Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6091059-54.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
04/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 10/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE/INCONSISTENTE. EXTINÇÃO
SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. RESP REPETITIVO 1352721/SP. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA
MANTIDO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PREJUDICADA.
1. Para a percepção de Aposentadoria por Idade, o segurado deve demonstrar o cumprimento da
idade mínima de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher, e número mínimo de contribuições
para preenchimento do período de carência correspondente, conforme artigos 48 e 142 da Lei
8.213/91.
2. Anoto, por oportuno, que a edição da Lei nº 11.718, de 20 de junho de 2008, promoveu uma
alteração no art. 48 da Lei 8.213/91, que possibilitou a contagem mista do tempo de labor rural e
urbano para fins de concessão de aposentadoria por idade, com a majoração do requisito etário
mínimo para 60 (sessenta) e 65 (sessenta e cinco) anos, respectivamente, para mulheres e
homens. A lei não faz distinção acerca de qual seria a atividade a ser exercida pelo segurado no
momento imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou requerimento
administrativo, sendo irrelevante aferir se a atividade agrícola foi ou não exercida por último.
3. Verifico, ainda, que, por meio de acórdão publicado no DJe de 04/09/2019 (Resp
1.674.221/PR), a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça – STJ, em julgamento sob o
rito dos recursos repetitivos, fixou a seguinte tese em relação ao Tema Repetitivo 1.007: "O
tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991,
pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do artigo
48, parágrafo 3º, da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no
período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário
ou do requerimento administrativo".
4. Observe-se, por fim, que o C. STF concluiu, no dia 25/9/2020 (Plenário Virtual), o julgamento
do Tema 1104 (RE 1.281.909), que discutia a questão dos requisitos para concessão da
aposentadoria híbrida, tendo firmado a seguinte tese: “É infraconstitucional, a ela se aplicando os
efeitos da ausência de repercussão geral, a controvérsia relativa à definição e ao preenchimento
dos requisitos legais necessários para a concessão de aposentadoria híbrida, prevista no art. 48,
§ 3º da Lei nº 8.213/91.”. Desse modo, ausente arepercussão geralda matéria, prevalece o
entendimento adotado pelo C.STJ, ao julgar o Tema 1007.
5. Como bem consignado pela r. sentença, a documentação colacionada aos autos é insuficiente
à comprovação vindicada. Nenhum documento indica a autora como trabalhadora rural, em
qualquer tempo. Os documentos relacionados acima sob os números 1 e 2 não lhe são
extensíveis, porquanto ela nem sequer seria nascida quando foram produzidos. O documento
relacionado sob o número 3 só indica que a autora teria se formado no 4º ano da Escola Mista do
Bairro Campo Alegre, em 1965, mas não conduz o entendimento de exercício de trabalho rural,
por evidente. O título eleitoral do irmão da autora, constante do documento relacionado sob o nº
4, indica que ele residiria na Fazenda Campo Alegre, mesmo local onde a autora e seu marido
residiriam por ocasião do enlace matrimonial, consoante Certidão de Casamento relacionada sob
o número 5. O documento de número 6 não a aponta como trabalhadora rural, e sim como
“doméstica”. Os documentos relacionados sob os números 7, 8 e 9, colacionados aos autos
somente de forma parcial, por sua vez, demonstram a existência de uma propriedade rural em
condomínio, de propriedade dos genitores da autora, denominada “Sítio Santo Antônio”,
encravada na Fazenda “Marinheiro de Cima”, mas esse fato causa certa estranheza, uma vez
que, aparentemente, a autora residiria em outra fazenda quando se casou, denominada Fazenda
Campo Alegre, também de propriedade de seu pai, conforme ele mesmo afirmou em processo
revisional (documento relacionado sob o número 10). E, com relação ao documento relacionado
sob o número 11, vê-se que só restaram reconhecidos os interregnos de trabalho rural do marido
dela nos períodos de 30/08/1968 a 21/12/1968 e de 02/01/1971 a 02/08/1972, na qualidade de
empregado, prestado para Leonor Bucalon, considerando os documentos apresentados,
delimitados os períodos de acordo com o pedido do requerente, sendo certo que o trabalho nessa
condição não lhe é extensível automaticamente, como no caso do labor exercido em regime de
subsistência.
6. Assim, mesmo que a prova testemunhal seja favorável à pretensão autoral, ela não serve,
exclusivamente, para o reconhecimento vindicado. Desse modo, considerando que o conjunto
probatório foi insuficiente/inconsistente à comprovação pleiteada, seria o caso de se manter a
improcedência da ação, não tendo a parte autora se desincumbido do ônus probatório que lhe
cabia, ex vi do art. 373, I, do CPC/2015.
