Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001277-93.2019.4.03.6328
Relator(a)
Juiz Federal RODRIGO OLIVA MONTEIRO
Órgão Julgador
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
14/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 27/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ADITAMENTO DA INICIAL.
JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO
CONFIGURADO. RAZOÁVEL INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA
TESTEMUNHAL. CARÊNCIA SUFICIENTE NA DATA DO REQUERIMENTO. BENEFÍCIO
DEVIDO. RECURSO DO RÉU DESPROVIDO. RECURSO DO AUTOR PROVIDO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001277-93.2019.4.03.6328
RELATOR:44º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: MARINALVA LEAL DE SOUZA
Advogado do(a) RECORRENTE: CAMILA MATHEUS GIACOMELLI - SP270968-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001277-93.2019.4.03.6328
RELATOR:44º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: MARINALVA LEAL DE SOUZA
Advogado do(a) RECORRENTE: CAMILA MATHEUS GIACOMELLI - SP270968-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso inominado interposto pelas partes de sentença que julgou parcialmente
procedente o pedido para condenar o INSS a “reconhecer e averbar o tempo de labor rural de
01/01/2015 a 02/08/2018, exercido pela autora MARINALVA LEAL DE SOUZA, na condição de
“segurada especial”
O INSS, em preliminar, sustenta que houve cerceamento de defesa, bem como julgamento
além do pedido. No mérito, afirma que não restou demonstrada a atividade rural em regime de
economia familiar.
A parte autora sustenta que há provas do exercício da atividade rural desde 1980 até a data de
entrada do requerimento - DER, motivo pelo qual pretende a reforma do julgado.
Não foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001277-93.2019.4.03.6328
RELATOR:44º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: MARINALVA LEAL DE SOUZA
Advogado do(a) RECORRENTE: CAMILA MATHEUS GIACOMELLI - SP270968-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, afasto a alegação do réu de cerceamento de defesa e de julgamento além do
pedido.
De fato, a parte autora aditou a exordial, postulando o reconhecimento de atividade rural entre
os anos de 1980 e 2019 (ID 210298716), de modo que a sentença, ao reconhecer o trabalho
rural nos anos de 2015 a 2018, não extrapolou os limites do pedido.
Vale destacar que o INSS foi citado após o recebimento do aditamento da exordial (IDs
210298716 e 210298723) e não apresentou discordância no ponto. Além disso, a Autarquia foi
regularmente intimada para manifestação acerca dos novos documentos juntados pela parte
autora após a audiência de instrução (ID 210298741), a revelar pleno respeito aos princípios do
contraditório e da ampla defesa.
Passo à análise do mérito.
Trata-se de demanda na qual se discute o direito da parte autora ao benefício de aposentadoria
rural por idade, benefício que se sujeita ao cumprimento de dois requisitos:
a) idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher;
b) exercício de atividade rural, no período imediatamente anterior ao requerimento
administrativo, pelo período correspondente à carência do benefício;
A parte autora nasceu em 11/11/1957, de modo que preencheu o requisito etário da
aposentadoria por idade rural no ano de 2012. Assim, deverá demonstrar, nos termos da tabela
do art. 142 da Lei nº 8.213/91, o exercício de atividade rural por 180 meses.
Outrossim, nos termos do § 2º do art. 48, a atividade rural deve ser demonstrada no período
imediatamente anterior ao requerimento do benefício – ou ao implemento do requisito etário,
sendo que igual imposição se extrai do arts. 39, I, e art. 143, todos da Lei n.º 8.213/91.
O art. 106, da Lei n.º 8.213/91, dispõe sobre a prova do exercício da atividade rural, mas traz rol
exemplificativo, admitindo-se a demonstração do tempo rural por outros meios, conforme
entendimento jurisprudencial tranquilo (STJ, AgInt no AREsp 807.833/SP, DJe 02/02/2017).
Contudo, será sempre necessário apresentar início de prova material da atividade rural, haja
vista a lei veda a prova do tempo de serviço fundada exclusivamente em depoimento de
testemunhas (art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91; Súmula 149/STJ).
Constituem início de prova material da atividade rural, entre outros: certidão de casamento ou
de nascimento, título de eleitor, certificado de dispensa de incorporação, sempre que constar
nesses documentos a qualificação do requerente ou de algum integrante da família nuclear
como rurícola; comprovante de endereço em zona rural; prova de frequência em escola situada
em zona rural; prova do domínio rural em nome do requerente ou de algum integrante da família
nuclear como rurícola.
