
| D.E. Publicado em 10/12/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO ao apelo do INSS e DETERMINAR, DE OFÍCIO, a alteração da correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021982-94.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Trata-se de apelação interposta pelo INSS em face da sentença que julgou PROCEDENTE a ação de concessão de benefício previdenciário ajuizada por RANULFO NUNES PEREIRA e condenou o requerido a pagar ao autor aposentadoria por idade de trabalhador rural, a partir da data do requerimento administrativo (29/08/2016), com correção monetária (Manual de Cálculos da Justiça Federal) e juros de mora (Lei nº 11.960/2009), além de honorários advocatícios fixados em 15% sobre o valor da condenação, antecipando, ainda, os efeitos da tutela para imediata implantação do benefício.
A sentença não foi submetida ao reexame necessário.
O recorrente pede a reforma da sentença, em síntese, sob os seguintes fundamentos:
- não estão comprovados os requisitos para a concessão do benefício, eis que não há prova material do trabalho rural no período de carência e o autor possui alguns vínculos urbanos.
Regularmente processado o feito, sem contrarrazões, os autos subiram a este Eg. Tribunal.
Certificado pela Subsecretaria da Sétima Turma, nos termos da Ordem de Serviço nº 13/2016, artigo 8º, que a apelação foi interposta no prazo legal.
É o relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual.
A parte autora alegou que trabalhou na atividade rural durante toda a sua vida, na condição de segurado especial, ora com registro em CTPS, ora como diarista (boia-fria).
E pleiteou a concessão de aposentadoria por idade rural, prevista no artigo 48, §§1º e 2º da Lei nº 8.213/91, verbis:
Em síntese, para a obtenção da aposentadoria por idade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) idade mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao da carência exigida para a sua concessão.
No que tange à carência, considerando o ano em que o rurícola implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício, o artigo 142 da Lei nº 8.213/91 estabelece regra de transição a ser observada pelos segurados inscritos na Previdência Social até 24/07/91.
Por sua vez, a regra de transição prevista na Lei nº 8.213/91, em seu artigo 143, estabelece que "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício."
Em outras palavras, facultou-se aos trabalhadores rurais, atualmente enquadrados como segurados obrigatórios, que requeressem até o ano de 2006 (15 anos da data de vigência da Lei n.º 8.213/91) aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, bastando apenas a comprovação do exercício de trabalho rural em número de meses idêntico à carência do benefício, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao seu requerimento.
Com o advento da Lei nº 11.718/2008, referido prazo foi prorrogado, exaurindo-se em 31/12/2010, a partir de quando se passou a exigir o recolhimento de contribuições, na forma estabelecida em seu art. 3º.
Portanto, em se tratando de segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/91, deve ser considerada a tabela progressiva inserta no artigo 142 da Lei de Benefícios, não havendo que se falar em exigência de contribuição ao trabalhador rural, bastando a comprovação do efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.
Aos que ingressaram no sistema após essa data, aplica-se a regra prevista no art. 25, inc. II, da Lei de Benefícios que exige a comprovação de 180 contribuições mensais.
Nessa esteira é o entendimento da Eg. Sétima Turma deste Tribunal Regional:
COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL
A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Dentro desse contexto, considerando as precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
Conforme entendimento jurisprudencial sedimentado, a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ.
CASO CONCRETO
A idade mínima exigida para obtenção do benefício restou comprovada, pois, tendo a parte autora nascido em 15/01/1956, implementou o requisito etário em 2016.
Em relação ao período de carência, a parte autora deveria comprovar o labor rural, mesmo que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao implemento da idade, ao longo de, ao menos, 180 meses, conforme determinação contida no art. 142 da Lei nº 8.213/91.
Anote-se que a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, restou sedimentada pelo C. STJ, no julgamento do REsp nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva.
Os documentos acostados são a certidão de casamento (1975), onde o autor está qualificado como lavrador e as cópias de sua CTPS com registros na cultura da cana de açúcar em 1997, 2002, 2003, 2005, 2006/2008 e 2009/2010, além de dois registros na construção civil, o primeiro em agosto de 1976 e o segundo, por apenas dois dias, no mês de agosto de 1977.
