Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5790971-89.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
11/09/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 17/09/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO: APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. BENEFÍCIO CONCEDIDO
ADMINISTRATIVAMENTE. POSTERIOR CESSAÇÃO. REQUISITOS NÃO SATISFEITOS.
DEVOLUÇÃO DE VALORES PAGOS. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER
ALIMENTAR
1. Para comprovar o labor rural em regime de economia familiar noperíodo compreendido entre
07/07/1962 até a 02/04/1998, a autora apresentou os seguintes documentos: a) Matrícula do Sítio
Tanquinho, onde a Autora declarou a profissão de “lavradora”, b) Comprovante de recolhimento
de INCRA referentes aos anos de 1988/1996, onde se verifica que a profissão declarada do
esposo, nos INCRA'sde 1992/1996 é trabalhador rural e com a informação de que nunca houve
trabalhadores assalariados;c) Notas Fiscais de entrada, referentes à venda de produtos agrícolas,
confeccionadas em 1993, 1995 e 1997 1997 (ID 73539694 - Pág. 102 , ID 73539694 - Pág.
32/46);d) Notas Fiscais de compra de insumos agrícolas, confeccionadas em 1994/1996; e)
Comprovante de cadastro de trabalhador/contribuinte individual da Autora, referente ao NIT
114.369.193- 33, onde a Autora declarou a atividade de segurada especial; e) declaração do
Sindicato Rural..
2. A declaração de sindicato rural não pode ser considerada início de prova material, uma vez que
não foi homologada pelo Instituto. Ela equivale a declaração particular subscrita por terceiro,
colhida sem o crivo do contraditório e, portanto, não se enquadra no conceito de prova material
(ID 73539694 - Pág. 4).-.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
3. Por sua vez, a qualificação da autora na Certidão do Livro 3-O de Transcrições das
Transmissões (termo n. 15.122), expedida pelo Serviço de Registro de Imóveis e Anexos da
Comarca de Pederneiras-SP, não pode se estender após o seu casamento em 26/10/63, já que
na certidão de casamento ela está qualificada como “do lar” e seu marido como “motorista” . Por
outro lado, as demais provas acostadas aos autos (documentos fiscais), apenas identificam o
marido da autora.
4. Dúvidas não subsistem sobre a possibilidade de extensão da qualificação de lavrador de um
cônjuge ao outro constante de documento apresentado, para fins de comprovação da atividade
campesina, que indique, por exemplo, o marido como trabalhador rural (STJ, 3ª Seção, EREsp
1171565, relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05.03.2015), especialmente quando houver
documentos em seu nome que atestem sua condição de rurícola, o que só é possívelquando se
tratar de hipótese de agricultura de subsistência em que o labor é exercido em regime de
economia familiar.
5. Todavia, o seu marido era trabalhador urbano, pois qualificado como motorista (Certidão de
casamento 26/10/1963 onde ele está qualificado como motorista e ela do lar -ID 73539694 - Pág.
143), além de aposentar-se por tempo de contribuição na condição de industriário, de modo que a
jurisprudência nãoautoriza a extensão da prova em nome do marido nestas situações.
6. Ainda que se reconheça que a função de tratorista agrícola é essencialmente de natureza rural,
porque lida com a terra, o plantio, a colheita, de sorte que o trator deve ser considerado
instrumento de trabalho de qualidade rural, diverso do motorista, que labora no transporte em
função tipicamente urbana, fato é que, em 1998, o marido da autora se aposentou por tempo de
contribuição na condição de industriário, conforme INFBEN juntado aos autos com DIB em
21/10/98 e cujo valor, em 2009, era R$ 758,67 (ID 73539694 - Pág. 64) superior ao salário
mínimo da época que era R$ 465,00.
7. No caso concreto, embora a autora tenha demonstrado a existência de imóvel rural em seu
nome, isto não é suficiente para demonstrar o alegado trabalho nas lides campesinas em regime
de economia familiar, que pressupõe uma forma rudimentar de trabalho rural em que os membros
da família realizam trabalho indispensável à própria subsistência e mútua colaboração.
8. Insta dizer que a simples existência de imóvel rural em nome da autora, por si só, não a
equipara a trabalhadora rural, principalmente em regime de economia familiar, devendo
demonstrar o efetivo exercício do seu trabalho na referida propriedade por um período mínimo,
contínuo e duradouro, o que não restou demonstrado.
