
| D.E. Publicado em 12/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer da apelação e lhe dar provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0024846-08.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de apelação interposta em face da r. sentença que julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade rural, a partir da data da citação, com os consectários legais, dispensado o reexame necessário.
Nas razões de apelo, o INSS requer a reforma do julgado, já que a autora não possui os requisitos necessários à concessão do benefício, bem como não configurado o trabalho em regime de economia familiar. Subsidiariamente questiona os índices de correção monetária, exorando a aplicação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/2009. Prequestiona a matéria.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta egrégia Corte, tendo estes sido distribuídos a este relator.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço da apelação porque presentes os requisitos de admissibilidade.
Discute-se nos autos o direito da parte autora a benefício de aposentadoria por idade rural.
A aposentadoria por idade, rural e urbana, é garantida pela Constituição Federal em seu artigo 201, §7º, inciso II, para os segurados do regime geral de previdência social (RGPS), nos termos da lei e desde que obedecidas as seguintes condições:
Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, a saber: a comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento, consoante o disposto na Lei n. 8.213/91.
A questão relativa à comprovação de atividade rural se encontra pacificada no Superior Tribunal de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente testemunhal (Súmula 149 do STJ).
De acordo com o que restou definido quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), aplica-se a súmula acima aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material, corroborada com provas testemunhal, para comprovação de tempo de serviço.
Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei 8.213/91, não significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por meio de documentos, o exercício de atividade na condição de rurícola, pois isto importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade a prova testemunhal para demonstração do labor rural.
Contudo, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar, na forma da súmula nº 34 da TNU.
Admite-se, ainda, a extensão da qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro. Para além, segundo a súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de trabalho rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
No mais, segundo o RESP 1.354.908, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), necessária a comprovação do tempo de atividade rural no período imediatamente anterior à aquisição da idade:
Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp 207.425, 5ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei 8.213/91, a regra transitória assegurou aos rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei, nos seguintes termos:
Assim, o prazo de 15 (quinze) anos do artigo 143 da Lei 8.213/91 expiraria em 25/07/2006.
Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 02 (dois) anos, estendendo-se até 25/07/2008, em face do disposto na MP 312/06, convertida na Lei 11.368/06.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 410/07, convertida na Lei 11.718/08, estabeleceu nova prorrogação para o prazo previsto no artigo 143 da Lei 8.213/91, nos seguintes termos:
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo e respectivo inciso I ao trabalhador rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que comprovar a prestação de serviço de natureza rural, em caráter eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação de emprego."
Observe-se que, nos termos do artigo 2º da Lei nº 11.718/08, o prazo estabelecido no referido artigo 143 da LBPS passou a vigorar até 31/12/2010. Bizarramente, com flagrante antinomia com o artigo 2º, o artigo 3º da Lei nº 11.718/08 acaba por indiretamente estender o prazo até 31/12/2020, além de criar tempo de serviço ficto.
Abstração feita da hipotética ofensa à Constituição Federal, por falta de relevância e urgência da medida provisória, e por possível ofensa ao princípio hospedado no artigo 194, § único, II, do Texto Magno, o fato é que a Lei nº 11.718/08 não contemplou o trabalhador rural que se enquadra na categoria de segurado especial.
No caso do segurado especial, definido no artigo 11, inciso VII, da Lei 8.213/91, remanesce o disposto no artigo 39 desta última lei. Diferentemente dos demais trabalhadores rurais, trata-se de segurado que mantém vínculo com a previdência social mediante contribuição descontada em percentual incidente sobre a receita oriunda da venda de seus produtos, na forma do artigo 25, caput e incisos, da Lei nº 8.212/91. Vale dizer: após 25/07/2006, a pretensão do segurado especial ao recebimento de aposentadoria por idade deverá ser analisada conforme o disposto no artigo 39, inciso I, da Lei 8.213/91.
Ademais, não obstante o "pseudo-exaurimento" da regra transitória insculpida no artigo 143 da Lei n. 8.213/91, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, fato é que a regra permanente do artigo 48 dessa norma continua a exigir, para concessão de aposentadoria por idade a rurícolas, a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante § 1º e § 2º do referido dispositivo.
A questão já foi apreciada, por ora sem muita profundidade, por nossos tribunais, conforme se infere dos seguintes julgados:
No caso em discussão, o requisito etário restou preenchido em 26/8/2013, quando a autora completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade.
A requerente alega que, a partir de seus 12 anos de idade, passou a auxiliar seus pais na lavoura, no imóvel rural denominado "Cervo", pertencente a seus avós paternos Benedito Pereira da Silva e Ida Atílio da Silva, de 56,64,31 hectares, localizado no município de Pitangueiras, Estado de São Paulo.
Tal atividade perdurou até aproximadamente agosto de 1998, quando parte ideal da propriedade foi vendida para "Case Comercial e Agrícola", que, por sua vez, no ano de 2000, novamente vendida para "Usina Santa Elisa S/A".
Assim sendo, os genitores da pleiteante adquiriram, em 1998, imóvel rural denominado "Sítio São Sebastião", com área de 8,71 hectares, localizado no município de Frutal, Estado de Minas Gerais, onde continuaram com suas atividades rurais, com o cultivo de milho e amendoim, até a propriedade ser vendida.