7. Entretanto, o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática de
recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973 é no sentido de que a ausência de
conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de pressuposto de constituição e
desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito,
propiciando ao autor intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários.
8. Mantenho, por fim, a condenação da parte autora no pagamento das verbas sucumbenciais,
observados os benefícios da assistência judiciária gratuita (arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei
1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC), já que deu causa à extinção do processo
sem resolução do mérito.
9. Processo extinto, de ofício. Apelação da parte autora prejudicada.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6091059-54.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: ELIZABETH COLELLA BINATI
Advogado do(a) APELANTE: FABIO LUIS BINATI - SP246994-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6091059-54.2019.4.03.9999
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator):
Trata-se de apelação em ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte
autora requer a concessão de aposentadoria por idade híbrida.
A r. sentença julgou improcedente o pedido constante da exordial, condenando a parte autora
ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios fixados em 10%
(dez por cento), sobre o valor causa, ressalvado o disposto no artigo 98, parágrafo 3º, do
Código de Processo Civil, eis que beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Opostos embargos de declaração pela parte autora, restaram rejeitados (ID 98910943).
Irresignada, a parte autora ofertou apelação, alegando, em apertada síntese, que possui os
requisitos necessários à concessão da benesse vindicada, motivando as razões de sua
insurgência. Nesses termos, requer a reforma da r. sentença, com a procedência do pedido
inaugural.
Sem contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal.
Os autos foram sobrestados nesta E. Corte, em cumprimento à determinação da Superior
Instância (Tema 1.007/STJ).
É o relatório.
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator):
De início, determino o regular prosseguimento do feito, considerando que as razões que
levaram ao sobrestamento do andamento processual não mais subsistem.
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente
regular, motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de
adequação (art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse
recursal e inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do
artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
Para a percepção de Aposentadoria por Idade, o segurado deve demonstrar o cumprimento da
idade mínima de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher, e número mínimo de contribuições
para preenchimento do período de carência correspondente, conforme artigos 48 e 142 da Lei
8.213/91.
Cumpre ressaltar que, com o advento da Lei nº 10.666, de 08 de maio de 2003, a perda da
qualidade de segurado se tornou irrelevante para a concessão da aposentadoria por idade,
desde que o segurado já conte com o tempo de contribuição correspondente ao exigido para
efeito de carência, na data de requerimento do benefício.
"Art. 3º: A perda da qualidade do segurado não será considerada para a concessão das
aposentadorias por tempo de contribuição e especial.
§1º Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será
considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o
tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do
requerimento do benefício.
§2º A concessão do benefício de aposentadoria por idade, nos termos do §1º, observará, para
os fins de cálculo do valor do benefício, o disposto no art. 3º, caput e §2°, da Lei nº 9.876, de 26
de novembro de 1999, ou, não havendo salários de contribuição recolhidos no período a partir
da competência julho de 1994, o disposto no art. 35 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991."
Muito embora o art. 3º, §1º, da Lei 10.666/2003 estabeleça que o segurado conte com no
mínimo o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do
requerimento do benefício, a Jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça entende
que a carência exigida deve levar em conta a data em que o segurado implementou as
condições necessárias à concessão do benefício e não a data do requerimento administrativo.
Nesse sentido, trago à colação o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 142 DA LEI Nº
8.213/91. PERÍODO DE CARÊNCIA. PREENCHIMENTO. PERDA DA QUALIDADE DE
SEGURADO. ATENDIMENTO PRÉVIO DOS REQUISITOS. BENEFÍCIO DEVIDO.
1. Na forma da atual redação do art. 142 da Lei nº 8.213/91, alterado pela Lei nº 9.032/95, a
carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá à tabela ali
prevista, mas levando-se em consideração o ano em que o segurado implementou as
condições necessárias à concessão do benefício e não a data do requerimento administrativo.
2. Aplica-se ao caso o art. 102, § 1º, da Lei nº 8.213/91, que dispõe que a perda da qualidade
de segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja concessão tenham sido
preenchidos todos os requisitos segundo a legislação então em vigor (arts. 52 e 53 da Lei nº
8.213/91).
3. Recurso especial provido."
(REsp. nº 490.585/PR, Relator o Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, DJU de 23/8/2005).
O artigo 24 da Lei nº 8.213/1991 dispõe que: "Período de carência é o número mínimo de
contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício,
consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências."
