Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5359442-83.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
30/04/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/05/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
CARÊNCIA CUMPRIDA. COMPROVADA A ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL
CORROBORADO POR TESTEMUNHOS. PROVIMENTO.
I.Comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período
imediatamente anterior ao requerimento (Resp Repetitivo nº 1.354.908) como requisitos para
concessão do benefício previdenciário.
II. A atividade rural comprovada por meio de prova material corroborada por prova testemunhal
(Súmula nº 149 do STJ e Recursos Repetitivos nºs 1.348.633 e 1.321.493).
III. Entendimento uniforme de que as contribuições previdenciárias são desnecessárias, contanto
que se comprove o efetivo exercício de labor rural. Precedente do STJ.
IV. Requisitos legais para a concessão do benefício pleiteado foram preenchidos.
V. Preliminar rejeitada. Apelação provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5359442-83.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELANTE: APARECIDA ROSA ALVES
Advogado do(a) APELANTE: JOSE BRUN JUNIOR - SP128366-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5359442-83.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: APARECIDA ROSA ALVES
Advogado do(a) APELANTE: JOSE BRUN JUNIOR - SP128366-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora):
Cuida-se derecurso de apelaçãointerposto porAparecida Rosa Alvescontra sentença proferida em
demanda previdenciária, que julgou improcedente o pedido deaposentadoria por idade
ruralpleiteado perante oInstituto Nacional do Seguro Social - INSS.
A parte autora sustenta, em síntese: a) preliminarmente, que houve cerceamento de defesa,
resultando em nulidade da sentença por falta de análise da prova oral; b) há início de prova
material; b) a prova testemunhal é robusta o suficiente para comprovar as atividades rurais; c)
requer a reforma da sentença de primeiro grau, concedendo à autora o benefício desde a data do
requerimento administrativo, invertendo-se o ônus da sucumbência.
Sem contrarrazões, os autos subiram a esta E. Corte Regional.
É o relatório.
rig
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5359442-83.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: APARECIDA ROSA ALVES
Advogado do(a) APELANTE: JOSE BRUN JUNIOR - SP128366-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora):
Preliminarmente, em seu recurso de apelação, a parte autora alegou que houve nulidade da
sentença de primeiro grau por falta de análise da prova oral. A análise de prova cabe ao livre
convencimento do Magistrado. A alegação não procede, pois em nenhum momento houve
cerceamento de defesa, tanto que houve o deferimento de produção de prova oral, como se
observa em despacho ID 147267180, sendo inquiridas 04 testemunhas arroladas pela autora:
duas na comarca de Dois Córregos e duas na de Garça, ouvidas por meio de carta precatória (ID
147267248).
Portanto, rejeito a preliminar.
Da aposentadoria por idade rural
O direito à aposentadoria por idade rural foi estabelecido no artigo 201, § 7º, inciso II, da
Constituição da República, in verbis:
“Art. 201 (...)
§ 7 É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei,
obedecidas as seguintes condições: (...)
II - 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher,
para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia
familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal. (Redação dada
pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)”.
A disciplina legal para exercício do direito pelos trabalhadores rurais consta dos artigos 48 e 143
da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, o Plano de Benefícios da Previdência Social (PBPS), valendo
transcrever o teor do artigo 48, in verbis:
“Art. 48.A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se
mulher.(Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 1oOs limites fixados nocaputsão reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de
trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alíneaado inciso I, na
alíneagdo inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Redação Dada pela Lei nº 9.876, de
26.11.99)
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1odeste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo
exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9odo art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11,718, de 2008)
§ 3o Os trabalhadores rurais de que trata o § 1odeste artigo que não atendam ao disposto no §
2odeste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.(Incluído pela Lei
nº 11,718, de 2008)
§ 4o Para efeito do § 3odeste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de
acordo com o disposto no inciso II docaputdo art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-
contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-
contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008)”.
Quanto aos segurados especiais em regime de economia familiar, a previsão está no artigo 39,
inciso I, da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, in verbis:
“Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica
garantida a concessão: (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de
pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86
desta Lei, desde que comprovem o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua,
no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses
correspondentes à carência do benefício requerido, observado o disposto nos arts. 38-A e 38-B
desta Lei; ou (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)”
Anote-se que, embora o artigo 143 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, refira limitação temporal ao
requerimento do benefício, a concessão da aposentadoria por idade rural contém a sua base
legal na norma do artigo 48 da mesma lei, razão por que não há que se cogitar de tal limite.
