Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0004405-33.2019.4.03.6325
Relator(a)
Juiz Federal RODRIGO OLIVA MONTEIRO
Órgão Julgador
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
23/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 04/03/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. TEMPO RURAL EXERCIDO
APÓS A VIGÊNCIA DA LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DO RECOLHIMENTO DE
CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS PARA FINS DE CARÊNCIA. SENTENÇA DE
PROCEDÊNCIA MANTIDA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. APLICAÇÃO DO ART. 46 DA
LEI 9.099/1995. RECURSO DO AUTOR DESPROVIDO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004405-33.2019.4.03.6325
RELATOR:44º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: ARMINDO CARLOS NETTO
Advogados do(a) RECORRIDO: IGOR KLEBER PERINE - SP251813-A, EDNISE DE
CARVALHO RODRIGUES TAMAROZZI - SP234882-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004405-33.2019.4.03.6325
RELATOR:44º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
RECORRIDO: ARMINDO CARLOS NETTO
Advogados do(a) RECORRIDO: IGOR KLEBER PERINE - SP251813-A, EDNISE DE
CARVALHO RODRIGUES TAMAROZZI - SP234882-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso inominado interposto pela parte ré de sentença que julgou procedente o
pedido para “a) declarar, para efeito de carência, o período de 03/01/1992 a 31/10/2003, na
forma da fundamentação; b) condenar o Instituto Nacional do Seguro Social a conceder
aposentadoria por idade híbrida ao autor Armindo Carlos Netto desde a data do requerimento
administrativo do NB 193.545.928-4 (21/05/2019), de conformidade com os parâmetros fixados
no parecer contábil (eventos nºs 41-42); c) condenar o Instituto Nacional do Seguro Social a
pagar ao autor as prestações vencidas, nos termos da fundamentação e do parecer contábil,
correspondentes a R$ 20.898,93 (vinte mil, oitocentos e noventa e oito reais, noventa e três
centavos), atualizados até 03/2021.”
A parte recorrente requer a atribuição de efeito suspensivo ao recurso. No mérito, sustenta que
não é possível o reconhecimento da atividade rural posterior à Lei 8.213/1991 sem o
recolhimento das contribuições previdenciárias para fins de carência, motivo pelo qual postula a
reforma do julgado, com a consequente devolução dos valores recebidos.
Foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004405-33.2019.4.03.6325
RELATOR:44º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
RECORRIDO: ARMINDO CARLOS NETTO
Advogados do(a) RECORRIDO: IGOR KLEBER PERINE - SP251813-A, EDNISE DE
CARVALHO RODRIGUES TAMAROZZI - SP234882-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, nego efeito suspensivo ao recurso do réu, pois não foi demonstrado o risco de
dano irreparável a que se refere o art. 43 da Lei 9.099/95.
Quanto ao mérito, o art. 48, caput e §§ 1º e 2º, da Lei n.º 8.213/91, disciplina a concessão da
aposentadoria por idade aos trabalhadores em geral da seguinte forma:
“Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se
mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso
de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I,
na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Redação dada pela Lei nº 9.876, de
1999)
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11,718, de 2008)
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no §
2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela
Lei nº 11,718, de 2008)
§ 4º Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de
acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-
de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-
contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008)”
Essa norma, que alcança os trabalhadores em geral (urbanos e rurais), estabelece dois
requisitos para a concessão da aposentadoria por idade:
a) 65 anos de idade, se homem, e 60 anos de idade, se mulher, reduzido em 5 anos o limite
para os trabalhadores rurais de ambos os sexos;
b) cumprimento do período de carência, que será de 180 contribuições mensais (art. 25, II),
salvo para os trabalhadores inscritos na previdência social antes do advento da Lei n.º
8.213/91, que se submetem à regra de transição do art. 142.
Nos termos do § 2º do art. 48, para fazer jus ao requisito etário reduzido em 5 anos, o
trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural por tempo igual à carência do
benefício no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício. Em outras palavras,
a condição de trabalhador rural não é suficiente para que o segurado faça jus ao requisito etário
diminuído, devendo ele demonstrar, em acréscimo, o exercício de atividade rural pelo período
de carência do benefício. De fato, se assim não fosse, qualquer pessoa que se tornasse
trabalhadora rural, ainda que por um dia, teria direito ao favor legal.
