
| D.E. Publicado em 21/09/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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| Data e Hora: | 14/09/2018 16:10:54 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000744-69.2015.4.03.6007/MS
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Trata-se de apelação interposta por Francisco Ferreira Lopes em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida.
A r. sentença julgou improcedente o pedido inicial e condenou a parte autora no pagamento de custas processuais e ao pagamento de honorários de advogado de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa (art. 85, 2º, CPC - Lei n. 13.105/2015), suspensa a exigibilidade, cabendo ao credor demonstrar que houve superação da situação de insuficiência de recursos, no prazo de 5 (cinco) anos (art. 98, 3º, CPC - Lei n. 13.105/2015).
Em suas razões recursais, a parte autora pugna pela reforma da sentença aduzindo, em síntese, que restaram comprovados os requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado.
Regularmente processado o feito, com contrarrazões, os autos subiram a este Eg. Tribunal.
Certificado pela Subsecretaria da Sétima Turma, nos termos da Ordem de Serviço nº 13/2016, artigo 8º, que a apelação foi interposta no prazo legal e, ainda, que a parte autora é beneficiária da justiça gratuita.
É o relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
A parte autora pleiteia a concessão de aposentadoria por idade, na forma híbrida (ou mista), prevista no artigo 48, §§3º e 4º, da Lei nº 8.213/91, verbis:
O artigo 48 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 11.718/2008, corrigiu distorção até então existente e passou a contemplar os trabalhadores rurais que, em decorrência do fenômeno social da urbanização do trabalho, passaram a exercer temporária ou permanentemente, atividade urbana assegurando-lhes o direito à contagem mista do tempo de labor rural e urbano para fins de concessão de aposentadoria por idade, adotando-se o requisito etário mínimo de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher, além do cumprimento da carência exigida.
Do comando normativo legal haure-se que a lei não faz distinção acerca de qual seria a atividade a ser exercida pelo segurado no momento imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou requerimento administrativo.
Por ocasião do julgamento do RESP nº 1.407.613, sob a sistemática dos recursos repetitivos, o Eg. STJ adotou o entendimento de que pouco importa se o segurado era rural ou urbano quando do requerimento, podendo somar ou mesclar os tempos para fins de obtenção do benefício de aposentadoria por idade (híbrida) aos 65 (sessenta e cinco) anos, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
Nesse sentido, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), quando do julgamento do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei Federal-PEDILEF nº 50009573320124047214), reviu seu posicionamento para adotar o entendimento consagrado no âmbito do RESP nº 1.407.613.
Confira-se:
Logo, para fins de somatória dos períodos de labor urbano e rural, é irrelevante se a atividade agrícola foi ou não exercida por último.
Assim, comprovada a natureza mista do labor exercido no período de carência, o regime será o do artigo 48, §§ 3º e 4º, da Lei 8.213/1991, conforme entendimento consolidado quando do julgamento do RESP nº. 1.407.613, segundo o qual o segurado pode somar ou mesclar os tempos para fins de obtenção do benefício de aposentadoria por idade (híbrida) aos 65 (sessenta e cinco) anos, se homem, e 60 (sessenta), se mulher, não importando se o segurado era rural ou urbano à época do requerimento do benefício (RESP nº. 1.407.613, julgamento em 14.10.2014, Rel. Ministro Herman Benjamin).
CARÊNCIA
No que tange à carência, para os segurados inscritos na Previdência Social até 24/07/1991, há que se observar a regra de transição estabelecida no artigo 142 da Lei nº 8.213/91, de acordo com o ano em que houve o implemento dos requisitos para a aposentadoria por idade.
Aos que ingressaram no sistema após essa data, aplica-se a regra prevista no art. 25, inc. II, da Lei de Benefícios que exige a comprovação de 180 contribuições mensais.