(Precedente: TRF 3ª Região, 9ª Turma, Apelação Cível 5000087-29.2018.4.03.6139, Rel.
Desembargadora Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS, j. 07/02/2020)
Enfatize-se, ainda, que o direito à percepção do benefício é regulado pela lei vigente no tempo
em que preenchidos os requisitos, porquanto a interpretação da sucessão de leis no tempo
submete-se à observância do valor da segurança jurídica e, consequentemente, ao direito
adquirido (artigo 5º, XXXVI da CR), em observância ao princípio tempus regit actum, bem assim
pelo pacificado pelo Colendo Supremo Tribunal Federal no RE 597.389/SP, sob o regime da
repercussão geral (Questão de Ordem, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j.
22/04/2009). (Precedentes: REsp 1.900.559/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, j. 24/11/2020;
AgInt no REsp 1.871.619/SP, Rel. Ministro Og Fernandes, j. 16/11/2020).
Assim, a obtenção da aposentadoria por idade rural depende do preenchimento de dois
requisitos: a idade e a prova da atividade rural.
1. A idade mínima de 60 (sessenta) anos, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher,
foi fixada pelo texto constitucional, e também no artigo 11, incisos I, letra “a”; V, letra “g”; VI e VIII,
c/c o artigo 48, §1º, todos da Lei nº 8.213, de 24/07/1991.
2. O exercício de atividade rural, ainda que descontínuo, deve ser demonstrado no período
imediatamente anterior ao requerimento do benefício (artigo 143 da Lei nº 8.213, de 21/07/1991),
pelo tempo correspondente ao da carência do benefício pretendido, atualmente 180 (cento e
oitenta) meses, observados os artigos 142 e 143 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991.
2.1. Inicialmente, anote-se a necessidade de perfazimento simultâneo dos requisitos, embora
essa regra não se aplique à aposentadoria por idade urbana.
Assim, é imprescindível a comprovação da labuta no campo no período imediatamente anterior
ao implemento da idade, conforme entendimento assentado pelo Colendo Superior Tribunal da
Justiça no Tema 642/STJ: “O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando
completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer
seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora
não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no
passado, ambos os requisitos carência e idade”, extraído do julgamento do RESP Repetitivo
n°1.354.908/SP, com a seguinte ementa,in verbis:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE
RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE
TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER
PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º
combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de queo segurado especial tem que
estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural,
momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo
48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter
atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo
descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito.
Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os
requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da
sucumbência.Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado
em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)
Evidentemente, uma vez comprovados os requisitos de idade de do tempo de labor campesino
equivalente à carência, não há que se falar em perda da qualidade de segurado, na medida em
que o direito à aposentação é incorporado ao patrimônio jurídico do trabalhador.
2.2. A comprovação da atividade rural pode ser realizada mediante início de prova material
corroborada por prova testemunhal, conforme o § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991,
in verbis:
Art. 55. (...)
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa
administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando
for baseadaem início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova
exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na
forma prevista no regulamento. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
Nesse sentido, estabelece o verbete da Súmula 149 do C. STJ: “A prova exclusivamente
testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício
previdenciário”. (STJ, Terceira Seção, j. 07/12/1995, DJ 18/12/1995).
O precedente aplica-se também aos trabalhadores rurais denominados “boias-frias”, conforme
assentado no Tema 554/STJ: “Aplica-se a Súmula 149/STJ (...) aos trabalhadores rurais
denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por
outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino,
a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica
violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for
complementada por idônea e robusta prova testemunhal”. (REsp Repetitivo nº 1.321.493, Relator
Ministro Herman Benjamin, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012).
2.3. Ademais, com fulcro na possibilidade de eficácia prospectiva e retrospectiva dos
documentos, o reconhecimento de tempo de serviço rural vai além do período relativo ao início de
prova material, quando for corroborado por prova testemunhal. Esse entendimento foi
consolidado pelo C. STJ no Tema 638/STJ: “Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de
serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova
testemunhal, colhida sob contraditório" (RESP nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves
Lima, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).
