Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5005170-18.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal MARCELO GUERRA MARTINS
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
06/07/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 08/07/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO – APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA - RECONHECIMENTO DE
TEMPO DE SERVIÇO RURAL – INÍCIO DE PROVA MATERIAL COMPLEMENTADO PELA
PROVA TESTEMUNHAL.
1. A Lei Federal nº. 8.213/91 garante ao segurado que exerceu serviço urbano e rural, o direito a
se aposentar por idade, na forma híbrida, desde que preenchidos os requisitos etário – 65
(sessenta e cinco) anos para homem e 60 (sessenta) para mulher – e de carência.
2. O art. 55, § 3º, da Lei Federal nº 8.213 estatui que a comprovação do tempo de serviço rural
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova
exclusivamente testemunhal. Nesse sentido, a Súmula nº 149 do Superior Tribunal de Justiça.
3. No que tange à atividade rural exercida após a vigência da Lei nº 8.213/91, não obstante ser
necessário o recolhimento das respectivas contribuições, não se pode exigir que tal comprovação
seja encargo do empregado, do “bóia-fria”, do safrista, do volante, do diarista, etc., na medida em
que o responsável pelo recolhimento de tais tributos é o empregador ou patrão. O mesmo ocorre
em relação ao segurado especial objeto do art. 11, VII, da Lei Federal nº 8.213.
4. A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, este não deve ser reconhecido em
período anterior aos 12 anos de idade, uma vez que o menor nessas condições, ainda que
acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não é
razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, principalmente por não contar
com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
5. Nos termos de orientação do Superior Tribunal de Justiça, em regime de repetitividade, a falta
de prova do labor rural implica a extinção do processo, sem a resolução do mérito: (Corte
Especial, REsp. 1.352.721/SP, j. 16/12/2015, DJe: 28/04/2016, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES
MAIA FILHO).
6. A controvérsia está restrita ao exercício de trabalho rural pelo período alegado pela parte
autora.
7. No caso concreto, há início de prova material - corroborado pelos depoimentos das
testemunhas - do exercício de trabalho rural, pela autora, de 2004 a 2017, período que, somado
ao tempo de trabalho urbano é suficiente ao preenchimento da carência.
8. O termo inicial deve ser fixado na data do requerimento administrativo, considerando que,
naquela ocasião, a parte autora já havia implementado os requisitos necessários à concessão do
benefício.
9. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos
pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à
época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE 870947.
10. Apelação da autora provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005170-18.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - JUIZ CONVOCADO MARCELO GUERRA MARTINS
APELANTE: LEILA SANDIM KLAGENBERG
Advogado do(a) APELANTE: LIDIANE AMALIA SANDIM KLAGENBERG ARANTES -
MS21061-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005170-18.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: LEILA SANDIM KLAGENBERG
Advogado do(a) APELANTE: LIDIANE AMALIA SANDIM KLAGENBERG ARANTES -
MS21061-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Juiz Federal Convocado Marcelo Guerra:
Trata-se de ação destinada a viabilizar a concessão da denominada “aposentadoria por idade
híbrida”.
A r. sentença (fls. 56/59, ID 135334765) julgou o processo extinto, sem a resolução do mérito,
nos termos do artigo 485, inciso IV, do Código de Processo Civil. A parte autora foi condenada
ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor atualizado
da causa, observada a Justiça Gratuita.
Apelação da parte autora (fls. 26/42, ID 135334766), na qual requer a reforma da r. sentença.
Sustenta o cumprimento dos requisitos para a concessão do benefício: os documentos
apresentados seriam aptos a constituir início de prova material. Ademais, as testemunhas
teriam confirmado as alegações da autora.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005170-18.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: LEILA SANDIM KLAGENBERG
Advogado do(a) APELANTE: LIDIANE AMALIA SANDIM KLAGENBERG ARANTES -
MS21061-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Juiz Federal Convocado Marcelo Guerra:
A Lei Federal nº. 8.213/91 garante ao segurado que exerceu serviço urbano e rural o direito a
se aposentar por idade, na forma híbrida, desde que preenchidos os requisitos etário (65 anos
para homem e 60 anos para mulher) e de carência. A Lei Federal nº. 8.212/91, quanto à
aposentadoria por idade, estabelece o seguinte:
“Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se
mulher.