Por seu turno, o art. 25, inciso II, da referida Lei estabelece que:
"A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos
seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
(...)
II - aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo de serviço e aposentadoria especial: 180
contribuições mensais."
Porém, para os segurados inscritos na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, o art.
142 da Lei nº 8.213/1991, trouxe uma regra de transição, consubstanciada em uma tabela
progressiva de carência, de acordo com o ano em que foram implementadas as condições para
a aposentadoria por idade.
Deve-se observar que para aferir a carência a ser cumprida deverá ser levada em consideração
a data em que foi implementado o requisito etário para a obtenção do benefício e não aquele
em que a pessoa ingressa com o requerimento de aposentadoria por idade junto ao Instituto
Nacional do Seguro Social.
Trata-se de observância do mandamento constitucional de que todos são iguais perante a lei
(art. 5º, caput, da Constituição Federal). Se, por exemplo, aquele que tivesse preenchido as
condições de idade e de carência, mas que fizesse o requerimento administrativo
posteriormente seria prejudicado com a postergação do seu pedido, já que estaria obrigado a
cumprir um período maior de carência do que aquele que o fizesse no mesmo momento em que
tivesse completado a idade mínima exigida, o que obviamente não se coaduna com o princípio
da isonomia, que requer que pessoas em situações iguais sejam tratadas da mesma maneira.
Por outro lado, no caso de cumprimento do requisito etário, mas não da carência, o aferimento
desta, relativamente à aposentadoria por idade, será realizado quando do atingimento da idade
esperada, ainda que, naquele momento a pessoa não tivesse completado a carência
necessária.
Nessa situação, o próprio adiamento da possibilidade de obtenção do benefício para o
momento em que fosse cumprida a carência exigida no artigo 142 da Lei de Benefícios
Previdenciários já estabeleceria diferença entre aquele que cumpriu a carência no momento em
que completara a idade mínima, não havendo que se falar em necessidade de qualquer prazo
adicional.
Corroborando este entendimento, cito a Súmula nº 02 da Turma Regional de Uniformização dos
Juizados Especiais Federais da 4ª Região, que assim dispôs: Para a concessão da
aposentadoria por idade, não é necessário que os requisitos da idade e da carência sejam
preenchidos simultaneamente.
Anoto, por oportuno, que a edição da Lei nº 11.718, de 20 de junho de 2008, promoveu uma
alteração no art. 48 da Lei 8.213/91, que possibilitou a contagem mista do tempo de labor rural
e urbano para fins de concessão de aposentadoria por idade, com a majoração do requisito
etário mínimo para 60 (sessenta) e 65 (sessenta e cinco) anos, respectivamente, para mulheres
e homens.
Trago à colação a redação mencionada, in litteris:
"§2º: Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei.
§3º: Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no §
2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
§4º: Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de
acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-
de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-
contribuição da Previdência Social." (g.n.)
A lei não faz distinção acerca de qual seria a atividade a ser exercida pelo segurado no
momento imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou requerimento
administrativo, sendo irrelevante aferir se a atividade agrícola foi ou não exercida por último.
Verifico, ainda, que, por meio de acórdão publicado no DJe de 04/09/2019 (Resp
1.674.221/PR), a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça – STJ, em julgamento sob
o rito dos recursos repetitivos, fixou a seguinte tese em relação ao Tema Repetitivo 1.007: "O
tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991,
pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por
idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do
artigo 48, parágrafo 3º, da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto
exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do
requisito etário ou do requerimento administrativo".
Observe-se, por fim, que o C. STF concluiu, no dia 25/9/2020 (Plenário Virtual), o julgamento do
Tema 1104 (RE 1.281.909), que discutia a questão dos requisitos para concessão da
aposentadoria híbrida, tendo firmado a seguinte tese: “É infraconstitucional, a ela se aplicando
os efeitos da ausência de repercussão geral, a controvérsia relativa à definição e ao
preenchimento dos requisitos legais necessários para a concessão de aposentadoria híbrida,
prevista no art. 48, § 3º da Lei nº 8.213/91.”
Desse modo, ausenterepercussão geralda matéria, prevalece o entendimento adotado pelo
C.STJ, ao julgar o Tema 1007.
Feitas tais considerações, passo à análise dos requisitos necessários. A idade mínima de 60
anos exigida para a obtenção do benefício foi atingida pela parte autora em 2013, haja vista
haver nascido em 24/08/1953, segundo atesta sua documentação. Desse modo, necessária
agora a comprovação da carência no montante de 180 meses, conforme redação dada ao art.