É necessário, ainda, que o exercício da atividade rural, pelo tempo correspondente à carência
do benefício, ocorra no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, de modo
que não é possível, para o fim de obter a redução da idade mínima, somar a atividade rural
praticada em períodos longínquos. Nesse sentido a Súmula 54/TNU: “Para a concessão de
aposentadoria por idade de trabalhador rural, o tempo de exercício de atividade equivalente à
carência deve ser aferido no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou
à data do implemento da idade mínima.”
A descontinuidade do exercício no período imediatamente anterior não impede o
reconhecimento do direito, desde que limitada a 120 dias (art. 11, § 9º, III, da Lei n.º 8.213/91).
O trabalhador que não possuir, no período imediatamente anterior ao requerimento
administrativo, tempo de atividade rural por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, poderá aproveitar os períodos de carência
cumpridos sob outras categorias de segurado, porém, neste caso, perde o direito à redução do
requisito etário em 5 anos (art. 48, § 3º).
Os exatos contornos do instituto da aposentadoria híbrida foram dados pelo Superior Tribunal
de Justiça, intérprete em última instância da lei federal, conforme recente precedente abaixo,
cujos parâmetros adoto na integralidade:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO AO RITO
DOS RECURSOS REPETITIVOS. OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 1.036, § 5o. DO CÓDIGO FUX
E DOS ARTS. 256-E, II, E 256-I DO RISTJ. APOSENTADORIA HÍBRIDA. ART. 48, §§ 3o. E 4o.
DA LEI 8.213/1991. PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DE ISONOMIA A TRABALHADORES
RURAIS E URBANOS. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL.
EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL, REMOTO E DESCONTÍNUO, ANTERIOR À LEI
8.213/1991 A DESPEITO DO NÃO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DO
TEMPO DE SERVIÇO PARA FINS DE CARÊNCIA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO
DO LABOR CAMPESINO POR OCASIÃO DO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO OU DO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TESE FIXADA EM HARMONIA COM O PARECER
MINISTERIAL. RECURSO ESPECIAL DO INSS PARCIALMENTE PROVIDO, TÃO SOMENTE,
PARAAFASTAR A MULTA FIXADA NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
1. A análise da lide judicial que envolve a proteção do Trabalhador Rural exige do julgador
sensibilidade, e é necessário lançar um olhar especial a esses trabalhadores para compreender
a especial condição a que estão submetidos nas lides campesinas.
2. Como leciona a Professora DANIELA MARQUES DE MORAES, é preciso analisar quem é o
outro e em que este outro é importante para os preceitos de direito e de justiça. Não obstante o
outro possivelmente ser aqueles que foi deixado em segundo plano, identificá-lo pressupõe um
cuidado maior. Não se pode limitar a apontar que seja o outro. É preciso tratar de tema
correlatos ao outro, com alteridade, responsabilidade e, então, além de distinguir o outro, incluí-
lo (mas não apenas de modo formal) ao rol dos sujeitos de direito e dos destinatários da justiça
(A Importância do Olhar do Outro para a Democratização do Acesso à Justiça, Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2015, p. 35).
3. A Lei 11.718/2008, ao incluir a previsão dos §§ 3o. e 4o. no art. 48 da lei 8.213/1991, abrigou,
como já referido, aqueles Trabalhadores Rurais que passaram a exercer temporária ou
permanentemente períodos em atividade urbana, já que antes da inovação legislativa o mesmo
Segurado se encontrava num paradoxo jurídico de desamparo previdenciário: ao atingir idade
avançada, não podia receber a aposentadoria rural porque exerceu trabalho urbano e não tinha
como desfrutar da aposentadoria urbana em razão de o curto período laboral não preencher o
período de carência (REsp. 1. 407.613/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 28.11.2014).
4. A aposentadoria híbrida consagra o princípio constitucional de uniformidade e equivalência
dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, conferindo proteção àqueles
Trabalhadores que imigraram, temporária ou definitivamente, muitas vezes acossados pela
penúria, para o meio urbano, em busca de uma vida mais digna, e não conseguiram
implementar os requisitos para a concessão de qualquer aposentadoria, encontrando-se em
situação de extrema vulnerabilidade social.
