Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5907318-11.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
30/04/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/05/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. TEMPO RURAL. REGIME DE
ECONOMIA FAMILIAR NÃO CARACTERIZADO.
I- As provas exibidas não constituem um conjunto harmônico de molde a colmatar a convicção no
sentido de que o requerente tenha exercido atividades no campo como pequeno produtor rural
em regime de economia familiar.
II- Os documentos apresentados descaracterizam a alegada atividade como pequeno produtor
rural em regime de economia familiar, no qual o trabalho dos membros da família é indispensável
à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a
utilização de empregados.
III- Não preenchidos, in casu, os requisitos necessários à concessão do benefício, consoante
dispõe os arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios.
IV- Apelação improvida.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5907318-11.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: WANDERLEY CACCIOLARI
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO RODRIGUES RIBEIRO - SP161631-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5907318-11.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: WANDERLEY CACCIOLARI
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO RODRIGUES RIBEIRO - SP161631-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à concessão de
aposentadoria por idade, mediante a conjugação de períodos de atividades rural e urbana
(modalidade híbrida).
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quo julgou improcedente o pedido.
Inconformada, apelou a parte autora, pleiteando a reforma integral do decisum.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5907318-11.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: WANDERLEY CACCIOLARI
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO RODRIGUES RIBEIRO - SP161631-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Dispõe o art. 48
da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 11.718/08, in verbis:
"A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei,
completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de
trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea 'a' do inciso I, na
alínea 'g' do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo
exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei.
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º
deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição
sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco)
anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
(...)"
Da leitura dos §§ 1º e 2º acima transcritos, depreende-se que o trabalhador rural, ao completar 60
(sessenta) anos, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher, tem direito à
aposentadoria por idade desde que comprove o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de
forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício (ou
implemento do requisito etário, conforme jurisprudência pacífica sobre o tema), por tempo igual
ao número de meses de contribuição correspondente à carência, observada a tabela constante
do art. 142 da Lei nº 8.213/91. Cumpre ressaltar, adicionalmente, que a Terceira Seção do C.
Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Incidente de Uniformização - Petição nº 7.476/PR,
firmou posicionamento no sentido de que o § 1º do art. 3º da Lei nº 10.666/03 dirige-se apenas ao
trabalhador urbano.
No que tange ao disposto no § 3º, se o trabalhador rural não comprovar o exercício de atividade
no campo no período imediatamente anterior ao requerimento da aposentadoria (ou implemento
do requisito etário) e nem possuir o tempo de atividade rural equivalente à carência, poderá valer-
se dos períodos de contribuição da atividade urbana para aposentar-se. Nessa hipótese, o
requisito etário é majorado para 65 (sessenta e cinco) e 60 (sessenta) anos, respectivamente,
homem e mulher.
O C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia
nº 1.788.404/PR, firmou a seguinte tese: "o tempo de serviço rural, ainda que remoto e
descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência
necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o
recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja qual for a
predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no
momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo." No referido
julgado pacificou-se, dessa forma, o entendimento no sentido de ser possível a "concessão de
aposentadoria híbrida, mesmo nos casos em que toda a atividade rural foi realizada antes de
1991", assegurada a "dispensabilidade das contribuições referentes ao labor rural exercido antes
de 1991".
Com relação à comprovação do labor no campo, o C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o
Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.348.633-SP, firmou posicionamento no
sentido de ser possível o reconhecimento do "tempo de serviço rural mediante apresentação de
um início de prova material sem delimitar o documento mais remoto como termo inicial do período
a ser computado, contanto que corroborado por testemunhos idôneos a elastecer sua eficácia"
(Primeira Seção, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, por maioria, j. 28/08/2013, DJe
05/12/14).
O período de carência encontra-se previsto nos artigos 25 e 142, da Lei nº 8.213/91.
Passo à análise do caso concreto.
A parte autora nasceu em 22/12/48 e implementou o requisito etário (65 anos) em 22/12/13. Logo,
a carência a ser cumprida é de 180 meses.
A parte autora alega na inicial que exerceu atividade rural em regime de economia familiar no
período de 5/6/88 a 1º/9/17.
No tocante ao exercício de atividades rural e urbana, encontram-se acostadas aos autos as
cópias dos seguintes documentos:
Período urbano:
- Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo de Contribuição (fls. 21) e CTPS (fls. 55),
totalizando 9 anos, 11 meses e 1 dia de atividade urbana.
Período rural:
- Escritura de divisão amigável, lavrada em 1977, qualificando os genitores do autor como
adquirentes de uma parte de um imóvel rural;
- Matrícula do respectivo imóvel rural, com registro datado de 25/3/77, qualificando os seus
genitores como coproprietário de um imóvel rural de 448 hectares, com averbação de que o autor
herdou 70% e sua genitora 29%;
- Notas fiscais de produtor dos anos de 1988, 1993, 1994, 2003, 2005, 2011, 2012, 2013, 2017,
2018 em nome de seu genitor e do autor, referente à comercialização de 700 sacas de soja em
grãos ao preço de R$35.000,00 e um trator ao preço de R$40.000,00;
- Certificado de cadastro do imóvel rural do exercício de 2010/2011/2012/2013/2014, em nome do
autor e “outros”, constando o mesmo como titular de um imóvel rural de 83,19 hectares,
classificando o mesmo como “pequena propriedade”;
- Certificados de cadastro de imóvel rural do exercício de 2015/2016/2017, em nome do autor,
constando o requerente como proprietário do referido imóvel rural, agora com 57,42 hectares,
classificando o mesmo como “pequena propriedade improdutiva” e
- Declarações do I.T.R. dos exercícios de 2015 e 2017, em nome do autor.