(...)
§ 2º. Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei.
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no §
2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
§ 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de
acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-
de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-
contribuição da Previdência Social.”.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, no regime de repetitividade, estabelece que “o
tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991,
pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por
idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art.
48, § 3º. da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de
carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do
requerimento administrativo” (1ª Seção, REsp 1674221/SP, j. 14/08/2019, DJe 04/09/2019, Rel.
Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO).
O art. 55, § 3º, da Lei Federal nº 8.213 estatui que a comprovação do tempo de serviço rural
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido, a Súmula nº 149 do Superior Tribunal de
Justiça: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola,
para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Não se exige a presença de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do
período que se pretende reconhecer. Assim, a prova documental deve ser corroborada por
prova testemunhal idônea, com efetivo potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse
entendimento prevalece nesta C. 7ª Turma e no STJ, destacando-se:
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS
NÃO DEMONSTRADOS.
(...).
3. Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é
imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o
documento. (...)".
(TRF-3, 7ª Turma, APELREEX 0008835-06.2015.4.03.9999, j. 30/11/2015, DJe: 07/12/2015,
Rel. Des. Fed. PAULO DOMINGUES).
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO.
CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO
DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
(...)
2) não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência
estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua
eficácia probatória. (...)".
(STJ, 2ª Turma, AgRg no AREsp 547.042/SP, j. 23/09/2014, DJe: 30/09/2014, Rel. Min.
MAURO CAMPBELL MARQUES).
No que diz respeito ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia
familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos
seguintes termos:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado
urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda
que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro
outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do
caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal
meio de vida;
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal
meio de vida; e
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este
equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente,
trabalhem com o grupo familiar respectivo.
§1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros
da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do
núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a
utilização de empregados permanentes."
Nesse campo, é oportuno consignar que “(...) consoante entendimento desta Eg. Sétima Turma,
admite-se aextensãodaqualificaçãode lavrador em documento de terceiro- familiarpróximo -
quando se tratar de agricultura de subsistência, em regime deeconomia familiar” (TRF-3, 7ª
Turma, ApCiv. 5140577-93.2020.4.03.9999, Dje 01/07/2020, Rel. Des. Fed. INÊS VIRGÍNIA).
Segundo jurisprudência pacífica, é dispensável o recolhimento das contribuições para fins de
obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes
da vigência da Lei nº 8.213/91, destacando-se os seguintes precedentes:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO
REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL.
CÔMPUTO DE TEMPO RURAL ANTERIOR À LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DE
RECOLHIMENTO DO TRIBUTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS PARA SANAR
OMISSÃO SEM EFEITO MODIFICATIVO.
(...)
2. No presente caso, impõe-se sanar omissão para asseverar que a jurisprudência do STJ
possui entendimento no sentido de que é dispensável o recolhimento de contribuições
previdenciárias, para fins de reconhecimento de tempo de serviço rural, quanto ao labor
exercido antes da Lei 8.213/1991. (...)".
(STJ, 2ª Turma, EDcl no AgRg no REsp 1537424/SC, j. 27/10/2015, DJe: 05/11/2015, Rel. Min.
MAURO CAMPBELL MARQUES).
"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 485, V, DO CÓDIGO DE PROCESSO
CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 55, § 2º, DA LEI N. 8.213/91. OCORRÊNCIA. SEGURADA
VINCULADA AO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL-RGPS. TEMPO DE SERVIÇO
RURAL. APOSENTADORIA. CONTRIBUIÇÕES. DESNECESSIDADE. ANTES DA VIGÊNCIA
DA REFERIDA LEI. PRECEDENTES. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. A autora sempre esteve vinculada ao Regime Geral de Previdência Social.
