
| D.E. Publicado em 08/07/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juíza Federal Convocada
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | VANESSA VIEIRA DE MELLO:10176 |
| Nº de Série do Certificado: | 11DE1807055AA463 |
| Data e Hora: | 25/06/2019 17:25:10 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002307-64.2013.4.03.6138/SP
RELATÓRIO
Cuida-se recurso de apelação autárquico, tirado de sentença, não submetida à remessa oficial, que, em autos de concessão de aposentadoria por idade de trabalhadora rural, julgou procedente o pedido e condenou o réu ao pagamento das prestações vencidas, a partir do requerimento administrativo, discriminados os consectários. Arbitrou-se a verba honorária à ordem de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos do verbete 111 do Superior Tribunal de Justiça, fls. 84/87 verso.
O INSS pugna pela reforma da decisão combatida, ao argumento de ausência de início de prova material da atividade rurícola, no período que antecedeu o requerimento administrativo. Aduz ser inadmissível prova exclusivamente testemunhal para denotar-se tal espécie de labor. Aduz que a demandante percebe benefício de amparo ao idoso a obstar a concessão da benesse. Sustenta a aplicabilidade da Lei n. 11.960/2009 quanto aos juros de mora e correção monetária. Prequestiona a matéria para fins recursais. Vide fls. 92/97, e respectivo verso.
Ofertadas contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, afigura-se correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o art. 496, § 3º, inciso I do Código de Processo Civil atual, que entrou em vigor em 18 de março de 2016, dispõe que a sentença não será submetida ao reexame necessário quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários mínimos, em desfavor da União ou das respectivas autarquias e fundações de direito público.
No caso dos autos, considero as datas do termo inicial do benefício e da prolação da sentença, em 31 de março de 2016 (fls. 18 e 84/97 verso). Atenho-me ao teto para o salário-de-benefício como parâmetro de determinação do valor da benesse. Verifico que a hipótese em exame não excede os mil salários mínimos.
Não sendo, pois, o caso de submeter a decisão de primeiro grau à remessa oficial, passo à análise do recurso autárquico em seus exatos limites.
A aposentadoria por idade de rurícola exige idade mínima de 60 anos (homem) e 55 anos (mulher), bem assim comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência da benesse, conforme tabela progressiva, de cunho transitório, inserta no art. 142 da Lei nº 8.213/91, a ser manejada conforme o ano de implementação do requisito etário, ficando afastada a obrigatoriedade de contribuições. Findo o período de vigência da norma de transição, imperioso aplicar-se a regra permanente estampada no art. 48 e parágrafos do mesmo diploma, na dicção da Lei nº 11.718/2008, fincada, nesse particular, a exigência de demonstração do exercício de labor rural por 180 meses (carência da aposentadoria por idade).
Muito se debateu a respeito da comprovação da atividade rural para efeito de concessão do aludido benefício e, atualmente, reconhece-se na jurisprudência elenco de posicionamentos assentados sobre o assunto, a nortear apreciação das espécies e a valoração dos respectivos conjuntos probatórios. Dentre esses entendimentos, podem-se destacar os seguintes:
(i) é suficiente à demonstração do labor rural início de prova material (v.g., documentos expedidos por órgãos públicos que contemplem a qualificação rurícola da parte autora, não sendo taxativo o rol de documentos previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal coesa e harmônica, sendo inservível a tal finalidade prova exclusivamente testemunhal (Súmula STJ 149), inclusive para os chamados "boias-frias" (REsp nº 1.321.493/PR, apreciado na sistemática do art. 543-C do CPC);
(ii) são extensíveis à mulher, a partir da celebração do matrimônio ou do limiar da união estável, os documentos em que os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores (v.g., STJ, AGARESP 201402280175, Relatora Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJE 11/12/2014);
(iii) não se enquadra como princípio documental certidão recente da Justiça Eleitoral, preenchida de acordo com informações fornecidas pelo próprio postulante do jubilamento, assemelhando-se, portanto, à singela declaração unilateral de atividade profissional (e.g., TRF3, AC 00160584920114039999, Relator Juiz Convocado Valdeci dos Santos, Décima Turma, e-DJF3 01/07/2015; AC 00025385620104039999, AC 1482334, Relatora Desembargadora Federal Tania Marangoni, Oitava Turma, e-DJF3 16/04/2015);
(iv) o afastamento do ofício rural, após o preenchimento de todos os requisitos exigidos à aposentadoria, não interfere em sua concessão, sendo, contudo, inaplicável aos rurícolas o estatuído no art. 3º, da Lei nº 10.666/2003 (STJ, PET nº 7.476/PR, 3ª Seção, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 13/12/2010, Rel. p/ acórdão Min. Jorge Mussi; AgRg no REsp nº 1.253.184, 5ª Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 06/09/2011; AgRg no REsp nº 1.242.720, 6ª Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Junior, j. 02/02/2012; REsp nº 1.304.136, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamim, j. 21/02/2013, DJe 07/03/2013), sob pena, inclusive, de se atribuir aos trabalhadores rurais regime híbrido em que se mesclariam as vantagens típicas dos campesinos e outras inerentes exclusivamente aos obreiros urbanos;
(v) possível o reconhecimento de tempo de serviço rural antecedente ou ulterior ao princípio de prova documental apresentado, desde que ratificado por testemunhos idôneos (STJ, REsp nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).