No que tange ao período de atividade em labor rural, os documentos supramencionados não
demonstram que o autor exerceu atividade como trabalhador rural em regime de economia
familiar. A quantidade de imóveis rurais, o tamanho da área rural, a quantidade de produto
comercializado e os valores das notas fiscais juntadas descaracterizam a alegada atividade de
trabalhador rural em regime de economia familiar, no qual no qual o trabalho dos membros da
família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e
colaboração, sem a utilização de empregados.
Versando sobre a matéria em análise, merecem destaque os acórdãos abaixo, in verbis:
"EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. ART. 143 DA LEI 8.213/91. TRABALHO
RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE PROVA. PROVA MATERIAL
DA CONDIÇÃO DE EMPREGADOR RURAL. AUSÊNCIA DE CONTRIBUIÇÕES
PREVIDENCIÁRIAS. BENEFÍCIO INDEVIDO. VERBA DE SUCUMBÊNCIA.
1. A prova testemunhal que corrobore início de prova material é suficiente para a comprovação do
trabalho rural, nos termos do § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149 do Superior Tribunal
de Justiça.
2. Trabalho rural em regime de economia familiar não caracterizado, em razão de o conjunto
probatório demonstrar a inviabilidade da alegação de que o Autor exercia suas atividades sem
empregados , apenas com o auxílio da família.
3. Caracterizando-se como produtor rural, o Autor é segurado obrigatório da Previdência Social,
estando obrigado ao recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias para fazer jus ao
benefício (inciso V, letra "a", do artigo 11, da Lei nº 8.213/91). Carência não cumprida; benefício
indevido.
4. Sem condenação do Autor ao pagamento de honorários advocatícios, por ser o mesmo
beneficiário da Assistência Judiciária Gratuita. Precedente do STF.
5. Apelação do INSS provida."
(TRF - 3ª Região, AC nº 2004.03.99.038286-5, 10ª Turma, Relator Des. Fed. Galvão Miranda, j.
15/2/05, v.u., DJU 14/3/05, grifos meus)
"RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO.
VALORAÇÃO DE PROVA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA
TESTEMUNHAL. INOCORRÊNCIA.
1. O conhecimento do recurso especial fundado na alínea "c" da Constituição da República
requisita, em qualquer caso, a transcrição dos trechos dos acórdãos que configurem o dissídio,
mencionando-se as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados, não
se oferecendo, como bastante, a simples transcrição de ementas, votos ou notícias de
julgamento.
2. "A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento." (artigo
55, parágrafo 3º, da Lei 8.213/91).
3. O início de prova material, de acordo com a interpretação sistemática da lei, é aquele feito
mediante documentos que comprovem o exercício da atividade nos períodos a serem contados,
devendo ser contemporâneos dos fatos a comprovar, indicando, ainda, o período e a função
exercida pelo trabalhador.
4. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que para fins de concessão do benefício de
aposentadoria por idade, o início de prova material deverá ser corroborado por idônea e robusta
prova testemunhal.
5. Em havendo o acórdão recorrido afirmado que, a par de não bastante à demonstração do
tempo de serviço a prova documental, a testemunhal era insuficiente à comprovação da atividade
rural desempenhada pelo segurado, a preservação da improcedência do pedido de aposentadoria
por idade é medida que se impõe.
6. Ademais, a 3ª Seção desta Corte tem firme entendimento no sentido de que a simples
declaração prestada em favor do segurado, sem guardar contemporaneidade com o fato
declarado, carece da condição de prova material, exteriorizando, apenas, simples testemunho
escrito que, legalmente, não se mostra apto a comprovar a atividade laborativa para fins
previdenciários (EREsp 205.885/SP, Relator Ministro Vicente Leal, in DJ 30/10/2000).
7. Recurso não conhecido."
(STJ, REsp. n.º 434.015, 6ª Turma, Relator Min. Hamilton Carvalhido, j. 20/02/03, DJ 17/03/03, p.
299, v.u., grifos meus)
Com efeito, os indícios de prova material, singularmente considerados, não são, por si sós,
suficientes para formar a convicção do magistrado. Nem tampouco as testemunhas
provavelmente o seriam. Mas apenas a conjugação de ambos os meios probatórios - todos
juridicamente idôneos para formar a convicção do juiz - tornaria inquestionável a comprovação da
atividade laborativa rural.
Não comprovando o autor o recolhimento das devidas contribuições no período exigido em lei, o
pedido deve ser julgado improcedente.
Ante o exposto, nego provimento à apelação.
É o meu voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. TEMPO RURAL. REGIME DE
ECONOMIA FAMILIAR NÃO CARACTERIZADO.
I- As provas exibidas não constituem um conjunto harmônico de molde a colmatar a convicção no
sentido de que o requerente tenha exercido atividades no campo como pequeno produtor rural
em regime de economia familiar.
II- Os documentos apresentados descaracterizam a alegada atividade como pequeno produtor
rural em regime de economia familiar, no qual o trabalho dos membros da família é indispensável
à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a
utilização de empregados.
III- Não preenchidos, in casu, os requisitos necessários à concessão do benefício, consoante
dispõe os arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios.
IV- Apelação improvida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
