que a
comprovação do tempo de serviço só produzirá efeito quando baseada em início de prova
material, "não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo
de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento" (Súmula 149/STJ).
3. No âmbito desta Corte, é pacífico o entendimento de ser possível o reconhecimento do tempo
de serviço mediante apresentação de um início de prova material, desde que corroborado por
testemunhos idôneos. Precedentes.
4. A Lei de Benefícios, ao exigir um "início de prova material", teve por pressuposto assegurar o
direito à contagem do tempo de atividade exercida por trabalhador rural em período anterior ao
advento da Lei 8.213/91 levando em conta as dificuldades deste, notadamente hipossuficiente.
5. Ainda que inexista prova documental do período antecedente ao casamento do segurado,
ocorrido em 1974, os testemunhos colhidos em juízo, conforme reconhecido pelas instâncias
ordinárias, corroboraram a alegação da inicial e confirmaram o trabalho do autor desde 1967.
6. No caso concreto, mostra-se necessário decotar, dos períodos reconhecidos na sentença,
alguns poucos meses em função de os autos evidenciarem os registros de contratos de trabalho
urbano em datas que coincidem com o termo final dos interregnos de labor como rurícola, não
impedindo, contudo, o reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de serviço,
mormente por estar incontroversa a circunstância de que o autor cumpriu a carência devida no
exercício de atividade urbana, conforme exige o inc. II do art. 25 da Lei 8.213/91.
7. Os juros de mora devem incidir em 1% ao mês, a partir da citação válida, nos termos da
Súmula n. 204/STJ, por se tratar de matéria previdenciária. E, a partir do advento da Lei
11.960/09, no percentual estabelecido para caderneta de poupança. Acórdão sujeito ao regime do
art. 543-C do Código de Processo Civil."(STJ - 1ª Seção, REsp 1.348.622/SP, Rel. Min.
ARNALDO ESTEVES LIMA, j. 23/08/2013).
Ressalto, ainda, que se encontra pacificado no Superior Tribunal de Justiça que a qualificação da
mulher como "doméstica" ou "do lar" na certidão de casamento não descaracteriza sua condição
de trabalhadora rural, uma vez que é comum o acúmulo da atividade rural com a doméstica, de
forma que a condição de rurícola do marido contido no documento matrimonial pode ser
estendida à esposa. Nessa linha, julgados da Corte Superior:
"AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL. INÍCIO DE PROVA
MATERIAL. CERTIDÃO DE CASAMENTO ONDE CONSTA O MARIDO LAVRADOR.
EXTENSÃO DA QUALIDADE DE TRABALHADOR RURAL EM REGIME DE ECONOMIA
FAMILIAR À ESPOSA. PRECEDENTES.
1. Conforme consignado na análise monocrática, consta dos autos a certidão de casamento da
autora com o Sr. Sebastião Maurilio da Silva, já falecido, e lá qualificado como lavrador que,
aliada à prova testemunhal, dão conta do exercício de atividade rural exercido em regime de
economia familiar. Tal fato é reconhecido pela própria Corte.
2. Ora, se o Tribunal de origem reconheceu que há documento público do qual se consta como
profissão do marido da autora lavrador e que houve testemunha para corroborar o depoimento da
recorrente, não poderia ter decidido que "o Plano de Benefícios da Previdência Social, Lei n.º
8.213/91, não admite prova exclusivamente testemunhal para comprovação de tempo de serviço,
dispondo em seu artigo 55, parágrafo 3º, que a prova testemunhal só produzirá efeito quando
baseada em início de prova material." Isto, frise-se novamente, porque há certidão de casamento
onde a profissão de seu falecido esposo como rurícola.
3. Com efeito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que o
documento probante da situação de camponês do marido é extensível à esposa, ainda que
desenvolva tarefas domésticas, ante a situação de campesinos comum ao casal.
4. Saliente-se, por fim, que não há violação do enunciado da Súmula 7/STJ quando a decisão
desta Corte se fundamenta nas próprias premissas traçadas pela Corte de origem para
fundamentar sua decisão.Agravo regimental improvido."(AgRg no REsp 1448931/SP, Rel.
Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/05/2014, DJe 02/06/2014).
No caso vertente, a parte autora anexou aos autos razoável início de prova material,
consubstanciado nos seguintes documentos: i) certidão de casamento dos pais, em que o genitor
é qualificado como lavrador (1966); ii) contrato particular de compromisso de venda e compra de
imóvel rural, em que o esposo figura como promitente comprador de imóvel rural (1995); iii)
cadastro de contribuintes de ICMS em nome do esposo (2012); iv) notas fiscais de compra e
venda de insumos agrícolas (2007/2008).