Os documentos devem ser contemporâneos dos fatos por provar (Súmula 34/TNU). A utilização
de documentação extemporânea é excepcionalmente admitida, quando extraída de bancos de
dados efetivamente existentes e acessíveis à fiscalização do INSS (art. 62, § 3º, do Decreto
3.048/98).
Declarações de ex-empregadores ou de terceiros acerca da atividade rural, se extemporâneas,
não servem como prova material para o início de comprovação do tempo rural.
Não se exige prova documental em relação a todos os anos integrantes do período de alegado
exercício de atividade rural (Súmula 14/TNU), porém é necessário que ela se refira a uma
fração desse período, fazendo-se necessária a confirmação do início de prova material por
depoimento de testemunhas. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHO RURAL. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL.
ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE.
1. Para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalhador rural, apesar de não haver
exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o
período que se quer comprovar, é preciso que tal prova seja contemporânea aos fatos alegados
e refira-se, pelo menos, a uma fração daquele período, corroborado com prova testemunhal.
2. No caso, o único documento acostado aos autos é a certidão de nascimento da própria
autora. Assim, não há início de prova material, in casu.
3. A prova testemunhal deve estar apoiada em um início razoável de prova material,
contemporâneo à época dos fatos alegados, nos termos da Súmula 149/STJ: "A prova
exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da
obtenção de beneficio previdenciário", o que não ocorre no caso dos autos.
4. Agravo Regimental não provido.
(AgRg no AREsp 380.664/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado
em 01/10/2013, DJe 11/10/2013).
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. INÍCIO
DE PROVA MATERIAL CONTEMPORÂNEA. EXISTÊNCIA. EFICÁCIA PROBATÓRIA
EXTENSÍVEL POR PROVA TESTEMUNHAL. SÚMULAS Nº 14 E 20/TNU. INCIDENTE
PROVIDO EM PARTE.
1. “Para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige que o início de prova
material, corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício” (Súmula nº
14/TNU).
2. Retorno dos autos ao Juizado de origem para a produção de prova testemunhal (Súmula nº
20/TNU).
3. Pedido de Uniformização de Jurisprudência provido em parte, com determinação de
devolução dos recursos com mesmo objeto às Turmas de origem a fim de que, nos termos do
art. 15, §§ 1º e 3º, do RI/TNU, mantenham ou promovam a adequação da decisão recorrida.
(PEDILEF 2005.81.10.001065-3, Relatora Juíza Federal Simone Lemos Fernandes, Julgamento
em 06/09/2011).
A descontinuidade do exercício do labor rural não impede o reconhecimento do direito, desde
que limitada a 120 dias (art. 11, § 9º, III, da Lei n.º 8.213/91).
No caso em exame, a parte autora pretende o reconhecimento do tempo rural de 1980 a
02/08/2018 (DER), com a consequente concessão de aposentadoria por idade rural.
Considerando o implemento do requisito etário em 2012, a autora deve demonstrar o exercício
da atividade rural a partir de 1997, por 180 meses sem descontinuidade superior a 120 dias.
Esse é o período objeto da prova.
Com a finalidade de comprovar a atividade rural, a parte autora juntou cópia da CTPS de seu
cônjuge com anotação de vínculo empregatício de natureza rural no período de 1981 a 2012 (ID
210298701, fls. 30/33 e 52), certidão de casamento da filha, do ano de 2011, na qual consta a
profissão de lavrador do cônjuge da autora (ID 210298701, fls. 57), e notas fiscais de compra de
produtos/insumos agrícolas em nome da autora nos anos de 2015 a 2017 (ID 210298735).
A jurisprudência é tranquila a respeito da validade de documentos em nome de membros da
família como início de prova material. Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA.
DEMONSTRAÇÃO DO TRABALHO NO CAMPO. DOCUMENTOS EM NOME DOS PAIS DA
AUTORA. VÍNCULO URBANO DE UM DOS MEMBROS DA UNIDADE FAMILIAR QUE NÃO
DESCARACTERIZA A CONDIÇÃO DE RURÍCOLA DOS DEMAIS. 1. A solução integral da
controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC. 2. Para o
fim de demonstração de labor rural, são aceitos, como início de prova material, os documentos
em nome dos pais da autora que os qualificam como lavradores, aliados à robusta prova
testemunhal. 3. Recurso Especial não provido.
(REsp 1506744/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
03/11/2015, DJe 02/02/2016).
Assim, há razoável início de prova material do período de atividade rural controverso.
