Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5004004-53.2017.4.03.9999
Relator(a)
Juiz Federal Convocado RODRIGO ZACHARIAS
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
08/04/2018
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 12/04/2018
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. BENEFÍCIO NÃO
CONTRIBUTIVO. ARTIGO 143 DA LEI 8.213/91. NORMA TRANSITÓRIA. ARTIGO 39 DA
REFERIDA LEI. MARIDO PRODUTOR RURAL. VÁRIAS PROPRIEDADES. REGIME DE
ECONOMIA FAMILIAR AFASTADO. PRODUTORA RURAL CONTRIBUINTE INDIVIDUAL.
AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. REQUISITOS
NÃO PREENCHIDOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO PROVIDA. PEDIDO
JULGADO IMPROCEDENTE. TUTELA DE URGÊNCIA REVOGADA.
- Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, a
saber: a comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período
imediatamente anterior ao requerimento, consoante o disposto na Lei n. 8.213/91.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural se encontra pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula 149 do STJ).
- De acordo com o que restou definido quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado
segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), aplica-se a
súmula acima aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a
apresentação de início de prova material, corroborada com provas testemunhal, para
comprovação de tempo de serviço.
- Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei 8.213/91, não
significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por meio de documentos, o
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
exercício de atividade na condição de rurícola, pois isto importaria em se exigir que todo o
período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade a prova
testemunhal para demonstração do labor rural.
- Admite-se, contudo, a extensão da qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro e, ainda,
que os documentos não se refiram precisamente ao período a ser comprovado. Nesse sentido, o
REsp n. 501.281, 5ª Turma, j. em 28/10/2003, v.u., DJ de 24/11/2003, p. 354, Rel. Ministra Laurita
Vaz.
- No mais, segundo o RESP 1.354.908, realizado segundo a sistemática de recurso
representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), necessária a comprovação do tempo de
atividade rural no período imediatamente anterior à aquisição da idade:
- Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem
desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de ativ idade no meio rural
(STJ, REsp 207.425, 5ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro
Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003,
p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
- O art. 143 da Lei 8.213/91 constitui regra transitória assegurou aos rurícolas o direito de
requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados da vigência da referida Lei, independentemente do pagamento de contribuições
previdenciárias. Assim, o prazo de 15 (quinze) anos do artigo 143 da Lei 8.213/91 expiraria em
25/07/2006.
- Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como
segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a
uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 02
(dois) anos, estendendo-se até 25/07/2008, em face do disposto na MP 312/06, convertida na Lei
11.368/06.
- Finalmente, a Medida Provisória nº 410/07, convertida na Lei 11.718/08, estabeleceu nova
prorrogação para o prazo previsto no artigo 143 da Lei 8.213/91, até 31/12/2010, para o
trabalhador rural empregado e o enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que
presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação
de emprego.
- Observe-se que o prazo estabelecido no referido artigo 143 passou a vigorar até 31/12/2010,
mas não contemplou o trabalhador rural que se enquadra na categoria de segurado especial
(caso dos autos). De outra parte, para o segurado especial definido no artigo 11, inciso VII, da Lei
8.213/91, remanesce o disposto no artigo 39 da referida lei. Diferentemente dos demais
trabalhadores rurais, trata-se de segurado que mantém vínculo com a previdência social mediante
contribuição descontada em percentual incidente sobre a receita oriunda da venda de seus
produtos, na forma do artigo 25, caput e incisos, da Lei nº 8.212/91. Vale dizer: após 25/07/2006,
a pretensão do segurado especial ao recebimento de aposentadoria por idade deverá ser
analisada conforme o disposto no artigo 39, inciso I, da Lei 8.213/91.
- Ademais, não obstante o exaurimento da regra transitória insculpida no artigo 143 da Lei n.
8.213/91, fato é que a regra permanente do artigo 48 dessa norma continua a exigir para
concessão de aposentadoria por idade dos segurados rurícolas, inclusive empregados, a
comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período
imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de
contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante §1º e § 2º do referido
dispositivo. Trata-se, a bem da verdade, de norma que parece confrontar com o caráter
contributivo da previdência social, mas que não incide ao presente feito.
- No caso em discussão, o requisito etário restou preenchido em 4/8/2006. A autora alega que
trabalhou a vida toda na lavoura, em regime de economia familiar, tendo cumprido a carência
exigida na Lei nº 8.213/91.
