
| D.E. Publicado em 14/06/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, revogar a justiça gratuita e condenar a autora como litigante de má-fé, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0030688-42.2013.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Cuida-se de apelação interposta em face da r. sentença que julgou procedente o pedido de concessão o benefício de aposentadoria por idade rural à parte autora, desde a citação, antecipados os efeitos da tutela.
Em suas razões, o INSS requer a reforma do julgado para que seja negado o pedido, porque não comprovado o trabalho como segurado especial, em regime de economia familiar. Impugna termo inicial e consectários.
Contrarrazões apresentadas.
Subiram os autos a esta egrégia Corte, tendo sido distribuídos a este relator.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço do recurso porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
Passo à análise do mérito.
A aposentadoria por idade, rural e urbana, é garantida pela Constituição Federal em seu artigo 201, §7º, inciso II, para os segurados do regime geral de previdência social (RGPS), nos termos da lei e desde que obedecidas as seguintes condições:
"II - sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, reduzido em cinco anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal; " |
Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, a saber: a comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento, consoante o disposto na Lei n. 8.213/91.
A questão relativa à comprovação de atividade rural se encontra pacificada no Superior Tribunal de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente testemunhal (Súmula 149 do STJ).
Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei 8.213/91, não significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por meio de documentos, o exercício de atividade na condição de rurícola, pois isto importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade a prova testemunhal para demonstração do labor rural.
Contudo, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar, na forma da súmula nº 34 da TNU.
Admite-se, ainda, a extensão da qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro. Para além, segundo a súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
"Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de trabalho rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental". |
De acordo com o que restou definido quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), aplica-se a súmula acima aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material, corroborada com provas testemunhal, para comprovação de tempo de serviço.
No mais, segundo o RESP 1.354.908, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), necessária a comprovação do tempo de atividade rural no período imediatamente anterior à aquisição da idade:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil (RECURSO ESPECIAL Nº 1.354.908 - SP (2012/0247219-3), RELATOR: MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, DJ 09/09/2015)." |
Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de ativ idade no meio rural (STJ, REsp 207.425, 5ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei 8.213/91, a regra transitória assegurou aos rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei, nos seguintes termos:
"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do artigo 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de 1 (um) salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idênticos à carência do referido benefício (Redação determinada pela Lei 9.063/1995)." |
Assim, o prazo de 15 (quinze) anos do artigo 143 da Lei 8.213/91 expiraria em 25/07/2006.
Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 02 (dois) anos, estendendo-se até 25/07/2008, em face do disposto na MP 312/06, convertida na Lei 11.368/06.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 410/07, convertida na Lei 11.718/08, estabeleceu nova prorrogação para o prazo previsto no artigo 143 da Lei 8.213/91, nos seguintes termos:
"Art. 2º Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 143 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010. |
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo ao trabalhador rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação de emprego. |
Art. 3o Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural, em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil. |
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo e respectivo inciso I ao trabalhador rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que comprovar a prestação de serviço de natureza rural, em caráter eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação de emprego." |
Observe-se que o prazo estabelecido no referido artigo 143 passou a vigorar até 31/12/2010, mas não contemplou o trabalhador rural que se enquadra na categoria de segurado especial (caso dos autos).
De outra parte, para o segurado especial definido no artigo 11, inciso VII, da Lei 8.213/91, remanesce o disposto no artigo 39 da referida lei. Diferentemente dos demais trabalhadores rurais, trata-se de segurado que mantém vínculo com a previdência social mediante contribuição descontada em percentual incidente sobre a receita oriunda da venda de seus produtos, na forma do artigo 25, caput e incisos, da Lei nº 8.212/91.
Vale dizer: após 25/07/2006, a pretensão do segurado especial ao recebimento de aposentadoria por idade deverá ser analisada conforme o disposto no artigo 39, inciso I, da Lei 8.213/91.
Ademais, não obstante o exaurimento da regra transitória insculpida no artigo 143 da Lei n. 8.213/91, fato é que a regra permanente do artigo 48 dessa norma continua a exigir para concessão de aposentadoria por idade dos segurados rurícolas, inclusive empregados, a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante §1º e § 2º do referido dispositivo. Trata-se, a bem da verdade, de norma que parece confrontar com o caráter contributivo da previdência social, mas que não incide ao presente feito.
No caso em discussão, o requisito etário restou preenchido em 15/9/2009.