142 da Lei 8.213/91, após sua modificação pela Lei 9.032/95.
Com relação ao labor rural, a jurisprudência do E. STJ firmou-se no sentido de que é
insuficiente apenas a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, na
forma da Súmula 149 - STJ, in verbis:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à com provação da atividade rurícola, para
efeito de obtenção de benefício previdenciário.".
Ainda de acordo com a jurisprudência, necessária demonstração razoável de início de prova
material, a ser corroborada por prova testemunhal, atentando-se, dentre outros aspectos, que,
em regra, são extensíveis aos postulantes rurícolas os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou os conviventes, aparecem qualificados como lavradores.
Vale destacar, por fim, que início de prova material não significa completude, mas elemento
indicativo que permita o reconhecimento da situação jurídica discutida, desde que associada a
outros dados probatórios.
Quanto à atividade rural exercida após a vigência da Lei nº 8.213/91 (depois de 2010), não
obstante a Lei nº 11.718/2008 preveja a necessidade de um número mínimo de recolhimentos
das respectivas contribuições ao trabalhador rural enquadrado na categoria de contribuinte
individual sem relação de emprego, vejo que a jurisprudência do C. STJ não exige tal
comprovação do “bóia-fria”, do safrista, do volante e do diarista, na medida em que equipara
tais atividades ao segurado especial, o qual já estaria dispensado de tais recolhimentos.
Nesse sentido:
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENQUADRAMENTO DO TRABALHADORBÓIA-
FRIA. EQUIPARAÇÃO AO SEGURADO ESPECIAL. ART. 11, VII DA LEI 8.213/1991.
DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DECONTRIBUIÇÕES.RECURSO ESPECIAL DO
INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Esta Corte consolidou a orientação de que o Trabalhador Rural, na condição debóia-
fria,equipara-se ao Segurado Especial de que trata o inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, no
que tange aos requisitos necessários para a obtenção de benefícios previdenciários.
2. Exigindo-se, tão somente, a apresentação de prova material, ainda que diminuta, desta que
corroborada por robusta prova testemunhal, não havendo que se falar em necessidade de
comprovação de recolhimentosprevidenciários para fins de concessão de aposentadoria rural
(REsp. 1.321.493/PR, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 19.12.2012).
3. É inegável que o trabalhadorbóia-friaexerce sua atividade em flagrante desproteção, sem
qualquer formalização e com o recebimento de valores ínfimos, o que demonstra a total falta de
razoabilidade em se exigir que deveriam recolhercontribuiçõesprevidenciárias.
4. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento”.
(STJ, 1ª Turma, Resp. 1762211, DJ 07/12/2018, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO).
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do(a) menor, entendo pela possibilidade de
reconhecimento já a partir dos 12 anos de idade, uma vez que as normas que impedem o
trabalho infantil não podem penalizar o(a) jovem que exerceu labor campesino nessa situação.
No entanto, esse entendimento não permite o reconhecimento para idades inferiores a este
patamar, porquanto mesmo que o(a) jovem acompanhasse os pais na lavoura e,
eventualmente, os auxiliasse em algumas atividades, não é razoável supor que pudesse
exercer plenamente a atividade rural em virtude de não possuir o vigor físico necessário para
tanto.
Nesses termos:
“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO. RURÍCOLA. MENOR
DE 12 ANOS. LEI Nº 8.213/91, ART. 11, INCISO VII. PRECEDENTES. SÚMULA 07/STJ. 1 -
Demonstrado o exercício da atividade rural do menor de doze anos, em regime de economia
familiar, o tempo de serviço é de ser reconhecido para fins previdenciários, porquanto as
normas que proíbem o trabalho do menor foram editadas para protegê-lo e não para prejudicá-
lo. Precedentes. 2 - Recurso especial conhecido"(STJ - REsp: 331568 RS 2001/0093416-0,
Relator: Ministro FERNANDO GONÇALVES, Data de Julgamento: 23/10/2001, T6 - SEXTA
TURMA, Data de Publicação: DJ 12.11.2001 p. 182RSTJ vol. 153 p. 551).
"PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ULTRA PETITA. APOSENTADORIA
POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE LABOR EXERCIDO SOB
CONDIÇÕES ESPECIAIS. TEMPO DE LABOR NA FAINA RURAL.
(...)