- Nos autos, há pletora de documentos que configuram início de prova material, tais como: (i)
certidão de casamento – celebrado em 1971 –, onde consta a profissão de lavrador do cônjuge
da autora Wilson Boni; (ii) matrícula de imóveis rurais; (iii) notas fiscais de produtor; (iv)
declaração anual do Produtor Rural – DAP, em nome do cônjuge, demonstrando grandes
movimentações empresariais rurais, em especial negociações de compra e venda de gado; (v)
declarações de ITR da "São Judas Tadeu" e da "Fazenda Santa Rita”; (vi) comprovante de
aquisição contra febre aftosa; (vii) certificado de cadastro de imóvel rural – CCIR etc.
- A prova testemunha formada por três depoimentos atesta que a autora sempre viveu em sua
propriedade rural, desempenhando atividades para a subsistência.
- Ocorre que as circunstâncias do caso tornam totalmente incompatíveis a condição de regime de
economia familiar, porque a parte autora possuía plena capacidade contributiva de recolher
contribuições à previdência social como produtora rural, mas jamais contribuiu para a previdência
social, para a manutenção de sua qualidade de segurada (CNIS).
- Outrossim, o cônjuge da parte autora é proprietários de dois imóveis rurais, a saber: Fazenda
São Judas Tadeu (1.070,2 ha), no município de Corguinho/MS, e Fazenda Santa Rita (259,0 ha),
na cidade de Jaraguari/MS. As propriedades exploradas pela autora, em condomínio, são bem
superiores a 4 (quatro) módulos fiscais da região, nos termos do artigo 11, VII, “a”, item 1, da Lei
nº 8.213/91. Só a primeira possui 30,5700 módulos fiscais, enquanto a segunda, 7,4000 módulos
fiscais.
- Diante do montante da produção agrícola (vide notas fiscais de produtor rural), a toda evidência,
as propriedades rurais tocadas pelos familiares da autora eram voltadas a fins comerciais,
exclusivamente, de modo que não se amolda à situação exigida pelo artigo 11, § 1º, da LBPS.
- Enfim, a soma das circunstâncias indica que não se trata de economia de subsistência,
afigurando-se absurda a concessão do benefício não contributivo neste caso. Posto isto, a
atividade da família da parte autora afasta-se da enquadrada no art. 12, VII, da Lei nº 8.212/91,
mais se aproximando da prevista no art. 12, V, “a”, da mesma lei. Trata-se de produtora rural
contribuinte individual.
- Assim, indevido o benefício.
- Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados
em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Novo CPC.
Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser
beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação provida.
- Revogação da tutela antecipatória de urgência concedida.
Acórdao
APELAÇÃO (198) Nº 5004004-53.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELZA MARIA VOLPATO BONI
Advogados do(a) APELADO: ARTHUR ANDRADE FRANCISCO - MS16303, RAFAEL
COLDIBELLI FRANCISCO FILHO - MS1587800A
APELAÇÃO (198) Nº 5004004-53.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELZA MARIA VOLPATO BONI
Advogados do(a) APELADO: ARTHUR ANDRADE FRANCISCO - MS16303, RAFAEL
COLDIBELLI FRANCISCO FILHO - MS1587800A
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Cuida-se de apelação interposta em
face da r. sentença que julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade
rural à parte autora, a contar da data do requerimento feito em 16/2/2009, acrescido dos
consectários legais, dispensado o reexame necessário, antecipando os efeitos da tutela.
Em suas razões, o INSS requer a suspensão dos efeitos da tutela, além da reforma do julgado
para que seja negado o pedido, porque não comprovado os requisitos necessários para
concessão do benefício. Prequestiona a matéria.
Contrarrazões apresentadas.
Subiram os autos a esta egrégia Corte, tendo sido distribuídos a este relator.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5004004-53.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELZA MARIA VOLPATO BONI
Advogados do(a) APELADO: ARTHUR ANDRADE FRANCISCO - MS16303, RAFAEL
COLDIBELLI FRANCISCO FILHO - MS1587800A
V O T O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: O recurso preenche os pressupostos de
admissibilidade e merece ser conhecido.
