
| D.E. Publicado em 24/09/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso da autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002895-89.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL RELATORA INÊS VIRGÍNIA: Trata-se de apelação interposta por MANOEL FRANCISCO CASTELHANO em face da sentença que julgou IMPROCEDENTE o pedido de concessão do benefício de APOSENTADORIA POR IDADE DE TRABALHADOR RURAL, condenando a parte autora ao pagamento da taxa judiciária, as despesas processuais, com incidência de juros legais de 1% ao mês, além de correção monetária de acordo com a tabela prática do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, a partir de cada desembolso, bem como honorários advocatícios no valor de 10% do valor da condenação, nos termos do art. 20, § 3º do CPC, ressalvando-se os benefícios da justiça gratuita.
A parte autora pede a reforma da sentença, em síntese, sob os seguintes fundamentos:
- as cópias da Carteira de Trabalho do apelante, onde constam alguns dos contratos de trabalho rural constituem início de prova material;
- início de prova material não indica completude, mas sim, começo de prova, princípio de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da situação jurídica discutida, desde que associada a outros dados probatórios;
- o início de prova material pode projetar efeitos para período de tempo anterior ou posterior ao nele retratado, desde que corroborado por segura prova testemunhal;
- as testemunhas foram uníssonas em corroborar o labor rural do autor pelo tempo necessário a sua aposentadoria;
- o segurado especial necessita comprovar o exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao número de meses correspondentes à carência.
Regularmente processado o feito, com contrarrazões, os autos subiram a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, conforme certidão de fl. 205, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
O autor iniciou o labor rural aos 11 (onze) anos de idade no Fazendão localizado próximo a Charqueada, onde juntamente com o pai se dedicava na lavoura de arroz, feijão e milho até os 13 (treze) anos. Passou a trabalhar como boia-fria com vários turmeiros, dedicando-se ao corte de cana e capinagem até o ano de 1974, quando passou a ter registros rurais em sua CTPS - 12 (doze) anos e 05 (cinco) dias.
E ajuizou a presente ação pretendendo a concessão da aposentadoria por idade rural, prevista no artigo 48, §§1º e 2º, da Lei nº 8.213/91, in verbis:
Em síntese, para a obtenção da aposentadoria por idade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) idade mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao da carência exigida para a sua concessão.
No que tange à carência, considerando o ano em que o rurícola implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício, o artigo 142 da Lei nº 8.213/91 estabelece regra de transição a ser observada pelos segurados inscritos na Previdência Social até 24/07/91.
Por sua vez, a regra de transição prevista na Lei nº 8.213/91, em seu artigo 143, estabelece que "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício."
Em outras palavras, facultou-se aos trabalhadores rurais, atualmente enquadrados como segurados obrigatórios, que requeressem até o ano de 2006 (15 anos da data de vigência da Lei n.º 8.213/91) aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, bastando apenas a comprovação do exercício de trabalho rural em número de meses idêntico à carência do benefício, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao seu requerimento.
Com o advento da Lei nº 11.718/2008, referido prazo foi prorrogado, exaurindo-se em 31/12/2010, a partir de quando se passou a exigir o recolhimento de contribuições, na forma estabelecida em seu art. 3º.
Portanto, em se tratando de segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/91, deve ser considerada a tabela progressiva inserta no artigo 142 da Lei de Benefícios, não havendo que se falar em exigência de contribuição ao trabalhador rural, bastando a comprovação do efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.
Aos que ingressaram no sistema após essa data, aplica-se a regra prevista no art. 25, inc. II, da Lei de Benefícios que exige a comprovação de 180 contribuições mensais.
Nessa esteira é o entendimento da Eg. Sétima Turma deste Tribunal Regional:
COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL
A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Dentro desse contexto, considerando as precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal. Conforme entendimento jurisprudencial sedimentado, a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ.
CASO CONCRETO
A idade mínima exigida para obtenção do benefício restou comprovada, tendo a parte autora nascido em 25/03/1954 (fl. 14).
