Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5877357-25.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
23/02/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 03/03/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. BENEFÍCIO NÃO
CONTRIBUTIVO. ARTIGO 143 DA LEI 8.213/91. NORMA TRANSITÓRIA. INÍCIO DE PROVA
MATERIAL. ATIVIDADE URBANA DO CÔNJUGE. PROVA TESTEMUNHAL FRÁGIL.
REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- À concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, exige-se: a comprovação da idade mínima
e o desenvolvimento de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento (REsp
Repetitivo n. 1.354.908).
- A comprovação de atividade rural deve ser feita por meio de início de prova material
corroborado por robusta prova testemunhal (Súmula n. 149 do STJ e Recursos Repetitivos n.
1.348.633 e 1.321.493).
- Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem
desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural.
Precedentes do STJ.
- Quanto aos segurados especiais que implementarem os requisitos para concessão do benefício
após 31 de dezembro de 2010, não deve ser aplicado o limite temporal a que se refere o art. 143,
com as alterações promovidas pela Lei n. 11.718/2008, destinadas, exclusivamente, aos
trabalhadores rurais não enquadrados ou equiparados a segurados especiais. A estes últimos,
aplica-se o disposto no art. 39, I da Lei nº 8.213/91, sem limite de data, aliado à regra permanente
do artigo 48 do mesmo diploma.
- Conjunto probatório insuficiente à comprovação do período de atividade rural debatido, sendo
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
indevida a concessão do benefício não contributivo.
- Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados
em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do CPC,
suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser
beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5877357-25.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA NADIR ZAMBON DA FONSECA
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5877357-25.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA NADIR ZAMBON DA FONSECA
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N
R E L A T Ó R I O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: Cuida-se de apelação interposta em
face desentença que julgou procedente os pedidos para averbar o período de 6/11/1972 a
11/11/2016, laborado pela parte autora na condição de rurícola, bem como condenar o réu a
conceder o benefício de aposentadoria por idade rural, desde a data do pedido administrativo,
com acréscimodos consectários legais.
Houve dispensado reexame necessário.
Em suas razões, o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS alega anão comprovação do
trabalho rural pelo tempo necessário exigido em lei, bem como o exaurimento do art. 143 da Lei
n. 8.213/1991. Subsidiariamente questiona os índices de correção monetária e os juros de mora,
exorando a aplicação do artigo 1º-F da Lei n. 9.494/1997.
Com contrarrazões, os autos subirama esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5877357-25.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA NADIR ZAMBON DA FONSECA
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N
V O T O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: O recurso preenche os pressupostos de
admissibilidade e merece ser conhecido.
Discute-se o preenchimento dos requisitos para a concessão de aposentadoria por idade ao
rurícola, consoante o disposto na Lei n. 8.213/1991.
A comprovação de atividade rural, para o segurado especial e para os demais trabalhadores
rurais, inclusive os denominados “boias-frias”, deve ser feita por meio de início de prova material,
a qual possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à sua data
de referência, desde que corroborado por robusta prova testemunhal (Súmula n. 149 do STJ e
Recursos Especiais Repetitivos n. 1.348.633 e 1.321.493).
No mais, segundo o entendimento firmado no REsp n. 1.354.908, pela sistemática de recurso
representativo da controvérsia (CPC/1973, art. 543-C), faz-se necessária a comprovação do
tempo de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento ou à aquisição da
idade:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE
RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE
TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER
PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Tese
delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º
combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que
estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural,
momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo
48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter
atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo
descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito.
Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os
requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS
conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código
de Processo Civil.” (RECURSO ESPECIAL Nº 1.354.908 - SP (2012/0247219-3), RELATOR:
MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, DJ 09/09/2015)
Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem elas
desnecessárias, bastando a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ,
REsp 207.425, 5ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge
Scartezzini; STJ, RESP n. 502.817, 5ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361,
Rel. Ministra Laurita Vaz).
Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei 8.213/1991, a regra transitória assegurou aos
rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15
(quinze) anos, contados da vigência da referida Lei, expirando em 25/07/2006.
Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como
segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a
uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado até 31/12/2010,
em face do disposto da Medida Provisória n. 410/2007, convertida na Lei 11.718/2008.
Com flagrante antinomia com o artigo 2º, o artigo 3º da Lei n. 11.718/2008 acaba por
indiretamente estender o prazo até 31/12/2020, além de criar tempo de serviço ficto.
Abstração feita da hipotética ofensa à Constituição Federal, por falta de relevância e urgência da
medida provisória, e por possível ofensa ao princípio hospedado no artigo 194, § único, II, do
Texto Magno, o fato é que a Lei n. 11.718/2008 não contemplou o trabalhador rural que se
enquadra na categoria de segurado especial.
No caso do segurado especial, definido no artigo 11, inciso VII, da Lei 8.213/1991, remanesce o
disposto no artigo 39 dessa mesma lei. Diferentemente dos demais trabalhadores rurais, trata-se
de segurado que mantém vínculo com a previdência social mediante contribuição descontada em
percentual incidente sobre a receita oriunda da venda de seus produtos, na forma do artigo 25,
caput e incisos, da Lei nº 8.212/1991. Vale dizer: após 25/7/2006, a pretensão do segurado
especial ao recebimento de aposentadoria por idade deverá ser analisada conforme o disposto no
artigo 39, inciso I, da Lei 8.213/1991.
