
| D.E. Publicado em 08/10/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso para aplicar aos juros de mora a Lei 9494/97 com a redação dada pela Lei 11.960/09 e, de ofício, explicitar os critérios de correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0020137-27.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face da sentença que julgou procedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade de trabalhador rural, condenando-o a pagar o benefício a partir do pedido administrativo (28/12/2015), no valor de um salário mínimo, abono anual, correção monetária segundo índice do TRF3ªR, a partir do vencimento de cada parcela, juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação e honorários advocatícios de R$ 700,00, antecipando, ainda, os efeitos da tutela para imediata implantação do benefício.
A sentença não foi submetida ao reexame necessário.
O recorrente pede a reforma da sentença, em síntese, sob os seguintes fundamentos: a) não comprovação dos requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado e b) juros de mora e correção monetária.
Regularmente processado o feito, com contrarrazões, os autos subiram a este Eg. Tribunal.
Certificado pela Subsecretaria da Sétima Turma, nos termos da Ordem de Serviço nº 13/2016, artigo 8º, que a apelação foi interposta no prazo legal.
É o relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
A parte autora pleiteia a concessão de aposentadoria por idade rural, prevista no artigo 48, §§1º e 2º da Lei nº 8.213/91, verbis:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. |
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. |
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei." |
Em síntese, para a obtenção da aposentadoria por idade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) idade mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao da carência exigida para a sua concessão.
No que tange à carência, considerando o ano em que o rurícola implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício, o artigo 142 da Lei nº 8.213/91 estabelece regra de transição a ser observada pelos segurados inscritos na Previdência Social até 24/07/91.
Por sua vez, a regra de transição prevista na Lei nº 8.213/91, em seu artigo 143, estabelece que "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício."
Em outras palavras, facultou-se aos trabalhadores rurais, atualmente enquadrados como segurados obrigatórios, que requeressem até o ano de 2006 (15 anos da data de vigência da Lei n.º 8.213/91) aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, bastando apenas a comprovação do exercício de trabalho rural em número de meses idêntico à carência do benefício, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao seu requerimento.
Com o advento da Lei nº 11.718/2008, referido prazo foi prorrogado, exaurindo-se em 31/12/2010, a partir de quando se tornou exigível o recolhimento de contribuições, na forma estabelecida em seu art. 3º.
Portanto, em se tratando de segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/91, deve ser considerada a tabela progressiva inserta no artigo 142 da Lei de Benefícios, não havendo que se falar em exigência de contribuição ao trabalhador rural, bastando a comprovação do efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.
Aos que ingressaram no sistema após essa data, aplica-se a regra prevista no art. 25, inc. II, da Lei de Benefícios que exige a comprovação de 180 contribuições mensais.
COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL
A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Dentro desse contexto, considerando as precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
Conforme entendimento jurisprudencial sedimentado, a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ.
CASO CONCRETO
A idade mínima exigida para obtenção do benefício restou comprovada, tendo a parte autora nascido em 23/12/1960 (fl. 13).
Com o implemento do requisito etário em 23/12/2015, a parte autora deve comprovar o exercício do labor rural no período imediatamente anterior a 2015, mesmo que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício requerido (180), não tendo o Instituto-réu conseguido infirmar a validade dos depoimentos prestados e dos documentos trazidos.
Anote-se que a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, restou sedimentada pelo C. STJ, no julgamento do REsp nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva.
Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo (AgRg no REsp nº 1362145/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campell Marques, DJe 01/04/2013; AgRg no Ag nº 1419422/MG, 6ª Turma, Relatora Ministra Assussete Magalhães, DJe 03/06/2013; AgRg no AREsp nº 324.476/SE, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 28/06/2013).
A parte autora alega que, desde a infância, exercia atividade rural com seus pais, em regime de economia familiar. Após seu casamento, em 1979, passou a trabalhar junto com o marido na lavoura.
Para comprovar suas alegações, a parte autora apresentou os seguintes documentos: a) certidão de casamento celebrado em 1979, onde seu marido está qualificado como lavrador (fl. 16); b) escritura de compra e venda de propriedade rural identificando seu esposo como comprador e a autora como agricultora - ano de 2004 (fls. 17/19); c) notas fiscais de 1995 a 2015 onde seu marido figura como produtor (fls. 20/46); d) certidão da Secretaria da Fazenda de que o marido da autora está inscrito como produtor rural, indicando as propriedades (fl. 47); e) contrato de comodato onde a autora e seu marido figuram como comodatários do Sítio Belo Horizonte - de 01/03/2010 a 31/12/2013, renovado em 01/03/2013 a 28/02/2015 e de 01/03/2015 a 28/02/2017 (fls. 49/54); d) declarações cadastrais de produtor rural em nome de seu marido - 2001 e 2003 (fls. 55/65); e) guias de pagamento de ITR exercício de 2003 a 2009 (fls. 65/104).