9. Não comprovado o labor rural em regime de economia familiar, correta a cessação do
benefício.
10. O benefício foi concedido administrativamente após a avaliação do preenchimento dos
requisitos legais para sua concessão.
11. Os valores pagos a esse título foram recebidos de boa-fé pela autora, não se restando
configurada, in casu, qualquer tipo de fraude.
12. Conforme jurisprudência, é incabível a devolução de valores percebidos pelo beneficiário de
boa-fé por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração.
13. Não se aplica ao caso dos autos o entendimento fixado no Recurso Especial 1.401.560/MT,
julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, pois não se discute na espécie a restituição de valores
recebidos em virtude de antecipação de tutela posteriormente revogada.
14. Recursos desprovidos.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5790971-89.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: MARIA CONCEICAO VASQUES FANTINI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA CONCEICAO
VASQUES FANTINI
Advogado do(a) APELADO: CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5790971-89.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: MARIA CONCEICAO VASQUES FANTINI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA CONCEICAO
VASQUES FANTINI
Advogado do(a) APELADO: CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA):Trata-se de
apelações interpostas pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e pela autora , em face da
sentença que julgou parcialmente procedente os pedidos, verbis:
"Posto isso, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos formulados por MARIA DA
CONCEIÇÃO VASQUES FANTINI em relação ao INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL
para tão somente DECLARAR INEXIGÍVEL a dívida referente aos valores recebidos pela autora a
título de benefício previdenciário. Por consequência, extingo o processo com resolução do mérito
(CPC, art. 487, I) Nesta oportunidade, CONCEDO A TUTELA DE URGÊNCIA e determino que o
INSS se abstenha de efetuar qualquer cobrança ou descontar do benefício da autora e inscrever
seu nome em dívida ativa, em relação ao débito oriundo do pagamento equivocado do benefício
nº 108.285.123-7. Oficie-se. Diante da sucumbência menor do requerido, condeno a parte autora
ao pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (um
mil reais), com fulcro no art. 85, § 8. e art. 86, parágrafo único, ambos do CPC/15, observada a
gratuidade, se o caso. P. I."
A autora ajuizou a presente ação objetivando o restabelecimento de sua aposentadoria por idade
rural, cessada indevidamente, em 01/01/2017.
O INSS, ora primeiro recorrente, pede a reforma parcial da sentença ao argumento, em síntese,
do cabimento da restituição dos valores recebidos indevidamente, ainda que comprovada a boa-
fé da autora no seu recebimento.
A autora, ora segunda recorrente, alega que nasceu e foi criada no campo, tendo exercido o labor
rural ao longo de toda sua vida e que o fato de seu marido ser tratorista não descaracteriza o
exercício da atividade rural em regime de economia familiar.
Regularmente processado o feito, os autos vieram a este Eg. Tribunal.
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5790971-89.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: MARIA CONCEICAO VASQUES FANTINI, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA CONCEICAO
VASQUES FANTINI
Advogado do(a) APELADO: CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA):Recebo as
apelações interpostas sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua
regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo
Civil.
Por questão de método, ingresso na análise conjunta dos recursos.
A parte autora pleiteia o restabelecimento de aposentadoria por idade rural, prevista no artigo 48,
§§1º e 2º da Lei nº 8.213/91, verbis:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de
trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na
alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo
exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei."
Em síntese, para a obtenção da aposentadoria por idade,deve o requerente comprovar o
preenchimento dos seguintes requisitos: (i) idade mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural,
ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do
benefício, por tempo igual ao da carência exigida para a sua concessão.
Em se tratando de segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/91, deve ser
considerada a tabela progressiva inserta no artigo 142 da Lei de Benefícios, não havendo que se
falar em exigência de contribuição ao trabalhador rural, bastando a comprovação do efetivo
exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, em número de meses idêntico à
carência do referido benefício e, aos que ingressaram no sistema após essa data, aplica-se a
regra prevista no art. 25, inc. II, da Lei de Benefícios que exige a comprovação de 180
contribuições mensais.
No presente caso, a parte autora completou a idade necessária para se aposentar em 1998, de
sorte que precisava comprovar 102 meses de atividade rural em período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício ou ao implemento do requisito etário..
O benefício concedido administrativamente foi cessado posteriormente porque se verificou que a
autora não havia comprovado ser trabalhadora rural em regime de economia familiar.
COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL
A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício
previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação
de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo
admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C.
