
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 6211506-71.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: JOSE APARECIDO VIEIRA
Advogado do(a) APELANTE: ANA MARIA FRIAS PENHARBEL - SP272816-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 6211506-71.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: JOSE APARECIDO VIEIRA
Advogado do(a) APELANTE: ANA MARIA FRIAS PENHARBEL - SP272816-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
“Art. Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural, em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência:
I– até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991;
II – de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e
III – de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo e respectivo inciso I ao trabalhador rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que comprovar a prestação de serviço de natureza rural, em caráter eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação de emprego”.
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO.
REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991.
REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)
Art. 55. (...)
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. ATIVIDADE URBANA DO CÔNJUGE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL DESCARACTERIZADO. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO LEGAL. OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DESNECESSIDADE DE VALORAÇÃO DOS DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS. SÚMULA N. 149 DO E. STJ. IMPEDIMENTO PARA O DESENVOLVIMENTO REGULAR DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE TÍTULO JUDICIAL QUE ORA SE RESCINDE. IMPOSSIBILIDADE. NATUREZA ALIMENTAR E BOA-FÉ. REVELIA. NÃO APLICAÇÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA.
(...)
II - A r. decisão rescindenda reconheceu o direito da então autora ao benefício de aposentadoria rural por idade com base na existência de início de prova material, consistente na certidão de casamento em que o marido consta como lavrador (11.09.1977), corroborado pelos depoimentos testemunhais.
III - Da análise dos documentos que compuseram os autos subjacentes, verifica-se que o cônjuge da então autora ostentava vários vínculos empregatícios de natureza urbana por tempo relevante (14.03.1978 a 31.03.1981; 01.04.1981 a 03.03.1983; 20.02.1987 a 11.1987 e 02.04.1990 a 10.10.1995), tendo sido contemplado, posteriormente, com o benefício de auxílio-doença a partir de 12.12.2001, convertido em aposentado por invalidez, na condição de comerciário/contribuinte individual, a contar de 13.09.2002.
IV - Considerando que a autora implementou o quesito etário somente em 2008 (nascida em 24.12.1953, completou 55 anos de idade em 24.12.2008), é de se concluir que a r. decisão rescindenda adotou interpretação não condizente com o art. 143 c/c o art. 55, §3º, ambos da Lei n. 8.213/91, na medida em que o documento reputado como início de prova material do labor rural (certidão de casamento) restou esmaecido ante a constatação de que o cônjuge exerceu, após o enlace matrimonial, atividades tipicamente urbanas, não bastando, portanto, a comprovação por prova exclusivamente testemunhal.
(...)
VI - A certidão de casamento em que o marido consta como lavrador (11.09.1977) não se presta como início de prova material do labor rural, tendo em vista o longo histórico de trabalho urbano empreendido por ele (extrato do CNIS).
VII - No que tange ao pedido de reconhecimento de atividade rural, é de se reconhecer que não foi apresentado documento indispensável ao ajuizamento da ação, ou seja, início de prova material no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário (24.12.2008), restando inócua a análise da prova testemunhal colhida em juízo.
VIII - Como o § 3º do art. 55 da Lei n. 8.213/91 versa sobre matéria probatória, é processual a natureza do aludido dispositivo legal, razão pela qual nos feitos que envolvam o reconhecimento de tempo de serviço a ausência nos autos do respectivo início de prova material constitui um impedimento para o desenvolvimento regular do processo, caracterizando-se, consequentemente, essa ausência, como um pressuposto processual, ou um suposto processual, como prefere denominar o sempre brilhante Professor Celso Neves. A finalidade do § 3º do art. 55 da Lei n. 8.213/91 e da Súmula 149 do E. STJ é evitar a averbação de tempo de serviço inexistente, resultante de procedimentos administrativos ou judiciais promovidos por pessoas que não exerceram atividade laborativa.
IX - A finalidade do legislador e da jurisprudência ao afastar a prova exclusivamente testemunhal não foi criar dificuldades inúteis para a comprovação do tempo de serviço urbano ou rural e encontra respaldo na segunda parte do art. 400 do CPC de 1973, atual artigo 443 do Novo CPC.
