D.E. Publicado em 20/03/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar e, no mérito, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0040534-44.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS.
A parte autora ajuizou a presente ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando, em síntese, o reconhecimento de tempo de labor rural sem registro no período de 31/12/1993 a 01/01/1999 para a concessão de aposentadoria por idade a partir do requerimento administrativo formulado em 22/05/2014.
A r. sentença julgou procedente em parte o pedido, desconsiderando o período de labor rural sem registro mas computando as contribuições realizadas no curso da ação para deferir a concessão do benefício almejado a partir do julgado. Encargos sucumbenciais atribuídos à parte autora.
Apelou a promovente. Preliminarmente, aponta a nulidade do julgado em virtude da ausência de produção de prova testemunhal. No mérito, aponta que restou comprovado o labor rural sem registro, devendo a ação ser julgada integralmente procedente, com o termo inicial do benefício fixado na data do requerimento administrativo.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0040534-44.2017.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS.
Da preliminar
Inicialmente, rejeito a preliminar arguida pela autora. Não há que se falar em nulidade da r. sentença, pois o período laborado como segurada especial consta no extrato do sistema CNIS de fls. 47 e é incontroverso. Referido período foi reconhecido pelo próprio INSS, na via administrativa (fls. 64/65), que não concedeu o benefício de aposentadoria por idade em virtude de não considerar referido interregno como carência. Assim, não se fazia necessária a produção de prova testemunhal.
Da aposentadoria por idade
O art. 48 da Lei nº 8.213/91 dispõe que a aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
Em relação à carência, são exigidas 180 (cento e oitenta) contribuições mensais (cf. art. 25, II da Lei de Benefícios), cabendo ressaltar que, no caso de segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/91, deve ser considerada a tabela progressiva inserta no art. 142 da Lei de Benefícios. Anoto, ainda, a desnecessidade de o trabalhador estar filiado na data de publicação daquela lei, bastando que seu primeiro vínculo empregatício, ou contribuição, seja anterior a ela.
Por sua vez, o art. 102 da mencionada norma prevê, em seu § 1º, que "a perda da qualidade de segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja concessão tenham sido preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos".
Assim, dúvidas não há em relação ao direito daqueles que, ao pleitearem a aposentadoria por idade, demonstram o cumprimento da carência e do requisito etário antes de deixarem de contribuir à Previdência.
No entanto, sempre houve entendimentos divergentes quanto à necessidade de as condições exigidas à concessão do benefício serem implementadas simultaneamente.
Solucionando tal questão, o art. 3º, §1º, da Lei 10.666/03 passou a prever que "na hipótese de aposentadoria por idade , a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício".
Portanto, o legislador entendeu que não perde o direito ao benefício aquele que tenha contribuído pelo número de meses exigido e venha a completar a idade necessária quando já tenha perdido a qualidade de segurado.
Esse, desde há muito, o posicionamento do C. STJ:
Dessa forma também já decidiu a Exma. Des. Fed. Therezinha Cazerta, cujos trechos da decisão que interessa a este julgado passo a transcrever:
E, quanto à aplicação da tabela progressiva de carência prevista no art. 142 da Lei nº 8.213/91, restou consolidado, após a edição da Súmula 44 pela Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais, o entendimento no sentido de que deve ser considerado o ano em que o segurado implementa o requisito etário.
Confira-se, verbis:
Quanto ao recolhimento das contribuições, preconizava o art. 79, I, da Lei nº 3.807/60 e atualmente prevê o art. 30, I, a, da Lei nº 8.213/91, que é responsabilidade do empregador, motivo pelo qual não se pode punir o empregado urbano pela ausência de recolhimentos, sendo computado o período laborado e comprovado para fins de carência, independentemente de indenização aos cofres da Previdência.