STJ.
Ademais, diante das precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as
dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp.
1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC,
art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte
do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
Destaca-se, ainda, que, diante da dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o
Eg. STJ vem admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo
único, da Lei nº 8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo (AgRg no REsp nº
1362145/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campell Marques, DJe 01/04/2013; AgRg no Ag
nº 1419422/MG, 6ª Turma, Relatora Ministra Assussete Magalhães, DJe 03/06/2013; AgRg no
AREsp nº 324.476/SE, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 28/06/2013).
Segundo a inicial, a autora nasceu e foi criada em área rural, na propriedade que pertencia ao
seu pai, no Sítio Tanquinho, localizado na Zona Rural de Macatuba-SP, onde exerceu a função
de “lavradora”, no cultivo de cana-de-açúcar, arroz, feijão, mandioca, em regime de economia
familiar, desde os 9 anos de idade, junto dos pais e irmãos, permanecendo mesmo após se
casar, ocasião em que o esposo também passou a trabalhar na mesma propriedade da família da
esposa. O marido da Autora possuía um pequeno trator que era utilizado para arar a terra do sítio
em que viviam e, eventualmente, a de algum vizinho, que depois lhe ajudava na safra das
plantações cultivadas no Sítio Tanquinho, num sistema de troca de favores. Almejando se
aposentar mais cedo, passou a efetuar recolhimentos de forma facultativa, com a permissão do
artigo 25, parágrafo 1º da Lei 8.212/1991, ocasião em que, procurou o INSS para tal finalidade e
lhe foi informado que precisaria cadastrar uma atividade de profissional autônomo, diferente da de
trabalhador rural, tendo sido conferido a este, a atividade de “motorista/tratorista autônomo”;
porém, nunca deixou o campo e jamais transformou a atividade que lhe foi atribuída, como fonte
de renda autônoma.
Para comprovar o labor rural em regime de economia familiar noperíodo compreendido entre
07/07/1962 até a 02/04/1998, a autora apresentou os seguintes documentos: a) Matrícula do Sítio
Tanquinho, onde a Autora declarou a profissão de “lavradora”, b) Comprovante de recolhimento
de INCRA referentes aos anos de 1988/1996, onde se verifica que a profissão declarada do
esposo, nos INCRA'sde 1992/1996 é trabalhador rural e com a informação de que nunca houve
trabalhadores assalariados;c) Notas Fiscais de entrada, referentes à venda de produtos agrícolas,
confeccionadas em 1993, 1995 e 1997 1997 (ID 73539694 - Pág. 102 , ID 73539694 - Pág.
32/46);d) Notas Fiscais de compra de insumos agrícolas, confeccionadas em 1994/1996; e)
Comprovante de cadastro de trabalhador/contribuinte individual da Autora, referente ao NIT
114.369.193- 33, onde a Autora declarou a atividade de segurada especial; e) declaração do
Sindicato Rural..
A declaração de sindicato rural não pode ser considerada início de prova material, uma vez que
não foi homologada pelo Instituto. Ela equivale a declaração particular subscrita por terceiro,
colhida sem o crivo do contraditório e, portanto, não se enquadra no conceito de prova material
(ID 73539694 - Pág. 4).-.
Por sua vez, a qualificação da autora na Certidão do Livro 3-O de Transcrições das Transmissões
(termo n. 15.122), expedida pelo Serviço de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de
Pederneiras-SP, não pode se estender após o seu casamento em 26/10/63, já que na certidão de
casamento ela está qualificada como “do lar” e seu marido como “motorista” . Por outro lado, as
demais provas acostadas aos autos (documentos fiscais), apenas identificam o marido da autora.
Dúvidas não subsistem sobre a possibilidade de extensão da qualificação de lavrador de um
cônjuge ao outro constante de documento apresentado, para fins de comprovação da atividade
campesina, que indique, por exemplo, o marido como trabalhador rural (STJ, 3ª Seção, EREsp
1171565, relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05.03.2015), especialmente quando houver
documentos em seu nome que atestem sua condição de rurícola, o que só é possívelquando se
tratar de hipótese de agricultura de subsistência em que o labor é exercido em regime de
economia familiar.
Todavia, o seu marido era trabalhador urbano, pois qualificado como motorista (Certidão de
casamento 26/10/1963 onde ele está qualificado como motorista e ela do lar -ID 73539694 - Pág.