Diga-se, de imediato, que para a caracterização da condição de rurícola deve-se levar em consideração o histórico laboral do trabalhador perquirindo-se qual atividade foi preponderantemente desempenhada durante toda a vida laborativa do segurado.
Isso porque, a condição de trabalhador rural exige verdadeira vinculação do trabalhador à terra, a denotar que ele elegeu o labor campesino como meio de vida.
Assim, o exercício de atividade urbana intercalada com a rural é circunstância que não impede, isoladamente, o reconhecimento de eventual direito à percepção de benefício previdenciário de trabalhador rural, conforme Súmula n.º 46 da TNU, que assim dispõe: "O exercício de atividade urbana intercalada não impede a concessão de benefício previdenciário de trabalhador rural, condição que deve ser analisada no caso concreto."
Portanto, o labor urbano exercido por curtos períodos, especialmente na entressafra, quando o trabalhador campesino precisa se valer de trabalhos esporádicos que lhe assegurem a sobrevivência, não constitui óbice, por si só, ao reconhecimento do labor rural.
No mais, considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo (AgRg no REsp nº 1362145/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campell Marques, DJe 01/04/2013; AgRg no Ag nº 1419422/MG, 6ª Turma, Relatora Ministra Assussete Magalhães, DJe 03/06/2013; AgRg no AREsp nº 324.476/SE, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 28/06/2013).
Diante disso, os registros como trabalhador rural ao longo de sua vida e durante o período de carência constituem forte e incontestável início de prova material que, no caso, está corroborada pela robusta prova testemunhal produzia nos autos.
Deveras. A prova testemunhal evidenciou de forma segura e induvidosa o labor rural da parte autora, sendo que os depoentes, que a conhecem há muitos anos, foram unânimes em suas declarações, confirmando que ela sempre trabalhou na lavoura e está em atividade até os dias de hoje.
O senhor Geraldo afirmou que conheceu o autor nos idos de 1990, quando ambos trabalharam na chácara do Zé Filipe, em regime de "porcentagem", depois o autor foi trabalhar como bóia-fria, atividade que exerce até a atualidade. No mesmo sentido foi o depoimento do senhor Laor, que conheceu o autor na Fazenda Montalar, à altura em que trabalhava como fiscal; lá, o autor desempenhava serviços gerais de lavoura como diarista nas culturas de abóbora, milho, feijão e algodão, atividade que exerce até os dias de hoje, ainda na condição de "volante". Ambas as testemunhas afirmaram que o autor sempre exerceu a atividade campesina e que não tem conhecimento de que ele tenha trabalhado na área urbana.
Assim sendo, o início de prova material, corroborado por robusta e coesa prova testemunhal, comprova a atividade campesina exercida pela parte autora.
CONCLUSÃO
Desse modo, presentes os pressupostos legais para a concessão do benefício, vez que implementado o requisito da idade e demonstrado o exercício da atividade rural, por período equivalente ao da carência exigida pelo artigo 142 da Lei nº 8213/91, a procedência do pedido era de rigor.
Vale destacar que a inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/PE, repercussão geral).
Tal índice deve ser aplicado ao caso, até porque o efeito suspensivo concedido em 24/09/2018 pelo Egrégio STF aos embargos de declaração opostos contra o referido julgado para a modulação de efeitos para atribuição de eficácia prospectiva, surtirá efeitos apenas quanto à definição do termo inicial da incidência do IPCA-e, o que deverá ser observado na fase de liquidação do julgado.
Assim, se a sentença determinou a aplicação de critérios de correção monetária diversos daqueles adotados quando do julgamento do RE nº 870.947/PE, pode esta Corte alterá-la, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento do Egrégio STF, em sede de repercussão geral.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se, até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, após, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/PE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral.
De acordo com a decisão do Egrégio STF, os juros moratórios serão calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto nesta decisão, e o perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, confirmo a tutela anteriormente concedida.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao apelo do INSS e DETERMINO, DE OFÍCIO, a alteração da correção monetária, nos termos explicitados no voto.
É O VOTO.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
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| Data e Hora: | 29/11/2018 19:00:57 |