Considerando o implemento do requisito etário em 25/03/2014, a parte autora deve comprovar o exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao implemento da idade, mesmo que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício requerido, não tendo o Instituto-réu conseguido infirmar a validade dos depoimentos prestados aos autos e dos documentos de fls. 15/58.
Anote-se que a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, restou sedimentada pelo C. STJ, no julgamento do REsp nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva.
Para comprovar suas alegações, a parte autora apresentou os seguintes documentos:
- CTPS do autor com anotações como trabalhador rural nos anos de 1974/1975, 1977/1978, 1981/1984, 1993/1998, 1992/1999, 2004/2007 e 2009/2011, serviços gerais em estabelecimento de fiação de seda natural nos períodos de 13/03/1976 a 03/05/1976 e 01/03/1978 a 21/06/1978, pedreiro no período de 01/09/1978 a 30/12/1978.
O CNIS do autor, que ora determino a juntada, comprova que o autor trabalhou para Lázaro Luiz Boschiero no período de 01/08/2011 a 31/05/2013.
A testemunha Jonathan Caltarosso Leme afirmou que conhece o autor desde 1997, pois trabalhavam juntos na Fazenda de Lázaro Luiz Boschiero, na cultura de laranja. Declarou que moravam na Fazenda e trabalhavam todos os dias. Trabalharam juntos até meados de 2013.
A testemunha Miguel Vieira Machado Neto informou que conhece o autor desde 2003, época em que trabalhavam na colheita e pulverização da laranja, na fazenda Boschiero. Declarou que o autor trabalhou muito mais que 10 (dez) anos na plantação de laranja, informando que sempre o via subir na condução de trabalho, bem como já o viu trabalhando.
A testemunha José Vieira declarou que conhece o autor desde os 12 (doze) anos de idade, época em que trabalhava com o pai na Fazenda Fazendão na plantação de eucalipto e arroz, onde trabalhou até os 17 (dezessete) anos de idade. Após o autor trabalhou na cana. Soube por terceiros que ele continuava no trabalho rural.
Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo (AgRg no REsp nº 1362145/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campell Marques, DJe 01/04/2013; AgRg no Ag nº 1419422/MG, 6ª Turma, Relatora Ministra Assussete Magalhães, DJe 03/06/2013; AgRg no AREsp nº 324.476/SE, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 28/06/2013).
Assim sendo, o início de prova material, corroborado por robusta e coesa prova testemunhal, comprova a atividade campesina exercida pela parte autora.
Desse modo, presentes os pressupostos legais para a concessão do benefício, vez que implementado o requisito da idade e demonstrado o exercício da atividade rural, por período equivalente ao da carência exigida pelo artigo 142 da Lei nº 8213/91, a procedência do pedido era de rigor.
O termo inicial do benefício deve coincidir com a data do requerimento administrativo em 03/04/2014 (fl. 65), nos termos do art. 49 da Lei 8213/91.
Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/PE, repercussão geral).
Apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto com o julgado acima mencionado.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se, até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, após, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/PE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral.
De acordo com a decisão do Egrégio STF, os juros moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a data do presente julgamento (Súmula nº 111/STJ).
Junte-se, aos autos, extrato CNIS em anexo, como parte integrante desta decisão.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso do autor para condenar o INSS ao pagamento da APOSENTADORIA POR IDADE RURAL, desde a data do requerimento administrativo em 03/04/2014, determinando, ainda, na forma acima explicitada, a aplicação de juros de mora e correção monetária, bem como o pagamento de honorários de sucumbência. Independentemente do trânsito em julgado, determino, com base no artigo 497 do CPC/2015, a expedição de e-mail ao INSS, instruído com cópia dos documentos do segurado MANOEL FRANCISCO CASTELHANO, para que cumpra a obrigação de fazer consistente na imediata implantação do benefício de aposentadoria por idade rural, com data de início em 03/04/2014 (data do indeferimento administrativo como determinado no decisum), e renda mensal a ser calculada de acordo com a legislação vigente. OFICIE-SE.
É O VOTO.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal Relatora
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | INES VIRGINIA PRADO SOARES:10084 |
| Nº de Série do Certificado: | 11DE18032058641B |
| Data e Hora: | 14/09/2018 16:21:09 |