- Admite-se o cômputo do período laborado no campo pelo menor de idade (a partir dos 12 -
doze - anos), uma vez que as regras insculpidas nos Ordenamentos Constitucionais, vedando o
trabalho infantil, não podem prejudicá-lo.
- Dado parcial provimento tanto à remessa oficial (tida por interposta) como ao recurso de
apelação da autarquia previdenciária e negado provimento ao recurso de apelação da parte
autora". (TRF-3, 7ª Turma, AC nº 2012.03.99.028461-0/SP, DJe: 16/03/2017, Rel. Des. Fed.
FAUSTO DE SANCTIS).
Observe-se, por derradeiro, que o regime de economia familiar pressupõe a exploração de
atividade primária pelo indivíduo, como principal forma de sustento, acompanhado ou não pelo
grupo familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11, VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91).
Assim, nos termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se segurados especiais, em
regime de economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros, arrendatários rurais,
pescadores artesanais e assemelhados, que exerçam atividades individualmente ou com auxílio
eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos, ou a eles
equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo,
residindo na área rural ou em imóvel próximo ao local onde a atividade rural é exercida, em
área não superior a quatro módulos fiscais e com participação significativa nas atividades rurais
do grupo familiar.
Na exordial, a parte autora postulou o reconhecimento de suposto trabalho rural por ela
exercido, alegando, in litteris:
“(...)
Nascida aos 24/08/1953, estando na data do requerimento administrativo negado com 64 anos
de idade, a Autora implementou todos os requisitos para o recebimento da aposentadoria por
idade híbrida ou mista, eis que conta no ato administrativo com idade superior a 60 anos, e
laborou no meio rural que se somado aos recolhimentos previdenciários efetivados, totalizam
mais de 17 anos de trabalho, conforme documentos em anexo.
A autora, desde tenra idade, desde antes dos 12 anos de idade dedicou-se ao labor rural,
laborando toda vida em conjunto com seus pais e familiares, e mesmo depois de casada
manteve-se na lida rural, com a família de seu esposo, na mesma localidade (Campo Alegre /
Varação), até 22/11/1972, quando vieram para a cidade e seu esposo iniciou trabalho urbano
(CTPS anexa).
Inicialmente, a Autora mudou-se para o sítio herdado pela sua mãe, com toda a família, no
Campo Alegre, em Valentim Gentil- SP, com 7 anos de idade, quando seu pai assumiu
sociedade com os cunhados em uma propriedade rural denominada “Sítio Santo Antônio”,
inicialmente de 20 alqueires, onde dividiam com outras 6 (seis) famílias, depois diminuída para
13 alqueires, e por último possuíam apenas 5,57 alqueires, conforme certidões das matrículas
anexas, todos trabalhando em regime de economia familiar, e dependiam daquela terra e renda
para sobrevivência, sem jamais ter tido empregados, no cultivo de café e demais plantios para
própria sobrevivência.
Casou-se com 18 anos de idade, em 1971, e passou a morar com seu esposo no sítio onde seu
sogro e esposo eram empregados, tendo trabalhado ali por apenas mais um ano, também no
cultivo de café, até 22/11/72, quando Autora e esposo vieram para a cidade.
Ambas as propriedades onde a Autora viveu e trabalhou pertencem ao mesmo município de
Valentim Gentil-SP, denominados Campo Alegre e Varação, locais vizinhos.
Somente de labor rural, ininterruptamente, de 24/08/65 até 21/11/72, a Autora contabiliza 07
anos, 02 meses e 28 dias. Já no período entre 1972 até a data do requerimento (2017) a Autora
verteu recolhimentos aos cofres do INSS por carnê de GPS, conforme consta do CNIS,
contabilizando mais de 10 anos de labor urbano, somente até o requerimento administrativo
negado.
Desse modo, somando-se o tempo laborado no meio rural com o tempo devidamente
contribuído de atividade urbana, a Autora soma um total geral de 17 anos, 05 meses e 14 dias
de tempo total de trabalho, até a data do requerimento administrativo.
Por isso faz jus ao benefício de Aposentadoria por Idade Híbrida, no valor de um salário
mínimo, pois já implementou a idade e carência para o referido benefício.
(...)”
Como início de prova material da alegada atividade rural, apresentou os seguintes documentos:
1) Certificado de Reservista em nome do pai da autora, onde a profissão está ilegível, do ano
de 1946;
2) Certidão de Casamento do Pai da autora, cujo enlace matrimonial ocorreu aos 27/01/1949,
onde ele está qualificado como “lavrador”;
3) Certificado de Habilitação em nome da autora, indicando que a autora teria se formado no 4º
ano da Escola Mista do Bairro Campo Alegre, em 1965.
