
| D.E. Publicado em 06/06/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar arguida em contrarrazões e dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0010183-88.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária proposta com o fim de obter a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
A r. sentença julgou improcedente o pedido.
Alega a parte autora, em síntese, que restaram preenchidos os requisitos exigidos para a concessão do benefício pleiteado.
Em suas contrarrazões o INSS aponta, preliminarmente, ausência de interesse de agir em virtude da ausência de provocação na via administrativa.
Subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0010183-88.2017.4.03.9999/SP
VOTO
Preliminarmente, quanto à falta de prévio requerimento na via administrativa, embora a jurisprudência tenha recentemente se firmado no sentido de que é necessária a prévia postulação administrativa de benefícios previdenciários, sob pena de indevida sobrecarga do Poder Judiciário, que não pode ser substituto da Administração, entendo que o interesse de agir do segurado exsurge, conquanto não tenha formulado o pedido na seara administrativa, no momento em que o INSS oferece contestação resistindo à pretensão deduzida e, como corolário lógico, caracterizando o conflito de interesses e instaurando a lide.
Outro não é o entendimento de expressiva parte da jurisprudência, sendo oportuno trazer à colação lapidar julgado proferido pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que porta a seguinte ementa:
Esta Corte, a seu turno, assim decidiu:
Assim, contestada a ação em seu mérito, conforme fls. 74/79, restou caracterizada a resistência à pretensão ora postulada.
No mérito, busca a parte autora, nascida em 1957, a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
Discute-se, nestes autos, o preenchimento dos requisitos necessários à concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, sendo necessária a comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural pelo período exigido na Lei n. 8.213/91.
A Lei nº 8.213/91, em seus artigos 39, inciso I, 48, 142 e 143, estabelece os requisitos necessários para a concessão de aposentadoria por idade a rurícola.
Além do requisito etário, o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, em número de meses idêntico à carência do benefício.
O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o artigo 142, que assim dispõe:
No mais, segundo o RESP 1.354.908, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), necessária a comprovação do tempo de atividade rural no período imediatamente anterior à aquisição da idade:
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência, como dever de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo.
No que se refere à comprovação do labor campesino, algumas considerações se fazem necessárias, uma vez que balizam o entendimento deste Relator no que diz com a valoração das provas comumente apresentadas.
Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios da posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, por parte do autor, de propriedade rural, só se constituirá em elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor. No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
Têm-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais.
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos de sua necessidade que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido ou a entrega como forma de pagamento pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº 463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
O trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro. Para ocorrer essa descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é suficiente à subsistência da família.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e a sua aceitação.
No que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu serviço compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever de recolher as contribuições tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no varejo, isto é, para o consumidor final, a empregador rural pessoa física ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
Por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva. Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Da mesma forma, o ingresso no mercado de trabalho urbano não impede a concessão da aposentadoria rural, na hipótese de já restar ultimada, em tempo anterior, a carência exigida legalmente, considerando não só as datas do início de prova mais remoto e da existência do vínculo empregatício fora da área rural, como também que a prova testemunhal, segura e coerente, enseje a formação da convicção deste julgador acerca do trabalho campesino exercido no período.
Ao caso dos autos.
A parte autora completou a idade mínima de 55 anos em 2012, devendo comprovar o exercício de atividade rural por 180 meses (15 anos).
Nos termos da Súmula de nº 149 do Superior Tribunal de Justiça, é necessário que a prova testemunhal venha acompanhada de, pelo menos, um início razoável de prova documental, in verbis:
No caso em questão, para comprovar o exercício de atividade campesina da requerente vieram aos autos cópias de sua CTPS com anotações de vínculos de natureza rural entre os anos de 2004 e 2015, sendo o último sem data de saída (fls. 15/28 e 109/115). Foram apresentadas também cópias de livro de pagamentos de empregado rural relativas ao cônjuge da autora, com menção ao trabalho dela própria entre os anos de 1977 e 1990 (fls. 28/68).
É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira.
A CTPS da requerente, a seu turno, constitui prova plena do labor rural no período anotado e início de prova material dos demais períodos que pretende comprovar.
Nesse sentido, os julgados:
A corroborar a prova documental, os depoimentos colhidos sob o crivo do contraditório foram uníssonos em confirmar o labor rural da parte autora até os dias atuais.
Nesse sentido, esta Corte vem decidindo:
Dessa forma, ante o início de prova material apresentado, corroborado por prova testemunhal idônea, impõe-se reconhecer que a parte autora comprovou o exercício de atividade rural pelo período legalmente exigido.
Presentes os requisitos, é imperativa a reforma da sentença para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural à parte autora.
Fixo o termo inicial do benefício na data do citação, data em que o réu tomou conhecimento da pretensão autoral e a ela resistiu.
No que respeita à apuração do valor do benefício e dos seus reajustes, cumpre ao INSS, respeitada a regra do artigo 201 da Constituição Federal, obedecer ao disposto na Lei 8.213 de 1991 e legislação subsequente, no que for pertinente ao caso.
O abono anual é devido na espécie, à medida que decorre de previsão constitucional (art. 7º, VIII, da CF) e legal (Lei 8.213/91, art. 40 e parágrafo único).
Referentemente à verba honorária, fixo-a em 10% (dez por cento), considerados a natureza, o valor e as exigências da causa, conforme art. 85, §§ 2º e 8º, do CPC/2015, incidindo sobre as parcelas vencidas até a data deste decisum.
A correção monetária e os juros moratórios incidirão nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor, por ocasião da execução do julgado.
Relativamente às custas processuais, é imperioso sublinhar que o art. 8º da Lei 8.620, de 05.01.93, preceitua o seguinte:
Apesar do STJ entender que o INSS goza de isenção no recolhimento de custas processuais, perante a Justiça Federal, nos moldes do dispositivo legal supramencionado, a Colenda 5ª Turma deste Egrégio Tribunal tem decidido que, não obstante a isenção da autarquia federal, consoante o art. 9º, I, da Lei 6032/74 e art. 8º, § 1º, da Lei 8620/93, se ocorreu o prévio recolhimento das custas processuais pela parte contrária, o reembolso é devido, a teor do art. 14, § 4º, da Lei 9.289/96, salvo se esta estiver amparada pela gratuidade da Justiça.
Quanto às despesas processuais, são elas devidas, à observância do disposto no artigo 11 da Lei n.º 1060/50, combinado com o artigo 91 do Novo Código de Processo Civil. Porém, a se considerar a hipossuficiência da parte autora e os benefícios que lhe assistem, em razão da assistência judiciária gratuita, a ausência do efetivo desembolso desonera a condenação da autarquia federal à respectiva restituição.
Ante o exposto, REJEITO A PRELIMINAR ARGUIDA EM CONTRARRAZÕES E, NO MÉRITO, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, para julgar procedente o pedido e condenar a autarquia previdenciária a conceder-lhe o benefício de aposentadoria por idade rural, nos termos dos arts. 39, I, 48 e 143 da Lei 8.213/91, respeitada a regra do art. 201 § 2º, da CF/88, com abono anual, a partir da data da citação e a pagar-lhe as parcelas vencidas, com atualização monetária e juros de mora, além de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até este decisum.
É o voto.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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