
| D.E. Publicado em 08/10/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso e, de ofício, alterar os critérios de correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | INES VIRGINIA PRADO SOARES:10084 |
| Nº de Série do Certificado: | 11DE18032058641B |
| Data e Hora: | 26/09/2018 17:06:03 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000052-70.2015.4.03.6007/MS
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face da sentença que julgou procedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade de trabalhador rural, condenando-o a pagar o benefício a partir do requerimento administrativo - 11.03.2014, bem como ao pagamento dos atrasados devidos desde então, sobre os quais deverá incidir correção monetária, a partir do dia em que deveriam ter sido pagos os proventos, e juros de mora, a partir da citação, ambos calculados nos moldes da Resolução CJF n. 134/2010 (Manual de Cálculos da Justiça Federal), com as alterações determinadas pela Resolução CJF n. 267/2013 e ao pagamento de honorários de advogado no importe de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, não incidindo sobre as prestações vencidas após a sentença, nos moldes da Súmula n. 111 do egrégio Superior Tribunal de Justiça, antecipando, ainda, os efeitos da tutela para imediata implantação do benefício.
A sentença não foi submetida ao reexame necessário.
O recorrente pede a reforma da sentença, em síntese, ao argumento de que não houve a comprovação dos requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado.
Regularmente processado o feito, com contrarrazões, os autos subiram a este Eg. Tribunal.
É o relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: A parte autora pleiteia a concessão de aposentadoria por idade rural, prevista no artigo 48, §§1º e 2º da Lei nº 8.213/91, verbis:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. |
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. |
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei." |
Em síntese, para a obtenção da aposentadoria por idade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) idade mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao da carência exigida para a sua concessão.
No que tange à carência, considerando o ano em que o rurícola implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício, o artigo 142 da Lei nº 8.213/91 estabelece regra de transição a ser observada pelos segurados inscritos na Previdência Social até 24/07/91.
Por sua vez, a regra de transição prevista na Lei nº 8.213/91, em seu artigo 143, estabelece que "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício."
Em outras palavras, facultou-se aos trabalhadores rurais, atualmente enquadrados como segurados obrigatórios, que requeressem até o ano de 2006 (15 anos da data de vigência da Lei n.º 8.213/91) aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, bastando apenas a comprovação do exercício de trabalho rural em número de meses idêntico à carência do benefício, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao seu requerimento.
Com o advento da Lei nº 11.718/2008, referido prazo foi prorrogado, exaurindo-se em 31/12/2010, a partir de quando se tornou exigível o recolhimento de contribuições, na forma estabelecida em seu art. 3º.
Portanto, em se tratando de segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/91, deve ser considerada a tabela progressiva inserta no artigo 142 da Lei de Benefícios, não havendo que se falar em exigência de contribuição ao trabalhador rural, bastando a comprovação do efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.
Aos que ingressaram no sistema após essa data, aplica-se a regra prevista no art. 25, inc. II, da Lei de Benefícios que exige a comprovação de 180 contribuições mensais.
COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL
A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Dentro desse contexto, considerando as precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
Conforme entendimento jurisprudencial sedimentado, a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ.
CASO CONCRETO
A idade mínima exigida para obtenção do benefício restou comprovada, tendo a parte autora nascido em 22/06/1958 (fl. 10).
Com o implemento do requisito etário em 22/06/2013, a parte autora deve comprovar o exercício do labor rural no período imediatamente anterior a 2013, mesmo que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício requerido (180), não tendo o Instituto-réu conseguido infirmar a validade dos depoimentos prestados e dos documentos trazidos.
Anote-se que a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, restou sedimentada pelo C. STJ, no julgamento do REsp nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva.
Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo (AgRg no REsp nº 1362145/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campell Marques, DJe 01/04/2013; AgRg no Ag nº 1419422/MG, 6ª Turma, Relatora Ministra Assussete Magalhães, DJe 03/06/2013; AgRg no AREsp nº 324.476/SE, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 28/06/2013).