4) Título Eleitoral em nome do irmão da autora, indicando que ele se qualificou na ocasião como
“lavrador” e que residiria na Fazenda Campo Alegre, com data de 30/01/1970;
5) Certidão de Casamento da Paróquia de Valentim Gentil, onde consta que, aos 18/12/1971,
onde consta que o casal da autora seria residente na mesma Fazenda Campo Alegre;
6) Certidão de Casamento Civil da autora, cujo enlace matrimonial ocorreu aos 18/12/1971,
onde o esposo da autora foi qualificado como “lavrador” e a autora como “doméstica”;
7) Ficha nº 1 de Matrícula 6.618, feita em 20/07/1979, relacionada a um imóvel rural com área
de 48,40 hectares (20 alqueires), denominado “Sítio Santo Antônio”, encravado na Fazenda
“Marinheiro de Cima”, de propriedade de Waldemar Luiz Rovina e outros, sendo o pai da autora
um dos proprietários, observando-se que o número de registro anterior estaria relacionado às
transcrições nº 21.632 (10 alqueires) e 21.633 (10 alqueires);
8) Ficha nº 1 de Matrícula 9.901, feita em 09/05/1980, relacionada a um imóvel rural com área
de 33,33 hectares (13 alqueires), denominado “Sítio Santo Antônio”, encravado na Fazenda
“Marinheiro de Cima”, de propriedade de Octávio Rovina e outros, sendo o pai da autora um
dos proprietários, observando-se que o número de registro anterior estaria relacionado às
transcrições nº 21.632 e 21.633 e Matrícula nº 6.618;
9) Ficha nº 1 de Matrícula 6.749, feita em 23/08/1979, relacionada a um imóvel rural com área
de 13,48 hectares (5,57 alqueires), denominado “Sítio Santo Antônio”, encravado na Fazenda
“Marinheiro de Cima”, de propriedade de Waldemar Luiz Rovina e outros, sendo o pai da autora
um dos proprietários, observando-se que o número de registro anterior estaria relacionado às
transcrições nº 21.632 e 21.633, já matriculado sob o nº 6.618;
10) Formulário de Controle de revisão de aposentadoria por velhice concedido ao genitor da
autora em 25/06/1991, onde consta, em entrevista, que ele afirmou que seria proprietário da
Fazenda Campo Alegre e que a vendeu para comprar uma casa (ID 98910832) e que o INSS,
em operação revisional, entendeu ser regular o benefício concedido. Constata-se, ainda, que
Adalberto Zangrando, proprietário da Fazenda Santa Marlene, seria empregador dele em
período posterior.
11) Cópia de Processo Administrativo de Concessão de Aposentadoria por Tempo de
Contribuição do esposo da autora (Luiz Dorival Binati), onde consta que ele teria declarado
“lavrador” em Título Eleitoral emitido em 1968, o mesmo sendo declarado em pedido de
habilitação efetuado em 1972, onde restou averbado os períodos de trabalho rural de
30/08/1968 a 21/12/1968 e 02/01/1971 a 02/08/1972, na qualidade de empregado, prestado
para Leonor Bucalon, observados os documentos apresentados, delimitados de acordo com o
pedido do requerente (ID 98910843 – pág. 29 e 98910843 – pág. 34).
Com relação à prova oral produzida, as testemunhas Antonio Cevallos Junior, vizinho de cerca
e proprietário rural, disse conhecer a autora há mais de 50 anos, e que ela trabalhou no sítio de
propriedade da família dela e que, quando se casou, foi morar no sítio em que o marido
trabalhava. Esclareceu que, na propriedade do pai da autora, eles não tinham empregados e
salientou que cinco ou seis famílias moravam e trabalhavam lá. A testemunha Valentin Jair
Rovina disse conhecer a autora desde criança e que ela trabalhava no sítio do pai dela até se
casar, tendo ido morar com o sogro. O pai da autora era sócio do pai da testemunha, sendo que
a testemunha trabalhou na roça junto com a autora. Por fim, a testemunha Clementino Bocalon
disse conhecer a autora desde que ela ia na escola. Esclareceu que a família da autora recebeu
o sítio de herança e que ela trabalhou ali até casar. Depois do casamento, a autora foi morar no
sítio do pai do depoente e depois, foi para a cidade. Esclareceu que cinco ou seis famílias
“tocavam” a propriedade rural recebida por herança e que foi ao casamento dela, que ocorreu
na propriedade do depoente, onde morou junto com o marido dela, sendo certo que ela exercia
o trabalho rural.