Ademais, não obstante o exaurimento da regra transitória insculpida no artigo 143 da Lei n.
8.213/1991, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, fato é que a regra
permanente do artigo 48 dessa norma continua a exigir, para concessão de aposentadoria por
idade a rurícolas, a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma
descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao
número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante
§ 1º e § 2º do referido dispositivo.
No caso em discussão, o requisito etário restou preenchido em 6/11/2015, quando a autora
completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade.
A autora alega que desde tenra idade trabalha nas lides rurais, em regime de economia familiar,
tendo cumprido a carência exigida na Lei n. 8.213/1991.
Como início de prova material, a autora juntou (i) cópia de sua certidão de casamento, celebrado
em 1980, na qual ela foi qualificada como “prendas domésticas” e seu marido “lavrador”; (ii) CTPS
com vínculos empregatícios rurais, nos períodos de 2/10/1986 a 17/12/1986, 1º/4/1987 a 2/5/1987
e 11/5/1987 a 9/10/1987; e (iii) documentos relacionados à propriedade rural de seu pai e por ela
herdada, além dos inerentes ao imposto sobre a propriedade rural.
O fato da autora figurar como proprietária de parcela do imóvel rural, desde 2010, em condomínio
com irmãos e genitora, não tem o condão de demonstrar o labor rural como segurada especial.
Cabe ressaltar o disposto no artigo 11, VII, § 1º "Entende-se como regime de economia familiar a
atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao
desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua
dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes."
Além disso, nos termos do artigo 11, § 9º, da Lei n. 8.213/1991, com a redação da Lei n.
11.718/2008, não é segurado especial o membro de grupo familiar que possuir outra fonte de
rendimento. No caso, o grupo familiar possui outra fonte de rendimento há décadas, consistindo
no trabalho do marido como urbano.
Dados do CNIS demonstram que o cônjuge trabalhou como empregado urbano entre os anos de
1982 e 2011; bem como efetuou diversos recolhimentos previdenciários, na condição de
contribuinte individual, nos períodos de 1º/9/2003 a 30/4/2004, 1º/8/2009 a 31/12/2013 e
1º/11/2014 a 31/10/2019.
Os vínculos urbanos não foram esporádicos ou de entressafra, já que apresentou um nível de
continuidade e de diversidade bastante dispare dos pleitos previdenciários.
Apesar do entendimento de que as atividades urbanas ou renda auferida por um dos integrantes
do grupo familiar não afasta a condição de segurado especial dos demais componentes do grupo
familiar, verifica-se que a renda auferida pelo marido da autora desconstitui a imprescindibilidade
dos rendimentos do trabalho em regime de economia familiar para a subsistência do casal, nos
termos preconizados pelo § 1º do art. 11 da Lei n. 8.213/1991.
Friso que a posse de imóvel rural, por si só, suficiente a comprovação da atividade no campo, em
regime de economia familiar.
A despeito dos depoimentos favoráveis das testemunhas, não se pode ignorar o todo conjunto
probatório, pelos motivos já elencados.
Assim, indevida a concessão do benefício não contributivo, porque não comprovado o trabalho
exclusivamente rural, em regime de economia familiar, além do fato de que não há nos autos
elemento de convicção, em nome da autora, capaz de estabelecer liame entre o ofício rural
alegado e a forma de sua ocorrência.
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados
em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do CPC,
suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser
beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, conheço da apelação e lhe dou provimento, para julgar improcedente o
pedido.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. BENEFÍCIO NÃO
CONTRIBUTIVO. ARTIGO 143 DA LEI 8.213/91. NORMA TRANSITÓRIA. INÍCIO DE PROVA
MATERIAL. ATIVIDADE URBANA DO CÔNJUGE. PROVA TESTEMUNHAL FRÁGIL.
REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- À concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, exige-se: a comprovação da idade mínima
e o desenvolvimento de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento (REsp
Repetitivo n. 1.354.908).
- A comprovação de atividade rural deve ser feita por meio de início de prova material
corroborado por robusta prova testemunhal (Súmula n. 149 do STJ e Recursos Repetitivos n.
1.348.633 e 1.321.493).
- Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem
desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural.
Precedentes do STJ.
- Quanto aos segurados especiais que implementarem os requisitos para concessão do benefício
após 31 de dezembro de 2010, não deve ser aplicado o limite temporal a que se refere o art. 143,
com as alterações promovidas pela Lei n. 11.718/2008, destinadas, exclusivamente, aos
trabalhadores rurais não enquadrados ou equiparados a segurados especiais. A estes últimos,
aplica-se o disposto no art. 39, I da Lei nº 8.213/91, sem limite de data, aliado à regra permanente
do artigo 48 do mesmo diploma.
- Conjunto probatório insuficiente à comprovação do período de atividade rural debatido, sendo
indevida a concessão do benefício não contributivo.
- Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados
em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do CPC,
suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser
beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