X - A interpretação teleológica dos dispositivos legais que versam sobre a questão em exame leva à conclusão que a ausência nos autos de documento tido por início de prova material é causa de extinção do feito sem resolução do mérito, com base no art. 485, IV, do Novo CPC, pois o art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91 e a Súmula 149 do E. STJ, ao vedarem a prova exclusivamente testemunhal em tais casos, criaram um óbice de procedibilidade nos processos que envolvam o reconhecimento de tempo de serviço, que a rigor acarretaria o indeferimento da inicial, nos termos dos arts. 320 e 321 do atual CPC.
XI - Carece a autora da ação subjacente de comprovação material sobre o exercício de atividade rural por ela desempenhado (art. 39, I, da Lei nº 8.213/91), restando prejudicada a apreciação do pedido de reconhecimento da atividade rural.
XII - Cabe ressalvar que os valores recebidos por força de título judicial gerador do benefício de aposentadoria rural por idade (NB 41/150.848.253-2), que ora se rescinde, não se sujeitam à restituição, pois possuem natureza claramente alimentar, tendo como destinação o atendimento de necessidades básicas da ora ré. Importante salientar que a percepção do benefício em comento decorreu de decisão judicial, com trânsito em julgado, não se vislumbrando, no caso concreto, qualquer ardil ou manobra da parte autora na ação subjacente com o escopo de atingir tal desiderato, evidenciando-se, daí, a boa-fé, consagrada no art. 113 do Código Civil.
XIII - Em face da ocorrência de revelia, não há ônus de sucumbência a suportar.
XIV - Ação rescisória cujo pedido se julga procedente. Processo subjacente que se julga extinto, sem resolução do mérito. Tutela que se concede em maior extensão.
(TERCEIRA SEÇÃO, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 10396 - 0008699-33.2015.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal SERGIO NASCIMENTO, j.09/06/2016, e-DJF3 Judicial 1 17/06/2016 ).
Postas as balizas, passa-se ao exame do caso dos autos.
A parte autora, nascida em
25/10/1958
, cumpriu o requisito etário em25/10/2018
, quando completou 60 (sessenta) anos de idade.Quanto à carência, verifica-se do conjunto das provas que logrou comprovar a lida campesina.
Não obstante não tenha apresentado todos os documentos com a inicial, fez juntar aos autos, com as alegações finais, o complemento da prova material do efetivo exercício em atividade rural por tempo suficiente e imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou à data do implemento da idade mínima.
O r. Juízo a quo abriu vista ao INSS determinando a sua manifestação, no sentido de conceder efetividade ao princípio do contraditório, porém a Autarquia quedou-se em silêncio (ID 108616778 - Pág. 1 e 108616882 - Pág. 1). Dessa forma, há que ser preservada a utilidade da prestação jurisdicional.
Na espécie, conforme alega o autor, desde jovem, sempre exerceu atividades rurais como diarista e, após 2002, como agricultor em seu sítio no bairro da Bateia, Piedade/SP, em regime de economia familiar, plantando inhame, batata doce e abobrinha.
Com efeito, o conjunto probatório demonstra que foram preenchidos os requisitos mínimos exigidos em lei para a concessão do benefício ora pleiteado.
O autor juntou aos autos os seguintes documentos:
1) certidão de casamento contraído em 08/01/1990, qualificando-o como lavrador;
2) certidão de nascimento de filho lavrada em 2018, qualificando-o como lavrador;
3) Certificado de Dispensa de Incorporação nº 904229 de 1977 em nome do autor. Consta a profissão de lavrador manuscrito no documento;
4) Declaração Cadastral de Produtor - DECAP, em nome do autor, do ano de 2004, válido até 2007.
Os seguintes documentos foram apresentados em alegações finais (ID 108616775), sob o crivo do contraditório:
- cadastro do contribuinte como produtor rural, somente a partir de 08/2012;
- listagem da empresa Agromaia Ind. e Com. de Imp. e Exp de Produtos Agrop., com notas fiscais de compras de adubo e insumos (Orthene, Glifosato, Orthocide, Gliz, Cercobin, Roundup, semente de pepino, coentro e de brócolis, entre outros), datados de 2011 a 2018.
Assim, a certidão de casamento contraído em 08/01/1990, o certificado de dispensa de incorporação do exército datado de 1977 e a certidão de nascimento do filho em 1992, nos quais o autor está qualificado como lavrador, somado ao cadastro do contribuinte como produtor rural, a partir de 08/2012, e à listagem da empresa Agromaia Ind. e Com. de Imp. e Exp de Produtos Agrop, com notas fiscais de compras de adubo e insumos, afiguram-se suficientes à comprovação do período de labor rural necessário para o preenchimento da carência.