A ilustrar tal entendimento, a decisão:
Há que se observar, ainda, que a Lei nº 11.718, de 20.06.2008, acrescentou os §§3º e 4º ao art. 48 da Lei 8.213/91, passando a dispor que, para o segurado que atuou em atividade rural , os períodos de contribuição referentes a atividades urbanas podem ser somados ao tempo de serviço rural sem contribuição para obtenção do benefício de aposentadoria comum por idade aos 60 anos (mulher) e 65 anos (homem). Observe-se a redação do referido dispositivo legal:
Nos termos do dispositivo supramencionado, incluído pela Lei nº. 11.718/2008, o(a) segurado(a) terá direito a se aposentar por idade, na forma híbrida, isto é, como trabalhador(a) rural e urbano(a), quando atingir 65 (homens) ou 60 (mulheres) anos, desde que tenha cumprido a carência exigida, devendo ser considerados ambos os períodos (urbano e rural ) para efeitos de se apurar o cumprimento da carência .
Com o advento da Lei nº 11.718/2008 surgiu uma discussão sobre se o novo benefício abarcaria, além dos trabalhadores rurais (conforme a literalidade do §3º do art. 48 da Lei nº. 8.213/91), também os trabalhadores urbanos, ou seja, se estes poderiam computar ou mesclar período rural anterior ou posterior a 11/1991 como carência para a obtenção da aposentadoria por idade híbrida. Tal controvérsia apareceu, inclusive, graças à previsão do artigo 51, §4º, do Decreto 3.048/1999, com redação dada pelo Decreto 6.777/2008, publicado em 30/12/2008, o qual determinou que:
Uma corrente doutrinária e jurisprudencial passou a sustentar que a aposentadoria por idade híbrida teria natureza de benefício rural e somente poderia ser concedida ao trabalhador rural que tenha, eventualmente, exercido atividade urbana, mas não ao trabalhador urbano que tenha, eventualmente, exercido alguma atividade rural . Argumentou-se que o §3º do artigo 48 da Lei 8.213/1991 dispõe expressamente que o benefício se destina aos trabalhadores rurais e que não haveria previsão de fonte de recursos para se financiar a ampliação do benefício em favor dos trabalhadores urbanos, de modo que conceder o benefício aos urbanos afrontaria o disposto nos artigos 195, § 5º, da CF/88 e 55, § 2º da Lei 8.213/1991. Quanto ao disposto no artigo 51, § 4º, do Decreto 3.048/1999, argumentou-se tratar-se de uma norma que objetivaria resguardar o direito adquirido daqueles que implementaram as condições enquanto rurais mas deixaram para formular pedido em momento posterior.
Esse entendimento de que o trabalhador urbano não faria jus à aposentadoria por idade híbrida vinha sendo adotado pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) que, no julgamento dos Pedidos de Uniformização n. 2008.50.51.001295-0 (Rel. Juiz Federal Paulo Ernane Moreira Barros) e n. 5001211-58.2012.4.04.7102 (Rel. Juíza Federal Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo), procedendo a uma interpretação sistemática dos artigos 48 e 55 da Lei 8.213/1991, decidiu que a Lei 11.718/2008 apenas autorizou ao trabalhador rural utilizar contribuições recolhidas para o regime urbano para fins de cumprimento da carência , mas não ao trabalhador urbano se utilizar de período rural para o preenchimento da carência necessária à concessão de aposentadoria por idade urbana.
Ocorre, contudo, que, em outubro de 2014, na ocasião do julgamento do RESP nº. 1407613, o Superior Tribunal de Justiça adotou entendimento diverso, posicionando-se no sentido de que pouco importa se o segurado era rural ou urbano quando do requerimento, podendo somar ou mesclar os tempos para fins de obter o benefício de aposentadoria por idade (híbrida) aos 65 (sessenta e cinco) anos, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
Inclusive, no bojo de julgamento realizado em novembro de 2014 (PEDILEF nº. 50009573320124047214), a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) reviu seu posicionamento anterior para adotar a mais recente diretriz hermenêutica da Segunda Turma do C. STJ, fixada nos autos do Recurso Especial nº. 1407613.