2. Não é exigível o recolhimento das contribuições previdenciárias, relativas ao tempo de
serviço prestado como trabalhador rural, antes da vigência da Lei n 8.213/91, para fins de
aposentadoria urbana pelo Regime Geral de Previdência Social. Precedentes da Terceira
Seção. Ação rescisória procedente".
(STJ, 3ª Seção, AR 3.650/RS, j. 11/11/2015, DJe: 04/12/2015, Rel. Des. Convoc. ERICSON
MARANHO).
"APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE
SERVIÇO RURAL ANTERIOR A PROVA DOCUMENTAL.
1. O tempo de serviço do segurado trabalhador rural exercido antes da data de início de
vigência da Lei nº 8.213/1991, é de ser computado e averbado, independentemente do
recolhimento das contribuições a ele correspondentes, mas não se presta para efeito de
carência. (...)".
(TRF-3, 7ª Turma, AC nº 0029462-51.2003.4.03.9999, j. 30/11/2015, DJe: 03/12/2015, Rel. Des.
Fed. FAUSTO DE SANCTIS).
No que tange à atividade rural exercida após a vigência da Lei nº 8.213/91, não obstante ser
necessário o recolhimento das respectivas contribuições, não se pode exigir que tal
comprovação seja encargo do empregado, do “bóia-fria”, do safrista, do volante, do diarista,
etc., na medida em que o responsável pelo recolhimento de tais tributos é o empregador ou
patrão. O mesmo ocorre em relação ao segurado especial objeto do art. 11, VII, da Lei Federal
nº 8.213. Nesse sentido:
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENQUADRAMENTO DO TRABALHADORBÓIA-
FRIA. EQUIPARAÇÃO AO SEGURADO ESPECIAL. ART. 11, VII DA LEI 8.213/1991.
DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DECONTRIBUIÇÕES.RECURSO ESPECIAL DO
INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Esta Corte consolidou a orientação de que o Trabalhador Rural, na condição debóia-
fria,equipara-se ao Segurado Especial de que trata o inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, no
que tange aos requisitos necessários para a obtenção de benefícios previdenciários.
2. Exigindo-se, tão somente, a apresentação de prova material, ainda que diminuta, desta que
corroborada por robusta prova testemunhal, não havendo que se falar em necessidade de
comprovação de recolhimentosprevidenciários para fins de concessão de aposentadoria rural
(REsp. 1.321.493/PR, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 19.12.2012).
3. É inegável que o trabalhadorbóia-friaexerce sua atividade em flagrante desproteção, sem
qualquer formalização e com o recebimento de valores ínfimos, o que demonstra a total falta de
razoabilidade em se exigir que deveriam recolhercontribuiçõesprevidenciárias.
4. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento”.
(STJ, 1ª Turma, Resp. 1762211, DJ 07/12/2018, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO).
Aliás, não é outro o entendimento fixado da 7ª Turma do TRF da 3ª Região. Com efeito:
“(...)
17 - O C. STJ já firmou entendimento de que o trabalhador ruralboia-fria,diarista ou volante é
equiparado ao segurado especial de que trata o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, de
modo que inexigível orecolhimentodecontribuiçõespara fins de concessão do beneplácito.
Precedente. (...)”.
(TRF-3, 7ª Turma, ApCiv. 0009951-76.2017.4.03.9999, Dje: 20/11/2020, Rel. Des. Fed.
CARLOS DELGADO).