Quanto à prova testemunhal, a testemunha Valdeti Alves declarou que conheceu a parte autora
no ano de 2012 no sítio Morada do Sol, no município de Piquerobi e que desde então
presenciou a autora laborar nas lides rurais na criação de galinhas, porcos e extração de leite
de vaca.
A testemunha Ivanilda Gomes da Silva Barbosa afirmou que presenciou o labor rural da autora
no município de Santo Anastácio desde 1994 até meados de 2000, após no município de
Presidente Bernardes até 2012 e a partir de 2013 no município de Piquerobi até os dias atuais.
O depoimento merece credibilidade, não obstante ter sido tomado sem o compromisso legal,
diante da riqueza de detalhes narrada pela testemunha.
Desta forma, tendo em vista os firmes depoimentos das testemunhas no sentido de que a parte
autora exerceu atividade rural ao menos desde 1994 até a data do requerimento, entendo que
há provas suficientes do exercício de atividade rural por mais de 180 meses no período
imediatamente anterior ao requerimento do benefício.
Destarte, a autora faz jus à aposentadoria por idade rural.
A data de início do benefício (DIB) deve ser fixada na DER (02/08/2018). De fato, considerando
que a parte autora preenchia todos os requisitos necessários à concessão da prestação
pleiteada na data do requerimento, esta deve ser o termo inicial de seus efeitos financeiros.
De fato, importa, no particular, o momento da aquisição do direito, ainda que tenha sido
declarado em momento posterior.
Nessa esteira, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO
ESPECIAL. REVISÃO DE APOSENTADORIA. EFEITOS FINANCEIROS. DATA DA
CONCESSÃO. PRECEDENTES DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA
PROVIMENTO. 1. A questão a ser revisitada em agravo regimental cinge-se à definição do
termo inicial dos efeitos financeiros da revisão da RMI do benefício aposentadoria por tempo de
contribuição. 2. O termo inicial dos efeitos financeiros da revisão deve retroagir à data da
concessão do benefício, uma vez que o deferimento da ação revisional representa o
reconhecimento tardio de um direito já incorporado ao patrimônio jurídico do segurado, não
obstante a comprovação posterior do salário de contribuição. 3. Agravo regimental não provido.
(STJ - AgRg no REsp: 1467290 SP 2014/0169079-1, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL
MARQUES, Data de Julgamento: 16/10/2014, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação:
DJe 28/10/2014).
Ante o exposto, nego provimento ao recurso do INSS e dou provimento ao recurso da parte
autora para julgar procedente o pedido e condenar o INSS a averbar, em favor da parte autora,
como tempo de atividade rural, o período de 01/01/1994 a 02/08/2018 e, via de consequência, a
implantar o benefício de aposentadoria por idade rural no valor de um salário-mínimo, com DIB
em 02/08/2018, bem como a pagar as prestações em atraso, devidas desde a DIB fixada até a
efetiva implantação do benefício.
As prestações vencidas deverão ser corrigidas (correção monetária e os juros da mora) na
forma prevista na Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal, cujos critérios estão
de acordo com o julgamento do Plenário do Supremo Tribunal Federal, no Recurso
Extraordinário nº 870.947, ao afastar a atualização monetária pela variação da TR e estabelecer
a incidência de juros da mora em percentual idêntico aos aplicados à caderneta de poupança
para débitos não tributários, a partir de julho de 2009, nas ações condenatórias em geral e nas
ações previdenciárias, e atualização e juros da mora pela variação da Selic para os débitos
tributários.
Provado o direito alegado na inicial, e tendo em vista o perigo de dano, ante o caráter alimentar
do benefício, concedo a tutela de urgência, determinando ao INSS a implantação do benefício,
no prazo máximo de 30 (trinta) dias. Oficie-se ao INSS para cumprimento.
Fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, devidos
pela parte ré, que ficará dispensada desse pagamento se a parte autora não for assistida por
advogado ou for assistida pela DPU (STJ, Súmula 421 e REsp 1.199.715/RJ).
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ADITAMENTO DA INICIAL.
JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO
CONFIGURADO. RAZOÁVEL INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA
TESTEMUNHAL. CARÊNCIA SUFICIENTE NA DATA DO REQUERIMENTO. BENEFÍCIO
DEVIDO. RECURSO DO RÉU DESPROVIDO. RECURSO DO AUTOR PROVIDO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quinta Turma
Recursal decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso do réu e dar provimento ao
recurso do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