143), além de aposentar-se por tempo de contribuição na condição de industriário, de modo que a
jurisprudência nãoautoriza a extensão da prova em nome do marido nestas situações.
Ainda que se reconheça que a função de tratorista agrícola é essencialmente de natureza rural,
porque lida com a terra, o plantio, a colheita, de sorte que o trator deve ser considerado
instrumento de trabalho de qualidade rural, diverso do motorista, que labora no transporte em
função tipicamente urbana, fato é que, em 1998, o marido da autora se aposentou por tempo de
contribuição na condição de industriário, conforme INFBEN juntado aos autos com DIB em
21/10/98 e cujo valor, em 2009, era R$ 758,67 (ID 73539694 - Pág. 64) superior ao salário
mínimo da época que era R$ 465,00.
No caso concreto, embora a autora tenha demonstrado a existência de imóvel rural em seu nome,
isto não é suficiente para demonstrar o alegado trabalho nas lides campesinas em regime de
economia familiar, que pressupõe uma forma rudimentar de trabalho rural em que os membros da
família realizam trabalho indispensável à própria subsistência e mútua colaboração.
Insta dizer que a simples existência de imóvel rural em nome da autora, por si só, não a equipara
a trabalhadora rural, principalmente em regime de economia familiar, devendo demonstrar o
efetivo exercício do seu trabalho na referida propriedade por um período mínimo, contínuo e
duradouro, o que não restou demonstrado.
Não comprovado o labor rural em regime de economia familiar, correta a cessação do benefício.
Por fim, o benefício foi concedido administrativamente após a avaliação do preenchimento dos
requisitos legais para sua concessão, cessando após a constatação de irregularidades na sua
concessão..
Assim, os valores pagos a esse título foram recebidos de boa-fé pela autora, não se restando
configurada, in casu, qualquer tipo de fraude.
Nesse passo observo que, em observância ao princípio da irrepetibilidade dos alimentos, da boa-
fé da autora e da natureza alimentar do benefício previdenciário, não há que se falar em
devolução dos valores pagos indevidamente.
Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. ERRO DA
ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES.
IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme a jurisprudência do STJ, é incabível a devolução de valores
percebidos por pensionista de boa-fé por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou
erro da Administração. 2. É descabido ao caso dos autos o entendimento fixado no Recurso
Especial 1.401.560/MT, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, pois não se discute na espécie a
restituição de valores recebidos em virtude de antecipação de tutela posteriormente revogada. 3.
Recurso Especial não provido." (REsp 1553521/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
SEGUNDA TURMA, julgado em 03/11/2015, DJe 02/02/2016)
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. ADICIONAL DE
INATIVIDADE. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. DEVOLUÇÃO
DOS VALORES PAGOS. IMPOSSIBILIDADE. VERBA ALIMENTAR. 1. É assente o entendimento
desta Corte de Justiça de que, em razão do principio da irrepetibilidade dos alimentos e,
sobretudo da boa-fé do beneficiário, não estão os benefícios de natureza alimentar, mormente o
adicional de inatividade, sujeitos a devolução, quando legitimamente recebidos, em razão de
decisão judicial. 2. Agravo regimental improvido. (STJ, 6ª Turma, Processo: AGRESP
200602028600, DJE 08.03.2010)
Portanto, é incabível a devolução de valores percebidos pelo beneficiário de boa-fé por força de
interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração, não se aplicando ao caso
dos autos o entendimento fixado no Recurso Especial 1.401.560/MT, julgado sob o rito do art.
543-C do CPC, pois não se discute na espécie a restituição de valores recebidos em virtude de
antecipação de tutela posteriormente revogada.
Ante o exposto, nego provimento a ambos os recursos.
É COMO VOTO.
/gabiv/soliveir.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO: APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. BENEFÍCIO CONCEDIDO
ADMINISTRATIVAMENTE. POSTERIOR CESSAÇÃO. REQUISITOS NÃO SATISFEITOS.
DEVOLUÇÃO DE VALORES PAGOS. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER
ALIMENTAR
1. Para comprovar o labor rural em regime de economia familiar noperíodo compreendido entre
07/07/1962 até a 02/04/1998, a autora apresentou os seguintes documentos: a) Matrícula do Sítio
Tanquinho, onde a Autora declarou a profissão de “lavradora”, b) Comprovante de recolhimento
de INCRA referentes aos anos de 1988/1996, onde se verifica que a profissão declarada do
esposo, nos INCRA'sde 1992/1996 é trabalhador rural e com a informação de que nunca houve
trabalhadores assalariados;c) Notas Fiscais de entrada, referentes à venda de produtos agrícolas,
confeccionadas em 1993, 1995 e 1997 1997 (ID 73539694 - Pág. 102 , ID 73539694 - Pág.