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, este não deve ser reconhecido em
período anterior aos 12 anos de idade, uma vez que o menor nessas condições, ainda que
acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não é
razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, principalmente por não
contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, esse entendimento já foi assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na
vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
"ACIDENTE DO TRABALHO. SEGURO OBRIGATORIO ESTABELECIDO NO ART. 165- XVI
DA CONSTITUIÇÃO: ALCANCE. CONTRATO LABORAL COM AFRONTA A PROIBIÇÃO
CONSTITUCIONAL DO TRABALHO DO MENOR DE DOZE ANOS. MENOR DE DOZE ANOS
QUE PRESTAVA SERVIÇOS A UM EMPREGADOR, SOB A DEPENDÊNCIA DESTE, E
MEDIANTE SALARIO. TENDO SOFRIDO O ACIDENTE DE TRABALHO FAZ JUS AO
SEGURO PRÓPRIO. NÃO OBSTA AO BENEFÍCIO A REGRA DO ART. 165-X DA CARTA DA
REPUBLICA, QUE FOI INSCRITA NA LISTA DAS GARANTIAS DOS TRABALHADORES EM
PROVEITO DESTES, NÃO EM SEU DETRIMENTO. RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS
CONHECIDOS E PROVIDOS".
(2ª Turma, RE nº 104.654/SP, DJ: 25/04/1986, Rel. Min. FRANCISCO REZEK).
"Agravo de instrumento. 2. Trabalhador rural ou rurícola menor de quatorze anos. Contagem de
tempo de serviço. Art. 11, VII, da Lei nº. 8213. Possibilidade. Precedentes.
3. Alegação de violação aos arts. 5º, XXXVI; e 97, da CF/88. Improcedente. Impossibilidade de
declaração de efeitos retroativos para o caso de declaração de nulidade de contratos
trabalhistas. Tratamento similar na doutrina do direito comparado: México, Alemanha, França e
Itália. Norma de garantia do trabalhador que não se interpreta em seu detrimento. Acórdão do
STJ em conformidade com a jurisprudência desta Corte.
4. Precedentes citados: AgRAI 105.794, 2ª T., Rel. Aldir Passarinho, DJ 02.04.86; e RE
104.654, 2ª T., Rel. Francisco Rezek, DJ 25.04.86.
5. Agravo de instrumento a que se nega provimento".
(2ª Turma, AI nº 529.694/RS, DJ 11/03/2005, Rel. Min. GILMAR MENDES).
Nesse diapasão caminha o entendimento da 7ª Turma do TRF-3ª Região, destacando-se as
seguintes ementas:
"PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ULTRA PETITA. APOSENTADORIA
POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE LABOR EXERCIDO SOB
CONDIÇÕES ESPECIAIS. TEMPO DE LABOR NA FAINA RURAL.
(...)
- Admite-se o cômputo do período laborado no campo pelo menor de idade (a partir dos 12 -
doze - anos), uma vez que as regras insculpidas nos Ordenamentos Constitucionais, vedando o
trabalho infantil, não podem prejudicá-lo.
- Dado parcial provimento tanto à remessa oficial (tida por interposta) como ao recurso de
apelação da autarquia previdenciária e negado provimento ao recurso de apelação da parte
autora".
(TRF-3, 7ª Turma, AC nº 2012.03.99.028461-0/SP, DJe: 16/03/2017, Rel. Des. Fed. FAUSTO
DE SANCTIS).
"PREVIDENCIÁRIO. CÔMPUTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. POSSIBILIDADE.
DISPENSA DE RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES.
(...)
4. É possível o reconhecimento do tempo de atividade rural prestado já aos 12 (doze) anos de
idade, consoante precedentes dos Tribunais Superiores.
5. De acordo com os documentos anexados aos autos, corroborados pela prova testemunhal, a
autora comprovou o exercício de atividade rural no período de 07/1975 a 07/1988, devendo ser
procedida a contagem do referido tempo de serviço, independentemente do recolhimento das
respectivas contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência, nos termos do artigo
55, §2º, da Lei 8.213/91.
6. Apelação provida".
(TRF-3, 7ª Turma, AC nº 2016.03.99.040416-4/SP, DJe: 13/03/2017, Rel. Des. Fed. TORU
YAMAMOTO).
Portanto, a implantação da aposentadoria por idade híbrida depende de prova de idade mínima
e do efetivo exercício das atividades urbana e rural, ainda que de forma descontínua, por tempo
igual ao da carência exigida para a sua concessão, sendo que o prazo de carência varia de
acordo com a tabela progressiva do artigo 142, da Lei Federal nº 8.213/91, que leva em
consideração o ano no qual o rurícola completou os requisitos para a concessão do benefício.
