
| D.E. Publicado em 12/02/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA AUTORA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0023794-74.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
A parte autora ajuizou a presente ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando, em síntese, a concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida.
Concedidos os benefícios da Justiça Gratuita.
Prova oral colacionada aos autos.
A sentença julgou improcedente o pedido e condenou a autora ao pagamento da custas e despesas processuais, além do honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa.
Apela a autora aduzindo que comprovou o labor campesino, fazendo jus à concessão do benefício pleiteado desde quando completou a idade ou desde o requerimento administrativo, com juros e correção monetária além de honorários advocatícios de 15% sobre a condenação.
Com contrarrazões, subiram os autos para este E. Tribunal.
É o Relatório.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0023794-74.2018.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
O art. 48 da Lei n.º 8.213/91 dispõe que a aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
Em relação à carência, são exigidas 180 (cento e oitenta) contribuições mensais (cf. art. 25, inc. II da Lei de Benefícios), cabendo ressaltar que, no caso de segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24.07.1991, deve ser considerada a tabela progressiva inserta no art. 142 da Lei de Benefícios. Anoto, ainda, a desnecessidade de o trabalhador estar filiado na data de publicação daquela lei, bastando que seu primeiro vínculo empregatício, ou contribuição, seja anterior a ela.
Por sua vez, há que se observar que a Lei n.º 11.718 de 20.06.2008 acrescentou os §§3º e 4º ao art. 48 da Lei n.º 8.213/91, passando a dispor que, para o segurado que atuou em atividade rural, os períodos de contribuição referentes a atividades urbanas podem ser somados ao tempo de serviço rural sem contribuição para obtenção do benefício de aposentadoria comum por idade aos 60 anos (mulher) e 65 anos (homem). Observe-se a redação do referido dispositivo legal:
A todos os trabalhadores rurais são aplicáveis as regras do art. 48 e seus parágrafos para fins de aposentadoria por idade.
A regra geral em vigor é a do § 2º do art. 48, que garante aposentadoria por idade ao trabalhador rural que complete 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinquenta e cinco), se mulher, desde que comprove o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9º do art. 11. A carência para a aposentadoria por idade é de 180 (cento e oitenta) meses.
A regra geral tem, então, a seguinte equação: idade (60 ou 55 anos) + 180 meses de efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício.
A referência à forma "descontínua" da atividade faz supor que o legislador aceita que o trabalhador possa exercer, eventualmente, atividade urbana, para atender situação emergencial de falta de emprego, desde que o tempo decorrido não lhe retire a natureza de trabalhador rural.
A experiência tem demonstrado que muitos trabalhadores rurais têm dificuldade para comprovar o tempo de atividade exigido pela lei, em razão da simplicidade do homem do campo, até mesmo daquele que lhe dá emprego, da dificuldade de coletar documentos, das longas distâncias que deve percorrer para cuidar de seus direitos, enfim, situações que muitas vezes os fazem deixar para trás documentos que, no futuro, serão imprescindíveis para a defesa de seus direitos previdenciários.
Daí que a comprovação da atividade esbarra em tantas dificuldades que o legislador não poderia deixar de contemplar as situações em que o rurícola deixa o campo e vai exercer atividade urbana e, depois, retorna às suas origens. Nessas situações, o que normalmente acontece é que o trabalhador acaba não conseguindo comprovar o tempo de atividade rural suficiente à concessão da aposentadoria. Mas também não consegue comprovar a carência para a aposentadoria por idade como urbano.
O § 3º do art. 48 parece querer, justamente, dar cobertura previdenciária aos que não conseguem comprovar os requisitos nem para uma nem para outra aposentadoria. Convém transcrever:
Da nova previsão legal parece sair que o período de carência pode ser composto por períodos de atividade rural e de atividade urbana que, somados, devem totalizar 180 (cento e oitenta) meses.
Mas a idade já não será reduzida em 5 (cinco) anos: os homens deverão comprovar 65 (sessenta e cinco) anos e as mulheres 60 (sessenta) anos.
Daí resulta a equação para a aposentadoria híbrida: idade (65 ou 60 anos) + 180 meses, compostos pela soma dos períodos de atividade rural com os períodos de atividade urbana.
Há, porém, mais um aspecto a ser considerado. A aposentadoria híbrida está expressamente garantida para os trabalhadores rurais. Trata-se, a nosso ver, de mais uma cobertura previdenciária garantida aos trabalhadores rurais, que não pode ser estendida aos trabalhadores urbanos.
Na verdade, aos urbanos continua sendo possível somar períodos de atividade rural sem contribuição previdenciária apenas para fins de tempo de serviço, mas não para efeitos de carência.
Não é o que ocorre na aposentadoria híbrida, cujo cálculo da renda mensal inicial está previsto no § 4º do art. 48:
Ou seja, na aposentadoria híbrida, os períodos de atividade rural continuam a ser computados mesmo sem contribuição.
A diferença está em que, a nosso ver, a aposentadoria híbrida protege aqueles trabalhadores rurais que por algum tempo exercem atividades urbanas, mas as contingências da vida os trazem de volta ao campo. A proteção é dirigida ao trabalhador que termina sua vida nas lides rurais, embora por algum tempo tenha sido segurado urbano. Raciocínio contrário levaria a negar vigência ao § 2º do art. 55 da lei 8.213/1991, que dispõe que "O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento".
JOSÉ ANTONIO SAVARIS ensina:
Resta, portanto, verificar se houve cumprimento do requisito etário e o da carência.
Implementado o requesito etário pela autora em 22.07.2014 (60 anos), a concessão da prestação previdenciária pleiteada deve observar o art. 142 da Lei nº 8.213/91, que requer, para efeito de carência, que o segurado conte com, no mínimo, 180 (cento e oitenta) meses de contribuições.