A aposentadoria por idade, rural e urbana, é garantida pela Constituição Federal em seu artigo
201, §7º, inciso II, para os segurados do regime geral de previdência social (RGPS), nos termos
da lei e desde que obedecidas as seguintes condições:
"II - sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, reduzido
em cinco anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam
suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e
o pescador artesanal;"
Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, a
saber: a comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período
imediatamente anterior ao requerimento, consoante o disposto na Lei n. 8.213/91.
A questão relativa à comprovação de atividade rural se encontra pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula 149 do STJ).
De acordo com o que restou definido quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado
segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), aplica-se a
súmula acima aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a
apresentação de início de prova material, corroborada com provas testemunhal, para
comprovação de tempo de serviço.
Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei 8.213/91, não
significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por meio de documentos, o
exercício de atividade na condição de rurícola, pois isto importaria em se exigir que todo o
período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade a prova
testemunhal para demonstração do labor rural.
Contudo, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar, na forma
da súmula nº 34 da TNU.
Admite-se, ainda, a extensão da qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro. Para além,
segundo a súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "Admite-se como início de
prova material do efetivo exercício de trabalho rural, em regime de economia familiar, documentos
de terceiros, membros do grupo parental".
No mais, segundo o RESP 1.354.908, realizado segundo a sistemática de recurso representativo
da controvérsia (CPC, art. 543-C), necessária a comprovação do tempo de atividade rural no
período imediatamente anterior à aquisição da idade:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE
RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE
TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER
PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Tese
delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º
combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que
estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural,
momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo
48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter
atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo
descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito.
Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os
requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS
conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código
de Processo Civil (RECURSO ESPECIAL Nº 1.354.908 - SP (2012/0247219-3), RELATOR:
MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, DJ 09/09/2015)."
Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem desnecessárias,
sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de ativ idade no meio rural (STJ, REsp
207.425, 5ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge
Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361,
Rel. Ministra Laurita Vaz).
Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei 8.213/91, a regra transitória assegurou aos rurícolas
o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze)
anos, contados da vigência da referida Lei, nos seguintes termos:
"Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do artigo 11 desta
Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de 1 (um) salário mínimo, durante 15
(quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício
de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do
benefício, em número de meses idênticos à carência do referido benefício (Redação determinada
pela Lei 9.063/1995)."
Assim, o prazo de 15 (quinze) anos do artigo 143 da Lei 8.213/91 expiraria em 25/07/2006.
Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como
segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a
uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 02
(dois) anos, estendendo-se até 25/07/2008, em face do disposto na MP 312/06, convertida na Lei
11.368/06.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 410/07, convertida na Lei 11.718/08, estabeleceu nova
prorrogação para o prazo previsto no artigo 143 da Lei 8.213/91, nos seguintes termos:
"Art. 2º Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 143 da Lei nº 8.213, de 24 de
julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo ao trabalhador rural enquadrado na
categoria de segurado contribuinte individual que presta serviços de natureza rural, em caráter
eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação de emprego.
Art. 3o Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural, em valor equivalente ao
salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a
atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro
de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três),
limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro
de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze)
meses dentro do respectivo ano civil.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo e respectivo inciso I ao trabalhador
rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que comprovar a prestação de
serviço de natureza rural, em caráter eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação de
emprego."
Observe-se que, nos termos do artigo 2º da Lei nº 11.718/08, o prazo estabelecido no referido
artigo 143 da LBPS passou a vigorar até 31/12/2010. Bizarramente, com flagrante antinomia com
o artigo 2º, o artigo 3º da Lei nº 11.718/08 acaba por indiretamente estender o prazo até
31/12/2020, além de criar tempo de serviço ficto.
Abstração feita da hipotética ofensa à Constituição Federal, por falta de relevância e urgência da
medida provisória, e por possível ofensa ao princípio hospedado no artigo 194, § único, II, do
Texto Magno, o fato é que a Lei nº 11.718/08 não contemplou o trabalhador rural que se
enquadra na categoria de segurado especial.
No caso do segurado especial, definido no artigo 11, inciso VII, da Lei 8.213/91, remanesce o
disposto no artigo 39 desta última lei. Diferentemente dos demais trabalhadores rurais, trata-se de
segurado que mantém vínculo com a previdência social mediante contribuição descontada em
percentual incidente sobre a receita oriunda da venda de seus produtos, na forma do artigo 25,
caput e incisos, da Lei nº 8.212/91. Vale dizer: após 25/07/2006, a pretensão do segurado
especial ao recebimento de aposentadoria por idade deverá ser analisada conforme o disposto no
artigo 39, inciso I, da Lei 8.213/91.