32/46);d) Notas Fiscais de compra de insumos agrícolas, confeccionadas em 1994/1996; e)
Comprovante de cadastro de trabalhador/contribuinte individual da Autora, referente ao NIT
114.369.193- 33, onde a Autora declarou a atividade de segurada especial; e) declaração do
Sindicato Rural..
2. A declaração de sindicato rural não pode ser considerada início de prova material, uma vez que
não foi homologada pelo Instituto. Ela equivale a declaração particular subscrita por terceiro,
colhida sem o crivo do contraditório e, portanto, não se enquadra no conceito de prova material
(ID 73539694 - Pág. 4).-.
3. Por sua vez, a qualificação da autora na Certidão do Livro 3-O de Transcrições das
Transmissões (termo n. 15.122), expedida pelo Serviço de Registro de Imóveis e Anexos da
Comarca de Pederneiras-SP, não pode se estender após o seu casamento em 26/10/63, já que
na certidão de casamento ela está qualificada como “do lar” e seu marido como “motorista” . Por
outro lado, as demais provas acostadas aos autos (documentos fiscais), apenas identificam o
marido da autora.
4. Dúvidas não subsistem sobre a possibilidade de extensão da qualificação de lavrador de um
cônjuge ao outro constante de documento apresentado, para fins de comprovação da atividade
campesina, que indique, por exemplo, o marido como trabalhador rural (STJ, 3ª Seção, EREsp
1171565, relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05.03.2015), especialmente quando houver
documentos em seu nome que atestem sua condição de rurícola, o que só é possívelquando se
tratar de hipótese de agricultura de subsistência em que o labor é exercido em regime de
economia familiar.
5. Todavia, o seu marido era trabalhador urbano, pois qualificado como motorista (Certidão de
casamento 26/10/1963 onde ele está qualificado como motorista e ela do lar -ID 73539694 - Pág.
143), além de aposentar-se por tempo de contribuição na condição de industriário, de modo que a
jurisprudência nãoautoriza a extensão da prova em nome do marido nestas situações.
6. Ainda que se reconheça que a função de tratorista agrícola é essencialmente de natureza rural,
porque lida com a terra, o plantio, a colheita, de sorte que o trator deve ser considerado
instrumento de trabalho de qualidade rural, diverso do motorista, que labora no transporte em
função tipicamente urbana, fato é que, em 1998, o marido da autora se aposentou por tempo de
contribuição na condição de industriário, conforme INFBEN juntado aos autos com DIB em
21/10/98 e cujo valor, em 2009, era R$ 758,67 (ID 73539694 - Pág. 64) superior ao salário
mínimo da época que era R$ 465,00.
7. No caso concreto, embora a autora tenha demonstrado a existência de imóvel rural em seu
nome, isto não é suficiente para demonstrar o alegado trabalho nas lides campesinas em regime
de economia familiar, que pressupõe uma forma rudimentar de trabalho rural em que os membros
da família realizam trabalho indispensável à própria subsistência e mútua colaboração.
8. Insta dizer que a simples existência de imóvel rural em nome da autora, por si só, não a
equipara a trabalhadora rural, principalmente em regime de economia familiar, devendo
demonstrar o efetivo exercício do seu trabalho na referida propriedade por um período mínimo,
contínuo e duradouro, o que não restou demonstrado.
9. Não comprovado o labor rural em regime de economia familiar, correta a cessação do
benefício.
10. O benefício foi concedido administrativamente após a avaliação do preenchimento dos
requisitos legais para sua concessão.
11. Os valores pagos a esse título foram recebidos de boa-fé pela autora, não se restando
configurada, in casu, qualquer tipo de fraude.
12. Conforme jurisprudência, é incabível a devolução de valores percebidos pelo beneficiário de
boa-fé por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração.
13. Não se aplica ao caso dos autos o entendimento fixado no Recurso Especial 1.401.560/MT,
julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, pois não se discute na espécie a restituição de valores
recebidos em virtude de antecipação de tutela posteriormente revogada.
14. Recursos desprovidos.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por
unanimidade, negar provimento a ambos os recursos, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