5. A inovação legislativa objetivou conferir o máximo aproveitamento e valorização ao labor
rural, ao admitir que o Trabalhador que não preenche os requisitos para concessão de
aposentadoria rural ou aposentadoria urbana por idade possa integrar os períodos de labor rural
com outros períodos contributivos em modalidade diversa de Segurado, para fins de
comprovação da carência de 180 meses para a concessão da aposentadoria híbrida, desde que
cumprido o requisito etário de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher.
6. Analisando o tema, esta Corte é uníssona ao reconhecer a possibilidade de soma de lapsos
de atividade rural, ainda que anteriores à edição da Lei 8.213/1991, sem necessidade de
recolhimento de contribuições ou comprovação de que houve exercício de atividade rural no
período contemporâneo ao requerimento administrativo ou implemento da idade, para fins de
concessão de aposentadoria híbrida, desde que a soma do tempo de serviço urbano ou rural
alcance a carência exigida para a concessão do benefício de aposentadoria por idade.
7. A teste defendida pela Autarquia Previdenciária, de que o Segurado deve comprovar o
exercício de período de atividade rural nos últimos quinze anos que antecedem o implemento
etário, criaria uma nova regra que não encontra qualquer previsão legal. Se revela, assim, não
só contrária à orientação jurisprudencial desta Corte Superior, como também contraria o
objetivo da legislação previdenciária.
8. Não admitir o cômputo do trabalho rural exercido em período remoto, ainda que o Segurado
não tenha retornado à atividade campesina, tornaria a norma do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991
praticamente sem efeito, vez que a realidade demonstra que a tendência desses Trabalhadores
é o exercício de atividade rural quando mais jovens, migrando para o atividade urbana com o
avançar da idade. Na verdade, o entendimento contrário, expressa, sobretudo, a velha posição
preconceituosa contra o Trabalhador Rural, máxime se do sexo feminino.
9. É a partir dessa realidade social experimentada pelos Trabalhadores Rurais que o texto legal
deve ser interpretado, não se podendo admitir que a justiça fique retida entre o rochedo que o
legalismo impõe e o vento que o pensamento renovador sopra. A justiça pode ser cega, mas os
juízes não são. O juiz guia a justiça de forma surpreendente, nos meandros do processo, e ela
sai desse labirinto com a venda retirada dos seus olhos.
10. Nestes termos, se propõe a fixação da seguinte tese: o tempo de serviço rural, ainda que
remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da
carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido
efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja
qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho
exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
11. É firme a orientação desta Corte ao afirmar que os Embargos de Declaração opostos com
notório propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório, não havendo que se falar,
assim, em majoração da verba honorária.
12. Recurso Especial do INSS provido, tão somente, para afastar a majoração de honorários
fixada no julgamento dos Embargos de Declaração. (STJ, REsp 1788404/PR, Primeira Seção,
Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 04/09/2019)
A aposentadoria por idade assim concedida é híbrida no sentido de permitir a conjugação de
regimes jurídicos distintos: o regime da dispensa da carência (tempo rural) com o regime do art.
48, sujeito à prova da contribuição, sendo irrelevante o exercício da atividade rural ou urbana na
data do preenchimento do requisito etário ou no período imediatamente anterior ao
requerimento.
Verifica-se, desta forma, uma hipótese excepcional de dispensa de carência, de modo a ensejar
a soma do tempo rural aos períodos de carência, ainda que posteriores à Lei 8.213/1991, sob
outras categorias de segurado, assim facilitando a concessão da aposentadoria por idade aos
trabalhadores rurais que migraram temporária ou definitivamente para o meio urbano. Nesse
sentido, é o entendimento do STJ:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. RECURSO
ESPECIAL SUBMETIDO AO RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. APOSENTADORIA
HÍBRIDA. ART. 48, §§ 3o. E 4o. DA LEI 8.213/1991. PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DE
ISONOMIA A TRABALHADORES RURAIS E URBANOS. MESCLA DOS PERÍODOS DE
TRABALHO URBANO E RURAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL, REMOTO E
DESCONTÍNUO, ANTERIOR À LEI 8.213/1991 A DESPEITO DO NÃO RECOLHIMENTO DE
CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO PARA FINS DE CARÊNCIA.
DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO LABOR CAMPESINO POR OCASIÃO DO
IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO OU DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO DO INSS REJEITADOS.
1. Os Embargos de Declaração destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade ou eliminar
contradição existente no julgado. Excepcionalmente o Recurso Aclaratório pode servir para
amoldar o julgado à superveniente orientação jurisprudencial do Pretório Excelso, quando
dotada de efeito vinculante, em atenção à instrumentalidade das formas, de modo a garantir a
celeridade, eficácia da prestação jurisdicional e a reverência ao pronunciamento superior,
hipótese diversa da apresentada nos presentes autos.
2. O acórdão é claro ao consignar que o tempo de serviço rural, ainda que remoto e
descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência
necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado
o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja qual for a
predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no
momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
3. Assim, fica claro que o tempo de serviço rural pode ser computado, para fins de carência
para a concessão de aposentadoria híbrida, seja qual for o momento em que foi exercido, seja
ele anterior ou não a 1991.
4. Esta Corte, no julgamento do REsp. 1.354.908/SP, representativo da controvérsia, Rel. Min.
MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 10.2.2016, estabeleceu que o Segurado especial tem
que comprovar o exercício de atividade campesina no momento anterior ao implemento da
idade mínima para fins de concessão de aposentadoria rural, o que não se amolda à hipótese
dos autos. Como já delineado no acórdão, a aposentadoria híbrida, nos exatos termos do art.
48, § 3o. da Lei 8.213/1991, é devida exatamente àqueles trabalhadores rurais que não
preenchem os requisitos fixados no § 2o. do mesmo dispositivo, não havendo que se falar em
necessidade de comprovação da atividade rural em período anterior ao implemento etário.
5. Não há que se falar em violação aos princípios do equilíbrio financeiro e atuarial e da
precedência do custeio, vez que no presente recurso não há o reconhecimento de direito
previdenciário não previsto em lei, ao contrário, firmou-se aqui, tão somente, a literal aplicação
do disposto no art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991. Nesse passo, o cálculo envolvendo o equilíbrio
financeiro e atuarial e a precedência de custeio foram já objeto de análise do legislador quando
instituiu a nova política previdenciária introduzida pela Lei
11.718/2008.
6. A vedação disposta no art. 55 da Lei 8.213/1991, que impede o cômputo da atividade rural
para fins de carência, se dirige à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, não
havendo que se falar em óbice para cômputo para aposentadoria por idade, como é a
aposentadoria híbrida.
7. É entendimento pacífico desta Corte que os rurícolas em atividade por ocasião da Lei de
Benefícios, foram dispensados do recolhimento das contribuições relativas ao exercício do
trabalho no campo, substituindo a carência pela comprovação do efetivo desempenho do labor
agrícola, nos termos dos arts. 26, I e 39, I da Lei8.213/1991.
8. O que se percebe, em verdade, é que busca o INSS conferir caráter constitucional à matéria,
para fins de interposição de Recurso Extraordinário. Hipótese, contudo, que já fora rechaçada
pelo STF, reconhecendo a competência exclusiva do Superior Tribunal de Justiça do exame da
matéria. Precedentes: ARE 1.065.915, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, DJe 5.9.2017;
ARE 1.062.849, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, DJe 10.8.2017; ARE 1.059.692, Rel. Min. GILMAR
MENDES, DJe 9.8.2017;ARE 920.597, Rel. Min. GILMAR MENDES, DJe 26.10.2015.
9. Embargos de Declaração do INSS rejeitados.
(STJ, EDcl no REsp 1788404/PR, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª Seção,
julgado em 27/11/2019, DJe 29/11/2019.