Nessa senda, confirmando que não prescinde que o início de prova material diga respeito a todo
o período de carência, contanto que seja corroborado pela prova testemunhal, o C. STJ editou a
Súmula 577/STJ: “É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais
antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o
contraditório” (Primeira Seção, j. 22/06/2016, DJe 27/06/2016).
2.4. As provas materiais aptas à demonstração do trabalho rural foram elencadas no rol
meramente exemplificativo do artigo 106 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, conforme jurisprudência
pacificada (Precedentes: AgInt no AREsp 1372590/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques,
Segunda Turma, j. 21/03/2019; DJe 28/03/2019; RESP nº 1.081.919/PB, Relator Ministro Jorge
Mussi, Quinta Turma, DJe 03/08/2009; TRF3, Nona Turma, Apelação/Remessa Necessária
6080974-09.2019.4.03.9999, Relator Desembargador Federal Gilberto Jordan, publ. 25/11/2020)
A comprovação da atividade rural será realizada, ainda, mediante verificação dos registros de
segurados especiais no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), na forma dos artigos
38-A e 38-B da Lei nº 8.213, de 24/07/1991.
Quanto à declaração de sindicato de trabalhadores rurais, o documento foi submetido a três
disciplinas distintas. Inicialmente, por força do disposto pelo artigo 106 do PBPS, exigia-se a
homologação do Ministério Público. A partir da edição da Lei nº 9.063, em 14/06/1995, passou a
ser necessária a homologação do INSS. E desde 18/01/2019, com a edição da Medida Provisória
nº 871/2019, convertida na Lei nº 13.846, de 2019, não pode ser aceita a referida declaração para
fins de comprovação da atividade rural.
2.5. De outra parte, a ausência de início de prova material constitui óbice ao julgamento do mérito
da lide, resultando, necessariamente, em extinção sem julgamento de mérito, a teor do previsto
no artigo 55, § 3°, da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, caracterizando-se a ausência de pressuposto
de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, na forma do artigo 485, IV, do
CPC.
Foi submetida questão à Corte Especial do C. STJ no sentido de pacificar a solução dos casos
nos quais “a parte autora deixou de instruir seu pedido inicial com documentos que
comprovassem o exercício de atividade rural em momento imediatamente anterior ao ajuizamento
da ação, consoante exigência legal prevista no art. 143 da Lei 8.213/91”.
Aquela C. Corte Superior cristalizou o assunto no Tema 629/STJ: “A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o
julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa”.
(RESP Repetitivo nº 1.352.721/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, j.
16/12/2015, DJe 28/04/2016).
Nesse sentido, o precedente deste E. Tribunal Regional Federal 3ª Região: Terceira Seção, AR -
AÇÃO RESCISÓRIA - 10396 - 0008699-33.2015.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal
SERGIO NASCIMENTO, j.09/06/2016, e-DJF3 Judicial 1 17/06/2016.
Postas as balizas, passa-se ao exame do caso dos autos.
De pronto, verifica-se o cumprimento pela parte autora do requisito etário em 31/10/2012,
incumbindo-lhe, pois, demonstrar atividade campestre por 180 meses.
A parte autora anexou aos autos razoável início de prova material, conforme os seguintes
documentos:
- comprovante de endereço em nome da autora, datado de 2017;
- certidão de casamento, contraído em 2005, com Geraldo Ferreira da Silva. Consta a residência
dos contraentes na Fazenda Manacá.
Foi apresentada a Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS da autora, com os seguintes
registros:
- Pedro Valentim Fernandes, safrista, de 09/05/1996 a 31/10/1996;
- Alfredo Jacomini, SS Sebastião, de 26/04/1995 a 05/05/1996;
- Pedro Valentim Fernandes - Faz. Manacá, safrista, safrista, de 10/03/1997 a 21/07/1997; de
04/01/1999 a 23/09/1999; de 10/04/2000 a 06/09/2000; de 01/02/2001 a 31/03/2001; de
20/05/2002 a 30/08/2002; de 02/05/2003 a 07/09/2003; de 17/05/2004 a 09/09/2004; de
12/01/2005 a 24/08/2005; de 02/05/2006 a 29/08/2006; de 01/02/2007 a 27/08/2007.
