
| D.E. Publicado em 22/02/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer do recurso oficial, negar provimento ao recurso e, de ofício, alterar os critérios de juros de mora e correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000914-59.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face da sentença que julgou procedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade de trabalhador rural, condenando-o a pagar o benefício a partir do pedido administrativo (21/12/2011), no valor de um salário mínimo; abono anual; correção monetária pela Lei 6.899/81 e Súmula 148 do STJ; juros de mora de 1% ao mês, desde a citação (Súmula 204 do STJ) e honorários advocatícios de 10% sobre o débito existente por ocasião da sentença (Súmula 111 do STJ).
A sentença foi submetida ao reexame necessário.
O recorrente pede a reforma da sentença, em síntese, sob os seguintes fundamentos: a) não comprovação dos requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado; b) alteração do termo inicial do benefício e c) juros de mora e correção monetária nos termos da Lei 11.960/09.
Regularmente processado o feito, com contrarrazões, os autos subiram a este Eg. Tribunal.
É o relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: A sentença recorrida foi proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, o qual afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a 60 (sessenta) salários mínimos (art. 475, inciso I e parágrafo 2º).
Desta forma, considerando o valor do benefício e o lapso temporal desde a sua concessão, a hipótese dos autos não demanda reexame necessário.
Nesse sentido, precedente desta C. 7ª Turma:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REMESSA OFICIAL NÃO CONHECIDA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS A TÍTULO DE TUTELA ANTECIPADA. DESNECESSIDADE. APELAÇÃO DO INSS IMPROVIDA. |
1. Inaplicável a disposição sobre o reexame necessário, considerados o valor do benefício e o lapso temporal de sua implantação, não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos (art. 475, § 2º, CPC/1973). |
2. O entendimento firmado pelo STJ no REsp nº 1401560/MT versa sobre a devolução de valores recebidos a título de benefício previdenciário, e não benefício assistencial, como é o caso doa autos. Ademais, via de regra o benefício assistencial somente é concedido para pessoas de baixa renda, em situação de miserabilidade, razão pela qual não é o caso de se determinar a devolução de valores recebidos a título de antecipada. |
3. Apelação improvida. |
(AC nº 0039185-79.2012.4.03.9999/SP, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, DE 11/10/2017) |
Ingresso na análise do mérito.
A parte autora pleiteia a concessão de aposentadoria por idade rural, prevista no artigo 48, §§1º e 2º da Lei nº 8.213/91, verbis:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. |
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. |
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei." |
Em síntese, para a obtenção da aposentadoria por idade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) idade mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao da carência exigida para a sua concessão.
No que tange à carência, considerando o ano em que o rurícola implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício, o artigo 142 da Lei nº 8.213/91 estabelece regra de transição a ser observada pelos segurados inscritos na Previdência Social até 24/07/91.
Por sua vez, a regra de transição prevista na Lei nº 8.213/91, em seu artigo 143, estabelece que "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício."
Em outras palavras, facultou-se aos trabalhadores rurais, atualmente enquadrados como segurados obrigatórios, que requeressem até o ano de 2006 (15 anos da data de vigência da Lei n.º 8.213/91) aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, bastando apenas a comprovação do exercício de trabalho rural em número de meses idêntico à carência do benefício, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao seu requerimento.
Com o advento da Lei nº 11.718/2008, referido prazo foi prorrogado, exaurindo-se em 31/12/2010, a partir de quando se tornou exigível o recolhimento de contribuições, na forma estabelecida em seu art. 3º.
Portanto, em se tratando de segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/91, deve ser considerada a tabela progressiva inserta no artigo 142 da Lei de Benefícios, não havendo que se falar em exigência de contribuição ao trabalhador rural, bastando a comprovação do efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.
Aos que ingressaram no sistema após essa data, aplica-se a regra prevista no art. 25, inc. II, da Lei de Benefícios que exige a comprovação de 180 contribuições mensais.
COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL
A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Diante das precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
Importante dizer que a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, restou sedimentada pelo C. STJ, no julgamento do REsp nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva.
Destaca-se, ainda, que, diante da dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo (AgRg no REsp nº 1362145/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campell Marques, DJe 01/04/2013; AgRg no Ag nº 1419422/MG, 6ª Turma, Relatora Ministra Assussete Magalhães, DJe 03/06/2013; AgRg no AREsp nº 324.476/SE, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 28/06/2013).
Conforme entendimento jurisprudencial sedimentado, a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ.
CASO CONCRETO
A idade mínima exigida para obtenção do benefício restou comprovada, tendo a parte autora nascido em 10/08/1955 (fl. 25).
Com o implemento do requisito etário em 10/08/2010, a parte autora deve comprovar o exercício do labor rural no período imediatamente anterior a 2010, mesmo que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício requerido (180), não tendo o Instituto-réu conseguido infirmar a validade dos depoimentos prestados e dos documentos trazidos.
A parte autora alega que se casou em 1977, a partir de quando passou a exercer atividade rural como segurada especial, em regime de economia familiar. Assevera que a própria autarquia homologou administrativamente o período de 20/06/1978 a 01/10/1979 (Sítio Cachoeirinha - comodato) e 01/01/2002 a 08/12/2011 (Sítio Cachoeirinha - proprietária), totalizando 11 anos, 2 meses e 20 dias.