Nesse sentido é a tese fixada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema 1.007:
“O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei
8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria
híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos
termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto
exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do
requisito etário ou do requerimento administrativo”
Desta forma, no caso em exame, entendo que o Juízo singular valorou corretamente as provas
e conferiu correta interpretação à norma, nos seguintes termos:
“O autor postulou a concessão de aposentadoria por idade híbrida retroativamente à data do
requerimento administrativo do NB 193.545.928-4 (21/05/2019), mediante o cômputo, para fins
de carência, do intervalo em que laborou como rurícola em regime de economia familiar
(segurado especial), entre 03/01/1992 e 31/10/2003. A satisfação do requisito etário na data do
requerimento administrativo é incontroversa. O autor, nascido aos 05/12/1953 (fl. 12 - evento nº
2), atingiu 65 anos em 2018. A carência é de 180 meses, a teor do disposto nos artigos 25, II e
art. 142 da Lei nº 8.213/1991. Em sede de contagem administrativa, o Instituto-réu, embora
tenha acolhido as alegações do autor e reconhecido o labor campesino durante o interregno de
03/01/1992 a 31/10/2003, indeferiu o benefício sob a fundamentação de que não houve o
exercício de labor rural no momento imediatamente anterior ao preenchimento do requisito
etário ou à data de entrada do requerimento administrativo (fls. 203-204 e 208-210 – evento nº
29). Contudo, tratando-se de aposentadoria por idade híbrida (art. 48, § 3º, da Lei nº
8.213/1991, com a redação dada pela Lei nº 11.718/2008), não importa a predominância do
labor misto no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento
do requisito etário ou do requerimento administrativo. Ademais, para esse específico fim (
aposentadoria por idade híbrida), o período rural remoto e descontínuo, anterior ao advento da
Lei nº 8.213/1994, será computável para efeito de carência, independentemente do
recolhimento de contribuições previdenciárias. O que venho de referir está sintetizado na
ementa do acórdão
proferido pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento conjunto dos
Recursos Especiais nº 1.674.221 e 1.788.224, ambos da relatoria do ministro Napoleão Nunes
Maia Filho (recursos representativos de controvérsia, na forma do art. 1.036 do Código de
Processo Civil)”.
Diante disso, devem ser adotados, neste Acórdão, os fundamentos já expostos na sentença
monocrática, a qual deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, nos termos do
art. 46 da Lei nº 9.099/95.
O Supremo Tribunal Federal, em sucessivos julgados (cf. ARE 736.290 AgR/SP, Primeira
Turma, Rel. Min. Rosa Weber, DJE 15/08/2013; AI 749.969 AgR/RJ, Primeira Turma, Rel. Min.
Ricardo Lewandowski, DJE 08/10/2008; AI 749.963 AgR/RJ, Segunda Turma, Rel. Min. Eros
Grau, DJE 24/09/2009), afirmou que a regra veiculada pelo artigo 46 da Lei n. 9.099/95 não
infringe o devido processo legal, a ampla defesa, o contraditório e o dever de fundamentação
das decisões judiciais (arts. 5º, LIV, LV, 93, IX, da Constituição da República de 1988), se “a
jurisdição foi prestada mediante decisão suficientemente motivada” (AI 651.364 AgR/RJ,
Primeira Turma, Rel. Min. Menezes Direito, DJE 25/09/2008).
Diante do exposto, nego provimento ao recurso da parte ré.
Fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, devidos
pela parte recorrente vencida. Na hipótese de a parte ré ser recorrente vencida, ficará
dispensada desse pagamento se a parte autora não for assistida por advogado ou for assistida
pela DPU (STJ, Súmula 421 e REsp 1.199.715/RJ). Na hipótese de a parte autora ser
beneficiária de assistência judiciária gratuita e recorrente vencida, o pagamento dos valores
mencionados ficará suspenso nos termos do § 3º do art. 98, do novo CPC – Lei nº 13.105/15.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. TEMPO RURAL EXERCIDO
APÓS A VIGÊNCIA DA LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DO RECOLHIMENTO DE
CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS PARA FINS DE CARÊNCIA. SENTENÇA DE
PROCEDÊNCIA MANTIDA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. APLICAÇÃO DO ART. 46
DA LEI 9.099/1995. RECURSO DO AUTOR DESPROVIDO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quinta Turma
Recursal decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