Ademais, há início de prova material presentes na pletora de documentos acostados com a petição inicial:
- certidão de casamento de 1974 com profissão de lavrador do marido Jaime da Silveira Barbosa (f. 6);
- certidões de nascimento de filhos, de 1977 e 1982, com anotação das profissões de pecuarista e agropecuarista do marido (f. 8/9);
- escritura de divisão amigável de imóvel rural, de 1984, onde consta a transmissão de imóvel rural à autora e ao marido no tamanho de 53.24,00 ha ou 22 alqueires, denominado Sítio São José (f. 20 e 91);
Posteriormente, foram juntados aos autos outros documentos importantes, a saber:
- certidão e registro de outro imóvel pertencente à autora e marido, com tamanho de 31,4 há ou 13 alqueires, denominado Sítio Santa Luzia (f. 93);
- declaração de cadastro de imóvel rural (f. 96 e seguintes), relativa ao sítio São José;
- notas fiscais de venda de produtor rural (f. 122 e seguintes);
- declarações de ITR (f. 102 e seguintes).
Já, a prova testemunha formada por dois depoimentos atesta que a autora sempre viveu em propriedade rural, juntamente com o marido, tendo trabalhado na propriedade, demonstrando oblívio em relação a circunstâncias mínimas do empreendimento da autora.
Ocorre que as circunstâncias do caso tornam totalmente incompatíveis a condição de regime de economia familiar, porque a parte autora possuía plena capacidade contributiva de recolher contribuições à previdência social como produtor rural.
Ora, a autora possui 2 (dois) imóveis rurais, com área total de 84,6 há (f. 102 e 113), com valor declarado, em 2009, de R$ 385.000,00 (f. 119).
Logo, a autora faltou com a verdade, em seu depoimento pessoal, ao dizer que seu sítio possui apenas seis alqueires, devendo incorrer em litigância de má-fé.
A lei não permite o reconhecimento de segurado especial quando proprietário de imóvel superior a 4 (quatro) módulos fiscais da região, nos termos do artigo 11, VII, "a", item 1, da Lei nº 8.213/91.
Enfim, a soma das circunstâncias indica que não se trata de economia de subsistência, afigurando-se absurda a concessão do benefício não contributivo neste caso.
Posto isto, a atividade da família da parte autora afasta-se da enquadrada no art. 12, VII, da Lei nº 8.212/91, mais se aproximando da prevista no art. 12, V, "a", da mesma lei.
Trata-se produtora rural contribuinte individual, que não recolheu as contribuições previdenciárias devidas para a manutenção de sua qualidade de segurado.
E não se aplicam as regras do art. 39 da Lei nº 8.213/81.
Em decorrência, concluo pelo não preenchimento dos requisitos exigidos à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
No sentido de que a propriedade rural não pequena descaracteriza o regime de economia familiar:
PREVIDENCIÁRIO - APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO - RECONHECIMENTO DE TEMPO DE ATIVIDADE RURAL -INÍCIO DE PROVA MATERIAL - PRODUTOR RURAL - INAPLICABILIDADE DO ART. 55, § 2O, DA LEI 8.213/91 - APELAÇÃO DO AUTOR IMPROVIDA. 1. A regra do art. 55, § 3o, da Lei n° 8.213/91 e a súmula nº 149 do e. STJ não configuram obstáculos reconhecimento à atividade rural. 2. Mas, uma vez configurada a qualidade de produtor rural, já inscrito como autônomo perante o INSS, a regra do art. 55, § 2o, da Lei nº 8.213/91 não aproveita ao autor. 3. Necessidade de pagamento das contribuições para se reconhecer a contingência. 4. Ausência do cumprimento da carência. 5. Apelação do autor improvida. (TRF 3ª Região, 7ª Turma, proc. 97.03.038175-8, AC 376926, rel. juiz convocado Rodrigo Zacharias, DJ 05.6.2006). |
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, que arbitro em 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85, § 4º, III, do Novo CPC.
Revogo a justiça gratuita, absolutamente incompatível com a condição econômica da parte autora.
Condeno a parte autora em litigância de má-fé, na forma do artigo 17, II, do CPC/1973, então vigente, devendo pagar multa de 1% (um por cento) sobre o valor atribuído à causa corrigido, além de multa de 20% (vinte por cento) sobre a mesma base de cálculo.
Ademais, considerando que a apelação foi interposta antes da vigência do Novo CPC, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, §§ 1º a 11º, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal.
Diante do exposto, dou provimento à apelação, para julgar improcedente o pedido, nos termos da fundamentação desta decisão. De ofício revogo a justiça gratuita e condeno a parte autora em litigância de má-fé.
Comunique-se, via e-mail, para fins de revogação da tutela antecipatória de urgência concedida.
É voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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