Ademais, não obstante o "pseudo-exaurimento" da regra transitória insculpida no artigo 143 da
Lei n. 8.213/91, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, fato é que a
regra permanente do artigo 48 dessa norma continua a exigir, para concessão de aposentadoria
por idade a rurícolas, a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma
descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao
número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante
§ 1º e § 2º do referido dispositivo.
A questão já foi apreciada, por ora sem muita profundidade, por nossos tribunais, conforme se
infere dos seguintes julgados:
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR
RURAL. PRAZO PREVISTO NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/91. PRORROGAÇÃO. EXTINÇÃO
DO PROCESSO ANTES DA PRODUÇÃO DA PROVA TESTEMUNHAL. CERCEAMENTO DO
DIREITO DE DEFESA. 1. O prazo de 15 anos previsto no artigo 143 da Lei 8.213/91 para o
requerimento de aposentadoria rural por idade de trabalhador rural, que venceria a 24 de julho de
2006, foi prorrogado pela Lei 11.368 de 09 de novembro de 2006, por mais 2 anos e,
posteriormente, ganhou nova prorrogação pela Medida Provisória 410 de 28 de dezembro de
2007, convertida na Lei nº 11.718, de 20 de junho de 2008, que estabeleceu que o referido prazo
deve extinguir-se a 31 de dezembro de 2010. 2. "As alterações na Lei Previdenciária não podem
retroagir para alcançar fatos anteriores a ela, em face do princípio do tempus regit actum". (STJ -
AgRg no AgRg no REsp 543261/SP, Sexta Turma, DJ de 13.06.2005). 3. A sentença que
extingue o processo ajuizado a 19.09.2007, por segurada nascida a 13.12.1929, pretextando a
extinção do prazo de 15 anos previsto no artigo 143 para requerimento do benefício, antes da
produção de prova testemunhal necessária à apreciação final do pedido, incorre em cerceamento
do direito de defesa da pretensão deduzida, pois que a autora fica impedida de cumprir com a
exigência do artigo 55, § 3º, da Lei 8.213/91 (Precedentes. TRF-1 - Segunda Turma - AC
2007.01.99.015403-8/MG, DJ de 24.11.2008). 4. Sentença anulada, determinando-se o retorno
dos autos à origem para o seu normal prosseguimento. 5. Recurso de apelação provido." (TRF -
1ª Região, AC 200801990042175, 2ª Turma, j. em 10/12/2008, v.u., DJ de 19/02/2009, página 76,
Rel. Juiz Fed. Conv. Iran Velasco Nascimento).
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL. INDEFERIMENTO DA INICIAL. PRAZO PARA
REQUERIMENTO. ART. 143 DA LEI Nº 8.213/91. MP 312/06, CONVERTIDA NA LEI Nº
11.368/06 E MP 410/2007. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL
DEVE SER VIABILIZADA. SENTENÇA ANULADA. 1. Tratando-se de segurado especial
enquadrado no art. 11, VII, da Lei 8.213/91, após o decurso do prazo fixado pelo regramento
afeto à matéria, a pretensão deve ser analisada à luz do art. 39, I, do citado diploma legal, para
fins de aposentadoria rural por idade. 2. O prazo consignado no art. 143 da lei previdenciária foi
estendido até 26 de julho de 2008, em face da edição da MP nº. 312/06, convertida na Lei nº.
11.368/06. E, em face da MP nº 410/2007, esse prazo foi prorrogado até 31 de dezembro de
2010. 3. A certidão de casamento presente nos autos evidencia a condição de trabalhador rural e
constitui início razoável de prova material da atividade rurícola da parte autora, podendo,
inclusive, ser estendida ao cônjuge. 4. A prova testemunhal é indispensável nos casos de
aposentadoria rural por idade com início de prova material, e deve ser viabilizada pelo Juízo "a
quo". 5. Impossibilidade da análise do mérito, nos termos do § 3º do art. 515 do Código de
Processo Civil, ante a ausência de prova testemunhal. 6. Apelação provida. Sentença anulada,
para determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem com regular processamento e julgamento
do feito." (TRF - 1ª Região, AC 200801990185280, 2ª Turma, j. em 02/07/2008, v.u., DJ de
28/08/2008, Rel. Juiz Fed. Conv. André Prado de Vasconcelos).