Para comprovar suas alegações, a parte autora apresentou os seguintes documentos: a) certidão de casamento celebrado em 17/09/1977 onde seu marido está qualificado como lavrador; b) sua CTPS com vínculo urbano de 14/02/74 a 15/08/77 (fl. 28); c) declaração de atividade rural do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São José do Rio Pardo e demais documentos; d) matricula de imóvel rural em nome de seu marido; e) escritura pública de imóvel rural em nome de seu marido; f) certidões de nascimento dos seus filhos - 1978 e 1979 onde seu marido está qualificado como lavrador e o domicílio do casal é o Sítio Cachoeirinha; g) declaração cadastral de produtor rural; h) notificação de lançamento; i) certificados de cadastro de imóvel rural até o ano de 2009; j) ITR's até 2011; k) documento de fl. 123; l) notas fiscais de produtor rural.
Os documentos colacionados pela parte autora constituem início razoável de prova material de que ela trabalhava nas lides campesinas.
É certo que o marido da autora se aposentou como industriário (fl. 149) e que a autora possui vínculo urbano anotado em sua CTPS.
Todavia, a própria autora alega que passou a exercer a atividade rural após o seu casamento, em setembro/1977, momento posterior ao referido vínculo urbano. Ela disse que reside e trabalha no sítio Cachoeirinha desde que se casou, nunca tendo trabalhado na cidade. Afirmou que o sítio tem cerca de um alqueire, não tem empregados nem maquinário. Moram a autora, seu marido e os dois filhos. A autora esclareceu que o marido trabalhou na Nestlé e se aposentou há 05 anos, ajudando no sítio. O sítio era do seu sogro e foi comprado pelo seu marido.
Doutra parte, a autora possui documentos em nome próprio, não havendo necessidade de se socorrer dos documentos em nome de seu marido. De qualquer forma, a prova aponta no sentido de que o marido da autora trabalhava no sítio após o expediente na empresa em que trabalhava.
Ademais, o fato de um dos membros da família exercer atividade diversa da rural, por si só, não descaracteriza a condição de segurado especial de quem pleiteia o benefício.
Isso porque, o regime de economia familiar, tal como preceituado no inciso VII, do artigo 11, da Lei 8.213/1991, somente será descaracterizado se comprovado que a remuneração proveniente do trabalho urbano do membro da família dedicado a outra atividade que não a rural dispense a renda do trabalho rural dos demais para a subsistência do grupo familiar.
Sobre a questão, o Eg. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento de Recurso Especial submetido à sistemática dos recursos repetitivos, REsp 1.304.479/SP, sedimentou entendimento de que o "trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada, a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar".
Nesse sentido é a orientação firmada pela TNU que editou a Súmula 41 que porta o seguinte enunciado:
O exercício do labor rural pela autora restou sobejamente comprovado, tendo o próprio INSS homologado os períodos de 20/06/1978 a 01/10/1979 (Sítio Cachoeirinha - comodato) e 01/01/2002 a 08/12/2011 (Sítio Cachoeirinha - proprietária), totalizando 11 anos, 2 meses e 20 dias (fls. 152/153).
Por sua vez, a prova testemunhal produzida nos autos evidenciou de forma segura e induvidosa o labor rural da parte autora, sendo que os depoentes, que a conhecem há muitos anos, foram unânimes em suas declarações, confirmando que ela sempre trabalhou na lavoura, estando em atividade até os dias de hoje.
Joaquim Franco foi vizinho da autora e não mora lá há, aproximadamente, 20 anos. Afirmou que ela mora até hoje no Sítio Cachoeirinha e que, na época em que ele estava lá, ela trabalhava na roça, no sítio que era do sogro. O marido trabalhava na Nestlé e ajudava no sítio durante o dia. Eles não tinham empregados, nem maquinário. Posteriormente, o marido da autora adquiriu um pedaço do sítio do pai.
José Benedito Maziero possui um sítio que fica a 500 metros de distância do sítio da autora. Passou a residir lá em 1966 e a autora chegou em 1977, quando se casou. Ela mora no sítio com o marido e os dois filhos. Trabalha na roça com produção de cebola, arroz e verdura. Esclareceu que não há empregados no sítio, nem máquinas. O marido da autora trabalha na Nestlé e ajuda no sítio.
Carlos Donizete Maziero é vizinho da autora há 15 anos. A autora trabalha no sítio plantando verdura, cebola. Mora com o marido. Não há empregados, nem máquinas. O marido é aposentado da Nestlé. Antigamente ele trabalhava á noite na Nestlé e ajudava a autora no sítio de dia.
Assim sendo, o início de prova material, corroborado por robusta e coesa prova testemunhal, comprova a atividade campesina exercida pela parte autora.
CONCLUSÃO
Desse modo, presentes os pressupostos legais para a concessão do benefício, vez que implementado o requisito da idade e demonstrado o exercício da atividade rural, por período equivalente ao da carência exigida pelo artigo 142 da Lei nº 8213/91, a procedência do pedido era de rigor.
Relativamente ao termo inicial do benefício, o artigo 49 da Lei 8.213/91 dispõe:
Portanto, o termo inicial do benefício deve ser mantido a partir do requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal.
Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/SE, repercussão geral).
Não pode ser acolhido, portanto, o apelo do INSS.
Apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério de correção monetária, não é o caso de adotá-lo, porque em confronto com o julgado acima mencionado.
Assim, se a sentença determinou a aplicação de critérios de correção monetária diversos daqueles adotados quando do julgamento do RE nº 870.947/SE, pode esta Corte alterá-la, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento do Egrégio STF, em sede de repercussão geral.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se, até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, após, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral.
De acordo com a decisão do Egrégio STF, os juros moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
Ante o exposto, não conheço do recurso oficial, nego provimento ao recurso e, de ofício, altero os critérios de juros de mora e correção monetária.
É o voto.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
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