Porém, a partir de 31 de dezembro de 2010, aplica-se a carência de 180 meses, nos termos do
artigo 25, inciso II, da Lei Federal nº 8.213/91 e da Lei Federal nº 9.063/95.
Por fim, nos termos de orientação do Superior Tribunal de Justiça, em regime de repetitividade,
a falta de prova do labor rural implica a extinção do processo, sem a resolução do mérito: (Corte
Especial, REsp. 1.352.721/SP, j. 16/12/2015, DJe: 28/04/2016, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES
MAIA FILHO).
No mesmo sentido, precedentes recentes da 7ª Turma do TRF-3ª Região: ApCiv 0028764-
64.2011.4.03.9999, DJe: 28/01/2021, Rel. Des. Fed. CARLOS DELGADO; ApCiv 0008010-
69.2012.4.03.6183, Dje: 27/11/2019, Rel. Des. Fed. PAULO DOMINGUES; ApCiv 0002681-
35.2016.4.03.9999, DJe: 18/10/2019, Rel. Des. Fed. INÊS VIRGINIA.
No caso concreto, a parte autora nasceu em 1954, de forma que foi cumprido o requisito da
idade mínima no ano de 2014.
Considerado o ano do cumprimento do requisito etário, exige-se prova do exercício de atividade
urbana e rural por 180 (cento e oitenta) meses.
A controvérsia está restrita ao exercício de trabalho rural pelo período alegado pela parte
autora.
A autora afirma, na petição inicial, que exerce trabalho rural junto ao esposo, em regime de
economia familiar, desde 2004, quando se mudaram para a Chácara Canto Alegrense, em
Rochedo-MS. O casal sobreviveria de uma pequena criação de gado, fabricação de queijo e
cultivo de pequenas plantações para consumo próprio.
Para prova do tempo de serviço rural, foram apresentados:
- Certidão de casamento da autora com Holdemar Klagenberg, celebrado em 24 de julho de
1979, no qual a autora foi qualificada como “balconista” e seu esposo como “motorista” (fls. 20,
ID 135334764);
- Fatura de energia elétrica, na qual consta o endereço em zona rural (fls. 21, ID 135334764);
- Matrícula do imóvel com averbação de partilha em 2001, em favor da autora e seu esposo (fls.
28/31, ID 135334764);
- Declaração emitida pelo Sindicato dos Agricultores Familiares e Empreendedores Rurais de
Rochedo, em nome da autora, na qual se atesta o exercício de atividade rural em regime de
economia familiar de 2004 a 2017 (fls. 33/35, ID 135334764);
- Requerimento de matrícula de Holdemar Alcides Sandim Klagenberg, filho da autora, na
Escola Municipal de Rochedo/MS, datado de 2004 (fls. 37, ID 135334764);
- Declaração emitida pelo Secretário Escolar da E. M. Polo do Saber, na qual atesta que o filho
da autora esteve matriculado no estabelecimento no ano de 2004, e que residia na Chácara
Canto Alegrense, em Rochedo/MS (fls. 38, ID 135334764);
- Certidão de nascimento de Holdemar Alcides Sandim Klagenberg, datada de 16 de fevereiro
de 1990, sem indicação da profissão dos genitores (fls. 39, ID 135334764);
- Recibos de compra de materiais de construção em nome do esposo da autora, datados de
2004, 2006 e 2007 (fls. 40/42, 47/50 e 52/53, ID 135334764);
- Requerimentos de matrícula de Holdemar Alcides Sandim Klagenberg, filho da autora, na
Escola Estadual José Alves Ribeiro, datados de 2005 e 2006 (fls. 43, ID 135334764);
- Fichas de Atendimento expedidas pela Secretaria Municipal de Saúde de Rochedo-MS, em
nome da autora, datadas de 2005 e 2008 (fls. 44/46, ID 135334764);
- Comprovante de aquisição de vacina contra febre aftosa, datado de 30 de novembro de 2007,
em nome do esposo da autora, no qual consta a propriedade de 5 bovinos (fls. 51, ID
135334764);