No ano de 2011, os pais da autora adquiriram uma parte de terras da "Fazenda Santo Antônio", também localizada na cidade de Frutal, Estado de Minas Gerais, com área de 34,33 hectares, onde ela, irmãos e genitores continuam trabalhando, plantando leguminosas, tudo com a finalidade de garantir o sustento do grupo familiar.
Quanto ao requisito do início de prova material, consta dos autos pletora de documentos, em nome do genitor Narcizo Pereira da Silva, como:
(i) certidão de nascimento da autora, na qual ele foi qualificado como lavrador;
(ii) matrícula nº 865, do Cartório de Registro de Imóveis de Pitangueiras/SP, referente ao Sítio Cervo, pertencente aos avós paternos da parte autora, o qual foi vendido em 24/2/1992 para "Case Comercial e Agrícola";
(iii) declarações cadastrais - produtor;
(iv) pedido de talonário de produtor;
(v) recibos de entrega de declaração de ITR;
(vi) certificados de cadastro de imóvel rural - CCIR, relativos ao Sítio Sebastião e Santo Antônio;
(vii) matrícula nº 23.375, do Cartório de registro de Imóveis de Grutal/MG, referente ao Sítio São Sebastião, comprado em 13/5/1992;
(viii) matrícula nº 45.053, do Cartório de registro de Imóveis de Grutal/MG, referente ao Sítio Santo Antônio, adquirido em 20/1/2011;
(ix) foto etc.
Não obstante a autora tenha juntado aos autos diversos documentos, o conjunto probatório conduz à improcedência do pedido inicial.
Isso porque não comprovado seu efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, que se baseia numa produção rudimentar para subsistência, podendo incluir o comércio de pequenas quantidades dos excedentes da produção.
Entendo que é possível admitir a qualificação do genitor à filha como início de prova material, quando esta é solteira, a atrair o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça. Todavia, não é o caso dos autos, uma vez que se trata de mulher casada, conforme se verifica da petição inicial, procuração "ad-judicia et extra" e declaração de pobreza, razão pela qual não se pode estender a ela, que possui núcleo familiar próprio, a condição de trabalhadores rurais de seus genitores.
Não obstante as testemunhas terem alegado que a autora é separada de fato há mais de 15 (quinze) anos, não há qualquer prova nesse sentido. Em vários momentos nestes autos, o INSS requereu a juntada de certidão de casamento da autora, contudo ela sempre se quedou inerte, muito provavelmente pelo fato do marido não ser rurícola.
Os documentos imobiliários são prova tão somente da aquisição do imóvel pelos avós e genitores da autora, o que não leva, por sua vez, a conclusão de que lá tenham sido desenvolvidas atividades rurícolas, mormente em regime de economia familiar, para caracterização de sua qualidade como segurada especial, mormente porquanto não há nos autos qualquer documento comprobatório de que se tenha produzido qualquer tipo de cultura na referida localidade.
Não sendo a escritura, por si só, suficiente a comprovação da atividade no campo.
Ou seja, tais documentos apenas apontam a titularidade do domínio, não esboçando, entretanto, o efetivo trabalho rural.
Não há mais nenhuma prova robusta, em nome da requerente, que denote atividade campesina em quaisquer propriedades, tais como notas fiscais de produtor e certidões.
Da mesma forma que louvamos essa flexibilização hermenêutica, que decorreu da atenção prestadas às dificuldades da vida no campo, é razoável que a mesma não deve ser estendida ao ponto de admitir início de prova extremamente precário para demonstrar um extenso tempo de vários anos.
Por sua vez, os depoimentos das testemunhas, residentes na cidade de Pitangueiras, foram vagos e mal circunstanciados. Senão vejamos.
Cleusa Aparecida R. Gomes Gaisdorf e Maria Madalena Alinso Mini alegaram, em síntese, que conhecem a autora há mais 25 anos. Desde quando a conhecem, ela já trabalhava como lavradora. A depoente morava em um sítio vizinho ao local onde a requerente trabalhava junto com os pais. Informou que a parte autora trabalha até hoje. Informou que a propriedade em que a autora trabalhava chamava Sítio Cervo. O sítio possuía cerca de cinco alqueires, onde havia plantação de algodão, soja, milho, feijão, criação de porcos tudo em pequena escala. Sustenta que a trabalha atualmente no sitio Santo Antônio, na cidade de Frutal.
Ou seja, elas se limitaram a confirmar o trabalho da autora no Sítio Cervo, localizado no município de Pitangueiras, Estado de São Paulo, vendido em 24/2/1992, enquanto que nos sítios São Sebastião e Santo Antônio, localizado em Frutal, Minas Gerais, foram assaz genéricas; sequer demonstraram a indispensabilidade do labor à própria subsistência do grupo familiar em que ela está inserida. Certo é que nenhuma das depoentes laborou em companhia da requerente em tais locais.
Interessante notar que a autora reside no município de Pitangueiras, cidade a mais de 150 km (cento e cinquenta quilômetros) de Frutal, onde estão localizados os dois últimos sítios em que ela alega ter trabalhado em regime de economia familiar.
Assim, o conjunto probatório - provas documentais e testemunhais - demonstra que a autora não pode ser caracterizada como pequena produtora rural em regime de economia familiar.
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Novo CPC.
Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, conheço da apelação autárquica e lhe dou provimento, para julgar improcedente o pedido.
É o voto.
Juiz Federal Convocado
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| Signatário (a): | RODRIGO ZACHARIAS:10173 |
| Nº de Série do Certificado: | 11DE18121240443F |
| Data e Hora: | 25/02/2019 16:22:35 |