Para comprovar suas alegações, a parte autora apresentou os seguintes documentos: a) cópia da certidão de casamento, realizado em 22.10.1977, em que o marido da autora é qualificado como "agricultor" e a a autora como "do lar" (fl. 11); b) cópia de nota fiscal de venda de suínos, realizada pelo marido da autora, datada de 30.01.1980 (fl. 12); c) cópia de nota fiscal, datada de 17.12.1985, em que o marido da autora declara ser residente na Fazenda Canizio Lancer (fl. 13); d) cópia de carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Toledo, emitida em nome do marido da autora, e recibos de mensalidade, datados de 1987 a 1989 (fls. 14-15); e) cópia de nota fiscal em que o marido da autora declara residir na Chácara Pioneira (fl. 17); f) cópia de termo de rescisão e quitação de arrendamento celebrado entre o marido da autora e Arnildo Augusto Thomé, atinente a novembro de 1990 a meados de 1994 (fl. 18); g) cópias de contratos de arrendamento rural celebrados entre o marido da demandante e Everson Luiz Rezzieri e Ari Rezzieri, datados de 1994 a 22.10.1997 (fls. 19-27); h) cópia de carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São Gabriel do Oeste em nome do marido da autora, datada de 1997 (fl. 28); i) cópia da CTPS da autora (fls. 29-31); j) cópia de notas fiscais em que a autora declara residir na Granja ABC, datadas de 2002 e 2003 (fl. 32); k) cópia de demonstrativo de pagamento a produtor, figurando nessa qualidade a autora, por venda de leite "in natura" datada de janeiro de 2003 (fl. 33); l) cópia de contracheque de folha de pagamento de leite "in natura", figurando como proprietária a autora, e como propriedade a Chácara ABC, datada de novembro de 2004 (fl. 34); m) cópia de aquisição de vacina contra a febre aftosa, para 19 (dezenove) cabeças de gado, em nome do marido da autora, datada de 31.05.2011 (fl. 35); n) cópia de aquisição de vacina contra a febre aftosa, para 22 (vinte e duas) cabeças de gado, datada de 21.05.2012, firmando como produtor ou responsável legal a autora (fl. 36); o) cópia de declaração de exercício de atividade rural emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Rio Verde de Mato Grosso, MS, indicando que a autora trabalha desde 01.08.2012 no Assentamento Matadeira (fls. 37-38); p) cópia de guia de trânsito animal, datada de 25.04.2013, em nome do marido da demandante (fl. 39); q) cópia de atualização cadastral - agropecuária, para fins de recolhimento de ICMS, em nome da autora e de seu marido, atinentes ao assentamento Matadeira, datada de 12.11.2012 (fl. 40); r) cópia de declarações anuais de produtor rural, em nome do marido da autora, datadas de 25.03.2013 e 06.03.2014 (fls. 41 e 44); s) cópia de entrevista rural perante o INSS feita pela autora (fls. 45-46) e t) cópia da homologação pelo INSS do período de atividade rural, como segurado especial, desenvolvido pela autora, entre 01.08.2012 a 10.03.2014 (fl. 47).
Os documentos colacionados pela parte autora constituem início razoável de prova material de que ela trabalhava nas lides campesinas, como segurada especial.
Por sua vez, a prova testemunhal produzida nos autos, em consonância com o depoimento pessoal da autora, evidenciou de forma segura e induvidosa o labor rural da parte autora, sendo que os depoentes, que a conhecem há muitos anos, foram unânimes em suas declarações, confirmando que ela sempre trabalhou na lavoura e trabalha até hoje na chácara (no assentamento), onde produzem leite (cerca de 10 vacas), criam galinhas, porcos e vendem para sua subsistência.
Assim sendo, o início de prova material, corroborado por robusta e coesa prova testemunhal, comprova a atividade campesina exercida pela parte autora.
Para a caracterização da condição de rurícola, deve-se levar em consideração o histórico laboral do trabalhador perquirindo-se qual atividade foi preponderantemente desempenhada durante toda a vida laborativa do segurado.
Isso porque, a condição de trabalhador rural exige verdadeira vinculação do trabalhador à terra, a denotar que ele elegeu o labor campesino como meio de vida.
Assim, o exercício de atividade urbana intercalada com a rural é circunstância que não impede, isoladamente, o reconhecimento de eventual direito à percepção de benefício previdenciário de trabalhador rural, conforme Súmula n.º 46 da TNU, que assim dispõe:
Portanto, o labor urbano exercido por curtos períodos, especialmente na entressafra, quando o trabalhador campesino precisa se valer de trabalhos esporádicos que lhe assegurem a sobrevivência, não constitui óbice, por si só, ao reconhecimento do labor rural.
CONCLUSÃO
Desse modo, presentes os pressupostos legais para a concessão do benefício, vez que implementado o requisito da idade e demonstrado o exercício da atividade rural, por período equivalente ao da carência exigida pelo artigo 142 da Lei nº 8213/91, a procedência do pedido era de rigor.
O termo inicial do benefício deve ser mantido a partir do requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal.
Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral).
Apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto com o julgado acima mencionado.
Assim, se a sentença determinou a aplicação de critérios de correção monetária diversos daqueles adotados quando do julgamento do RE nº 870.947/SE, pode esta Corte alterá-la, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento do Egrégio STF, em sede de repercussão geral.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se, até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, após, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral.
De acordo com a decisão do Egrégio STF, os juros moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso e, de ofício, altero os critérios de correção monetária.
É o voto.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | INES VIRGINIA PRADO SOARES:10084 |
| Nº de Série do Certificado: | 11DE18032058641B |
| Data e Hora: | 26/09/2018 17:06:00 |