- Recibo de entrega de declaração de ITR em nome da autora, referente ao exercício de 2009
(fls. 54, ID 135334764);
- Certificado de Cadastro de Imóvel Rural da Chácara Canto Alegrense, no qual a autora consta
como proprietária, com data de registro em 6 de novembro de 2014 (fls. 55, ID 135334764);
- Extrato do Produtor emitido pela Agência Estadual de Defesa Sanitária Animal e Vegetal –
IAGRO, em nome da autora e seu esposo, referente ao período de 31 de dezembro de 2014 a
31 de dezembro de 2015, no qual consta a vacinação de 3 bovinos (fls. 56, ID 135334764);
- Comprovantes e notas fiscais referentes à aquisição vacinas para febre aftosa em nome do
esposo da autora, datados de 2015, 2016 e 2017 (fls. 57/60 e 62/64, ID 135334764);
- Comprovante de Registro de Vacinação emitido pela Agência Estadual de Defesa Sanitária
Animal e Vegetal – IAGRO, no qual o esposo da autora consta como produtor, datado de 2017
(fls. 65, ID 135334764);
- CTPS da autora, na qual constam dois vínculos empregatícios urbanos entre 1975 e 1978 (fls.
1, ID 135334765);
- Demonstrativo da Simulação do Cálculo do Tempo de Contribuição emitido pelo INSS, no qual
foi reconhecido 1 ano, 10 meses e 1 dia de contribuição (fls. 2, ID 135334765).
Inicialmente, cumpre esclarecer que o INSS reconheceu administrativamente o período de
carência de 1 ano e 10 meses, considerando os recolhimentos efetuados entre 1975 e 1978.
Portanto, a concessão do benefício está condicionada ao reconhecimento de, ao menos, 160
meses de atividade rural após 2004, conforme alegado pela autora.
As certidões de casamento e de nascimento do filho da autora não constituem início de prova
material, porque anteriores ao período que se deseja provar. Ademais, a certidão de casamento
qualifica os contraentes como trabalhadores urbanos.
Os documentos escolares e as fichas de atendimento médico, por sua vez, indicam apenas o
endereço em área rural, não fazendo qualquer menção à profissão da autora e de seu esposo.
As declarações emitidas por sindicato somente constituem início de prova material se
homologados por órgão oficial. Jurisprudência específica da C. Sétima Turma: TRF-3, 7ª
Turma, ApCiv. 0000109-28.2014.4.03.6006, Dje: 22/10/2020, Rel. Des. Fed. CARLOS
DELGADO.
Diante da ausência de homologação do documento apresentado pela autora, seu valor
probatório deve ser afastado.
De outro lado, os demais documentos - referentes ao imóvel e à propriedade de bovinos são
aptos a constituir início de prova material.
Em depoimento, a autora afirmou que começou a trabalhar aos 19 anos como empregada
doméstica, ajudante em loja, auxiliar de escritório e auxiliar numa clínica odontológica até o
casamento, aos 26 anos. Após o casamento, passou a viver na zona urbana de São Gabriel
durante aproximadamente 20 anos, período durante o qual o esposo trabalhou como tratorista
rural. Em 2004, mudaram-se para a zona rural de Rochedo, passando a viver na Chácara
Alegretense. Afirma que tanto ela quanto o esposo obtêm renda da criação de galinhas,
produção de leite, queijos, etc (ID 135334769).
Foram ouvidas duas testemunhas, que confirmaram as alegações da autora.
A testemunha Cristine Batista de Souza afirmou conhecer a autora desde 2004 e que, desde
então, a autora vive numa chácara e produz queijos junto ao marido. A testemunha afirmou ser
vizinha da autora, além ter estudado com o filho da autora durante o ensino médio e que já
esteve na chácara da autora algumas vezes (ID 135334768).