Válida, nesse passo, a transcrição dos julgados supramencionados:
Desse modo, é irrelevante o fato de o (a) segurado (a) estar ou não exercendo atividade rural no momento em que completa a idade ou apresenta o requerimento administrativo, bem como o tipo de trabalho predominante, conforme, o entendimento mais recente, adotado tanto pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais quanto pelo Superior Tribunal de Justiça, o que deve definir o regime jurídico da aposentadoria é o trabalho exercido no período de carência: se exclusivamente rural ou urbano, será devida, respectivamente, aposentadoria por idade rural ou urbana; se de natureza mista, o regime será o do artigo 48, parágrafos 3º e 4º, da Lei nº. 8.213/1991, independentemente de a atividade urbana ser a preponderante no período de carência ou a vigente quando do implemento da idade.
No caso concreto, resta verificar se houve cumprimento do requisito etário e também da carência.
A autora, nascida em 1951, implementou o requisito etário (60 anos) em 2011, devendo, portanto, comprovar o labor por 180 meses (15 anos).
No tocante à carência, a controvérsia envolve unicamente o período de 31/12/1993 a 01/01/1999, que consta do CNIS e foi reconhecido pelo próprio INSS como efetivamente laborado pela autora na condição de segurada especial (fls. 10/11).
Observo que, em hipóteses como a presente, não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência como dever de verter contribuições por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo.
Nesse sentido, esta Corte vem decidindo:
Assim, somado o interregno de serviço rural entre 31/12/1993 e 01/01/1999 ao demais períodos de contribuições incontroversas, restou comprovado, à época do requerimento administrativo, formulado em 22/05/2014 (fls. 10), até mesmo mais tempo que o exigido na lei de referência.
Dessa forma, a demandante tem direito à concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida, nos termos do artigo 48, §§3º e 4º, da Lei nº 8.213/91, desde 22/05/2014, momento em que o INSS tomou inequívoca ciência da pretensão.
Reconhecida a integral procedência do pedido, devem ser invertidos os ônus da sucumbência, cabendo ao INSS o pagamento de verba honorária, fixada em 10% (dez por cento), considerados a natureza, o valor e as exigências da causa, sobre as parcelas vencidas até a data deste decisum, nos termos da Súmula 111 do STJ.
Com relação aos índices de correção monetária e taxa de juros incidentes sobre os valores em atraso, deve ser observado o julgamento proferido pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947.
Relativamente às custas processuais, é imperioso sublinhar que o art. 8º da Lei 8.620, de 05.01.93, preceitua o seguinte:
Apesar do STJ entender que o INSS goza de isenção no recolhimento de custas processuais, perante a Justiça Federal, nos moldes do dispositivo legal supramencionado, a Colenda 5ª Turma deste Egrégio Tribunal tem decidido que, não obstante a isenção da autarquia federal, consoante o art. 9º, I, da Lei 6032/74 e art. 8º, § 1º, da Lei 8620/93, se ocorreu o prévio recolhimento das custas processuais pela parte contrária, o reembolso é devido, a teor do art. 14, § 4º, da Lei 9.289/96, salvo se esta estiver amparada pela gratuidade da Justiça.
De conseguinte, em sendo a parte autora beneficiária da justiça gratuita deixo de condenar o INSS ao reembolso das custas processuais, porque nenhuma verba a esse título foi paga pela parte autora e a autarquia federal é isenta e nada há a restituir.
Ante o exposto, REJEITO A PRELIMINAR E, NO MÉRITO, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, para julgar integralmente procedente o pedido e condenar a autarquia previdenciária a conceder-lhe o benefício de aposentadoria por idade desde a data do requerimento administrativo e a pagar-lhe as parcelas vencidas com atualização monetária e juros de mora, além de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até este decisum.
É o voto.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 05/03/2018 16:44:44 |