A despeito de toda evolução exegética a respeito da matéria, certo é que alguns pontos permaneceram polêmicos por anos e apenas recentemente experimentaram pacificação. Talvez o maior deles diga respeito, justamente, à necessidade de demonstração da labuta rural no período imediatamente anterior ao requerimento da benesse.
Respeitáveis posições recusavam uma resposta apriorística do que viesse a se entender pela expressão período imediatamente anterior, sob o argumento de que a solução da controvérsia passa por acurado estudo de cada caso concreto, com destaque à cronologia laboral da parte autora, a fim de definir se verdadeiramente se está diante de pessoa que dedicou sua vida profissional às lides rurais.
Sem embargo, o dissenso acabou desfechado pelo c. STJ em sede de recurso representativo de controvérsia, in verbis:
No mesmo sentido:
Da análise dos entendimentos jurisprudenciais coletados, penso que a concessão da aposentadoria por idade de trabalhador rural há de se atrelar à comprovação do desempenho de labor rural quando da propositura da ação, da formulação do requerimento administrativo ou, ao menos, por ocasião do atingimento do requisito etário, como, de resto, textualmente deliberado por esta E. Corte em paradigma da Terceira Seção:
Postas as balizas, passa-se ao exame do caso dos autos.
No presente caso, pretende a autora, nascida em 15 de março de 1935, fl. 10, a concessão de aposentadoria por idade rural a partir do requerimento administrativo.
Cumpre esclarecer que a autora não fazia jus à aposentadoria por idade rural prevista na legislação anterior à Lei n. 8.213/91, à míngua da ultimação do requisito etário. No entanto, é possível a concessão da benesse pleiteada a partir da vigência da Lei n. 8.213/91, desde que preenchidas as condições nela estipuladas.
Nessa toada, o requisito etário foi implementado, na medida em que a autora contava 56 anos quando a novel legislação entrou em vigor. Resta perquirir, portanto, a comprovação do labor campesino pelo lapso temporal de 60 meses.
A título de início de prova material, foram colacionados documentos em nome do cônjuge da autora, em que se acha qualificado como lavrador, quais sejam, certidão de casamento celebrado em 21 de julho de 1951, com averbação de divórcio em 16 de novembro de 1993; certidão de nascimento de filhos havidos nos anos de 1956 e 1958. E como assentado pela Segunda Turma do STJ no AGARESP 201402280175, Rel. Min. Assusete Magalhães, DJE 11/12/2014, a qualificação de trabalhador rural do marido se estende à demandante. Vide fls. 13/15.
Ademais, a autora apresentou documento em nome próprio, a saber, carteira de filiação à Cooperativa dos Trabalhadores Rurais Temporários de Guaira, expedida em 22 de junho de 1982.Vide fl. 16.
Resulta evidenciada a presença, in casu, de princípios de prova documental do labor rural.
Os depoimentos testemunhais colhidos em audiência, realizada na data de 27 de novembro de 2014, foram uníssonos no sentido de que a autora sempre exerceu atividades rurícolas. Vide transcrições, fls.65/66 verso.
Deveras, as testemunhas Iolanda Luzia da Silva Siqueira e Guiomar de Lima, que conhecem a autora há cerca de quarenta anos, afirmaram que ela sempre trabalhou na roça, sobretudo na cultura de tomate. Mencionaram diversas propriedades rurais, a saber, fazendas Matão, Santa Luzia, Boa Esperança e Figueirão, além dos empreiteiros Adelino, Mané Carrinho, Alcides, Arlindo, Geraldo Miguel e Tonico. Acrescentaram que a demandante parou de trabalhar faz dezessete anos, considerando-se a audiência realizada em 2014.
Destaque-se que o divórcio da autora, ocorrido no ano de 1983- no presente caso em que se tenciona o empréstimo da condição de rurícola de seu cônjuge- por si só não é circunstância impeditiva à concessão da aposentadoria por idade de trabalhadora rural. Isso porque a permanência da labuta campesina pela demandante, após o evento da separação, restou testificada por prova oral firme e convincente, colhida sob o crivo do contraditório.
Nesse contexto, estou em que a prova testemunhal produzida favorece o pleito autoral, sendo coesa e harmônica no que tange à prestação do trabalho rural, no período que antecedeu o implemento do requisito etário, a acenar à procedência do pedido deduzido.
No tocante à correção monetária e aos juros de mora, cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE 870.947, definindo a seguinte tese de repercussão geral: " 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade-CRFB, art. 5º, XXII-, uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina."
Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere à correção monetária e aos juros de mora não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão exarada pelo STF em sede de repercussão geral.
Nesse cenário, sobre os valores em atraso incidirão correção monetária e juros de mora em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
Quanto à modulação dos efeitos da decisão do RE 870.947, destaca-se a pendência de apreciação, pelo STF, de Embargos de Declaração, ficando remarcada, desta forma, a sujeição da questão da incidência da correção monetária ao desfecho do referido leading case .
A percepção do benefício de amparo ao idoso não obsta a concessão da benesse, pois, os valores já pagos, seja na via administrativa ou por força de decisão judicial, deverão ser integralmente abatidos do débito.
Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Do exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS, para fixar os juros de mora nos termos da fundamentação, explicitando a correção monetária.
É o voto.
VANESSA MELLO
Juíza Federal Convocada
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | VANESSA VIEIRA DE MELLO:10176 |
| Nº de Série do Certificado: | 11DE1807055AA463 |
| Data e Hora: | 25/06/2019 17:25:07 |