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. PRAZO PARA REQUERIMENTO.
1. O artigo 143 da Lei 8.213/91, tratando genericamente do trabalhador rural, que passou a ser
enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social ( na forma da
alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do Art. 11), assegurou-lhe o direito de requerer
aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir
da data de sua vigência, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que
descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de
meses idêntico à carência exigida. 2. Tratando-se de segurado especial enquadrado no artigo 11,
VII, da Lei n°. 8.213/91, após aquele ínterim, a pretensão deve ser analisada à luz do artigo 39, I,
para fins de aposentadoria rural por idade. 3. Conforme MP n° 312/06, convertida na Lei n°
11.368/06, o prazo referido no artigo 143 da Lei n° 8.213/91 foi prorrogado até 2008. 4. Sentença
reformada." (TRF - 4ª Região, AC 200770990037250, Turma Suplementar, j. em 25/04/2007, v.u.,
DE de 11/05/2007, Rel. Des. Fed. Ricardo Teixeira do Valle Pereira).
No caso em discussão, o requisito etário restou preenchido em 4/8/2006.
A autora alega que trabalhou a vida toda na lavoura, em regime de economia familiar, tendo
cumprido a carência exigida na Lei nº 8.213/91.
Nos autos, há pletora de documentos que configuram início de prova material, tais como: (i)
certidão de casamento – celebrado em 1971 –, onde consta a profissão de lavrador do cônjuge
da autora Wilson Boni; (ii) matrícula de imóveis rurais; (iii) notas fiscais de produtor; (iv)
declaração anual do Produtor Rural – DAP, em nome do cônjuge, demonstrando grandes
movimentações empresariais rurais, em especial negociações de compra e venda de gado; (v)
declarações de ITR da "São Judas Tadeu" e da "Fazenda Santa Rita”; (vi) comprovante de
aquisição contra febre aftosa; (vii) certificado de cadastro de imóvel rural – CCIR etc.
A prova testemunha formada por três depoimentos atesta que a autora sempre viveu em sua
propriedade rural, desempenhando atividades para a subsistência.
Ocorre que as circunstâncias do caso tornam totalmente incompatíveis a condição de regime de
economia familiar, porque a parte autora possuía plena capacidade contributiva de recolher
contribuições à previdência social como produtora rural, mas jamais contribuiu para a previdência
social, para a manutenção de sua qualidade de segurada (CNIS).
Outrossim, o cônjuge da parte autora é proprietários de dois imóveis rurais, a saber: Fazenda São
Judas Tadeu (1.070,2 ha), no município de Corguinho/MS, e Fazenda Santa Rita (259,0 ha), na
cidade de Jaraguari/MS.
Ora. As propriedades exploradas pela autora, em condomínio, são bem superiores a 4 (quatro)
módulos fiscais da região, nos termos do artigo 11, VII, “a”, item 1, da Lei nº 8.213/91. Só a
primeira possui 30,5700 módulos fiscais, enquanto a segunda, 7,4000 módulos fiscais.
Diante do montante da produção agrícola (vide notas fiscais de produtor rural), a toda evidência,
as propriedades rurais tocadas pelos familiares da autora eram voltadas a fins comerciais,
exclusivamente, de modo que não se amolda à situação exigida pelo artigo 11, § 1º, da LBPS, in
verbis:
“§ 1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros
da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo
familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de
empregados permanentes”
A própria autora, em entrevista rural, junto da autarquia, asseverou que na Fazenda São Judas
Tadeu, há a presença de funcionário registrado, bem como houve outro empregado que laborou
em tal localidade por vários anos.
Enfim, a soma das circunstâncias indica que não se trata de economia de subsistência,
afigurando-se absurda a concessão do benefício não contributivo neste caso.
Posto isto, a atividade da família da parte autora afasta-se da enquadrada no art. 12, VII, da Lei
nº 8.212/91, mais se aproximando da prevista no art. 12, V, “a”, da mesma lei. Trata-se de
produtora rural contribuinte individual.
Consequentemente, não se aplicam as regras do art. 39 da Lei nº 8.213/81.