Com efeito, verifica-se que foram anexados aos autos documentos suficientes em nome da parte autora capazes de comprovar o seu efetivo labor campesino por todo período de carência necessário à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, nos termos preconizados pela legislação previdenciária.
As testemunhas ouvidas em juízo corroboraram o labor rural da parte autora pelo tempo necessário para fazer jus ao benefício, devendo, assim, a r. sentença deve ser reformada para conceder à autoria o benefício da aposentação.
Custas e despesas processuais
O INSS, como autarquia federal, é isento do pagamento de custas na Justiça Federal, por força do artigo 4º, I, da Lei Federal nº 9.289/1996.
Da mesma forma, em face do disposto no artigo 1º, § 1º, da referida lei, combinado com o estabelecido pelo artigo 6º da Lei Estadual paulista nº 11.608, de 2003, também está isento nas lides aforadas perante a Justiça Estadual de São Paulo no exercício da competência delegada.
Quanto às demandas aforadas no Estado de Mato Grosso do Sul, a isenção prevista nas Leis Estaduais sul-mato-grossenses nºs 1.135/91 e 1.936/98 foi revogada pela Lei Estadual nº 3.779/09 (art. 24, §§ 1º e 2º), razão pela qual cabe ao INSS o ônus do pagamento das custas processuais naquele Estado.
Caberá à parte vencida arcar com as despesas processuais e as custas somente ao final, na forma do artigo 91 do CPC.
Consectários legais
Aplica-se aos débitos previdenciários a súmula 148 do C.STJ: "Os débitos relativos a benefício previdenciário, vencidos e cobrados em juízo após a vigência da Lei nº 6.899/81, devem ser corrigidos monetariamente na forma prevista nesse diploma legal”. (Terceira Seção, j. 07/12/1995)
Da mesma forma, incide a súmula 8 deste E. Tribunal: “Em se tratando de matéria previdenciária, incide a correção monetária a partir do vencimento de cada prestação do benefício, procedendo-se à atualização em consonância com os índices legalmente estabelecidos, tendo em vista o período compreendido entre o mês em que deveria ter sido pago, e o mês do referido pagamento".
a) Juros de mora
A incidência de juros de mora deve observar a norma do artigo 240 do CPC de 2015, correspondente ao artigo 219 do CPC de 1973, de modo que são devidos a partir da citação, à ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02; após, à razão de 1% ao mês, por força do art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança, conforme determinado na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
b) Correção monetária
Há incidência de correção monetária na forma da Lei n. 6.899, de 08/04/1981 e da legislação superveniente, conforme preconizado pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal, consoante os precedentes do C. STF no julgamento do RE n. 870.947 (Tema 810), bem como do C. STJ no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
c) Honorários advocatícios
Em razão da sucumbência, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados em patamar mínimo sobre o valor da condenação, observadas as normas do artigo 85, §§ 3º e 5º, do CPC/2015.
Os honorários advocatícios, conforme a Súmula 111 do C. STJ, incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência; porém, tendo em vista que a pretensão do requerente apenas foi deferida nesta sede recursal, a condenação da verba honorária incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da presente decisão.
Dispositivo
Ante o exposto,
dou provimento à apelação
.É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. PERÍODO DE CARÊNCIA. COMPROVAÇÃO DE TRABALHO RURAL PELO PERÍODO DE CARÊNCIA EXIGIDO EM LEI. REQUISITOS PREENCHIDOS.
I.Comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento (REsp Repetitivo nº 1.354.908) como requisitos para concessão ao benefício previdenciário.
II. A atividade rural deverá ser comprovada por meio de início de prova material podendo ser corroborado por prova testemunhal (Súmula nº 149 do STJ e Recursos Repetitivos nºs 1.348.633 e 1.321.493). - Entendimento uniforme de que as contribuições previdenciárias são desnecessárias, contanto que se comprove o efetivo exercício de labor rural. Precedentes do STJ.
III. Juntada de documentos por ocasião das alegações finais. Vista ao INSS para manifestação, preservação do princípio do contraditório e da utilidade do processo.
IV. Os requisitos para concessão ao benefício pleiteado foram preenchidos.
V. Apelação provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