Resulta evidenciada a presença de princípios de prova documental do labor rural.
Ainda que na certidão de casamento conste simplesmente a denominação de “serviços gerais”
em nome de Geraldo Ferreira da Silva, marido da autora, há que se observar que ambos residiam
na Fazenda Manacá, na data do matrimônio, ou seja, em zona rural.
Outrossim, os registros na CTPS da autora demonstram que ela laborou por vários anos na lida
rural, como safrista, servindo como início de prova material, devendo, contudo, ser corroborado
por robustas provas orais.
No mais, as testemunhas ouvidas em audiência, sob o crivo do contraditório comprovaram, de
forma coerente e harmônica que a autora laborou como rurícola, pelo menos desde 2008,
conforme depoimentos extraídos da audiência de instrução e julgamento (IDs 147267192 e
147267266):
A testemunha José Teodoro da Silva alegou que "conhece a Dona Aparecida há 10 a 11 anos
mais ou menos. Que trabalhou com ela no Estrela Branca, Meneguethi, Pacheco, Zé Fernandes.
Que até outro dia ela estava trabalhando, no café, carpindo, desbrotando café, todo ano. Que ela
trabalhava por safra, na roça, por turma. Que não tem conhecimento de ela ter trabalhado na
cidade. Que na entressafra de café, não soube informar o que a autora fazia, pois só se tem
serviço de safra em safra. Que o depoente a conheceu em Dois Córregos, de 10 a 11 anos. Que
ao ser indagado sobre a autora ter laborado com mandioca, nas entressafras, ele não sabe, acha
que deve ter ocorrido quando morava em Garça, quando não se conheciam, quando ela se
mudou para Dois Córregos, só trabalharam com café, nas safras. Que ela chegou a vir trabalhar
durante uns 3 períodos antes de se mudar definitivamente para Dois Córregos. Que não se
recorda da primeira vez que ela veio para Dois Córregos. Que a última lavoura que ela trabalhou,
foi na lavoura de café, foi com o Zé Fernando, Lira, depois com o Menegethi. Que isso aconteceu
em 2002, 2007. Que tem dois anos que o depoente se aposentou, daí para cá, parou de trabalhar
com a autora e não sabe mais onde ela se trabalhou. Que a última propriedade em que
trabalharam juntos foi no Meneguethi e no Zé Fernando”.
Nesse mesmo sentido, a testemunha Maria Teresa Avelino asseverou que “conheceu a autor no
café, há sete anos, que vem trabalhando com a autora. Que trabalharam no café, depois carpindo
cana, depois no café de novo e na laranja, até semana passada. Que trabalharam juntas no Lira,
Moça Branca, aqui perto, no Fernandes, e trabalharam com o Nando na fazenda. Que trabalham
de forma 'picada', um tempo numa fazenda, depois em outra. Que tem serviço todo mês, sem
carteira assinada. Que o último turmeiro foi o Nando, em fazenda de café. Que também
trabalharam com o turmeiro Adriano. Que iam trabalhar de ônibus e de perua, cada turmeiro com
sua turma e meio de transporte. Que isso vem ocorrendo desde 2012. Nas safras e nas
entressafras carpiam cana. Que não tem conhecimento da autora ter trabalhado na cidade,
somente na roça. Que o último trabalho foi na semana passada, com o Nando, com café, mas
não se recorda do nome da fazenda. Que antes disso, trabalharam no Carmo, com café, com o
Adriano. Que conhece a autora há 11 anos”.
Deveras, as testemunhas ouvidas sob o crivo do contraditório preencheram as lacunas
necessárias à concessão do benefício buscado, uma vez que a autora possui registros
interpolados entre 1996 a 2007 e as provas orais foram suficientes para completar as lacunas
temporais da autora na lida rural, pois alegaram que chegaram a laborar em conjunto em diversos
períodos, como em 2002, 2007, bem como alegaram tê-la visto ir trabalhar com turmeiros em
período recente, à época da audiência, ocorrida em 2019.