Não é razoável exigir de toda a sociedade (artigo 195, caput, da Constituição Federal) que
contribua para a previdência social, deixando de fora desse esforço os pequenos proprietários
rurais que exercem atividade empresarial.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO DO §1º DO ART. 557 DO C.P.C.
ATIVIDADERURAL.REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR NÃO CARACTERIZADO. EXPRESSIVO
PODER ECONÔMICO. I - Dos embargos de declaração opostos pela parte autora verifica-se o
notório intuito de reforma do julgado, quanto à comprovação do exercício de atividaderural,assim,
devem ser recebidos como agravo previsto no art. 557, §1º, do Código de Processo Civil, haja
vista o princípio da fungibilidade e a tempestividade do recurso. II - A decisão agravada destacou
que embora o autor tenha acostado cópia de seu certificado de dispensa e incorporação (1971, fl.
51), qualificado como lavrador, bem como documentos de seu genitor, quais sejam, guia de
recolhimento de contribuição sindical à Federação dos Trabalhadores na Agricultura (1963/1967;
fl. 44), certificado da Secretaria da Fazenda inscrito comoprodutor rural(1968; fl. 46), declaração
deprodutor rural(1973/1976; fls. 52/55) e notas de compras (1965; fls. 47/50), não restou
comprovado o seu labor em regime de economia familiar. III - O legislador teve por escopo dar
proteção àqueles que, não qualificados como empregados, desenvolvem atividades primárias,
sem nenhuma base organizacional e sem escala de produção, em que buscam, tão-somente,
obter aquele mínimo de bens materiais necessários à sobrevivência. Não é, portanto, o caso dos
autos, vez que os dados constantes dos documentos acostados aos autos, revelam significativo
poder econômico da família do autor, que poderia ser qualificado como contribuinte individual, a
teor do art. 11, V, "a", da Lei 8.213/91. IV - As notas de compra da Sociedade Algodoeira do
Nordeste Brasileiro S.A (fls. 47/50), indicam a compra degrandequantidade de milho,
aproximadamente 382 sacos, pagando a empresa ao genitor do autor elevado valor
($400.906,00; $325.000,00; $89.933,00; $325.000,00), considerando o salário mínimo da época
($66,00). V - O próprio autor em seu depoimento pessoal relata que apropriedademedia 89
alqueires (fl. 105), não havendo que se falar em divisão de alqueires entre seus irmãos, como
alega o agravante, tendo em vista que a não comprovação do regime de economia familiar
decorreu do expressivo poder econômico constatado nos documentos acima indicados. VI - Não
restou comprovada a condição desegurado especialdo autor, e não havendo nos autos elementos
que atestem o recolhimento de contribuições previdenciárias, restou inviável a pretendida
averbação de tempo de serviçorural. VII - Agravo do autor improvido (art.557, §1º do C.P.C) (AC
00465814420114039999, AC - APELAÇÃO CÍVEL – 1698292, Relator(a) DESEMBARGADOR
FEDERAL SERGIO NASCIMENTO, TRF3, DÉCIMA TURMA, Fonte e-DJF3 Judicial 1
DATA:15/05/2013).
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE. REMESSA OFICIAL.
TRABALHADORRURAL.MÉDIA PROPRIEDADERURAL.ALUGUEL DE PASTO.
DESCARATERIZAÇÃO. 1. Quando não se tratar de sentença líquida, inaplicável o § 2º do artigo
475 do Código de Processo Civil, posto que desconhecido o conteúdo econômico do pleito.