Cumpre observar que, a exigência de prova documental foi abrandada para o trabalhador
denominado boia-fria, estando atualmente pacificada a compreensão no e. Superior Tribunal de
Justiça, segundo a qual, para demonstrar o exercício do labor rural é necessário um início de
prova material, sendo desnecessária que se refira a todo período de carência, exigindo-se, no
entanto, que a robusta prova testemunhal amplie sua eficácia probatória (REsp nº 1.321.493/PR,
representativo de controvérsia, DJe de 19/12/2012).
Insta realçar, ainda, que eventuais contribuições previdenciárias vertidas pela parte autora não
descaracterizam sua condição de trabalhadora rural, consoante vaticina o art. 25, § 1º, da Lei nº
8.212/91, que permitiu ao segurado especial se inscrever, facultativamente, como contribuinte
individual.
A prova testemunhal produzida em Juízo, por sua vez, corroborou o alegado na exordial, não
remanescendo quaisquer dúvidas quanto ao exercício, pela parte autora, de atividade rural nos
períodos pleiteados.
Assim, ante o conjunto probatório, restou demonstrada a regular atividade rural da parte autora
nos períodos de 30.04.1969 a 30.06.1975 e de 17.10.1995 a 02.05.2017, devendo ser procedida
a contagem de tempo de serviço cumprido nos citados interregnos.
Da aposentadoria por idade híbrida.
A análise da aposentadoria por idade urbana passa, necessariamente, pela consideração de dois
requisitos: a) idade mínima, de 65 anos, se homem, ou 60 anos, se mulher; e b) período de
carência, a teor do disposto no art. 48, caput, da Lei nº 8.213/91:
"A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei,
completar 65 anos de idade, se homem, e 60, se mulher."
Cumpre ressaltar que os registros presentes na Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS
não demandam confirmação judicial, diante da presunção de veracidade relativa de que goza tal
documento. Outrossim, os períodos constantes na planilha CNIS devem ser considerados como
tempo de trabalho incontroverso.
Sublinhe-se, aliás, que o dever de recolhimento das contribuições previdenciárias constitui ônus
do empregador, o qual não pode ser transmitido ao segurado, que restaria prejudicado por
negligente conduta a este não imputável (Nesse sentido: STJ - 5ª Turma, REsp 566405, Rel. Min.
Laurita Vaz, DJ 15/12/2003; TRF - 3ª Região, 2ª Turma, AC 2000.03.99.006110-1, Rel. Des. Fed.
Sylvia Steiner, j. 15/05/2001, RTRF-3ª Região 48/234).
No mais, o tempo de serviço do trabalhador rural contratado por empregador rural exercido antes
da data de início de vigência da Lei n.º 8.213/1991 é de ser computado e averbado,
independentemente do recolhimento das contribuições correspondentes, conforme orientação
firmada pelo E. STJ no julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº
1352791/SP (1ª Seção, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 05/12/2013).
Destaque-se que a perda da condição de segurado não será considerada para efeitos de
concessão do benefício de aposentadoria por idade, consoante se depreende da regra prevista
no art. 3º, §1º, da Lei nº 10.666/03 (Nesse sentido: STJ - 3ª Seção, ERESP 175265, Rel. Min.
Fernando Gonçalves, DJ 23/09/2000; REsp 1412566/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL
MARQUES, Segunda Turma, DJe 02/04/2014).
Assim, comprovado o exercício da atividade pelo prazo determinado na Lei n.º 8.213/1991, bem
como atingida a idade estipulada, as situações fáticas que levam à aquisição de direito a
benefícios previdenciários, mesmo que constituídas anteriormente à sua vigência, subordinam-se
aos seus efeitos jurídicos.
Com efeito, o § 3º, do art. 48, da Lei nº 8.291/91, introduzido pela Lei 11.718, de 20 de junho de
2008, permitiu a aposentadoria por idade híbrida, possibilitando a contagem cumulativa do tempo
de labor urbano e rural, para fins de aposentadoria por idade. Nessa esteira:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR
IDADE HÍBRIDA. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535 DO CPC. NÃO CARACTERIZAÇÃO.
JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. ARTIGO 48, §§ 3º E 4º DA LEI
8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.718/2008. OBSERVÂNCIA. RECURSO
ESPECIAL CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. A Lei 11.718/2008 introduziu no sistema
previdenciário brasileiro uma nova modalidade de aposentadoria por idade denominada
aposentadoria por idade híbrida. 2. Neste caso, permite-se ao segurado mesclar o período urbano
ao período rural e vice-versa, para implementar a carência mínima necessária e obter o benefício
etário híbrido. 3. Não atendendo o segurado rural à regra básica para aposentadoria rural por
idade com comprovação de atividade rural, segundo a regra de transição prevista no artigo 142
da Lei 8.213/1991, o § 3º do artigo 48 da Lei 8.213/1991, introduzido pela Lei 11.718/2008,
permite que aos 65 anos, se homem e 60 anos, mulher, o segurado preencha o período de
carência faltante com períodos de contribuição de outra qualidade de segurado, calculando-se o
benefício de acordo com o § 4º do artigo 48. 4. Considerando que a intenção do legislador foi a
de permitir aos trabalhadores rurais, que se enquadrem nas categorias de segurado empregado,
contribuinte individual, trabalhador avulso e segurado especial, o aproveitamento do tempo rural
mesclado ao tempo urbano, preenchendo inclusive carência, o direito à aposentadoria por idade
híbrida deve ser reconhecido. 5. Recurso especial conhecido e não provido." (REsp 1367479/RS,
Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 04/09/2014, DJe
10/09/2014) - grifo nosso.
Consigne-se, ao ensejo, que em se tratando de aposentadoria por idade híbrida não se exige a
simultaneidade entre o implemento do requisito etário e o exercício da atividade laborativa, seja
esta urbana ou rural. No mais, não há vedação para que o tempo de serviço rural, anterior à Lei n.
8.213/91, seja considerado para efeito de carência, tampouco há exigência de recolhimento das
respectivas contribuições. Nesse diapasão, colaciono os seguintes arestos:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA HÍBRIDA POR IDADE. ART. 48, § 3º, DA LEI N.
8213/91. EXEGESE. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL.
EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL NO MOMENTO QUE ANTECEDE O REQUERIMENTO.
DESNECESSIDADE. CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR À VIGÊNCIA
DA LEI N. 8.213/91 PARA FINS DE CARÊNCIA. POSSIBILIDADE. 1. A Lei 11.718/2008, ao
alterar o art. 48 da Lei 8.213/91, conferiu ao segurado o direito à aposentadoria híbrida por idade,
possibilitando que, na apuração do tempo de serviço, seja realizada a soma dos lapsos temporais
de trabalho rural com o urbano. 2. Para fins do aludido benefício, em que é considerado no
cálculo tanto o tempo de serviço urbano quanto o de serviço rural, é irrelevante a natureza do
trabalho exercido no momento anterior ao requerimento da aposentadoria. 3. O tempo de serviço
rural anterior ao advento da Lei n. 8.213/91 pode ser computado para fins da carência necessária
à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o
recolhimento das contribuições. 4. O cálculo do benefício ocorrerá na forma do disposto no inciso
II do caput do art. 29 da Lei n. 8.213/91, sendo que, nas competências em que foi exercido o
labor rurícola sem o recolhimento de contribuições, o valor a integrar o período básico de cálculo -
PBC será o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. 5. A idade mínima
para essa modalidade de benefício é a mesma exigida para a aposentadoria do trabalhador
urbano, ou seja, 65 anos para o homem e 60 anos para a mulher, portanto, sem a redução de 5
anos a que faria jus o trabalhador exclusivamente rurícola. 6. Recurso especial improvido." (STJ -
1ª Turma, REsp 1476383, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe 08/10/2015) (grifei).
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE URBANA. LEI Nº 11.718/08. CONTAGEM
MISTA DO TEMPO DE LABOR RURAL E URBANO PARA FINS DE CONCESSÃO DE
APOSENTADORIA POR IDADE. POSSIBILIDADE. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL NO
MOMENTO QUE ANTECEDE O REQUERIMENTO. DESNECESSIDADE. CÔMPUTO DO
TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI N. 8.213/91 PARA FINS DE
CARÊNCIA. POSSIBILIDADE. APELAÇÃO DO INSS IMPROVIDA. [...] 6. Nesse ponto, destaco
que a insurgência do INSS não merece acolhimento. A aposentadoria híbrida tem por objetivo
alcançar os trabalhadores que, ao longo de sua vida, mesclaram períodos de labor urbano e rural,
sem, contudo, perfazer tempo suficiente para se aposentar em nenhuma dessas duas atividades,
quando isoladamente consideradas, permitindo-se, assim, a somatória de ambos os tempos. Ao
contrário do alegado, a Lei não faz distinção acerca de qual seria a atividade a ser exercida pelo
segurado no momento imediatamente anterior ao requerimento administrativo, sequer veda a
possibilidade de se computar o referido tempo de labor campesino, anterior à vigência da Lei nº
8.213/91, para fins de carência. Apenas exige a elevação do requisito etário, ou seja, o mesmo
relacionado à aposentadoria por idade urbana, consoante já exposto nesse arrazoado,
diferenciando tal modalidade de aposentação daquela eminentemente rurícola. [...] (TRF - 3ª
Região, 7ª Turma, AC 00107863520154039999, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, e-DJF3 Judicial
1: 23/06/2016) (grifei).