Pois bem.
Como bem consignado pela r. sentença, a documentação colacionada aos autos é insuficiente
à comprovação vindicada. Nenhum documento indica a autora como trabalhadora rural, em
qualquer tempo. Os documentos relacionados acima sob os números 1 e 2 não lhe são
extensíveis, porquanto ela nem sequer seria nascida quando foram produzidos. O documento
relacionado sob o número 3 só indica que a autora teria se formado no 4º ano da Escola Mista
do Bairro Campo Alegre, em 1965, mas não conduz o entendimento de exercício de trabalho
rural, por evidente. O título eleitoral do irmão da autora, constante do documento relacionado
sob o nº 4, indica que ele residiria na Fazenda Campo Alegre, mesmo local onde a autora e seu
marido residiriam por ocasião do enlace matrimonial, consoante Certidão de Casamento
relacionada sob o número 5. O documento de número 6 não a aponta como trabalhadora rural,
e sim como “doméstica”. Os documentos relacionados sob os números 7, 8 e 9, colacionados
aos autos somente de forma parcial, por sua vez, demonstram a existência de uma propriedade
rural em condomínio, de propriedade dos genitores da autora, denominada “Sítio Santo
Antônio”, encravada na Fazenda “Marinheiro de Cima”, mas esse fato causa certa estranheza,
uma vez que, aparentemente, a autora residiria em outra fazenda quando se casou,
denominada Fazenda Campo Alegre, também de propriedade de seu pai, conforme ele mesmo
afirmou em processo revisional (documento relacionado sob o número 10). E, com relação ao
documento relacionado sob o número 11, vê-se que só restaram reconhecidos os interregnos
de trabalho rural do marido dela nos períodos de 30/08/1968 a 21/12/1968 e de 02/01/1971 a
02/08/1972, na qualidade de empregado, prestado para Leonor Bucalon, considerando os
documentos apresentados, delimitados os períodos de acordo com o pedido do requerente,
sendo certo que o trabalho nessa condição não lhe é extensível automaticamente, como no
caso do labor exercido em regime de subsistência.
Assim, mesmo que a prova testemunhal seja favorável à pretensão autoral, ela não serve,
exclusivamente, para o reconhecimento vindicado.
Desse modo, considerando que o conjunto probatório foi insuficiente/inconsistente à
comprovação pleiteada, seria o caso de se manter a improcedência da ação, não tendo a parte
autora se desincumbido do ônus probatório que lhe cabia, ex vi do art. 373, I, do CPC/2015.
Entretanto, o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática de
recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973 é no sentido de que a ausência de
conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de pressuposto de constituição
e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito,
propiciando ao autor intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários.
Por oportuno, transcrevo:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR
IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA
ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO
DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE
DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO
ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os
seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas
previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em
conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto
social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais
da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da
Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido
de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe
garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na
hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna,
a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental
à prestação previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística
civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar
prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas
demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual
garantido constitucionalmente, tendo a CF/88dado primazia à função social do RGPS ao erigir
como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo
certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente
dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura
previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela
via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do
CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa.
6. Recurso Especial do INSS desprovido". (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO
NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).
Mantenho, por fim, a condenação da parte autora no pagamento das verbas sucumbenciais,
observados os benefícios da assistência judiciária gratuita (arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei
1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC), já que deu causa à extinção do processo
sem resolução do mérito.
Ante o exposto, DE OFÍCIO, extingo o processo, sem resolução do mérito, com fulcro no art.
485, IV do CPC/2015, julgando prejudicado o apelo da parte autora, nos termos deste
arrazoado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE/INCONSISTENTE. EXTINÇÃO
SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. RESP REPETITIVO 1352721/SP. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA
MANTIDO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PREJUDICADA.
1. Para a percepção de Aposentadoria por Idade, o segurado deve demonstrar o cumprimento
da idade mínima de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher, e número mínimo de
contribuições para preenchimento do período de carência correspondente, conforme artigos 48
e 142 da Lei 8.213/91.
2. Anoto, por oportuno, que a edição da Lei nº 11.718, de 20 de junho de 2008, promoveu uma
alteração no art. 48 da Lei 8.213/91, que possibilitou a contagem mista do tempo de labor rural
e urbano para fins de concessão de aposentadoria por idade, com a majoração do requisito
etário mínimo para 60 (sessenta) e 65 (sessenta e cinco) anos, respectivamente, para mulheres
e homens. A lei não faz distinção acerca de qual seria a atividade a ser exercida pelo segurado
no momento imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou requerimento
administrativo, sendo irrelevante aferir se a atividade agrícola foi ou não exercida por último.