Também não incide o § 3º desse artigo, tendo em vista que a sentença não se fundamentou em
jurisprudência do plenário ou súmula do Supremo Tribunal Federal, ou do tribunal superior
competente. Assim, quando ausente a determinação de remessa pelo juízo a quo, o Tribunal
deverá conhecê-la de ofício. 2. Para a concessão do benefício de aposentadoria por idade de
trabalhadorruralé necessário o implemento do requisito etário bem como comprovação do efetivo
exercício de atividaderural,individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que de
forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo
igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido
(art. 39, I e art. 48, ambos da Lei nº 8.213/91). 3 A lei previdenciária enquadra comosegurado
especial: a pessoa física residente no imóvelruralou em aglomerado urbano oururalpróximo a ele
que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de
terceiros, na condição deprodutor,seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro
ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatáriorurais,que explore atividade agropecuária em
área de até 4 (quatro) módulos fiscais (art. 11, VII, "a", 1). Verifico pela documentação acostada
aos autos que a propriedade do autor tem 10,72 módulos fiscais, o que descaracteriza sua
condição desegurado. 4. O aluguel de pastos, noticiado pelo autor e por uma das testemunhas,
também descaracteriza a condição desegurado especial. 5. Apelação provida. Remessa oficial
provida (AC 00313045120104019199, AC - APELAÇÃO CIVEL – 00313045120104019199,
Relator(a) DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO DE ASSIS BETTI, TRF1, SEGUNDA
TURMA, Fonte e-DJF1 DATA:27/10/2011 PAGINA:96).
Outrossim, segundo dados do CNIS, o cônjuge da parte autora verteu diversos recolhimentos
previdenciários, como autônomo, no interstício de 1º/1/1980 a 31/7/1999.
A requerente reside em ambiente urbano, na cidade de Campo Grande/MS, município assaz
distante do qual está localizado o imóvel rural, onde a autora alega exercer trabalho rural, na
condição de segurada especial.
A aposentadoria por idade rural é reservada às pessoas pobres, sem capacidade contributiva,
que vivem em situação de regime de economia familiar, situação assaz diversa da experimentada
pelo autor durante sua vida laborativa.
Em decorrência, concluo pelo não preenchimento dos requisitos exigidos à concessão do
benefício pretendido.
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados
em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Novo CPC.
Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser
beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, conheço da apelação e lhe dou provimento, para julgar improcedente o
pedido.
Comunique-se, via e-mail, para fins de revogação da tutela antecipatória de urgência concedida.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. BENEFÍCIO NÃO
CONTRIBUTIVO. ARTIGO 143 DA LEI 8.213/91. NORMA TRANSITÓRIA. ARTIGO 39 DA
REFERIDA LEI. MARIDO PRODUTOR RURAL. VÁRIAS PROPRIEDADES. REGIME DE
ECONOMIA FAMILIAR AFASTADO. PRODUTORA RURAL CONTRIBUINTE INDIVIDUAL.
AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. REQUISITOS
NÃO PREENCHIDOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO PROVIDA. PEDIDO
JULGADO IMPROCEDENTE. TUTELA DE URGÊNCIA REVOGADA.
- Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, a
saber: a comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período
imediatamente anterior ao requerimento, consoante o disposto na Lei n. 8.213/91.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural se encontra pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula 149 do STJ).
- De acordo com o que restou definido quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado
segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), aplica-se a
súmula acima aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a
apresentação de início de prova material, corroborada com provas testemunhal, para
comprovação de tempo de serviço.
- Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei 8.213/91, não
significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por meio de documentos, o
exercício de atividade na condição de rurícola, pois isto importaria em se exigir que todo o
período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade a prova
testemunhal para demonstração do labor rural.
- Admite-se, contudo, a extensão da qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro e, ainda,
que os documentos não se refiram precisamente ao período a ser comprovado. Nesse sentido, o
REsp n. 501.281, 5ª Turma, j. em 28/10/2003, v.u., DJ de 24/11/2003, p. 354, Rel. Ministra Laurita
Vaz.
- No mais, segundo o RESP 1.354.908, realizado segundo a sistemática de recurso
representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), necessária a comprovação do tempo de
atividade rural no período imediatamente anterior à aquisição da idade:
- Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem
desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de ativ idade no meio rural
(STJ, REsp 207.425, 5ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro
Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003,
p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
- O art. 143 da Lei 8.213/91 constitui regra transitória assegurou aos rurícolas o direito de
requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados da vigência da referida Lei, independentemente do pagamento de contribuições
previdenciárias. Assim, o prazo de 15 (quinze) anos do artigo 143 da Lei 8.213/91 expiraria em
25/07/2006.
- Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como
segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a
uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 02
(dois) anos, estendendo-se até 25/07/2008, em face do disposto na MP 312/06, convertida na Lei
11.368/06.
- Finalmente, a Medida Provisória nº 410/07, convertida na Lei 11.718/08, estabeleceu nova
prorrogação para o prazo previsto no artigo 143 da Lei 8.213/91, até 31/12/2010, para o
trabalhador rural empregado e o enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que
presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação
de emprego.