Nessa toada, saliento que o Colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Recursos
Especiais nºs 1.674.221/SP e 1.788.404/PR (1ª Seção, Min. Rel. Napoleão Nunes Maia, DJe
04.09.2019), submetidos ao regime dos recursos repetitivos, decidiu que o tempo de serviço rural,
ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado
para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não
tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei
8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o
tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento
administrativo.
Pois bem. Conforme já constatado, a parte autora comprovou o exercício de atividade rural nos
períodos de 30.04.1969 a 30.06.1975 e de 17.10.1995 a 02.05.2017.
De outro turno, evidencia-se pelo extrato do CNIS e pelas cópias de CTPS – documentos que
gozam de presunção relativa de veracidade, não afastada por prova em sentido contrário – o
exercício de atividade urbana e o recolhimento de contribuições em períodos compreendidos
entre os anos de 1975 a 1979 e de 2004 a 2017.
Assim sendo, tendo a parte autora completado 60 anos de idade em 30.04.2017, bem como
cumprido o tempo de atividade urbana e rural por período superior ao legalmente exigido, nos
moldes do art. 48, caput, e § 3º, da Lei n. 8.213/91, é de se conceder a aposentadoria por idade
híbrida, observada eventual prescrição quinquenal.
O benefício é devido a partir da data do requerimento administrativo (D.E.R. 02.05.2017),
momento em que o INSS tomou ciência da pretensão da parte autora.
Observo que a correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as
respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição
quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça
Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que
estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data
da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção
desta Corte. Após a expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba
honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, §
3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do CPC, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da
decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
Embora o INSS seja isento do pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as
despesas judiciais feitas pela parte vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos
autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).
Caso a parte autora esteja recebendo benefício previdenciário concedido administrativamente,
deverá optar, à época da liquidação de sentença, pelo beneficio judicial ou administrativo que
entenda ser mais vantajoso.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, fixando, de ofício, os consectários legais,
nos termos acima delineados.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. ART. 48, "CAPUT", E § 3º DA LEI
8.213/91. AUXÍLIO-DOENÇA ENTRE PERÍODOS CONTRIBUTIVOS. POSSIBILIDADE DE
CÔMPUTO PARA EFEITO DE CARÊNCIA. ATIVIDADE RURAL E URBANA COMPROVADAS.
CONCOMITANTE EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA OU RURAL COM O IMPLEMENTO DO
REQUISITO ETÁRIO. INEXIGIBILIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO.
1. O benefício de aposentadoria por idade urbana exige o cumprimento de dois requisitos: a)
idade mínima, de 65 anos, se homem, ou 60 anos, se mulher; e b) período de carência (art. 48,
"caput", da Lei nº 8.213/91).
2. Início de prova material, corroborado por prova testemunhal, enseja o reconhecimento do
tempo laborado como trabalhador rural. A atividade rural desempenhada em data anterior a
novembro de 1991 pode ser considerada para averbação do tempo de serviço, sem necessidade
de recolhimento de contribuições previdenciárias.
3. A Lei 11.718, de 20 de junho de 2008, ao introduzir o § 3, do art. 48, do mencionado diploma
legal, permitiu a aposentadoria por idade híbrida, possibilitando a contagem cumulativa do tempo
de labor urbano e rural, para fins de aposentadoria por idade.
4. Em se tratando de aposentadoria por idade híbrida, não se exige a simultaneidade entre o
implemento do requisito etário e o exercício da atividade laborativa, seja esta urbana ou rural.
Precedentes do STJ e desta Corte.
5. Os intervalos de tempo em que o segurado gozou de auxílio-doença, desde que estejam entre
períodos contributivos, devem ser considerados para efeito de carência.
6. Comprovadas as atividades rurais e urbanas pela carência exigida, e preenchida a idade
necessária à concessão do benefício, faz jus a parte autora ao recebimento da aposentadoria por
idade.
7. Apelação do INSS desprovida. Fixados, de ofício, os consectários legais. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento a apelacao do INSS, fixando, de oficio, os consectarios
legais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