Anoto que se encontra pacificado no Eg. Superior Tribunal de Justiça, o entendimento de que o período de atividade rural exercido anteriormente à Lei nº 8.213/91 pode ser computado também como período de carência, para fins de aposentadoria por idade mista, conformada no artigo 48, §§ 3º e 4º, da LBPS, com a redação dada pela Lei nº 11.718/2008.
Nesse sentido:
Por fim, em se tratando de aposentadoria por idade híbrida não se exige a simultaneidade entre o implemento do requisito etário e o exercício da atividade laborativa, seja esta urbana ou rural.
Feitas essas considerações, cuida-se perquirir se a parte autora faz jus ao benefício pleiteado.
COMPROVAÇÃO DO LABOR URBANO
O exercício da atividade urbana restou demonstrado através do documento de fl. 74, onde restaram comprovadas 109 contribuições mensais , fato sobre o qual não se discute, devendo ser havido como tempo de trabalho incontroverso.
Anote-se que, para o trabalhador urbano, com a edição da Súmula 44 da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais, ficou consolidado o entendimento de que deve ser considerado o ano em que o segurado implementa o requisito etário.
Confira-se:
O período controvertido refere-se ao tempo laborado como rural.
COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL
A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Dentro desse contexto, considerando as precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
Dentre os documentos admitidos pelo Eg. STJ estão aqueles que atestam a condição de rurícola do cônjuge, cuja qualificação pode estender-se a esposa, desde que a continuação da atividade rural seja comprovada por robusta prova testemunhal (AgRg no AREsp nº 272.248/MG, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 12/04/2013; AgRg no REsp nº 1342162/CE, 1ª Turma, Relator Ministro Sérgio Kukina, DJe 27/09/2013).
Conforme entendimento jurisprudencial sedimentado, a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ.
Pois bem.
Colho dos autos que a idade mínima exigida para a obtenção do benefício restou comprovada pela documentação pessoal da parte autora, acostada às fls. 28, tendo ela nascido em 14/05/1946.
Considerando o implemento do requisito etário em 14/05/2011, a parte autora deve comprovar a carência de 180 meses.
A parte autora alega que, (RESUMO)
Para comprovar suas alegações (atividade rural), a parte autora apresentou os seguintes documentos: a) cópia de sua CTPS, com anotações de vínculos (fls. 20-25, 28-36 e 50-52); b) cópia do certificado de reservista, datado de 20.11.1968, em que o autor foi qualificado como "lavrador", residente na Fazenda Furna (folha 38); c) cópia de sua carteira de associado junto ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Pedro Gomes, MS, sem data legível (folha 39); d) cópia de documentos pessoais de Maria José de Melo Lopes, esposa do autor (folha 39); e) cópia da certidão de casamento do autor com a Sra. Maria José de Melo Lopes, celebrado aos 29.07.1972, em que o autor foi qualificado como "lavrador" (folha 40); f) cópia de certidões de nascimento de filhos do autor, ocorridos em 24.04.1974, 1978, 19.07.1979 e 17.01.1981, o primeiro em Goiás e os demais em Pedro Gomes/ MS (fls. 41-44); g) cópia de pagamento de mensalidades para o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Pedro Gomes, datados de 1999-2000 (fls. 45-49); e h) cópia das decisões proferidas nos autos n. 2005.60.07.000058-7, em que houve a concessão do benefício de aposentadoria por idade de trabalhador rural para a sua esposa (fls. 53-73).
Ressalto, ainda, que a prova testemunhal produzida nos autos evidenciou de forma segura e induvidosa o labor rural da parte autora, sendo que os depoentes, que a conhecem há muitos anos, foram unânimes em suas declarações, confirmando que ela trabalhou na lavoura , detalhando quais as culturas que cultivava.
José Flor da Silva conhece o autor desde 1976 e trabalharam juntos na Fazenda Boa Vista. A testemunha mudou-se da fazenda em 1989 e afirmou que o autor continuou na fazenda, tendo perdido, depois, contato.
Maurício José Venâncio conhece o autor há 15 anos e também trabalhou com ele na roça, na fazenda Florão.