- Observe-se que o prazo estabelecido no referido artigo 143 passou a vigorar até 31/12/2010,
mas não contemplou o trabalhador rural que se enquadra na categoria de segurado especial
(caso dos autos). De outra parte, para o segurado especial definido no artigo 11, inciso VII, da Lei
8.213/91, remanesce o disposto no artigo 39 da referida lei. Diferentemente dos demais
trabalhadores rurais, trata-se de segurado que mantém vínculo com a previdência social mediante
contribuição descontada em percentual incidente sobre a receita oriunda da venda de seus
produtos, na forma do artigo 25, caput e incisos, da Lei nº 8.212/91. Vale dizer: após 25/07/2006,
a pretensão do segurado especial ao recebimento de aposentadoria por idade deverá ser
analisada conforme o disposto no artigo 39, inciso I, da Lei 8.213/91.
- Ademais, não obstante o exaurimento da regra transitória insculpida no artigo 143 da Lei n.
8.213/91, fato é que a regra permanente do artigo 48 dessa norma continua a exigir para
concessão de aposentadoria por idade dos segurados rurícolas, inclusive empregados, a
comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período
imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de
contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante §1º e § 2º do referido
dispositivo. Trata-se, a bem da verdade, de norma que parece confrontar com o caráter
contributivo da previdência social, mas que não incide ao presente feito.
- No caso em discussão, o requisito etário restou preenchido em 4/8/2006. A autora alega que
trabalhou a vida toda na lavoura, em regime de economia familiar, tendo cumprido a carência
exigida na Lei nº 8.213/91.
- Nos autos, há pletora de documentos que configuram início de prova material, tais como: (i)
certidão de casamento – celebrado em 1971 –, onde consta a profissão de lavrador do cônjuge
da autora Wilson Boni; (ii) matrícula de imóveis rurais; (iii) notas fiscais de produtor; (iv)
declaração anual do Produtor Rural – DAP, em nome do cônjuge, demonstrando grandes
movimentações empresariais rurais, em especial negociações de compra e venda de gado; (v)
declarações de ITR da "São Judas Tadeu" e da "Fazenda Santa Rita”; (vi) comprovante de
aquisição contra febre aftosa; (vii) certificado de cadastro de imóvel rural – CCIR etc.
- A prova testemunha formada por três depoimentos atesta que a autora sempre viveu em sua
propriedade rural, desempenhando atividades para a subsistência.
- Ocorre que as circunstâncias do caso tornam totalmente incompatíveis a condição de regime de
economia familiar, porque a parte autora possuía plena capacidade contributiva de recolher
contribuições à previdência social como produtora rural, mas jamais contribuiu para a previdência
social, para a manutenção de sua qualidade de segurada (CNIS).
- Outrossim, o cônjuge da parte autora é proprietários de dois imóveis rurais, a saber: Fazenda
São Judas Tadeu (1.070,2 ha), no município de Corguinho/MS, e Fazenda Santa Rita (259,0 ha),
na cidade de Jaraguari/MS. As propriedades exploradas pela autora, em condomínio, são bem
superiores a 4 (quatro) módulos fiscais da região, nos termos do artigo 11, VII, “a”, item 1, da Lei
nº 8.213/91. Só a primeira possui 30,5700 módulos fiscais, enquanto a segunda, 7,4000 módulos
fiscais.
- Diante do montante da produção agrícola (vide notas fiscais de produtor rural), a toda evidência,
as propriedades rurais tocadas pelos familiares da autora eram voltadas a fins comerciais,
exclusivamente, de modo que não se amolda à situação exigida pelo artigo 11, § 1º, da LBPS.
- Enfim, a soma das circunstâncias indica que não se trata de economia de subsistência,
afigurando-se absurda a concessão do benefício não contributivo neste caso. Posto isto, a
atividade da família da parte autora afasta-se da enquadrada no art. 12, VII, da Lei nº 8.212/91,
mais se aproximando da prevista no art. 12, V, “a”, da mesma lei. Trata-se de produtora rural
contribuinte individual.
- Assim, indevido o benefício.
- Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados
em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Novo CPC.
Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser
beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação provida.
- Revogação da tutela antecipatória de urgência concedida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu conhecer da apelação e lhe dar provimento, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