Na hipótese dos autos, a parte autora alega ter exercido atividade rural, em regime de economia familiar e, portanto, sem o correspondente registro em CTPS, de 08/06/1968 a 30/11/1972, 15/01/1973 a 14/04/1983, 03/02/1987 a 21/05/1991 e 14/10/1991 a 10/08/2002.
Nos termos da Súmula de nº 149 do Superior Tribunal de Justiça, é necessário que a prova testemunhal indicativa do labor rurícola venha acompanhada de, pelo menos, um início razoável de prova documental, in verbis:
Do trabalho do menor.
Sedimentado o entendimento na jurisprudência dos tribunais superiores de que a atividade rural do trabalhador menor entre 12 (doze) e 14 (quatorze) anos deve ser computado para fins previdenciários, eis que a proibição do trabalho ao menor de 14 anos foi estabelecida em seu benefício e não em seu prejuízo.
Nesse sentido colaciono os julgados:
Outro aspecto relevante diz com a averbação do tempo de serviço requerida por menores de idade, em decorrência da atividade prestada em regime de economia familiar. A esse respeito, o fato da parte autora não apresentar documentos em seu próprio nome que a identifique como lavrador (a), em época correspondente à parte do período que pretende ver reconhecido, por si só, não elide o direito pleiteado, pois é sabido que não se tem registro de qualificação profissional em documentos de menores, que na maioria das vezes se restringem à sua Certidão de Nascimento, especialmente em se tratando de rurícolas. É necessária, contudo, a apresentação de documentos concomitantes, expedidos em nome de pessoas da família, para que a qualificação dos genitores se estenda aos filhos, ainda que não se possa comprovar documentalmente a união de esforços do núcleo familiar à busca da subsistência comum.
Em regra, toda a documentação comprobatória da atividade, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos de sua necessidade que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido ou a entrega como forma de pagamento pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
No caso em questão, para comprovar a sua condição de trabalhadora rural, a requerente apresentou os seguintes documentos:
a) certidão de seu casamento, datada de 04.09.1972, em que seu cônjuge está qualificado como lavrador;
b) CTPS da autora com vínculos rurais entre 1984 e 1986 e do ano de 1991;
Pertinente dizer que é sedimentado o entendimento de que documentos apresentados para comprovação de tempo rural não precisam referir-se a todo o interregno que se pretende comprovar, constituindo em início de prova material e não prova plena, podendo, assim, ser complementado por depoimentos testemunhais. Confira-se:
A convicção de que ocorreu o efetivo exercício da atividade, durante determinado período, nesses casos, forma-se através do exame minucioso do conjunto probatório, que se resume nos indícios de prova escrita, em consonância com a oitiva das testemunhas. É preciso que se estabeleça um entrelaçamento entre os elementos extraídos de ambos os meios probatórios: o material e o testemunhal.
Nesse sentido, é a orientação do Superior Tribunal de Justiça.
Confira-se:
Finalmente, impende sublinhar que, para a conclusão sobre ter ou não direito à aposentadoria, mister se faz a constatação, por meio da prova testemunhal, se efetivamente a parte autora trabalhou no campo e a duração do referido labor, corroborando, assim, o início de prova material apresentado, o que ocorreu nos autos.
Com efeito, a oitiva das testemunhas,mostrou-se harmônica e reveladora da atividade rural da parte autora.
A testemunha Maria disse que conheceu a autora há 47 anos e que trabalhou com ela nas lides rurais na mesma fazenda. Que a conheceu antes dela ser casada e que a mesma já trabalhava na fazenda ajudando seus pais.
A testemunha Fátima disse que eram vizinhas da mesma fazenda e que sempre via a autora na roça, que se mudou para a cidade e a autora continuou na fazenda.
Dos requisitos para a concessão do benefício.
Portanto, neste cenário, entendo comprovados os períodos de 08/06/1968 a 30/11/1972, 15/01/1973 a 14/04/1983, 03/02/1987 a 21/05/1991. e 14/10/1991 a 10/08/2002, ressaltando que, à luz do art. 55, §§ 1ºe 2º, da Lei 8.213/91, não há obstáculo à contagem do tempo rural anterior a 25/07/1991 para a obtenção de qualquer benefício do regime geral, independentemente de contribuição, sendo que os intervalos posteriores podem ser utilizados somente na hipótese de requerimento dos benefícios previstos no inciso I, do artigo 39.
Dessa forma, ante o início de prova material apresentado, corroborado por prova testemunhal idônea, impõe-se reconhecer que a parte autora comprovou o exercício de atividade rural.
Note-se que, no extrato do CNIS juntado pela autarquia, entre os anos de 1984 e 1991, a autora sempre esteve vinculada a empresas ligadas à agropecuária, corroborando, assim, o seu ofício como trabalhadora rural. No entanto, após essa data não há início de prova material a corroborar que a autora continuou a laborar nas lides rurais.
No entanto, no extrato do CNIS, bem como como na CTPS da demandante, não há nenhum registro de atividade urbana ou recolhimento de contribuições previdenciárias após 11/07/1991.
Sendo assim, a autora comprovou o exercício de atividade rural nos intervalos pleiteados na inicial, porém não o exercício de atividade laboral no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, devendo-se, portanto, averbar os períodos ora reconhecidos, não tendo a requerente o direito à concessão do benefício de aposentadoria por idade.
Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, condeno ambas as partes a pagar honorários ao advogado da parte contrária, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do Novo CPC. Todavia, em relação à parte autora, fica suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita.
Isso posto, dou parcial provimento à apelação da autora, nos termos da fundamentação.
É o voto.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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| Data e Hora: | 29/01/2019 13:28:10 |