Nesse passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar.
Assim sendo, o início de prova material, corroborado por robusta e coesa prova testemunhal, comprova a atividade campesina exercida pela parte autora.
Importante destacar que o labor urbano exercido por curtos períodos, especialmente na entressafra, quando o trabalhador campesino precisa se valer de trabalhos esporádicos que lhe assegurem a sobrevivência, não constitui óbice, por si só, ao reconhecimento do labor rural.
É a hipótese dos autos em que, no ano de 1982 o autor teve vínculo empregatício de natureza urbana, com a empregadora "Nosde Engenharia Ltda.-ME" (fl. 82), por dois meses, aproximadamente.
A respeito da descontinuidade do labor rural, a Lei n. 11.718/08 estabeleceu período não superior a 120 dias, corridos ou intercalados, por ano, como parâmetro de tempo admitido à interrupção do labor rural para fins de concessão de aposentadoria rural. Importante dizer que a descontinuidade da atividade rural a ser considerada pela legislação é aquela que não representa uma ruptura definitiva do rurícola com a lavoura, situação essa que, repita-se, deve ser analisada caso a caso, conforme as particularidades de cada região.
Isso significa que eventuais interrupções do exercício das atividades campesinas (descontinuidade), decorrentes de vínculos urbanos ou mesmo de inatividade, durante o período de carência, são admitidas, devendo ser analisados caso a caso.
Portanto, o período de 120 dias estabelecido pela lei não deve ser adotado como preceito único, sendo mister perquirir se, no caso concreto, o trabalho no meio rural é o que efetivamente proporciona a subsistência da sua família, ou seja, se é a atividade profissional mais importante.
Por conseguinte, o exíguo período que a parte autora trabalhou em atividade urbana no ano de 1982, ao contrário do alegado pelo INSS, não descaracteriza o trabalho rural, cuja descontinuidade é admitida de maneira expressa pela Lei de Benefícios em seu art. 143, desde que o período da carência tenha sido preenchido todo pelo trabalho rural, o que restou sobejamente comprovado.
No caso concreto, a soma dos períodos de trabalho rural e urbano, constantes no CNIS, resulta no cumprimento do tempo de carência exigido, nos termos dos artigos 48, § 3º c.c. 142 c/c 25, II, da Lei n. 8.213/91.
Dessa sorte, presentes os dois requisitos indispensáveis à concessão do benefício, a parte autora faz jus à concessão da aposentadoria por idade híbrida, a partir do requerimento administrativo, nos termos do artigo 49 da Lei nº 8.213/91.
O termo inicial do benefício deve ser a data do requerimento administrativo (29/05/2013 - fl. 74), tendo a parte autora demonstrado que já havia preenchido os requisitos necessários à concessão do benefício desde então.
A RMI será calculada nos termos do artigo 48, § 4º, da LBPS, que dispõe:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. |
(...) |
§ 4o Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. " |
CONSECTÁRIOS: |
Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/PE, repercussão geral).
Apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto com o julgado acima mencionado.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se, até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, após, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/PE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral.
De acordo com a decisão do Egrégio STF, os juros moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
Invertida a sucumbência, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação (Súmula 111 do STJ).
No que se refere às custas processuais, no âmbito da Justiça Federal, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto no artigo 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96.
Tal isenção, decorrente de lei:
- não se aplica no âmbito da Justiça Estadual do Mato Grosso do Sul, nos termos artigo 27 da Lei Estadual nº 3.779/2009, que está em consonância com o disposto na Súmula nº 178/STJ ("O INSS não goza de isenção de pagamento de custas e emolumentos, nas ações acidentárias e de benefícios, propostas na Justiça Estadual").
- não exime o INSS do reembolso das custas recolhidas pela parte autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso dos autos, tendo em conta a gratuidade processual que foi concedida à parte autora.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso e condeno o INSS a pagar a aposentadoria por idade híbrida, nos termos do expendido.
É o voto.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
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