A testemunha Terezinha Alves da Silveira, por sua vez, afirmou conhecer a autora há muitos
anos e que é vizinha da autora desde 2004. Que os pais da autora moravam na chácara no
passado, e que a autora a recebeu de herança. Afirmou que desde então a autora e o esposo
trabalham na chácara produzindo queijos, sem empregados ou maquinários. Que eles possuem
vacas (ID 135334770).
Desta forma, verifica-se que há início de prova material - corroborado pelos depoimentos das
testemunhas - do exercício de trabalho rural, pela autora, de 2004 a 2017, período que, somado
ao tempo de trabalho urbano é suficiente ao preenchimento da carência.
O benefício deve ser concedido.
O termo inicial deve ser fixado na data do requerimento administrativo (06/10/2017),
considerando que, naquela ocasião, a parte autora já havia implementado os requisitos
necessários à concessão da benesse.
Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos
pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à
época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE
870947.
Por tais fundamentos, dou provimento à apelação da parte autora.
Inverto o ônus sucumbencial. Condeno a autarquia ao ressarcimento das despesas processuais
eventualmente desembolsadas pela autora e fixo honorários advocatícios em 10% (dez por
cento) do valor da condenação, nos termos da Súmula nº 111 do STJ.
O INSS é isento de custas processuais, arcando com as demais despesas, inclusive honorários
periciais (Res. CJF nºs. 541 e 558/2007), além de reembolsar custas recolhidas pela parte
contrária, o que não é o caso dos autos, ante a gratuidade processual concedida (art. 4º, I e
parágrafo único, da Lei 9.289/1996, art. 24-A da Lei 9.028/1995, n.r., e art. 8º, § 1º, da Lei
8.620/1993).
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO – APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA - RECONHECIMENTO DE
TEMPO DE SERVIÇO RURAL – INÍCIO DE PROVA MATERIAL COMPLEMENTADO PELA
PROVA TESTEMUNHAL.
1. A Lei Federal nº. 8.213/91 garante ao segurado que exerceu serviço urbano e rural, o direito
a se aposentar por idade, na forma híbrida, desde que preenchidos os requisitos etário – 65
(sessenta e cinco) anos para homem e 60 (sessenta) para mulher – e de carência.
2. O art. 55, § 3º, da Lei Federal nº 8.213 estatui que a comprovação do tempo de serviço rural
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido, a Súmula nº 149 do Superior Tribunal de
Justiça.
3. No que tange à atividade rural exercida após a vigência da Lei nº 8.213/91, não obstante ser
necessário o recolhimento das respectivas contribuições, não se pode exigir que tal
comprovação seja encargo do empregado, do “bóia-fria”, do safrista, do volante, do diarista,
etc., na medida em que o responsável pelo recolhimento de tais tributos é o empregador ou
patrão. O mesmo ocorre em relação ao segurado especial objeto do art. 11, VII, da Lei Federal
nº 8.213.
4. A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, este não deve ser reconhecido
em período anterior aos 12 anos de idade, uma vez que o menor nessas condições, ainda que
acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não é
razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, principalmente por não
contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
5. Nos termos de orientação do Superior Tribunal de Justiça, em regime de repetitividade, a
falta de prova do labor rural implica a extinção do processo, sem a resolução do mérito: (Corte
Especial, REsp. 1.352.721/SP, j. 16/12/2015, DJe: 28/04/2016, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES
MAIA FILHO).
6. A controvérsia está restrita ao exercício de trabalho rural pelo período alegado pela parte
autora.
7. No caso concreto, há início de prova material - corroborado pelos depoimentos das
testemunhas - do exercício de trabalho rural, pela autora, de 2004 a 2017, período que, somado
ao tempo de trabalho urbano é suficiente ao preenchimento da carência.
8. O termo inicial deve ser fixado na data do requerimento administrativo, considerando que,
naquela ocasião, a parte autora já havia implementado os requisitos necessários à concessão
do benefício.
9. Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios
estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça
Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos
autos do RE 870947.
10. Apelação da autora provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado., nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