Nesse contexto, a prova testemunhal produzida favorece o pleito autoral, sendo coesa e
harmônica no que tange à prestação do trabalho rural pelo interregno necessário à concessão do
benefício requerido, a acenar à procedência do pedido deduzido.
Preenchidos os requisitos legais, há que se conceder o benefício da aposentadoria por idade
rural, desde a data do requerimento administrativo em 29/05/2017.
Passo à análise dos consectários.
Custas e despesas processuais
O INSS, como autarquia federal, é isento do pagamento de custas na Justiça Federal, por força
doartigo 4º, I, da Lei Federal nº 9.289/1996.
Da mesma forma, em face do disposto no artigo 1º, § 1º, da referida lei, combinado com o
estabelecido pelo artigo 6º da Lei Estadual paulista nº 11.608, de 2003, também está isento nas
lides aforadas peranteaJustiçaEstadual de São Paulo no exercício da competência delegada.
Quanto às demandas aforadas noEstado de Mato Grosso do Sul, a isenção prevista nas Leis
Estaduais sul-mato-grossensesnºs1.135/91 e 1.936/98 foi revogada pela Lei Estadual nº 3.779/09
(art. 24, §§ 1º e 2º), razão pela qual cabe ao INSS o ônus do pagamento das custas processuais
naquele Estado.
Caberá à parte vencida arcar com as despesas processuais e ascustassomente ao final, na forma
do artigo 91 do CPC.
Consectários legais
Aplica-se aos débitos previdenciários a súmula 148 do C.STJ:"Os débitos relativos a benefício
previdenciário, vencidos e cobrados em juízo após a vigência da Lei nº 6.899/81, devem ser
corrigidos monetariamente na forma prevista nesse diploma legal”. (Terceira Seção, j.
07/12/1995)
Da mesma forma, incide a súmula 8 deste E. Tribunal: “Em se tratando de matéria previdenciária,
incide a correção monetária a partir do vencimento de cada prestação do benefício, procedendo-
se à atualização em consonância com os índices legalmente estabelecidos, tendo em vista o
período compreendido entre o mês em que deveria ter sido pago, e o mês do referido
pagamento".
a) Juros de mora
A incidência de juros de mora deve observar a norma do artigo 240 do CPC de 2015,
correspondente ao artigo 219 do CPC de 1973, de modo que são devidos a partir da citação, à
ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02; após, à razão
de 1% ao mês, por força do art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009
(art. 1º-F da Lei 9.494/1997), de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança,
conforme determinado na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e
no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
b) Correção monetária
Há incidência de correção monetária na forma da Lei n. 6.899, de 08/04/1981 e da legislação
superveniente, conforme preconizado pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal, consoante os
precedentes do C. STF no julgamento do RE n. 870.947 (Tema 810), bem como do C. STJ no
julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
c) Honorários advocatícios
Em razão da sucumbência, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados
em patamar mínimo sobre o valor da condenação, observadas as normas do artigo 85, §§ 3ºe 5º,
do CPC/2015.
Os honorários advocatícios, conforme a Súmula 111 do C. STJ, incidem sobre as parcelas
vencidas até a sentença de procedência; porém, tendo em vista que a pretensão do requerente
apenas foi deferida nesta sede recursal, a condenação da verba honorária incidirá sobre as
parcelas vencidas até a data da presente decisão.
Ante o exposto, rejeito a preliminar edou provimento à apelação,nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
CARÊNCIA CUMPRIDA. COMPROVADA A ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL
CORROBORADO POR TESTEMUNHOS. PROVIMENTO.
I.Comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período
imediatamente anterior ao requerimento (Resp Repetitivo nº 1.354.908) como requisitos para
concessão do benefício previdenciário.
II. A atividade rural comprovada por meio de prova material corroborada por prova testemunhal
(Súmula nº 149 do STJ e Recursos Repetitivos nºs 1.348.633 e 1.321.493).
III. Entendimento uniforme de que as contribuições previdenciárias são desnecessárias, contanto
que se comprove o efetivo exercício de labor rural. Precedente do STJ.
IV. Requisitos legais para a concessão do benefício pleiteado foram preenchidos.
V. Preliminar rejeitada. Apelação provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