3. Verifico, ainda, que, por meio de acórdão publicado no DJe de 04/09/2019 (Resp
1.674.221/PR), a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça – STJ, em julgamento sob
o rito dos recursos repetitivos, fixou a seguinte tese em relação ao Tema Repetitivo 1.007: "O
tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991,
pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por
idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do
artigo 48, parágrafo 3º, da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto
exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do
requisito etário ou do requerimento administrativo".
4. Observe-se, por fim, que o C. STF concluiu, no dia 25/9/2020 (Plenário Virtual), o julgamento
do Tema 1104 (RE 1.281.909), que discutia a questão dos requisitos para concessão da
aposentadoria híbrida, tendo firmado a seguinte tese: “É infraconstitucional, a ela se aplicando
os efeitos da ausência de repercussão geral, a controvérsia relativa à definição e ao
preenchimento dos requisitos legais necessários para a concessão de aposentadoria híbrida,
prevista no art. 48, § 3º da Lei nº 8.213/91.”. Desse modo, ausente arepercussão geralda
matéria, prevalece o entendimento adotado pelo C.STJ, ao julgar o Tema 1007.
5. Como bem consignado pela r. sentença, a documentação colacionada aos autos é
insuficiente à comprovação vindicada. Nenhum documento indica a autora como trabalhadora
rural, em qualquer tempo. Os documentos relacionados acima sob os números 1 e 2 não lhe
são extensíveis, porquanto ela nem sequer seria nascida quando foram produzidos. O
documento relacionado sob o número 3 só indica que a autora teria se formado no 4º ano da
Escola Mista do Bairro Campo Alegre, em 1965, mas não conduz o entendimento de exercício
de trabalho rural, por evidente. O título eleitoral do irmão da autora, constante do documento
relacionado sob o nº 4, indica que ele residiria na Fazenda Campo Alegre, mesmo local onde a
autora e seu marido residiriam por ocasião do enlace matrimonial, consoante Certidão de
Casamento relacionada sob o número 5. O documento de número 6 não a aponta como
trabalhadora rural, e sim como “doméstica”. Os documentos relacionados sob os números 7, 8 e
9, colacionados aos autos somente de forma parcial, por sua vez, demonstram a existência de
uma propriedade rural em condomínio, de propriedade dos genitores da autora, denominada
“Sítio Santo Antônio”, encravada na Fazenda “Marinheiro de Cima”, mas esse fato causa certa
estranheza, uma vez que, aparentemente, a autora residiria em outra fazenda quando se casou,
denominada Fazenda Campo Alegre, também de propriedade de seu pai, conforme ele mesmo
afirmou em processo revisional (documento relacionado sob o número 10). E, com relação ao
documento relacionado sob o número 11, vê-se que só restaram reconhecidos os interregnos
de trabalho rural do marido dela nos períodos de 30/08/1968 a 21/12/1968 e de 02/01/1971 a
02/08/1972, na qualidade de empregado, prestado para Leonor Bucalon, considerando os
documentos apresentados, delimitados os períodos de acordo com o pedido do requerente,
sendo certo que o trabalho nessa condição não lhe é extensível automaticamente, como no
caso do labor exercido em regime de subsistência.
6. Assim, mesmo que a prova testemunhal seja favorável à pretensão autoral, ela não serve,
exclusivamente, para o reconhecimento vindicado. Desse modo, considerando que o conjunto
probatório foi insuficiente/inconsistente à comprovação pleiteada, seria o caso de se manter a
improcedência da ação, não tendo a parte autora se desincumbido do ônus probatório que lhe
cabia, ex vi do art. 373, I, do CPC/2015.
7. Entretanto, o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática
de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973 é no sentido de que a ausência de
conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de pressuposto de constituição
e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito,
propiciando ao autor intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários.
8. Mantenho, por fim, a condenação da parte autora no pagamento das verbas sucumbenciais,
observados os benefícios da assistência judiciária gratuita (arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei
1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC), já que deu causa à extinção do processo
sem resolução do mérito.
9. Processo extinto, de ofício. Apelação da parte autora prejudicada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu, DE OFÍCIO, extinguir o processo, sem resolução do mérito, com fulcro no
art. 485, IV do CPC/2015, julgando prejudicado o apelo da parte autora, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