Os documentos colacionados pela parte autora constituem início razoável de prova material de que ela trabalhava nas lides campesinas.
Por sua vez, a prova testemunhal produzida nos autos evidenciou de forma segura e induvidosa o labor rural da parte autora, sendo que os depoentes, que a conhecem há muitos anos, foram unânimes em suas declarações, confirmando que ela sempre trabalhou na lavoura, estando em atividade até os dias de hoje.
Devanir dos Santos Bonfim conhece a autora há mais 20 anos e disse que desde essa época ela sempre trabalhou na lavoura, o que faz até hoje. Esclareceu que a autora e o marido compraram um sítio há cerca de 10 ou 12 anos onde exerceram a atividade rural. Todavia, eles perderam o sítio, o que fez com que a autora voltasse a trabalhar como boia fria (fl. 170v).
Adenidio da Silva Morais conhece a autora há mais de 30 anos e afirma que ela sempre trabalhou na lavoura. Disse que sua família era arrendatária e trabalhava no sítio para sua subsistência. Depois tiveram um sítio próprio denominado Sítio São José que ficou com eles por cerca de 2 ou 3 anos, sendo que apenas a família trabalhava, na plantação de tomate, melancia e pimentão (fl. 171).
Maria Aparecida Miguel da Silva Filho disse que conhece a autora há mais de 40 anos e desde essa época ela trabalhava na lavoura e ainda trabalha. Esclarece que a família da autora era arrendatária em várias propriedades e nunca tiveram empregados, trabalhando só a família, que era a autora, o marido e dois filhos, na lavoura de tomate e melancia. Elencou diversos outros sítios arrendados pela autora e o marido onde eles exerciam a atividade rural (fl. 172).
Assim sendo, o início de prova material, corroborado por robusta e coesa prova testemunhal, comprova a atividade campesina exercida pela parte autora.
A corroborar o exercício de atividade rural pelo grupo familiar, em consulta ao CNIS do marido da autora emerge que ele foi aposentado por idade, em 24/04/2017, data em que completou 60 anos de idade (fl. 127).
Ademais, os documentos de fls. 142/164 denotam que o sítio foi adquirido através de financiamento e crédito fiduciário com hipoteca do próprio imóvel e novamente vendido logo a aquisição por não terem os adquirentes conseguido honrar as dívidas, o que não descaracteriza a condição de pequeno produtor.
Por fim, para que o segurado especial possa usufruir de outros benefícios previdenciários previstos pela Lei n. 8.213/91 que não os arrolados pelo seu artigo 39, lhe foi proporcionada a opção de contribuir, de maneira facultativa.
Neste sentido dispõe o art. 25, § 1º, da Lei n. 8.212/1991: "§ 1º O segurado especial de que trata este artigo, além da contribuição obrigatória referida no caput, poderá contribuir, facultativamente, na forma do art. 21 desta Lei" .
Portanto, a inscrição da parte autora como contribuinte facultativo não descaracteriza o regime de economia familiar, pois o artigo 25, §1º, da Lei nº 8.212/91 permite que o segurado especial possa contribuir como obrigatório e facultativo ao mesmo tempo.
Logo, considerando que o segurado especial não está obrigado a recolher, o fato de a parte autora ter efetuado recolhimento de contribuições como segurada facultativa não lhe retira o direito ao benefício, como no caso concreto em que o marido da autora recolheu como contribuinte individual.
CONCLUSÃO
Desse modo, presentes os pressupostos legais para a concessão do benefício, vez que implementado o requisito da idade e demonstrado o exercício da atividade rural, por período equivalente ao da carência exigida pelo artigo 142 da Lei nº 8213/91, a procedência do pedido era de rigor.
Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral).
Não pode ser acolhido, portanto, o apelo do INSS quanto à correção monetária.
Apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto com o julgado acima mencionado.
Assim, se a sentença não fixou os critérios de correção monetária a serem observados, pode esta Corte fazê-lo, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento do Egrégio STF, em sede de repercussão geral.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se, até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, após, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral.
De acordo com a decisão do Egrégio STF, os juros moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso para aplicar aos juros de mora a Lei 9494/97 com a redação dada pela Lei 11.960/09 e, de ofício, explicitar os critérios de correção monetária.
É o voto.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
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| Data e Hora: | 26/09/2018 17:07:13 |
